Um homem chamado Ove (2016)

Por André Dick

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Dirigido por Hannes Holm, Um homem chamado Ove foi indicado aos Oscars de melhor filme estrangeiro, pela Suécia, e melhor maquiagem e cabelo. Ele acompanha a vida de Ove (Rolf Lassgård), de 59 anos, que atua como líder de um bairro fechado, tentando impor regras intransferíveis, e sofre demissão do emprego, alguns meses depois de perder a sua esposa. Abalado, ele quer se matar e, para isso, compra uma corda, que tenta pendurar no teto de sua sala. Este início lembra muito As confissões de Schmidt, de Alexander Payne, e são raros os filmes que tratam da terceira idade de maneira realmente vigorosa.
Certo dia, chegam ao local Parvaneh (Bahar Pars), que está grávida, acompanhada de seu marido, Patrick (Patrik Tobias Almborg), e suas duas filhas (Nelly Jamarani e Zozan Akgün). Ao derrubarem a caixa postal de Ove com o carro, eles arranjam a princípio um incômodo, pois o que mais o vizinho faz é gritar para os que tentam andar de carro nas redondezas; em seguida, essas mesmas pessoas poderão fazer parte de uma mudança. Ove, em cada tentativa de suicídio, lembra de dias passados, seja na infância (Viktor Baagøe), quando tem uma relação concreta com o pai (Stefan Gödicke), um ferroviário, seja na juventude (quando é interpretado por Filip Berg) e conhece Sonja (Ida Engvoll), justamente num trem.

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Este filme de Hannes Holm é baseado num best-seller de Fredrik Backman e trabalha com temas distintos a cada passagem: Ove em sua idade mais velha é ranzinza, enquanto jovem era inseguro, e Sonja é a representação do que melhor lhe aconteceu. Holm conta essa história com flahbacks sem cansar, apesar de algumas cenas mal encaixadas (a ida ao hospital, por exemplo). Suas lembranças costuram a narrativa de maneira interessante, pois são desenvolvidas de maneira a contrapor duas versões de épocas diferentes da mesma pessoa. Há uma certa atmosfera buscada em Cloud Atlas, principalmente da história que foca um editor de livros que acaba parando num asilo e relembra de uma antiga amante – inclusive o trabalho com cores é o mesmo. Mais interessantes ainda são suas relações com Parvaneh, iraniana, quando resolve lhe oferecer algumas aulas de direção, Jimmy (Klas Wiljergård), que sempre está atrás dele sorridente, mesmo sendo menosprezado, e Rune (Börje Lundberg), um amigo do qual se afastou porque teria comprado algo que o deixou enciumado. É Parvaneh que, afinal, o aproxima novamente de uma vida real, e passa a ser emocionante a cena em que ambos vão a uma cafeteria.

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O mais interessante em Um homem chamado Ove não é apenas o elenco excelente, a começar por Rolf Lassgård, extremamente bem maquiado para aparentar mais idade, mas também a fotografia encantadora de Göran Hallberg, situando o personagem quase num universo irreal, em que tudo aparenta ser simétrico, como as casas de um bairro em que é preciso manter todos longe da corrida de um carro, o que acaba lhe rendendo um adversário inconveniente. Para complicar as coisas que devem ser simétricas e no horário certo, Ove se depara com um gato que passa a andar às voltas de sua casa. Todas essas manias do personagem parecem decorrer exatamente dos milésimos de segundo que transformam sua vida em duas situações que o diretor mostra com clareza: ou seja, sua mania em coibir a pressa das pessoas está justamente ligada a acontecimentos pontuais marcados por veículos que o atormentam. Dessa maneira, parece que o personagem não apenas responde por sua própria complexidade, como também pelo passado dos demais que o cercam e, igualmente, acabam por enredá-lo num mesmo lugar. Outros objetos, a exemplo da bicicleta, também são sintomáticos desse apego do personagem ao passado, assim como de sua obsessão pela marca de carros.

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O filme tem todos os elementos dramáticos para ser chamado de manipulador e possui algumas mudanças de tom mais abruptas e deslocadas, mas ele consegue conservar um sentimento especial pelos personagens e por breves aparições de uma juventude que se foi ou uma infância guardada como algo longínquo e é tão permanente quanto as coisas que realmente oferecem segurança. Ove é um personagem que se situa entre extremos, e nenhum deles é mostrado com aspecto desagradável, muito por causa da atuação realmente excelente de seu ator, capaz de desenhar nuances inesperadas mesmo dentro daquilo que já se espera dele. A lembrança dele de sua esposa e as idas recorrentes ao cemitério para visitá-la em sua sepultura costuram uma narrativa que poderia redundar num drama trágico quando parece trazer muito mais um reencontro com uma possibilidade de mudança. Pode ser visto como apelativo e previsível, por outro lado é simples e emociona.

En man som hetter Ove, SUE, 2016 Diretor: Hannes Holm Elenco: Rolf Lassgård, Filip Berg, Ida Engvoll, Bahar Pars, Tobias Almborg, Klas Wiljergård, Chatarina Larsson, Börje Lundberg, Stefan Gödicke, Anna-Lena Bergelin, Simeon Lindgren, Maja Rung, Fredrik Evers, Poyan Kamiri Roteiro: Fredrik Backman, Hannes Holm Fotografia: Göran Hallberg Trilha Sonora: Gaute Storaas Produção: Annica Bellander, Nicklas Wikström Nicastro Duração: 116 min. Estúdio: Tre Vänner Produktion AB

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2 Comentários

  1. Denise Teles Rodrigues

     /  17 de junho de 2017

    boa crítica!

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