Culpa (2018)

Título original: Den Skyldige

Título em inglês: The guilty

País: Dinamarca

Duração: 1 h e 24 min

Gêneros: Crime, drama, thriller

Elenco Principal: Jakob Cedergren

Diretor: Gustav Möller

IMDB: https://www.imdb.com/title/tt6742252/


“Debaixo d’água…

…tão calmo.

Sem perturbações.

Na água as coisas se movem lentamente ao redor.

Em silêncio.

Um grande silêncio azul!”


Começo a crítica com citações bastante serenas que podemos ouvir em uma determinada passagem de “Culpa“. Infelizmente, a história não é um documentário sobre alguma criatura aquática em seu tranquilo cotidiano. Na verdade, tais frases destoam completamente do viés narrativo, e as coloquei nesse texto apenas para proporcionar um certo escapismo – o mesmo propósito da inserção delas no filme -, pois a realidade é outra! Trata-se de uma pesada história transcorrida em meio ao caos urbano de uma grande cidade dinamarquesa, que, ao longo de todos os infindáveis dias, escuta, através dos ouvidos de um policial, a violência tomar corpo sob as mais diversas formas. “Culpa” é um filme surpreendente e produzido com extrema simplicidade. É a prova que para fazer um bom filme basta haver uma boa ideia. É o indicado pela Dinamarca ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2019.

Eis a sinopse: “O policial Asger trabalha na Central de Emergências de uma localidade na Dinamarca atendendo cidadãos que precisam da intervenção da polícia ou simplesmente de uma ambulância. Em um de seus plantões, ele atende a uma mulher desesperada, que clama por socorro após ter sido sequestrada. Asger se interessa pelo caso – mesmo sem poder investigar, pois está respondendo a um inquérito -, e tem que correr contra o tempo para resolver o crime, que, para sua surpresa, é mais complexo do que ele imagina e, para dificultar, a única arma que ele pode utilizar nessa conjuntura é a palavra.”

Culpa é uma palavra de difícil atribuição a alguém. A culpa é às vezes subjetiva e pode ser relativizada em várias situações, como a chamada legítima defesa ou mesmo a presença de problemas mentais, que são dois atenuantes mostrados no filme. Nesse contexto, o filme foca em dois crimes já consumados: um do próprio policial, cujo julgamento se avizinha, e outro relacionado às circunstâncias nas quais Iben e Michael, que são, respectivamente, a mulher sequestrada e seu ex-marido e suposto sequestrador estão inseridos. Notem que um homem que tenta afastar a sua culpabilidade em relação a um delito, Asger, terá que julgar esse elemento subjetivo que liga o fato ao seu autor em relação a um crime cometido por outrem, tendo como subsídios apenas vozes perturbadas e algumas poucas informações disponíveis. É um jogo de xadrez, no qual o policial controla os movimentos de suas peças apenas através de sua sensibilidade – e sem enxergar o tabuleiro. Podemos atribuir o interesse pelo sequestro a um senso de humanidade e compaixão do protagonista, ou mesmo a um compartilhamento de culpas entre os envolvidos. O certo é que essa motivação não está bem explicita no filme, mas considero essa resposta até irrelevante pelo viés narrativo apresentado.

Se você, atento leitor, tiver prestado atenção nos dados técnicos que são mostrados logo no início desse texto, vai notar que o elenco principal do filme em destaque é composto apenas por um ator: o intérprete do policial Asger, Jakob Cedergren. Por incrível que pareça, ele é o único “personagem físico” que tem relevância nesse filme, ou seja, trata-se de uma jornada de um personagem só, que apenas interage com personagens virtuais, diga-se, vozes. Mesmo a narrativa tendo essa característica um tanto quanto arriscada, afinal, ela teria todos os atributos para ser bastante monótona, a tensão se instala logo no início e persiste durante toda a exibição do filme. Essa é a prova da excelência do roteiro minimalista e um prêmio à ousadia do diretor. “Culpa” é um exercício de imaginação interessantíssimo, pois proporciona uma imersão do espectador ao tentar construir mentalmente o ambiente no qual as cenas são passadas, assim como o policial deve fazer também, ou seja, o espectador obrigatoriamente se põe no lugar de Asger. Acreditem que esse exercício trará muita angústia, pelas cartas do baralho que são jogadas à mesa. Trata-se realmente de uma viagem cinematográfica diferente.

Lidar com pessoas é sempre um desafio, pois cada uma delas tem uma forma de pensar e agir. Lidar com pessoas em desespero, com seus discernimentos alterados, é ainda pior. Lidar com o imprevisível, num contexto no qual novas descobertas e reviravoltas tomam forma a cada instante hiperboliza a dificuldade. Além disso tudo, não há imagens, só palavras constituídas de sentimentos obscuros, para serem processadas na mente combalida de um policial. Esta é a síntese de “Culpa“. Um filme para perder o controle! Atribuo 5 estrelas a essa obra com bastante louvor.

“Deslumbrante”, segundo o famoso crítico Roger Ebert.

O trailer, com legendas em inglês, segue abaixo.

Adriano Zumba


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