Armas na mesa (2016)

Por André Dick

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O diretor britânico John Madden conseguiu arrebatar vários Oscars em 1998 por Shakespeare apaixonado e, desde lá, procura acertar de novo um filme que possa ser indicado ao prêmio, em projetos como O capitão Corelli e O exótico Hotel Marigold. Em Armas na mesa, isso não aconteceu, mas seu estilo é visivelmente projetado para isso. É interessante como Madden vai mudando o estilo de acordo com cada projeto, não tendo exatamente uma referência dramática capaz de estabelecer um elo, embora o trabalho com a parte técnica seja sempre competente.
A atriz Jessica Chastain interpreta Elizabeth Sloane, a lobista mais conhecida em Washington, conhecida por sua ambição, e cada gesto dela tenta deixar isso claro. Tendo como parceiro Rodolfo Schmidt (Mark Strong), que a procura para combater a companhia onde trabalha, muito maior, ela se torna figura-chave numa discussão sobre uma votação que envolve congressistas do Senado e uma lei que visa ao controle de quem usa armas. Toda sua equipe a segue, menos Jane Molloy (Alison Pill), que parece tão ambiciosa quanto ela. A cultura norte-americana voltada ao armamento, tema já usado no conhecido documentário de Michael Moore Tiros em Columbine, é exposta de maneira a criar um diálogo com o próprio comportamento dos personagens: todos buscam um alvo, direto ou indireto.

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Do lado contrário, estão George Dupont (Sam Waterston), seu antigo chefe, que queria que ela fizesse lobby para as mulheres sobre o tema, Pat Connors (um interessante Michael Stuhlbarg) e o Senador Ron M. Sperling (John Lithgow), que tenta condená-la por tentar obter votos de maneira proibida. O diretor Madden tenta trabalhar a figura de Sloane de maneira complexa, contudo Chastain, uma atriz reconhecida por seu talento e suas nuances, se mostra um pouco overacting desde o início, excessivamente hiperativa, embora este seja o objetivo do personagem. Sua personagem, paradoxalmente, é excessivamente fria e pouco empática e ela não consegue desenvolvê-la como o faz Isabelle Huppert, por exemplo, em Elle, tampouco como surge em O ano mais violento (com um estilo visual, inclusive, parecido), sendo a primeira atuação realmente questionável do talento de Chastain, exibido desde sua estreia para as grandes plateias em A árvore da vida. Chastain sempre teve como principal elemento um misto de nervosismo com tranquilidade, o que a fazia tão viva em projetos como A hora mais escura. No entanto, ela precisa de um certo apoio do roteiro para realmente brilhar em Armas na mesa, o que falta em alguns momentos, e mesmo que a simbologia sustente a trama (os espelhos, o quarto vazio) tudo demora a fazer mais sentido.

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É quando ela se mostra mais vulnerável e complexa que o filme cresce, principalmente na sua relação com um jovem que acompanha mulheres, Forde (Jake Lacy), e com uma jovem chamada Esme (Gugu Mbatha-Raw), que ela tenta utilizar para tratar do tema de armamento. Quando, curiosamente, a narrativa apresenta menos diálogos e é mais introvertido que funciona. A partir desse ponto, seu comportamento, antes cercado por câmeras e discussões, jantares tentando contentar a políticos e encontros furtivos à noite, passa a ser visto como, inclusive, melancólico. O diretor perde a oportunidade de desenvolver mais a subtrama com Forde, reduzindo tudo a um choque entre identidades que se procuram sem a certeza de que se encontram uma na outra.
Madden utiliza um belo trabalho de fotografia de Sebastian Blenkov para mostrar os bastidores de Washington e a maneira como Sloane trabalha, em conflito com seus companheiros de equipe e sempre de forma ambiciosa, mas o mais curioso é que em nenhum momento se esclarece por que ela se predispõe a esse papel. A atuação de Chastain em conjunto com Mark Strong não tem a força que exibiam em A hora mais escura, embora renda bons momentos, naqueles em que o roteiro de Jonathan Perera encadeia diálogos e conflitos entre os personagens e a montagem de Alexander Berner, que realizou o feito de realizar aquela de Cloud Atlas para as irmãs Wachowski e Tom Tkywer, encubra muitas pistas com grande efeito.

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Armas na mesa também apresenta características que o aproximam de alguns filmes dos anos 70, em que havia conspirações políticas agindo nos bastidores de um tema visto por todos e entendido por poucos, por exemplo em A trama e Três dias do Condor, nos quais os bastidores da política se convertiam na perseguição a um determinado indivíduo, de maneira não muito clara. Em sua primeira parte, ele é particularmente confuso, alternando cenários das agências e jantares com congressistas, sem, no entanto, se perder quando passa para a vida solitária de Sloane. O que é mais perturbador nesse projeto é como Madden em alguns momentos realmente retrata a solidão existente em Washington, mesmo diante de mudanças que levariam a uma drástica reviravolta na sociedade. Assim, Armas na mesa realmente, em alguns momentos, capta a atmosfera de Washington e a pressão dessas equipes trabalhando contra o tempo para aprovarem determinadas leis. Trata-se de uma obra em parte desagradável, porque o espectador não tem exatamente pelo que torcer, e em parte instigante, à medida que trata de um tema bastante interessante e propício a debates.

Miss Sloane, EUA/FRA, 2016 Diretor: John Madden Elenco: Jessica Chastain, Mark Strong, Gugu Mbatha-Raw, Alison Pill, Michael Stuhlbarg, Jake Lacy, Sam Waterston, John Lithgow Roteiro: Jonathan Perera Fotografia: Sebastian Blenkov  Trilha Sonora: Max RichterProdução: Ariel Zeitoun, Ben Browning, Kris Thykier Duração: 132 min. Distribuidora: Paris Filmes Estúdio: Transfilm

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