Michael Myers vive! Enquanto Freddy Krueger e Jason Vorhees sucumbiram por conta de uma penca de filmes assustadores de tão ruins, o maníaco da franquia “Halloween” está vivinho e cada vez mais violento. “Halloween Kills: o Terror Continua” já entrega no título se tratar de uma continuação do filme de 2018. O longa anterior fez muitos esquecerem os inúmeros tropeços da saga. Estava distante de ser uma obra-prima do terror, mas agradou fãs e foi bem nas bilheterias. O suficiente para dar continuidade à trilogia pré-concebida, cujo segundo capítulo chega agora. Esta nova produção remete ao anterior e também ao original de John Carpenter no distante 1978. Ferida após mais um embate com Michael, Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) recebe no hospital os cuidados da neta e da filha, vividas por Judy Greer e Andi Matichack, respectivamente. Elas juram que o psicopata mascarado morreu num incêndio. Não demoram a descobrir que ele não apenas morreu, como trucidou os bombeiros naquela que talvez seja a melhor cena do filme. A partir daí, o longa se propõe a revisitar o passado, trazendo personagens do clássico dos anos 1970, agora mais velhos e atormentados. Primeiro problema: tais tipos estão ali apenas para servirem como vítimas do protagonista, visto que têm densidade psicológica zero. As sequências de assassinatos são brutais e muito bem filmadas, embora falte suspense. Segundo problema: “Halloween Kills” tenta explicar as motivações de Michael, algo desnecessário a esta altura do campeonato, e não soa nem um pouco convincente, ainda mais utilizando o recurso da narração. Munido de facas, picaretas e qualquer objeto cortante ou perfurante, o homicida vai deixando um rastro de sangue ao longo de pouco mais de uma hora e meia de filme. A atmosfera nostálgica que permeia a produção torna este novo “Halloween” um passatempo agradável, embora com todos os problemas de um filme do meio de uma trilogia. Agora, imperdoável mesmo é transformar Laurie Strode em coadjuvante. “Halloween Kills” se ressente da ausência de um confronto entre Michael e sua maior inimiga.
O que é real e o que é ficção? Essa é a indagação que move tanto “O Menino que Matou Meus Pais” quanto “A Menina Que Matou os Pais”, disponíveis no Amazon Prime Video. “Os filmes sobre o caso Richthofen” apresentam duas versões sobre um caso policial que movimentou a opinião pública em 2002: o brutal assassinato da psiquiatra Marísia e do engenheiro Manfred von Richthofen. A filha do casal, Suzane, o namorado, Daniel, e o irmão dele, Cristian Cravinhos, foram condenados pelo crime. Chocante é pouco para essa história. Os longas utilizam como fonte os autos do julgamento e traçam perfis distintos do par principal, vividos com desenvoltura por Carla Diaz e Leonardo Bittencourt. A ideia, um tanto óbvia, é fazer com que o público tire as suas conclusões. Ambos recriam, mesmo com recursos limitados, a vida dos personagens antes do crime e estão entrelaçados. Um não existe sem o outro. Os resultados são irregulares, embora “A Menina Que Matou os Pais” seja nitidamente superior a “O Menino Que Matou Meus Pais”. A narrativa é menos burocrática e cativa o espectador. Carla Diaz se sai bem, a despeito da peruca constrangedora nas cenas no tribunal, e de alguns exageros de interpretação reforçar uma aura perversa. Não à toa, os filmes pecam pelo tom novelesco de algumas cenas. Quem for em busca de um estudo psicológico vai dar com os burros n´água. Os roteiros fracos parecem se limitar a narrar os fatos. Temas interessantes ficam apenas na superfície. Entre altos e baixos, o espectador acompanha com interesse o desenrolar das tramas, mesmo sabendo de cor alguns detalhes da história. Ao final, fica no ar outra pergunta: não seria melhor condensar os dois filmes em um só? O público certamente sairia ganhando.
A presença luminosa de Amy Adams (“Liga da Justiça”, “A Chegada”, “Animais Noturnos”) na dianteira do elenco é um chamariz para o filme “A Mulher na Janela”, da Netflix. O elenco, por sinal, é pra lá de tarimbado. Conta ainda com Gary Oldman, Julianne Moore e Jennifer Jason Leigh. O suficiente para atiçar a curiosidade dos cinéfilos. Amy faz uma psicóloga infantil agorafóbica que combina remédios tarja preta com taças de vinho e curte espionar seus vizinhos. Não demora para ela testemunhar um assassinato. A referência do filme de Joe Wright é o manjado clássico sobre voyeurismo “Janela Indiscreta”, de Alfred Hitchcock. Se o fotógrafo vivido por James Stewart no longa do mestre do suspense estava confinado no apartamento por conta da perna quebrada, a psicóloga simplesmente não colocar os pés para fora de casa devido a um trauma pesadíssimo. A primeira parte de “A Mulher na Janela” é primorosa, com a câmera explorando a vastidão e a desordem do lar da protagonista, expressando bem a confusão mental da personagem. Os atores estão ótimos. O ponto alto do filme é o diálogo na cozinha entre as personagens de Amy e Julianne. Há uma certa estranheza nas falas e atuações que deixam o espectador com a pulga atrás da orelha. Aquilo ocorreu ou foi fruto de alucinação de alguém que vive entupida de medicamentos? O longa pouco explora essa questão e segue o caminho fácil dos suspenses mais rasos a partir de sua segunda metade. É fato que “A Mulher na Janela” prende a atenção até o final, assim como outro thriller recente da Netflix, “Fuja”, por coincidência também estrelado uma baita atriz (Sarah Paulson). Ambos partem de ótimas premissas, mas apelam para as soluções fáceis no intuito de agradar ao público.
Vencedor do Festival de Gramado do ano passado, “Pacarrete” chega ao cinemas em meio à pandemia do coronavírus, quando o público ainda hesita em retornar às salas da exibição. Teve melhor sorte que alguns exemplares do cinema brasileiro recente, lançados direto em streaming. É filme para ser visto no esplendor da tela grande. Pacarrete, o nome esquisito que batiza essa delicada produção, é uma derivação sertaneja do francês pâquirette. Aquela florzinha do campo conhecida como margarida e também o nome da protagonista. A extraordinária Marcélia Cartaxo, até hoje lembrada como a Macabéa do clássico “A Hora da Estrela” (1985), encarna a ex-bailarina e ex-professora de dança com a cabeça e os pés nas nuvens. Na pequena Russas, no sertão nordestino, Pacarrete planeja apresentar um espetáculo de dança na festa de aniversário do município. Não vai ser nada fácil quando a prefeitura programou um show de forró para o evento. Está aqui um dos temas do filme, o embate entre a cultura popular e a erudita. Pacarrete é elegante, culta e não se cansa de falar francês com o dono de uma quitanda (o ótimo João Miguel), o único da cidade que lhe dá ouvidos e parece entender a “loucura” da personagem. Mas se mostra uma mulher arretada quando provocada. E não são poucas as vezes em que ela desce do salto. O filme do estreante Allain Deberton combina momentos de doçura, agressividade e de pura fantasia. Um dos momentos de maior força dramática do longa é numa cena trágica ao som de “We Don’t Need Another Hero”, com Tina Turner, da trilha de “Mad Max: Além da Cúpula do Trovão”. Marcélia brilha não apenas nessa sequência, mas o filme todo com uma atuação antinaturalista (a protagonista parece declamar os diálogos e sua fala tem um tom empostado) e trejeitos desengonçados. Méritos da direção à parte, “Pacarrete” é dessa atriz magnífica que o cinema brasileiro presenteou com mais um papel memorável.
A incessante busca por referências em uma série ou filme pode prejudicar a sua fruição, assim como a avaliação do produto audiovisual. Críticos e espectadores se apressaram em apontar elementos de filmes como “A Bruxa”, “Midsommar - O Mal Não Espera a Noite”, “A Profecia” e “O Iluminado”, entre tantos outros, em “Desalma”, da Globoplay. A série não tem a pretensão de reinventar o terror, gênero que coincidentemente usa e abusa de referências. Mas há em “Desalma” um desejo de fazer terror com tempero brasileiro, a começar pela ambientação. A ação se passa na misteriosa Brígida, comunidade de descendentes ucranianos no sul do País que parece meio deslocada no tempo. Os filhos dos moradores se preparam para realizar a festa folclórica de Ivana Kupala, na qual os jovens dançam e bebem ao redor de uma enorme fogueira e as meninas usam arranjos florais na cabeça. A proximidade com os festejos reacende o mistério em torno de um crime ocorrido durante a celebração há 30 anos e até hoje uma ferida não cicatrizada. Salta aos olhos o requinte da produção. Fotografia, trilha sonora, locações e sobretudo a direção cinematográfica. O capricho resultou em comparações com produções norte-americanas e europeias. Como se fosse demérito realizar um produto audiovisual brasileiro com padrão internacional. “Desalma” baseia-se em livro da escritora Ana Paula Maia, que também responde pela criação da série. Temas como choque e identidade cultural e religiosidade marcam presença na narrativa que se alterna em dois tempos: passado e presente. O brutal assassinato de Halyna (Anna Melo), filha da amargurada Haia (Cássia Kis, que rouba todas as cenas), que carrega a fama de bruxa, movimenta os dez capítulos desta primeira temporada. Se no elenco de veteranos destaca-se ainda Cláudia Abreu, na pele da mãe de um garoto vítima de possessão, o elenco juvenil deixa bastante a desejar. Atuações fracas e diálogos didáticos nos flashbacks destoam do cuidado com outros elementos da série. O ritmo da história é devagar, e a trama só começa a engrenar a partir do quarto episódio. A lentidão ajuda o espectador a se embrenhar nesse mundo tão misterioso, ameaçador e fascinante quanto as matas catarinenses na quais se passa a trama de “Desalma”.
Existem filmes que ganham de cara o espectador e tornam o seu dia mais leve e alegre. “Aos Olhos de Ernesto” encanta com uma singela e delicada história sobre a velhice. Teria feito uma boa carreira nos cinemas não fosse a pandemia que nos privou das emoções na sala escura. Está agora nos cinemas e também no Now, Vivo Play e Oi. Merece (muito) ser descoberto. O protagonista é um homem uruguaio de 78 anos (o excelente Jorge Bolani) que está ficando cego. O filho (Júlio Andrade, o Dr. Evandro de “Sob Pressão”) insiste para o que o pai venda o apartamento em Porto Alegre e vá morar em ele em São Paulo. Ernesto rejeita. O local guarda muitas memórias da mulher que morreu, as quais ele não quer abandonar. Além disso, não quer ser um fardo. Eis que entra em cena Bia (Gabriela Poester), uma passeadora de cães de vinte e poucos anos. A amizade não começa lá muito bem. Mas o ex-fotógrafo não só vai contornar a enorme diferença de idade entre eles como perdoar os deslizes da garota. Bia terá mais a aprender com Ernesto do que ele com ela. O roteiro a quatro de mãos (Jorge Furtado e a diretora Ana Luiza Azevedo) é primoroso e os diálogos são deliciosos, salpicados de um humor agridoce, sobretudo aqueles que falam sobre o envelhecimento. Há uma cena memorável na qual Ernesto e o vizinho jogam xadrez e falam sobre suas taxas de colesterol, glicemia, creatinina etc. A passagem do tempo é o tema central do filme, que também fala de machismo, violência contra a mulher, confiança e amizade. Tudo tratado com muita leveza graças ao roteiro, um elenco afinadíssimo e a direção segura de Ana Luiza. A relação fraterna que se estabelece entre Ernesto e Bia fascina, diverte, comove e encanta em doses iguais. Um dos mais belos e ternos filmes de 2020.
Refilmar Alfred Hitchcock é tarefa inglória. Até mesmo o tarimbado Gus Van Sant (“Gênio Indomável”, “Elefante”, “Milk”) não foi poupado das críticas ao refazer “Psicose”. Se o original é imbatível, qual a razão de refilmar? Fisgar o público jovem? “Rebecca – A Mulher Inesquecível”, único longa do mestre do suspense a abocanhar o Oscar de Melhor Filme, ganhou uma adaptação para a geração Netflix. Nos papéis centrais estão a loirinha Lily James e o grandalhão Armie Hammer. A trama sobre a dama de companhia que se casa com um ricaço e vai morar na gigantesca propriedade da família na Inglaterra, onde passa a ser atormentada pelo “fantasma” da finada mulher dele, é bem conhecida e inspirou até novela da Globo (“A Sucessora”, com Susana Vieira). O filme baseia-se no livro da escritora Daphne Du Marier, que encontrou no cinema de Hitchcock o veículo perfeito. O romance contém boas doses de sadismo e perversidade ao gosto do cineasta britânico. Tais características foram diluídas no remake. Kristin Scott-Thomas é uma atriz e tanto, porém não transmite o temor que a devotada governanta vivida por Judith Anderson no original passava para Joan Fontaine. O erro não é de escalação do elenco, mas de direção. No cinema, Manderlay em seu gigantismo lembrava um castelo de filme de horror. O diretor Bean Wheatley não tira proveito da direção de arte caprichada e se mostra muito aquém das possibilidades deste conto gótico. Falta suspense, ambiguidade e mistério ao filme. Tampouco o mergulho na loucura da protagonista é desenvolvido de forma satisfatória. Este novo “Rebecca” consegue o improvável: desagradar tanto os fãs do filme original quanto as novas gerações. Pobre Hitchcock!
Quem já viu pelo menos uma das muitas séries espanholas do catálogo da Netflix notou a predominância dos gêneros policial e suspense em tramas sobre famílias. “Perdida” é indicada para quem curtiu “O Sucessor” e a recente “Alguém Tem que Morrer”. Há também ecos óbvios de “Prison Break” na trama sobre o pai (Daniel Grao) que vai para uma prisão barra-pesadíssima na Colômbia disposto a achar o homem que raptou sua filha (Juan Carlos Messier) e descobrir o paradeiro da garota. O enredo ainda inclui uma advogada (Adriana Paz) que presta os mais variados serviços para um chefão do narcotráfico (Fernand Solórzano), a mulher dele, uma atriz canastrona, e policiais corruptos. “Perdida” combina drama, suspense, ação e elementos do filme de prisão. Prende a atenção, embora o excesso de flashbacks para explicar as reais motivações dos personagens cansem o espectador. Como se os 11 episódios de cerca de 50 minutos não fossem suficientes para dar conta da história. O desleixo com a narrativa se acentua no desfecho da trama, na qual saltam aos olhos as situações inverossímeis e atropeladas.
“Alice Júnior” tem cara de comédia romântica teen bobinha, mas não se deixe levar pela aparência. O filme é a mais grata surpresa do cinema nacional neste último trimestre de 2020. O estreante em longas Gil Baroni assina uma produção LGBTQI com o dom de encantar até mesmo os mais insensíveis. A tarefa de retratar uma adolescente trans e youtuber (a carismática Anne Celestino, premiada no Festival de Brasília) que se muda de Recife para o sul do País e enfrenta o preconceito poderia ser espinhosa e repleta de clichês, mas é tudo tratado com muita cor e leveza. Os clichês aparecem de vez em quando, mas servem apenas para fazer fluir a narrativa e criar empatia com o público. O tom é de fábula, escolha que se revela acertadíssima. Não bastasse a presença luminosa da atriz principal, Baroni recorre a expedientes que falam a essa geração, dos memes das redes sociais nos efeitos digitais que pipocam na tela à trilha sonora que une Chico Science e Nação Zumbi e Pablo Vittar. Na escola, a “forasteira” reivindica o direito a não usar o uniforme escolar e se vestir como um garoto ao uso do banheiro feminino enquanto sonha com o primeiro beijo. Sim, Alice é uma BV! Os diálogos soam naturais e divertidos, como se tivessem sido escritos pelos próprios adolescentes do filme. Os personagens adultos não são tão interessantes assim, mas não comprometem. Em contraponto ao conservadorismo e a homofobia reinantes na escola, tanto o pai da protagonista quanto a mãe bicho-grilo de um estudante gay se mostram livres de preconceitos. Mas é no desenvolvimento da relação de Alice com um casal que inclui seu crushzinho e ameaça formar um triângulo que o filme amarra todas as pontas do roteiro e dá um desfecho bacana à história.
American Horror Story” encontra “Hollywood” em “Ratched”, a mais recente criação do prolífico Ryan Murphy. O terror com um pé no grotesco, o apuro estético e apelo nostálgico se fazem presentes nesta nova produção do showrunner para a Netflix. Ratched, como tudo mundo está careca de saber, é a enfermeira imortalizada pela oscarizada Louise Fletcher em “Um Estranho no Ninho”. Cabe a Sarah Paulson, atriz-fetiche do produtor e roteirista, a tarefa de dar vida à calculista e sádica personagem em um manicômio no final dos anos 40. O assassinato brutal de quatro padres dá o start na trama. O criminoso vai parar num hospital psiquiátrico, o mesmo onde a enfermeira arranja uma vaguinha. Joguinhos que envolvem chantagens e mentiras são as armas da enigmática Mildred Ratched para conquistar a confiança do patrão e galgar degraus dentro da hierarquia do hospital. Paulson está bem, como de costume, em uma interpretação bastante contida. Mas são os coadjuvantes que se destacam. Entre eles, Cynthia Nixon, no papel da assessora de imprensa do governador, Judy Davis, na pele da enfermeira-chefe do hospício, e Sharon Stone como uma milionária excêntrica e vingativa. O visual arrebatador, dos figurinos glamurosos à direção de arte e fotografia que privilegiam os tons de azul e verde, encobre as deficiências do roteiro. Para fãs de cinema pode ser divertido encontrar aqui e ali referências a filmes e personagens. É uma das marcas do trabalho de Murphy, além do sangue e do sexo. “Ratched” começa bem e vai perdendo a força à medida que a personagem passa a amadurecer. Assim como em “Hollywood” há um tom apaziguador ao final que destoa bastante dos episódios iniciais. Fãs dos trabalhos do produtor irão sentir uma pequena ponta de frustração.
O filão dos serial killers, seja em filmes, documentários e séries, é inesgotável e desperta o interesse de muita gente. Esse subgênero, por assim dizer, ainda engatinha no audiovisual brasileiro. Nesse sentido, “Bom Dia Verônica”, da Netflix, é mais do que bem-vinda. A produção tem pedigree. Baseia-se em livro dos escritores Ilana Casoy e Raphael Montes e reúne um elenco de atores tarimbados: Du Moscovis, Camila Morgado, Tainá Müller, Silvio Guindane, entre outros. Os cuidados se estendem à direção de arte, fotografia... Não cabe aqui comparar livro e série. São obras distintas e com linguagens diferentes. “Bom Dia, Verônica” tem a trama de um assassino em série como mote, mas abarca outros temas, todos na ordem do dia no País: violência doméstica, machismo, corrupção policial etc. Quem curte histórias escabrosas sobre matadores vai querer emendar um episódio no outro. A atmosfera é aflitiva e o suspense impera. Para se ter uma ideia, o vilão costuma pendurar suas vítimas em ganchos como se fossem pedaços de carne em açougues. Também há boas cenas de ação. Os atores contribuem para o êxito da empreitada. Moscovis está amedrontador e Camila expressa bem a angústia da mulher subjugada pelo marido psicopata e confinada dentro de casa. É um produto calculado milimetricamente para atingir o maior número possível de espectadores em escala global. Isso explica o visual um tanto limpinho e a adesão a alguns clichês das séries policiais (o delegado corrupto, a delegada que pega no pé da protagonista, o amigo que manja tudo de informática, a família certinha de comercial de margarina) e alguns diálogos rasos e furos no roteiro. Ao facilitar a vida do espectador a série perde pontos em termos artísticos, mas ainda assim se revela um bom passatempo.
Apesar de ter um serial killer como personagem, “Reckoning: Acerto de Contas” é um thriller psicológico com toques de drama. Para quem anda cansado do clima sombrio e das paisagens geladas das séries de noir nórdico que existem às pencas no streaming, a minissérie é um refresco. A história se passa na ensolarada Califórnia, embora tenha sido filmada na Austrália. O detetive Mike Serrato (Aden Young) e o orientador educacional Leo Doyle (Sam Trammel) são pais que precisam lidar com os filhos problemáticos e seus próprios demônios. O sumiço e assassinato de uma jovem reacende o interesse do policial pelo caso de um serial killer que há 20 anos quase pôs um ponto final em sua carreira. O modus operandi do matador inclui arrancar as tatuagens de suas vítimas, todas mulheres. Para não esquecer de seu fracasso, Serrato se pune cobrindo o peito com tatuagens iguais às das garotas mortas. Não menos traumatizado, Doyle também é afetado pelo crime. Aden se sai melhor que Trammel, exprimindo com perfeição a angústia, culpa e confusão mental do policial atormentado por um fracasso. Sua atuação é um dos trunfos de “Reckoning”. Produzida pelo canal AXN e disponibilizada pela Netflix, a atração tem aquele jeitão de produto para a TV a cabo, bem-feito, sem invencionices estéticas e dramatúrgicas. A narrativa flui sem tropeços e dá até para maratonar. Os episódios/capítulos são enxutos, com cerca de 45 minutos. O desfecho, no entanto, é apressado e um bocado decepcionante. Por se tratar de uma minissérie, o que significa um final fechado, talvez não haja uma nova leva de episódios. Mas seria interessante ver o detetive Mike Serrato às voltas como novos casos, assim como desenvolver personagens que não tiveram o seu merecido destaque.
“The Sinner” nunca se pautou pelo óbvio. A produção da Netflix sempre procurou mostrar a determinação/obsessão do detetive Harry Ambrose (Bill Pullman) em solucionar os casos dos quais foi incumbido. Nem que para isso coloque em risco a vida pessoal já um tanto conturbada e a integridade física. Outra característica da série é investigar a mente criminosa. O “quem matou?” é trocado pelo “por que matou?”. Mais ambiciosa e cerebral que suas antecessoras, a terceira temporada é regida pelas teorias do filósofo alemão Friedrich Nietzsche. O ritmo lento pode afastar alguns espectadores. Mas aqueles que forem fisgados pela história e pela atuação de Matthew Boomer não irão ficar desapontados. Boomer faz Jamie, um professor certinho e dedicado cuja mulher espera o primeiro filho do casal. Sua vida dá uma derrapada após a visita inesperada de Nick (Chris Messina). Logo fica claro que Jamie e o ex-colega de faculdade guardam um segredo. A especulação sobre um romance gay mal resolvido logo cai por terra. Ambos eram apaixonados mesmo era pelos ensinamentos de Nietzsche. Um acidente com o carro em que ambos estavam acabado matando Nick. O que se segue é a jornada do detetive em obter uma confissão do “pecador”, que expõe sua personalidade doentia e torna-se cada vez mais perigoso e surpreendente. O aflitivo oitavo episódio é exemplar nesse sentido. Harry nunca se enredou tanto num caso e quase pôs tudo a perder. Bill Pullman dá um show na pele do detetive e sofre de todas as formas, inclusive por conta de um dor no nervo ciático que o faz mancar. “The Sinner” se supera nesta terceira temporada e só nos faz torcer para que uma nova leva de episódios chegue logo.
Diretor dos viscerais e perturbadores “Amarelo Manga” e “Baixio das Bestas”, o pernambucano Cláudio Assis dá um salto evolutivo em “Piedade”. O filme é um passo à frente do poético “Big Jato”, drama familiar baseado no livro homônimo. Em “Piedade”, no entanto, as reminiscências biográficas são do próprio diretor. Entre os personagens estão o executivo paulista de uma petrolífera (Matheus Nachtergaele, habitual colaborador de Assis), a dona de um bar na praia da Saudade (Fernanda Montenegro), seu filho (Irandhir Santos) e o proprietário de um cinema pornô (Cauã Reymond). Nessa praia infestada de tubarões, um predador mais perigoso faz vir à tona uma revelação que irá abalar a família. Assis volta a falar de opressão social, capitalismo, tradições e relações familiares. Já o sexo como elemento libertador surge em duas cenas entre Cauã e Matheus, uma delas bastante comentada e que só causa estranheza em quem não conhece a obra do diretor. Mas o tom desta vez é bem mais suave, o que denota um trabalho primoroso de construção do roteiro e direção. Porém a maior novidade aqui é o flerte com o melodrama, algo até então impensável em um filme do cineasta. É um filme mais contido do diretor e que desperta curiosidade sobre seus próximos passos.
Nas ruas cobertas de fuligem de Small Heath, área pobre da industrial Birmingham, os irmãos Shelby comandam uma gangue que atua no ramo de apostas ilegais de cavalos. Mas pode incluir aí também contrabando e assaltos. Os brigões, arruaceiros e violentos Peaky Blinders, título que faz referência à providencial navalha escondida na boina, existiram de fato na Inglaterra após a Primeira Guerra e encontram na série da BBC disponível pela Netflix o melhor veículo. A primeira temporada dá as cartas de “Peaky Blinders – Sangue, Apostas e Navalhas”. O protagonista é Tommy Shelby (Cillian Murphy, o Espantalho de “Batman – o Cavaleiro das Trevas Ressurge”). Inglês de sangue cigano, o ex-soldado carrega traumas de guerra e tem a obstinação cega de vencer no mundo do crime organizado depois de voltar ao lar. Após ganharem por acidente um carregamento de armas, os gângsteres britânicos viram alvo do então secretário de Estado Winston Churchill, que coloca no pé de Tommy um inspetor de polícia astuto e agressivo (Sam Neill). Com Cillian e Neil em cena daria para dizer que pouco sobra para o restante do elenco. Mas seria injusto como o time tarimbado cujos destaques são Paul Anderson como o bipolar Arthur e Helen McCrory na pele da durona Polly. Os episódios de cerca de uma hora cativam (são apenas seis por temporada) e têm ritmo ágil, pontuados por uma trilha contemporânea de rock que vai de Arctic Monkeys a Nick Cave. As séries sobre o universo dos gângsteres nunca mais serão as mesmas depois de “Peaky Blinders”.
Baladas eletrônicas turbinadas a drogas e sexo na liberal Ibiza dos anos 90 e um assassinato. Esses são os ingredientes de “White Lines”, nova aposta da Netflix. A série tem como trunfo a assinatura de Álex Pina, criador do fenômeno “La Casa de Papel”, o que ajuda a fisgar espectadores. A vítima do crime é Axel Collins, DJ superstar nos anos 90, cujo corpo aparece nos dias atuais. A irmã do artista, Zoe, se manda de Manchester para a paradisíaca ilha. Não é preciso ser vidente para saber que ao investigar o crime a bibliotecária irá descobrir que ele não era flor que se cheire e ainda trazer à tona os podres da trupe que o acompanhava. Entre eles estão um guru espiritual, um DJ que trafica drogas, uma mulher que organiza orgias e um ricaço que tem uma relação incestuosa com a mãe. Há também o segurança barbudão, musculoso e tatuado com quem Zoe se envolve. Os clichês não são um problema em filmes e séries. O que conta é a forma como o diretor trabalha os lugares-comuns. Não é o caso aqui. “White Lines” tem como agravante uma protagonista chatinha e mestre em ferrar com a vida alheia. Esse híbrido desajeitado de policial e drama caminha a passos de tartaruga por dez episódios. Basta dizer que todos eles começam com flashbacks. Alguns mais interessantes que a trama contemporânea, como os que mostram Axel no comando de festas pontuadas por toda a sorte de excessos. A trilha sonora é vibrante, com canções de bandas como Primal Scream e Happy Mondays, e o visual enche os olhos. O título faz referência tanto às carreiras de cocaína quanto às faixas de segurança que Zoe precisa cruzar em sua jornada na ilha. Mas até a protagonista descobrir a si mesmo e o responsável pelo crime, o espectador vai penar um bocado.
Terra da fantasia, Hollywood maquiou a realidade por meio dos filmes. Suas produções eram moldadas ao paladar do público. Cabia aos chefões dos estúdios atender aos anseios populares. A minissérie “Hollywood” recria a era dourada do cinema americano, durante o pós-guerra, por meio de um grupo de jovens idealistas com o sonho de ver seus nomes estampados nas marquises dos cinemas. Mas o clima nostálgico serve mais a estética que a dramaturgia na criação de Ryan Murphy (de séries como “Glee”, “American Horror Story” e “Pose”). O roteiro se mostra sintonizado com o espírito progressista dos tempos atuais, questionando o espaço dando para negros, gays e mulheres no cinema industrial daqueles tempos. Na Hollywood idealizada por Murphy o preconceito e o machismo são superados e o esforço é agraciado com o Oscar, algo que só ocorreu décadas depois. A maneira que o showrunner encontrou para isso foi reescrever a história, ao estilo de Quentin Tarantino em “Bastardos Inglórios” e “Era uma Vez em... Hollywood”. O tom, no entanto, é romântico, e há temas em excesso para uma minissérie de apenas sete capítulos. Acompanha-se com interesse a saga de seus personagens, valorizada por atuações como a de Jim Parsons (o Sheldon de “Big Bang Theory”, excelente como um repulsivo agente de atores). Conferir o que é realidade e o que é ficção na trama, como o posto de gasolina de fachada para um serviço de michês, as festas (orgias?) promovidas pelo cineasta George Cukor e o fato de Vivien Leigh ter sido acusada de ter mãos masculinas por um diretor divertem os cinéfilos e o público em geral. Ainda assim é bem pouco.
Os filmes do cineasta franco-argentino Gaspar Noé são do tipo “ame ou odeie”. Não há meio termo. Noé é um provocador, porém muito talentoso. Pode-se reclamar da abordagem dos temas e da violência excessiva em seus trabalhos, mas o sujeito filma como poucos. “Clímax” é quase um terror musical. O enredo é bem simples: numa escola de dança isolada nas montanhas nevadas da França, um grupo de alunos comemora a conclusão de uma coreografia com uma balada movida à música e bebida. A situação fica tensa e foge do controle após alguém “batizar” a sangria com LSD. Os estudantes passam a enfrentar a pior bad trip de suas vidas. Noé se baseou numa história real ocorrida em 2006. É notável a forma como ele registra os corpos. A câmera paira sobre a pista e mostra os movimentos dos alunos. Às vezes sensuais, em outras apenas desajeitados, como se fossem mortos-vivos. O filme de zumbi é uma das referências cinematográficas do diretor, explicitadas no desnecessário prólogo. Noé quis expor a fragilidade humana com o filme. A droga é o detonador de preconceitos e, claro, da violência. Os gritos e uma câmera que ou está “voando” ou de ponta-cabeça fornecem a aura de pesadelo almejada pelo cineasta. Mas assim como em “Irreversível”, seu longa mais famoso, os maneirismos visuais e as deficiências do roteiro (os diálogos são embaraçosos) impedem um resultado satisfatório.
Apertem os cintos! Um militar armado invade um voo de Bruxelas para Moscou durante o embarque e manda o piloto decolar imediatamente. Caso contrário, o sol vai matar a todos, profetiza ele. “Noite Adentro”, primeira produção belga para a Netflix, é um vigoroso thriller com elementos de ficção científica distópica. São apenas seis episódios de pouco mais de 30 minutos cada e que deixam aquele gostinho de quero mais. Maratonar é palavra de ordem aqui. Os personagens, de diferentes nacionalidades e etnias, como convém nos tempos atuais, são bem clichês, mas vitais para o desenvolvimento da história e a criação de ganchos. Entre eles estão uma influencer de narizinho empinado, uma mãe com o filho doente e um homem com cara de poucos amigos. Todos eles irão expor seus piores defeitos à medida que a trama avança. O choque de egos torna os conflitos inevitáveis. O fenômeno cósmico que é o mote para a história, assim como um punhado de situações, são pra lá de inverossímeis. Mas ninguém vai dar muita bola para isso. “Noite Adentro” é voo seguro, porém sujeito a turbulências, para curtir confortavelmente na poltrona - ou sofá.
Em tempos de pandemia as pessoas não parecem nem um pouco interessadas em tramas que exigem demais do cérebro. O negócio é encontrar um produto audiovisual bem digerível para esquecer das notícias ruins do dia a dia. Isto ajuda a explicar o sucesso de “Toy Boy” em vários países, incluindo o Brasil. Mas não é tudo. A série junta-se a outras atrações espanholas que caíram no gosto popular, como “La Casa de Papel”, “Elite” e “O Sucessor”. Todas delas apresentam enredos simples com caraterísticas de telenovela. Em “Toy Boy”, o stripper Hugo (o bonitão e inexpressivo Jesús Mosquera) é acusado de um crime e cumpre sete anos de pena. É solto com ajuda de uma advogada iniciante (María Pedraza, a Marina de “Elite”). Ele vai, claro, tentar descobrir quem cometeu o assassinato que arruinou com sua vida. A trama envolve Macarena (Cristina Castaño), empresária ricaça de quem ela era o tal “garoto de brinquedo”, e mistura jogos de poder e trama detetivesca em meio a shows de strip-tease de rapazes de sunga em uma boate chamada Inferno. A atmosfera kitsch é digna de um filme vagabundo de décadas passadas. Onde mais se poderia encontrar apresentações de clube de mulheres com figurinos de espetáculos da Broadway? Ou um jovem gay problemático com visual emo? A série é divertida na maior parte do tempo, mas a extensão da temporada (13 episódios de pouco mais de uma hora) deixa evidente a falta de fôlego da história. Reviravoltas rocambolescas cumprem a tarefa de empurrar a elucidação do mistério. Além disso, a premissa de abordar o universo dos strippers e garotos de programa é desperdiçada por conta de uma abordagem caricata.
A Netflix está abarrotada de séries sobre o narcotráfico. Para quem curte o tema, “O Sucessor” é mais uma opção. A produção espanhola aborda o assunto por meio da história de Nemo Bandeira (o tarimbado José Coronado), chefão do tráfico na costa da Galícia, e sua conturbada família: o filho gay viciado em drogas (quanta ironia!), a herdeira que prefere cuidar de sua galeria de artes a tocar a empresa do clã, a filha bastarda que rejeita o pai, a mulher mal-amada e rancorosa e o advogado almofadinha tratado como se fosse filho e o grande vilão da série. Não bastasse, o protagonista descobre que tem Alzheimer. A doença vai começar a se pronunciar e interferir no destino dos Bandeiras ao longo da primeira temporada. Com tais ingredientes aliados à falta de verossimilhança de muitas situações e a previsibilidade da trama não restam dúvidas: “O Sucessor” é um novelão. O que não soa como um demérito. A Netflix tem no catálogo atrações bem-sucedidas que bebem no gênero, como “La Casa de Papel” e “Elite”. Não por acaso duas produções oriundas da Espanha. Tais séries estão longe de ser perfeitas, mas tem reviravoltas, elencos afinados e boas sacadas de direção, trunfos que fazem a diferença no final. Aqueles que se ligarem apenas no desenrolar do enredo de “O “Sucessor”, sem se importar com a coerência e a ausência de surpresas, podem se divertir.
“Il Processo” parte de um crime brutal para expor a Justiça e seus personagens. Os protagonistas são a obsessiva promotora da região italiana de Mântua, Elena Guerra (a luminosa Vittória Puccini), e o sedutor e carreirista advogado Ruggero Barone (Francesco Scianna). Os dois duelam no tribunal que julga a milionária Linda Monaco (Camila Filippi), herdeira de uma família poderosa, do assassinato da jovem Angelica Petroni (Margherita Caviezel). Cada episódio abre com flashbacks do depoimento da ré para depois mostrar as sessões que compõem o julgamento. Mas o grande achado narrativa de “Il Processo” é colocar a promotora e o advogado na cena do crime à medida que as testemunhas dão seus depoimentos. Cada um faz a interpretação que lhe convém dos fatos. O artifício ajuda a prender a atenção do público na bem fotografada série, que conta com locações em locais históricos. Há ainda um drama íntimo da protagonista e que irá mexer com os rumos do julgamento. As reviravoltas no caso lá pelo final tornam o produto ainda mais envolvente. O desfecho pode soar decepcionante, mas o percurso até lá é bem agradável.
Concebida como uma minissérie de 15 capítulos para a TV aberta na Espanha, “La Casa de Papel” estreou em 2017 e foi um fracasso em seu país natal. Ao ser adquirida pela Netflix, que a reeditou e dividiu em duas temporadas, virou um fenômeno pop planetário, com personagens como Tóquio, Berlin, Nairóbi e o gênio do crime, o Professor, alçados ao posto de ídolos. O êxito fez o serviço de streaming querer mais. A solução foi esticar a história. Os produtores e roteiristas criaram mais um roubo espetaculoso. Depois da Casa da Moeda, a invasão ao Banco da Espanha é o assunto das temporadas seguintes. A repetição leva a um desgaste da fórmula, sobretudo nesta quarta temporada. Isso se faz notar pelo excesso de flashbacks que estão ali apenas para “encher linguiça” e tornam alguns episódios enfadonhos e conflitos já vistos bastante tolos. Alguém ainda aguenta as tentativas desajeitadas de Arturito em se rebelar? A ação e a tensão estão garantidas. Dá até vontade de “maratonar”. Mas a sensação que fica ao final do oitavo episódio é de que a história já acabou. É o preço do sucesso. O gancho para a quinta temporada existe. Mas vai ser preciso muito jogo de cintura e criatividade por parte de seus criadores para voltar a fisgar a atenção do espectador.
As mulheres sempre tiveram destaque em “Ozark”, mas nunca como na terceira temporada da série. Wendy (a excelente Laura Linney) é a protagonista desta vez, deixando para trás o marido, Martin Byrde (Jason Bateman), pai de família que lava dinheiro para um cartel de drogas mexicano. A executiva/lobista domina os episódios e exibe extrema frieza e astúcia não apenas para salvar a pele do clã, mas também seus lucrativos negócios. A entrada em cena de Ben (Tom Pelphrey, que lembra demais Keanu Reeves), o irmão bipolar, mostra que a loira não hesita em fazer escolhas difíceis, por mais dolorosas que ela possa ser. A relação dos irmãos é um dos pontos altos da terceira temporada e mostra a ótima carpintaria dramática de Ozark. Além de Wendy temos a caipira Ruth (Julia Garner), a implacável advogada Helen (Janet McTeer) e a violenta viúva Darlene (Lisa Emery). São personagens bem construídas e psicologicamente densas. Mulheres fortes, determinadas e com pouco ou nenhum escrúpulo.
Halloween Kills: O Terror Continua
3.0 684 Assista AgoraMichael Myers vive! Enquanto Freddy Krueger e Jason Vorhees sucumbiram por conta de uma penca de filmes assustadores de tão ruins, o maníaco da franquia “Halloween” está vivinho e cada vez mais violento. “Halloween Kills: o Terror Continua” já entrega no título se tratar de uma continuação do filme de 2018. O longa anterior fez muitos esquecerem os inúmeros tropeços da saga. Estava distante de ser uma obra-prima do terror, mas agradou fãs e foi bem nas bilheterias. O suficiente para dar continuidade à trilogia pré-concebida, cujo segundo capítulo chega agora. Esta nova produção remete ao anterior e também ao original de John Carpenter no distante 1978. Ferida após mais um embate com Michael, Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) recebe no hospital os cuidados da neta e da filha, vividas por Judy Greer e Andi Matichack, respectivamente. Elas juram que o psicopata mascarado morreu num incêndio. Não demoram a descobrir que ele não apenas morreu, como trucidou os bombeiros naquela que talvez seja a melhor cena do filme. A partir daí, o longa se propõe a revisitar o passado, trazendo personagens do clássico dos anos 1970, agora mais velhos e atormentados. Primeiro problema: tais tipos estão ali apenas para servirem como vítimas do protagonista, visto que têm densidade psicológica zero. As sequências de assassinatos são brutais e muito bem filmadas, embora falte suspense. Segundo problema: “Halloween Kills” tenta explicar as motivações de Michael, algo desnecessário a esta altura do campeonato, e não soa nem um pouco convincente, ainda mais utilizando o recurso da narração. Munido de facas, picaretas e qualquer objeto cortante ou perfurante, o homicida vai deixando um rastro de sangue ao longo de pouco mais de uma hora e meia de filme. A atmosfera nostálgica que permeia a produção torna este novo “Halloween” um passatempo agradável, embora com todos os problemas de um filme do meio de uma trilogia. Agora, imperdoável mesmo é transformar Laurie Strode em coadjuvante. “Halloween Kills” se ressente da ausência de um confronto entre Michael e sua maior inimiga.
A Menina que Matou os Pais
3.1 680 Assista AgoraO que é real e o que é ficção? Essa é a indagação que move tanto “O Menino que Matou Meus Pais” quanto “A Menina Que Matou os Pais”, disponíveis no Amazon Prime Video. “Os filmes sobre o caso Richthofen” apresentam duas versões sobre um caso policial que movimentou a opinião pública em 2002: o brutal assassinato da psiquiatra Marísia e do engenheiro Manfred von Richthofen. A filha do casal, Suzane, o namorado, Daniel, e o irmão dele, Cristian Cravinhos, foram condenados pelo crime. Chocante é pouco para essa história. Os longas utilizam como fonte os autos do julgamento e traçam perfis distintos do par principal, vividos com desenvoltura por Carla Diaz e Leonardo Bittencourt. A ideia, um tanto óbvia, é fazer com que o público tire as suas conclusões. Ambos recriam, mesmo com recursos limitados, a vida dos personagens antes do crime e estão entrelaçados. Um não existe sem o outro. Os resultados são irregulares, embora “A Menina Que Matou os Pais” seja nitidamente superior a “O Menino Que Matou Meus Pais”. A narrativa é menos burocrática e cativa o espectador. Carla Diaz se sai bem, a despeito da peruca constrangedora nas cenas no tribunal, e de alguns exageros de interpretação reforçar uma aura perversa. Não à toa, os filmes pecam pelo tom novelesco de algumas cenas. Quem for em busca de um estudo psicológico vai dar com os burros n´água. Os roteiros fracos parecem se limitar a narrar os fatos. Temas interessantes ficam apenas na superfície. Entre altos e baixos, o espectador acompanha com interesse o desenrolar das tramas, mesmo sabendo de cor alguns detalhes da história. Ao final, fica no ar outra pergunta: não seria melhor condensar os dois filmes em um só? O público certamente sairia ganhando.
A Mulher na Janela
3.0 1,1K Assista AgoraA presença luminosa de Amy Adams (“Liga da Justiça”, “A Chegada”, “Animais Noturnos”) na dianteira do elenco é um chamariz para o filme “A Mulher na Janela”, da Netflix. O elenco, por sinal, é pra lá de tarimbado. Conta ainda com Gary Oldman, Julianne Moore e Jennifer Jason Leigh. O suficiente para atiçar a curiosidade dos cinéfilos. Amy faz uma psicóloga infantil agorafóbica que combina remédios tarja preta com taças de vinho e curte espionar seus vizinhos. Não demora para ela testemunhar um assassinato. A referência do filme de Joe Wright é o manjado clássico sobre voyeurismo “Janela Indiscreta”, de Alfred Hitchcock. Se o fotógrafo vivido por James Stewart no longa do mestre do suspense estava confinado no apartamento por conta da perna quebrada, a psicóloga simplesmente não colocar os pés para fora de casa devido a um trauma pesadíssimo. A primeira parte de “A Mulher na Janela” é primorosa, com a câmera explorando a vastidão e a desordem do lar da protagonista, expressando bem a confusão mental da personagem. Os atores estão ótimos. O ponto alto do filme é o diálogo na cozinha entre as personagens de Amy e Julianne. Há uma certa estranheza nas falas e atuações que deixam o espectador com a pulga atrás da orelha. Aquilo ocorreu ou foi fruto de alucinação de alguém que vive entupida de medicamentos? O longa pouco explora essa questão e segue o caminho fácil dos suspenses mais rasos a partir de sua segunda metade. É fato que “A Mulher na Janela” prende a atenção até o final, assim como outro thriller recente da Netflix, “Fuja”, por coincidência também estrelado uma baita atriz (Sarah Paulson). Ambos partem de ótimas premissas, mas apelam para as soluções fáceis no intuito de agradar ao público.
Pacarrete
4.1 106 Assista AgoraVencedor do Festival de Gramado do ano passado, “Pacarrete” chega ao cinemas em meio à pandemia do coronavírus, quando o público ainda hesita em retornar às salas da exibição. Teve melhor sorte que alguns exemplares do cinema brasileiro recente, lançados direto em streaming. É filme para ser visto no esplendor da tela grande. Pacarrete, o nome esquisito que batiza essa delicada produção, é uma derivação sertaneja do francês pâquirette. Aquela florzinha do campo conhecida como margarida e também o nome da protagonista. A extraordinária Marcélia Cartaxo, até hoje lembrada como a Macabéa do clássico “A Hora da Estrela” (1985), encarna a ex-bailarina e ex-professora de dança com a cabeça e os pés nas nuvens. Na pequena Russas, no sertão nordestino, Pacarrete planeja apresentar um espetáculo de dança na festa de aniversário do município. Não vai ser nada fácil quando a prefeitura programou um show de forró para o evento. Está aqui um dos temas do filme, o embate entre a cultura popular e a erudita. Pacarrete é elegante, culta e não se cansa de falar francês com o dono de uma quitanda (o ótimo João Miguel), o único da cidade que lhe dá ouvidos e parece entender a “loucura” da personagem. Mas se mostra uma mulher arretada quando provocada. E não são poucas as vezes em que ela desce do salto. O filme do estreante Allain Deberton combina momentos de doçura, agressividade e de pura fantasia. Um dos momentos de maior força dramática do longa é numa cena trágica ao som de “We Don’t Need Another Hero”, com Tina Turner, da trilha de “Mad Max: Além da Cúpula do Trovão”. Marcélia brilha não apenas nessa sequência, mas o filme todo com uma atuação antinaturalista (a protagonista parece declamar os diálogos e sua fala tem um tom empostado) e trejeitos desengonçados. Méritos da direção à parte, “Pacarrete” é dessa atriz magnífica que o cinema brasileiro presenteou com mais um papel memorável.
Desalma (1ª Temporada)
3.8 195A incessante busca por referências em uma série ou filme pode prejudicar a sua fruição, assim como a avaliação do produto audiovisual. Críticos e espectadores se apressaram em apontar elementos de filmes como “A Bruxa”, “Midsommar - O Mal Não Espera a Noite”, “A Profecia” e “O Iluminado”, entre tantos outros, em “Desalma”, da Globoplay. A série não tem a pretensão de reinventar o terror, gênero que coincidentemente usa e abusa de referências. Mas há em “Desalma” um desejo de fazer terror com tempero brasileiro, a começar pela ambientação. A ação se passa na misteriosa Brígida, comunidade de descendentes ucranianos no sul do País que parece meio deslocada no tempo. Os filhos dos moradores se preparam para realizar a festa folclórica de Ivana Kupala, na qual os jovens dançam e bebem ao redor de uma enorme fogueira e as meninas usam arranjos florais na cabeça. A proximidade com os festejos reacende o mistério em torno de um crime ocorrido durante a celebração há 30 anos e até hoje uma ferida não cicatrizada. Salta aos olhos o requinte da produção. Fotografia, trilha sonora, locações e sobretudo a direção cinematográfica. O capricho resultou em comparações com produções norte-americanas e europeias. Como se fosse demérito realizar um produto audiovisual brasileiro com padrão internacional. “Desalma” baseia-se em livro da escritora Ana Paula Maia, que também responde pela criação da série. Temas como choque e identidade cultural e religiosidade marcam presença na narrativa que se alterna em dois tempos: passado e presente. O brutal assassinato de Halyna (Anna Melo), filha da amargurada Haia (Cássia Kis, que rouba todas as cenas), que carrega a fama de bruxa, movimenta os dez capítulos desta primeira temporada. Se no elenco de veteranos destaca-se ainda Cláudia Abreu, na pele da mãe de um garoto vítima de possessão, o elenco juvenil deixa bastante a desejar. Atuações fracas e diálogos didáticos nos flashbacks destoam do cuidado com outros elementos da série. O ritmo da história é devagar, e a trama só começa a engrenar a partir do quarto episódio. A lentidão ajuda o espectador a se embrenhar nesse mundo tão misterioso, ameaçador e fascinante quanto as matas catarinenses na quais se passa a trama de “Desalma”.
Aos Olhos de Ernesto
4.0 20Existem filmes que ganham de cara o espectador e tornam o seu dia mais leve e alegre. “Aos Olhos de Ernesto” encanta com uma singela e delicada história sobre a velhice. Teria feito uma boa carreira nos cinemas não fosse a pandemia que nos privou das emoções na sala escura. Está agora nos cinemas e também no Now, Vivo Play e Oi. Merece (muito) ser descoberto. O protagonista é um homem uruguaio de 78 anos (o excelente Jorge Bolani) que está ficando cego. O filho (Júlio Andrade, o Dr. Evandro de “Sob Pressão”) insiste para o que o pai venda o apartamento em Porto Alegre e vá morar em ele em São Paulo. Ernesto rejeita. O local guarda muitas memórias da mulher que morreu, as quais ele não quer abandonar. Além disso, não quer ser um fardo. Eis que entra em cena Bia (Gabriela Poester), uma passeadora de cães de vinte e poucos anos. A amizade não começa lá muito bem. Mas o ex-fotógrafo não só vai contornar a enorme diferença de idade entre eles como perdoar os deslizes da garota. Bia terá mais a aprender com Ernesto do que ele com ela. O roteiro a quatro de mãos (Jorge Furtado e a diretora Ana Luiza Azevedo) é primoroso e os diálogos são deliciosos, salpicados de um humor agridoce, sobretudo aqueles que falam sobre o envelhecimento. Há uma cena memorável na qual Ernesto e o vizinho jogam xadrez e falam sobre suas taxas de colesterol, glicemia, creatinina etc. A passagem do tempo é o tema central do filme, que também fala de machismo, violência contra a mulher, confiança e amizade. Tudo tratado com muita leveza graças ao roteiro, um elenco afinadíssimo e a direção segura de Ana Luiza. A relação fraterna que se estabelece entre Ernesto e Bia fascina, diverte, comove e encanta em doses iguais. Um dos mais belos e ternos filmes de 2020.
Rebecca: A Mulher Inesquecível
2.9 334 Assista AgoraRefilmar Alfred Hitchcock é tarefa inglória. Até mesmo o tarimbado Gus Van Sant (“Gênio Indomável”, “Elefante”, “Milk”) não foi poupado das críticas ao refazer “Psicose”. Se o original é imbatível, qual a razão de refilmar? Fisgar o público jovem? “Rebecca – A Mulher Inesquecível”, único longa do mestre do suspense a abocanhar o Oscar de Melhor Filme, ganhou uma adaptação para a geração Netflix. Nos papéis centrais estão a loirinha Lily James e o grandalhão Armie Hammer. A trama sobre a dama de companhia que se casa com um ricaço e vai morar na gigantesca propriedade da família na Inglaterra, onde passa a ser atormentada pelo “fantasma” da finada mulher dele, é bem conhecida e inspirou até novela da Globo (“A Sucessora”, com Susana Vieira). O filme baseia-se no livro da escritora Daphne Du Marier, que encontrou no cinema de Hitchcock o veículo perfeito. O romance contém boas doses de sadismo e perversidade ao gosto do cineasta britânico. Tais características foram diluídas no remake. Kristin Scott-Thomas é uma atriz e tanto, porém não transmite o temor que a devotada governanta vivida por Judith Anderson no original passava para Joan Fontaine. O erro não é de escalação do elenco, mas de direção. No cinema, Manderlay em seu gigantismo lembrava um castelo de filme de horror. O diretor Bean Wheatley não tira proveito da direção de arte caprichada e se mostra muito aquém das possibilidades deste conto gótico. Falta suspense, ambiguidade e mistério ao filme. Tampouco o mergulho na loucura da protagonista é desenvolvido de forma satisfatória. Este novo “Rebecca” consegue o improvável: desagradar tanto os fãs do filme original quanto as novas gerações. Pobre Hitchcock!
Perdida (1ª Temporada)
3.7 21 Assista AgoraQuem já viu pelo menos uma das muitas séries espanholas do catálogo da Netflix notou a predominância dos gêneros policial e suspense em tramas sobre famílias. “Perdida” é indicada para quem curtiu “O Sucessor” e a recente “Alguém Tem que Morrer”. Há também ecos óbvios de “Prison Break” na trama sobre o pai (Daniel Grao) que vai para uma prisão barra-pesadíssima na Colômbia disposto a achar o homem que raptou sua filha (Juan Carlos Messier) e descobrir o paradeiro da garota. O enredo ainda inclui uma advogada (Adriana Paz) que presta os mais variados serviços para um chefão do narcotráfico (Fernand Solórzano), a mulher dele, uma atriz canastrona, e policiais corruptos. “Perdida” combina drama, suspense, ação e elementos do filme de prisão. Prende a atenção, embora o excesso de flashbacks para explicar as reais motivações dos personagens cansem o espectador. Como se os 11 episódios de cerca de 50 minutos não fossem suficientes para dar conta da história. O desleixo com a narrativa se acentua no desfecho da trama, na qual saltam aos olhos as situações inverossímeis e atropeladas.
Alice Júnior
3.8 144“Alice Júnior” tem cara de comédia romântica teen bobinha, mas não se deixe levar pela aparência. O filme é a mais grata surpresa do cinema nacional neste último trimestre de 2020. O estreante em longas Gil Baroni assina uma produção LGBTQI com o dom de encantar até mesmo os mais insensíveis. A tarefa de retratar uma adolescente trans e youtuber (a carismática Anne Celestino, premiada no Festival de Brasília) que se muda de Recife para o sul do País e enfrenta o preconceito poderia ser espinhosa e repleta de clichês, mas é tudo tratado com muita cor e leveza. Os clichês aparecem de vez em quando, mas servem apenas para fazer fluir a narrativa e criar empatia com o público. O tom é de fábula, escolha que se revela acertadíssima. Não bastasse a presença luminosa da atriz principal, Baroni recorre a expedientes que falam a essa geração, dos memes das redes sociais nos efeitos digitais que pipocam na tela à trilha sonora que une Chico Science e Nação Zumbi e Pablo Vittar. Na escola, a “forasteira” reivindica o direito a não usar o uniforme escolar e se vestir como um garoto ao uso do banheiro feminino enquanto sonha com o primeiro beijo. Sim, Alice é uma BV! Os diálogos soam naturais e divertidos, como se tivessem sido escritos pelos próprios adolescentes do filme. Os personagens adultos não são tão interessantes assim, mas não comprometem. Em contraponto ao conservadorismo e a homofobia reinantes na escola, tanto o pai da protagonista quanto a mãe bicho-grilo de um estudante gay se mostram livres de preconceitos. Mas é no desenvolvimento da relação de Alice com um casal que inclui seu crushzinho e ameaça formar um triângulo que o filme amarra todas as pontas do roteiro e dá um desfecho bacana à história.
Ratched (1ª Temporada)
3.8 393 Assista AgoraAmerican Horror Story” encontra “Hollywood” em “Ratched”, a mais recente criação do prolífico Ryan Murphy. O terror com um pé no grotesco, o apuro estético e apelo nostálgico se fazem presentes nesta nova produção do showrunner para a Netflix. Ratched, como tudo mundo está careca de saber, é a enfermeira imortalizada pela oscarizada Louise Fletcher em “Um Estranho no Ninho”. Cabe a Sarah Paulson, atriz-fetiche do produtor e roteirista, a tarefa de dar vida à calculista e sádica personagem em um manicômio no final dos anos 40. O assassinato brutal de quatro padres dá o start na trama. O criminoso vai parar num hospital psiquiátrico, o mesmo onde a enfermeira arranja uma vaguinha. Joguinhos que envolvem chantagens e mentiras são as armas da enigmática Mildred Ratched para conquistar a confiança do patrão e galgar degraus dentro da hierarquia do hospital. Paulson está bem, como de costume, em uma interpretação bastante contida. Mas são os coadjuvantes que se destacam. Entre eles, Cynthia Nixon, no papel da assessora de imprensa do governador, Judy Davis, na pele da enfermeira-chefe do hospício, e Sharon Stone como uma milionária excêntrica e vingativa. O visual arrebatador, dos figurinos glamurosos à direção de arte e fotografia que privilegiam os tons de azul e verde, encobre as deficiências do roteiro. Para fãs de cinema pode ser divertido encontrar aqui e ali referências a filmes e personagens. É uma das marcas do trabalho de Murphy, além do sangue e do sexo. “Ratched” começa bem e vai perdendo a força à medida que a personagem passa a amadurecer. Assim como em “Hollywood” há um tom apaziguador ao final que destoa bastante dos episódios iniciais. Fãs dos trabalhos do produtor irão sentir uma pequena ponta de frustração.
Bom Dia, Verônica (1ª Temporada)
4.2 762 Assista AgoraO filão dos serial killers, seja em filmes, documentários e séries, é inesgotável e desperta o interesse de muita gente. Esse subgênero, por assim dizer, ainda engatinha no audiovisual brasileiro. Nesse sentido, “Bom Dia Verônica”, da Netflix, é mais do que bem-vinda. A produção tem pedigree. Baseia-se em livro dos escritores Ilana Casoy e Raphael Montes e reúne um elenco de atores tarimbados: Du Moscovis, Camila Morgado, Tainá Müller, Silvio Guindane, entre outros. Os cuidados se estendem à direção de arte, fotografia... Não cabe aqui comparar livro e série. São obras distintas e com linguagens diferentes. “Bom Dia, Verônica” tem a trama de um assassino em série como mote, mas abarca outros temas, todos na ordem do dia no País: violência doméstica, machismo, corrupção policial etc. Quem curte histórias escabrosas sobre matadores vai querer emendar um episódio no outro. A atmosfera é aflitiva e o suspense impera. Para se ter uma ideia, o vilão costuma pendurar suas vítimas em ganchos como se fossem pedaços de carne em açougues. Também há boas cenas de ação. Os atores contribuem para o êxito da empreitada. Moscovis está amedrontador e Camila expressa bem a angústia da mulher subjugada pelo marido psicopata e confinada dentro de casa. É um produto calculado milimetricamente para atingir o maior número possível de espectadores em escala global. Isso explica o visual um tanto limpinho e a adesão a alguns clichês das séries policiais (o delegado corrupto, a delegada que pega no pé da protagonista, o amigo que manja tudo de informática, a família certinha de comercial de margarina) e alguns diálogos rasos e furos no roteiro. Ao facilitar a vida do espectador a série perde pontos em termos artísticos, mas ainda assim se revela um bom passatempo.
Reckoning
3.1 40Apesar de ter um serial killer como personagem, “Reckoning: Acerto de Contas” é um thriller psicológico com toques de drama. Para quem anda cansado do clima sombrio e das paisagens geladas das séries de noir nórdico que existem às pencas no streaming, a minissérie é um refresco. A história se passa na ensolarada Califórnia, embora tenha sido filmada na Austrália. O detetive Mike Serrato (Aden Young) e o orientador educacional Leo Doyle (Sam Trammel) são pais que precisam lidar com os filhos problemáticos e seus próprios demônios. O sumiço e assassinato de uma jovem reacende o interesse do policial pelo caso de um serial killer que há 20 anos quase pôs um ponto final em sua carreira. O modus operandi do matador inclui arrancar as tatuagens de suas vítimas, todas mulheres. Para não esquecer de seu fracasso, Serrato se pune cobrindo o peito com tatuagens iguais às das garotas mortas. Não menos traumatizado, Doyle também é afetado pelo crime. Aden se sai melhor que Trammel, exprimindo com perfeição a angústia, culpa e confusão mental do policial atormentado por um fracasso. Sua atuação é um dos trunfos de “Reckoning”. Produzida pelo canal AXN e disponibilizada pela Netflix, a atração tem aquele jeitão de produto para a TV a cabo, bem-feito, sem invencionices estéticas e dramatúrgicas. A narrativa flui sem tropeços e dá até para maratonar. Os episódios/capítulos são enxutos, com cerca de 45 minutos. O desfecho, no entanto, é apressado e um bocado decepcionante. Por se tratar de uma minissérie, o que significa um final fechado, talvez não haja uma nova leva de episódios. Mas seria interessante ver o detetive Mike Serrato às voltas como novos casos, assim como desenvolver personagens que não tiveram o seu merecido destaque.
The Sinner (3ª Temporada)
2.9 331 Assista Agora“The Sinner” nunca se pautou pelo óbvio. A produção da Netflix sempre procurou mostrar a determinação/obsessão do detetive Harry Ambrose (Bill Pullman) em solucionar os casos dos quais foi incumbido. Nem que para isso coloque em risco a vida pessoal já um tanto conturbada e a integridade física. Outra característica da série é investigar a mente criminosa. O “quem matou?” é trocado pelo “por que matou?”. Mais ambiciosa e cerebral que suas antecessoras, a terceira temporada é regida pelas teorias do filósofo alemão Friedrich Nietzsche. O ritmo lento pode afastar alguns espectadores. Mas aqueles que forem fisgados pela história e pela atuação de Matthew Boomer não irão ficar desapontados. Boomer faz Jamie, um professor certinho e dedicado cuja mulher espera o primeiro filho do casal. Sua vida dá uma derrapada após a visita inesperada de Nick (Chris Messina). Logo fica claro que Jamie e o ex-colega de faculdade guardam um segredo. A especulação sobre um romance gay mal resolvido logo cai por terra. Ambos eram apaixonados mesmo era pelos ensinamentos de Nietzsche. Um acidente com o carro em que ambos estavam acabado matando Nick. O que se segue é a jornada do detetive em obter uma confissão do “pecador”, que expõe sua personalidade doentia e torna-se cada vez mais perigoso e surpreendente. O aflitivo oitavo episódio é exemplar nesse sentido. Harry nunca se enredou tanto num caso e quase pôs tudo a perder. Bill Pullman dá um show na pele do detetive e sofre de todas as formas, inclusive por conta de um dor no nervo ciático que o faz mancar. “The Sinner” se supera nesta terceira temporada e só nos faz torcer para que uma nova leva de episódios chegue logo.
Piedade
3.2 78 Assista AgoraDiretor dos viscerais e perturbadores “Amarelo Manga” e “Baixio das Bestas”, o pernambucano Cláudio Assis dá um salto evolutivo em “Piedade”. O filme é um passo à frente do poético “Big Jato”, drama familiar baseado no livro homônimo. Em “Piedade”, no entanto, as reminiscências biográficas são do próprio diretor. Entre os personagens estão o executivo paulista de uma petrolífera (Matheus Nachtergaele, habitual colaborador de Assis), a dona de um bar na praia da Saudade (Fernanda Montenegro), seu filho (Irandhir Santos) e o proprietário de um cinema pornô (Cauã Reymond). Nessa praia infestada de tubarões, um predador mais perigoso faz vir à tona uma revelação que irá abalar a família. Assis volta a falar de opressão social, capitalismo, tradições e relações familiares. Já o sexo como elemento libertador surge em duas cenas entre Cauã e Matheus, uma delas bastante comentada e que só causa estranheza em quem não conhece a obra do diretor. Mas o tom desta vez é bem mais suave, o que denota um trabalho primoroso de construção do roteiro e direção. Porém a maior novidade aqui é o flerte com o melodrama, algo até então impensável em um filme do cineasta. É um filme mais contido do diretor e que desperta curiosidade sobre seus próximos passos.
Peaky Blinders: Sangue, Apostas e Navalhas (1ª Temporada)
4.4 462 Assista AgoraNas ruas cobertas de fuligem de Small Heath, área pobre da industrial Birmingham, os irmãos Shelby comandam uma gangue que atua no ramo de apostas ilegais de cavalos. Mas pode incluir aí também contrabando e assaltos. Os brigões, arruaceiros e violentos Peaky Blinders, título que faz referência à providencial navalha escondida na boina, existiram de fato na Inglaterra após a Primeira Guerra e encontram na série da BBC disponível pela Netflix o melhor veículo. A primeira temporada dá as cartas de “Peaky Blinders – Sangue, Apostas e Navalhas”. O protagonista é Tommy Shelby (Cillian Murphy, o Espantalho de “Batman – o Cavaleiro das Trevas Ressurge”). Inglês de sangue cigano, o ex-soldado carrega traumas de guerra e tem a obstinação cega de vencer no mundo do crime organizado depois de voltar ao lar. Após ganharem por acidente um carregamento de armas, os gângsteres britânicos viram alvo do então secretário de Estado Winston Churchill, que coloca no pé de Tommy um inspetor de polícia astuto e agressivo (Sam Neill). Com Cillian e Neil em cena daria para dizer que pouco sobra para o restante do elenco. Mas seria injusto como o time tarimbado cujos destaques são Paul Anderson como o bipolar Arthur e Helen McCrory na pele da durona Polly. Os episódios de cerca de uma hora cativam (são apenas seis por temporada) e têm ritmo ágil, pontuados por uma trilha contemporânea de rock que vai de Arctic Monkeys a Nick Cave. As séries sobre o universo dos gângsteres nunca mais serão as mesmas depois de “Peaky Blinders”.
White Lines (1ª Temporada)
3.2 57Baladas eletrônicas turbinadas a drogas e sexo na liberal Ibiza dos anos 90 e um assassinato. Esses são os ingredientes de “White Lines”, nova aposta da Netflix. A série tem como trunfo a assinatura de Álex Pina, criador do fenômeno “La Casa de Papel”, o que ajuda a fisgar espectadores. A vítima do crime é Axel Collins, DJ superstar nos anos 90, cujo corpo aparece nos dias atuais. A irmã do artista, Zoe, se manda de Manchester para a paradisíaca ilha. Não é preciso ser vidente para saber que ao investigar o crime a bibliotecária irá descobrir que ele não era flor que se cheire e ainda trazer à tona os podres da trupe que o acompanhava. Entre eles estão um guru espiritual, um DJ que trafica drogas, uma mulher que organiza orgias e um ricaço que tem uma relação incestuosa com a mãe. Há também o segurança barbudão, musculoso e tatuado com quem Zoe se envolve. Os clichês não são um problema em filmes e séries. O que conta é a forma como o diretor trabalha os lugares-comuns. Não é o caso aqui. “White Lines” tem como agravante uma protagonista chatinha e mestre em ferrar com a vida alheia. Esse híbrido desajeitado de policial e drama caminha a passos de tartaruga por dez episódios. Basta dizer que todos eles começam com flashbacks. Alguns mais interessantes que a trama contemporânea, como os que mostram Axel no comando de festas pontuadas por toda a sorte de excessos. A trilha sonora é vibrante, com canções de bandas como Primal Scream e Happy Mondays, e o visual enche os olhos. O título faz referência tanto às carreiras de cocaína quanto às faixas de segurança que Zoe precisa cruzar em sua jornada na ilha. Mas até a protagonista descobrir a si mesmo e o responsável pelo crime, o espectador vai penar um bocado.
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Hollywood
4.1 331 Assista AgoraTerra da fantasia, Hollywood maquiou a realidade por meio dos filmes. Suas produções eram moldadas ao paladar do público. Cabia aos chefões dos estúdios atender aos anseios populares. A minissérie “Hollywood” recria a era dourada do cinema americano, durante o pós-guerra, por meio de um grupo de jovens idealistas com o sonho de ver seus nomes estampados nas marquises dos cinemas. Mas o clima nostálgico serve mais a estética que a dramaturgia na criação de Ryan Murphy (de séries como “Glee”, “American Horror Story” e “Pose”). O roteiro se mostra sintonizado com o espírito progressista dos tempos atuais, questionando o espaço dando para negros, gays e mulheres no cinema industrial daqueles tempos. Na Hollywood idealizada por Murphy o preconceito e o machismo são superados e o esforço é agraciado com o Oscar, algo que só ocorreu décadas depois. A maneira que o showrunner encontrou para isso foi reescrever a história, ao estilo de Quentin Tarantino em “Bastardos Inglórios” e “Era uma Vez em... Hollywood”. O tom, no entanto, é romântico, e há temas em excesso para uma minissérie de apenas sete capítulos. Acompanha-se com interesse a saga de seus personagens, valorizada por atuações como a de Jim Parsons (o Sheldon de “Big Bang Theory”, excelente como um repulsivo agente de atores). Conferir o que é realidade e o que é ficção na trama, como o posto de gasolina de fachada para um serviço de michês, as festas (orgias?) promovidas pelo cineasta George Cukor e o fato de Vivien Leigh ter sido acusada de ter mãos masculinas por um diretor divertem os cinéfilos e o público em geral. Ainda assim é bem pouco.
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Clímax
3.6 1,1K Assista AgoraOs filmes do cineasta franco-argentino Gaspar Noé são do tipo “ame ou odeie”. Não há meio termo. Noé é um provocador, porém muito talentoso. Pode-se reclamar da abordagem dos temas e da violência excessiva em seus trabalhos, mas o sujeito filma como poucos. “Clímax” é quase um terror musical. O enredo é bem simples: numa escola de dança isolada nas montanhas nevadas da França, um grupo de alunos comemora a conclusão de uma coreografia com uma balada movida à música e bebida. A situação fica tensa e foge do controle após alguém “batizar” a sangria com LSD. Os estudantes passam a enfrentar a pior bad trip de suas vidas. Noé se baseou numa história real ocorrida em 2006. É notável a forma como ele registra os corpos. A câmera paira sobre a pista e mostra os movimentos dos alunos. Às vezes sensuais, em outras apenas desajeitados, como se fossem mortos-vivos. O filme de zumbi é uma das referências cinematográficas do diretor, explicitadas no desnecessário prólogo. Noé quis expor a fragilidade humana com o filme. A droga é o detonador de preconceitos e, claro, da violência. Os gritos e uma câmera que ou está “voando” ou de ponta-cabeça fornecem a aura de pesadelo almejada pelo cineasta. Mas assim como em “Irreversível”, seu longa mais famoso, os maneirismos visuais e as deficiências do roteiro (os diálogos são embaraçosos) impedem um resultado satisfatório.
Noite Adentro (1ª Temporada)
3.6 165 Assista AgoraApertem os cintos! Um militar armado invade um voo de Bruxelas para Moscou durante o embarque e manda o piloto decolar imediatamente. Caso contrário, o sol vai matar a todos, profetiza ele. “Noite Adentro”, primeira produção belga para a Netflix, é um vigoroso thriller com elementos de ficção científica distópica. São apenas seis episódios de pouco mais de 30 minutos cada e que deixam aquele gostinho de quero mais. Maratonar é palavra de ordem aqui. Os personagens, de diferentes nacionalidades e etnias, como convém nos tempos atuais, são bem clichês, mas vitais para o desenvolvimento da história e a criação de ganchos. Entre eles estão uma influencer de narizinho empinado, uma mãe com o filho doente e um homem com cara de poucos amigos. Todos eles irão expor seus piores defeitos à medida que a trama avança. O choque de egos torna os conflitos inevitáveis. O fenômeno cósmico que é o mote para a história, assim como um punhado de situações, são pra lá de inverossímeis. Mas ninguém vai dar muita bola para isso. “Noite Adentro” é voo seguro, porém sujeito a turbulências, para curtir confortavelmente na poltrona - ou sofá.
Toy Boy (1ª Temporada)
3.2 135 Assista AgoraEm tempos de pandemia as pessoas não parecem nem um pouco interessadas em tramas que exigem demais do cérebro. O negócio é encontrar um produto audiovisual bem digerível para esquecer das notícias ruins do dia a dia. Isto ajuda a explicar o sucesso de “Toy Boy” em vários países, incluindo o Brasil. Mas não é tudo. A série junta-se a outras atrações espanholas que caíram no gosto popular, como “La Casa de Papel”, “Elite” e “O Sucessor”. Todas delas apresentam enredos simples com caraterísticas de telenovela. Em “Toy Boy”, o stripper Hugo (o bonitão e inexpressivo Jesús Mosquera) é acusado de um crime e cumpre sete anos de pena. É solto com ajuda de uma advogada iniciante (María Pedraza, a Marina de “Elite”). Ele vai, claro, tentar descobrir quem cometeu o assassinato que arruinou com sua vida. A trama envolve Macarena (Cristina Castaño), empresária ricaça de quem ela era o tal “garoto de brinquedo”, e mistura jogos de poder e trama detetivesca em meio a shows de strip-tease de rapazes de sunga em uma boate chamada Inferno. A atmosfera kitsch é digna de um filme vagabundo de décadas passadas. Onde mais se poderia encontrar apresentações de clube de mulheres com figurinos de espetáculos da Broadway? Ou um jovem gay problemático com visual emo? A série é divertida na maior parte do tempo, mas a extensão da temporada (13 episódios de pouco mais de uma hora) deixa evidente a falta de fôlego da história. Reviravoltas rocambolescas cumprem a tarefa de empurrar a elucidação do mistério. Além disso, a premissa de abordar o universo dos strippers e garotos de programa é desperdiçada por conta de uma abordagem caricata.
O Sucessor (1ª Temporada)
4.0 39 Assista AgoraA Netflix está abarrotada de séries sobre o narcotráfico. Para quem curte o tema, “O Sucessor” é mais uma opção. A produção espanhola aborda o assunto por meio da história de Nemo Bandeira (o tarimbado José Coronado), chefão do tráfico na costa da Galícia, e sua conturbada família: o filho gay viciado em drogas (quanta ironia!), a herdeira que prefere cuidar de sua galeria de artes a tocar a empresa do clã, a filha bastarda que rejeita o pai, a mulher mal-amada e rancorosa e o advogado almofadinha tratado como se fosse filho e o grande vilão da série. Não bastasse, o protagonista descobre que tem Alzheimer. A doença vai começar a se pronunciar e interferir no destino dos Bandeiras ao longo da primeira temporada. Com tais ingredientes aliados à falta de verossimilhança de muitas situações e a previsibilidade da trama não restam dúvidas: “O Sucessor” é um novelão. O que não soa como um demérito. A Netflix tem no catálogo atrações bem-sucedidas que bebem no gênero, como “La Casa de Papel” e “Elite”. Não por acaso duas produções oriundas da Espanha. Tais séries estão longe de ser perfeitas, mas tem reviravoltas, elencos afinados e boas sacadas de direção, trunfos que fazem a diferença no final. Aqueles que se ligarem apenas no desenrolar do enredo de “O “Sucessor”, sem se importar com a coerência e a ausência de surpresas, podem se divertir.
O Processo
3.8 29 Assista Agora“Il Processo” parte de um crime brutal para expor a Justiça e seus personagens. Os protagonistas são a obsessiva promotora da região italiana de Mântua, Elena Guerra (a luminosa Vittória Puccini), e o sedutor e carreirista advogado Ruggero Barone (Francesco Scianna). Os dois duelam no tribunal que julga a milionária Linda Monaco (Camila Filippi), herdeira de uma família poderosa, do assassinato da jovem Angelica Petroni (Margherita Caviezel). Cada episódio abre com flashbacks do depoimento da ré para depois mostrar as sessões que compõem o julgamento. Mas o grande achado narrativa de “Il Processo” é colocar a promotora e o advogado na cena do crime à medida que as testemunhas dão seus depoimentos. Cada um faz a interpretação que lhe convém dos fatos. O artifício ajuda a prender a atenção do público na bem fotografada série, que conta com locações em locais históricos. Há ainda um drama íntimo da protagonista e que irá mexer com os rumos do julgamento. As reviravoltas no caso lá pelo final tornam o produto ainda mais envolvente. O desfecho pode soar decepcionante, mas o percurso até lá é bem agradável.
La Casa de Papel (Parte 4)
3.7 658 Assista AgoraConcebida como uma minissérie de 15 capítulos para a TV aberta na Espanha, “La Casa de Papel” estreou em 2017 e foi um fracasso em seu país natal. Ao ser adquirida pela Netflix, que a reeditou e dividiu em duas temporadas, virou um fenômeno pop planetário, com personagens como Tóquio, Berlin, Nairóbi e o gênio do crime, o Professor, alçados ao posto de ídolos. O êxito fez o serviço de streaming querer mais. A solução foi esticar a história. Os produtores e roteiristas criaram mais um roubo espetaculoso. Depois da Casa da Moeda, a invasão ao Banco da Espanha é o assunto das temporadas seguintes. A repetição leva a um desgaste da fórmula, sobretudo nesta quarta temporada. Isso se faz notar pelo excesso de flashbacks que estão ali apenas para “encher linguiça” e tornam alguns episódios enfadonhos e conflitos já vistos bastante tolos. Alguém ainda aguenta as tentativas desajeitadas de Arturito em se rebelar? A ação e a tensão estão garantidas. Dá até vontade de “maratonar”. Mas a sensação que fica ao final do oitavo episódio é de que a história já acabou. É o preço do sucesso. O gancho para a quinta temporada existe. Mas vai ser preciso muito jogo de cintura e criatividade por parte de seus criadores para voltar a fisgar a atenção do espectador.
Ozark (3ª Temporada)
4.4 316As mulheres sempre tiveram destaque em “Ozark”, mas nunca como na terceira temporada da série. Wendy (a excelente Laura Linney) é a protagonista desta vez, deixando para trás o marido, Martin Byrde (Jason Bateman), pai de família que lava dinheiro para um cartel de drogas mexicano. A executiva/lobista domina os episódios e exibe extrema frieza e astúcia não apenas para salvar a pele do clã, mas também seus lucrativos negócios. A entrada em cena de Ben (Tom Pelphrey, que lembra demais Keanu Reeves), o irmão bipolar, mostra que a loira não hesita em fazer escolhas difíceis, por mais dolorosas que ela possa ser. A relação dos irmãos é um dos pontos altos da terceira temporada e mostra a ótima carpintaria dramática de Ozark. Além de Wendy temos a caipira Ruth (Julia Garner), a implacável advogada Helen (Janet McTeer) e a violenta viúva Darlene (Lisa Emery). São personagens bem construídas e psicologicamente densas. Mulheres fortes, determinadas e com pouco ou nenhum escrúpulo.