O marketing brasileiro é peculiar: para poder criar afinidade com o espectador dizendo que esse terror foi feito pelos mesmos produtoras de “Corra!” e “Não Olhe Para Cima!”, o time de divulgação do filme transformou o título “It Lives Inside” (Ele Vive Dentro, na tradução literal) pelo também imperativo “Não Abra!”. Sem problemas até aí.
Megan Suri de “Desaparecida” é a jovem descendente de indianos Sam que percebe que uma ex-melhor amiga está em depressão e carrega um frasco de vidro sempre fechado. Num rompante de maldade no meio de uma discussão com a amiga, Sam quebra o frasco e libera uma entidade / criatura que passa a perseguí-la.
Faz parte daquele subgênero em que uma entidade diferente que obedece a uma certa lista de “regras” desafia a personagem principal a entender como se faz para destruí-la ou contê-la (tudo bem que o título original já dá uma pista). Então o roteiro e direção tem sempre os mesmos desafios:
- Como criar regras de criação da entidade consistentes e que se mantenham até o fim, sem trapacear para enganar o espectador.
- Como chegar num ponto aonde a tensão chega num nível onde tudo parece perdido, até a reviravolta, e, mais uma vez, sem trapacear?
- Como fazer com que essa entidade realmente seja assustadora, seja na forma ou nos atos?
- Bônus: Como trazer essa raiz da cultura indiana sem prejudicar a essência do terror?
Eis que o filme falha nos 4 desafios.
No primeiro as regras são jogadas na cara do público seja por desenhos ou uma longa explicação de uma determinada personagem e até mesmo por conclusões nada óbvias, sendo que tanto as regras não se conversam – com direito até a uma imitação dos 7 dias de “O Chamado” – como também não explicam a natureza ou motivação da criatura: ela gosta de viver dentro ou fora do frasco? Quando ela sai, porque ela faz o que faz e o que ela almeja? Como ela escolhe quem vai atacar e porque?
O segundo desafio tem a ver com o desfecho, muito bestinha, previsível e conta com uma falta enorme de preparação das personagens. Imagina ter tempo para se “armar” para poder enfrentar a criatura e – para dar um sentido figurado somente – ao invés de levar uma metralhadora, a protagonista preferir levar um estilingue. Difícil demais engolir.
O terceiro desafio é o que faz da criatura uma decepção. Todo mundo gosta de sustos e mortes bem elaboradas. Todo mundo, menos a própria criatura do filme. Ela é a entidade mais fraca de todos os filmes de terror lançados nos últimos anos. Chega até a dar pena dela.
O último desafio era para agregar um valor cultural, mas a diretora estreante, Bishal Dutta, também indiana, quase substituiu o terror por uma discussão étnico-social. A mensagem de mais da metade do roteiro é sobre os descendentes de uma determinada etnia (no caso a indiana) se apegarem mais a sua cultura sem querer se transformar em algo que não são, no caso, uma “americanização”. Só que essa mensagem não é nada sutil e por muitas vezes obscurece o terror que é onde deveria estar focando.
Há alguns longos diálogos que deixam o filme moroso. Então temos uma produção que a toda hora sai dos trilhos e não mira no terror que já é fraco seja pela criatura, seja pelas regras dispersas a qual ela obedece, oferecendo um desfecho que até mesmo o último segundo, feito para ser subjetivo, é sem sal e sem significado.
“Não Abra!” foi diferente de um jeito ruim, pois é um terror que esqueceu de ser terror.
Ficha Técnica:
Elenco:
Megan Suri
Neeru Bajwa
Mohana Krishnan
Betty Gabriel
Vik Sahay
Gage Marsh
Jenaya Ross
Beatrice Kitsos
Sangeeta Wylie
Direção:
Bishal Dutta
História e Roteiro:
Bishal Dutta
Ashish Mehta
Produção:
Raymond Mansfield
Sean McKittrick
Fotografia:
Matthew Lynn
Trilha Sonora:
Wesley Hughes