Hello, my name is Doris

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Eu nunca tinha prestado atenção na Sally Field até ver um esquete da Amy Schumer, com a Julia Louis-Dreyfus, a Patricia Arquette e a Tina Fey falando sobre mulheres que envelhecem e perdem espaço em Hollywood. No esquete elas lembram que Sally Field foi mãe de Tom Hanks em Forrest Gump, quando ela tinha 48 anos contra os 38 dele. Talvez esse exemplo nem seja perfeito, porque ela é mãe do Forrest menino no início do filme, e depois, com maquiagem, ela é envelhecida para mostrar a idade passando. Mesmo assim me dei conta de que quando era criança sempre via Field em alguns filmes como a mãe de alguém, e notei também que estava há muito tempo sem ver alguma coisa com ela.

Pois é, acho que a maioria da pessoas já está cansada de saber que atrizes jovens e bonitas dificilmente conseguem manter a carreira em alta depois que envelhecem. Os exemplos são muitos: Daryl Hannah, Diane Lane, Meg Ryan. Elas nem precisam envelhecer muito para serem jogadas para papéis secundários. Às vezes tenho a impressão de que simplesmente não há papéis para mulheres a partir de determinada idade. Homens também envelhecem e perdem status, mas mesmo assim eles ainda conseguem cenas românticas com atrizes mais jovens, quer ver? Jeff Bridges e Maggie Gyllenhaal em Coração Louco; Catherine Zeta-Jones e Sean Connery em Armadilha. Mesmo em Uma linda mulher, de 1990, que eu adoro, o Richard Gere tinha 41 para os 23 de Julia Roberts.

Por isso, Sally Field ficou um tempo na minha cabeça. No fim do ano passado eu descobri esse filme que seria lançado em 2016. Hello, my name is Doris é uma comédia romântica muito fofa e triste, e a protagonista é ninguém menos que Sally Field. Aos 69 anos. Seu par romântico é Max Greenfield, o Schmidt de New Girl, que vai fazer 37 em 2016. Só isso já deixa o filme para lá de interessante.

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Hello, my name is Doris é sobre uma mulher na terceira idade que viveu toda a sua vida com a mãe. Então a mãe morre e ela se vê sozinha, numa casa cheia de tralha, porque, lógico, ela é acumuladora e guarda tudo o que acha pela rua. Mas como eu disse, o filme é fofo, e Doris não é o estereótipo de uma velhinha maluca (mesmo que ela seja bem doidinha). Ela se veste de um jeito diferente para a idade, quase como uma menina hipster, com laços no cabelo, óculos de gatinho e vestidos e saias com estampas fofas.

Doris trabalha no mesmo lugar há muito tempo. Ela é uma das últimas funcionárias de uma agência de outro século, que foi se reerguendo e se moldando para os novos tempos. Como remanescente do passado, Doris pode não ter se reinventado, mas talvez por não ser um estereótipo de idosa entediante, conseguiu seu lugar, mesmo não se sentindo totalmente aceita neste ambiente de trabalho, que virou uma agência descolada com jovens modernos que chegam ao trabalho de bicicleta. Lá ela conhece o recém-transferido John Freemont. Assim eles vivem uma história de amor, pelo menos na cabeça dela. Mas uma história de amor possível. “Eu sou possível” é o mantra que Doris vive repetindo.

A partir dessa premissa o filme se propõe a fazer a gente passar vergonha alheia. Doris é fofa, mas também é bem desatinada. Por isso, eu ri muito, sorri que nem uma boba em vários momentos, mas também passei muito nervoso e embaraço. Uma cena em especial me fez tampar os ouvidos, só não digo qual para não estragar com um belo de um spoiler. É um desses momentos em que um filme se esforça para a gente gostar de seus protagonistas e da zona de conforto que eles frequentam, só para depois criar situações arriscadas em que eles vão ter que agir totalmente contra o que seria o previsível.

Doris é delicada, tímida e é quase uma velha dos gatos. Mas o charme do filme está em sua maluquice. Ela é uma stalker nata, e depois de ter certeza de que ela e John devem ficar juntos, as situações embaraçosas só aumentam, mas vale dizer que algumas são apenas hilárias, e que realmente divertem.

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O estilo de Doris foi o que mais me empolgou. Para o círculo famíliar, ela parece uma pessoa excêntrica e deslocada, mas quando ela conhece um clube noturno (stalkeando John na cara dura) no Brooklin, e as pessoas que frequentam o lugar a aceitam, e mais, quase a idolatram, ela se sente bem e adequada. Encaixou. Parece que ela não estava vivendo como as pessoas de seu tempo, era quase como se ela tivesse nascido numa geração errada. Sua fisionomia e personalidade acabaram por reverberar nos costumes e valores dos jovens, que a acolheram como se ela fosse um frescor, uma novidade muito bem vinda. Num exemplo bem maluco, parece com um escritor que só tem a obra reconhecida quando outra geração chega. Com leveza, essa discussão está no filme.

Hello, my name is Doris é triste por abordar a solidão de uma pessoa idosa, mas quer passar a mensagem de que sempre há tempo se houver entusiasmo, e também é especial por conseguir fazer isso criando um estilo próprio: cenas hilárias e constrangedoras, cenas românticas, uma protagonista que não deixa ninguém sentindo falta de uma atriz de trinta ou vinte e poucos anos. Sinto que ele não pode entrar em nenhuma categoria específica: uma comédia romântica triste ou um filme triste que nos engana com algumas gracinhas. Com uma boa dose de personalidade, o longa é a cara deste século, sem ser apelativo e enfadonho. Sempre me empolgo com filmes comerciais que conseguem isso. Na minha cabeça, Hello my name is Doris vai ficar marcado como uma resposta à questão de que tratava o esquete de Amy Schumer. Sally Field é pegável.

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