Não é de hoje que a tecnologia é utilizada nos filmes de terror como uma forma de canalizar alguns medos da sociedade. Este A Hora da Sua Morte faz de um aplicativo de celular o gatilho principal para desencadear alguns dos dilemas da atual geração de jovens. Há certas referências pops no longa, a começar pela protagonista vivida por Elizabeth Lail, rosto conhecido para a audiência da série You, da Netflix. Ela é Quinn Harris, uma enfermeira que sofre frequentes investidas do cirurgião chefe de seu plantão, vivido por Peter Facinelli - o Carlisle Cullen de Crepúsculo, quem lembra? - Pois é, além de ter que fugir da morte, numa vibe à la Premonição, ela também tem que se livrar do patrão abusivo.
O mais gozado no longa é que, apesar de ter jumpscares previsíveis e clichês, que mesmo assim podem te fazer pular algumas vezes da cadeira - eu mesmo pulei em uma cena - este não é um filme assustador e nem parece querer ser. Por mais que a premissa seja sufocante: os personagens baixam um aplicativo que lhes informa quanto tempo de vista lhes resta, o diretor Justin Dec sempre insere na história personagens que funcionam como alívio cômico: de um padre/exorcista engraçadão a um emburrecido atendente de loja de eletrônicos - onde inclusive acontece uma das cenas mais hilárias do longa.
Sem se aprofundar em praticamente nada que aborda - Dec só parece querer zoar mesmo, sobra até pros terraplanistas e veganos -, A Hora de Sua Morte assume o tom pastelão, há erros estúpidos de roteiro como o aplicativo de 60GB que é baixado em questão de segundos ou a ala proibida do hospital que permanece acessível a qualquer um. Apesar dos pesares, é interessante notar como a morte é vista pelos dois aspectos: da razão e da emoção. Ora, qual pessoa para melhor lidar com a morte senão alguém que estuda medicina? E qual a pessoa mais sensata para se procurar com a morte iminente senão um padre? Os médicos são mais céticos, enquanto o padre recorre a lendas e rituais.
Logicamente, A Hora da Sua Morte não traz respostas para nos confortar na hora da morte (transformada aqui num vilão de múltiplas facetas e formas mas que nunca impõe medo), nem funciona como um estudo antropológico de jovens conectados e famílias desestruturadas. O conflito entre razão e fé/emoção e ciência também é capenga, e o que sobra mesmo dessa sessão descompromissada é a sua boa vontade para rir ou não daqueles personagens tentando sobreviver ao inevitável.
A "antiga alegria" do título é como um remember de uma época que já se foi e que nunca mais será a mesma. A diretora Kelly Reichardt coloca seus dois personagens, Mark (Daniel London) e Kurt (Will Oldham), numa espécie de road movie bucólico. O que parece incitar O Segredo de Brokeback Mountain (principalmente na cena das banheiras aquecidas) já que foi lançado um ano após esse, na verdade lida com a passagem do tempo para dois homens adultos: um (Mark) com um bebê a caminho, o outro (Kurt) com um futuro incerto, como é possível percebermos apenas na cena final. Para Kurt, rever o amigo de longa data é como estar à vontade e, ao mesmo tempo, tentar transpassar a barreira invisível atrás da qual o outro parece se esconder, já em Mark fica visível o incômodo, seja nas perguntas e divagações do amigo, nos silêncios, na massagem, na nudez, etc. A câmera de Reichardt busca os prédios, as paisagens, as copas das árvores contemplando o mundo à volta daqueles dois homens comuns. O filme é um rito de passagem morno que deixa muita coisa nas entrelinhas.
Um curioso jogo de sedução proposto por Luis Buñuel. O velho magnata que deseja a virgindade da jovem moça de 18 anos. As trocas entre Carole Bouquet e Ángela Molina (essa me lembrou muito Ana de Armas) no papel de Conchita deixam claro que para Mathieu não importa quem ela seja, como ela seja e como ela reage, mas sim o que ela guarda. Dessa forma, Buñuel priva seu protagonista do tal ouro de tolo, que Raul Seixas certa vez cantou, ora, o ricaço tem tudo (bem, quase tudo) e, embora não seja mais jovem e belo, ele crê que seu poder financeiro lhe permita ter aquilo que mais quer. Buñuel finaliza com sua assinatura, deixando o espectador com sua sacada de mestre, SPOILER: o bordado que simboliza a virgindade rompida e o atentado do grupo terrorista sobre nossa dupla, afinal, cederam aos desejos carnais.
Talvez não dê conta da complexidade dos assuntos que pincela, como a solidão, a ética, a moral, a sexualidade, a puberdade e o amor proibido e irresponsável, no entanto, para um primeiro trabalho, me agrada bastante, ainda que tenha momentos descartáveis e mal resolvidos. Vale por uma Karine Teles arrasando na insegurança de sua personagem e Denise Fraga poderosa como a mãe protetora. O diálogo desta com o filho após descobrir seu segredo é ótimo. Aliás, o garoto Tom Karabachian nada contra a maré de jovens atores do nosso cinema e manda muito bem. Me surpreendeu.
Um filme de final aberto. Sadicamente aberto. Luis Buñuel primeiramente ensaia e experimenta com pessoas da alta classe em uma situação bastante excêntrica: o sujeito oculto e bíblico do título age de forma misteriosa prendendo de forma abstrata e surreal aquelas pessoas numa sala após um refinado jantar, elas então passam a conviver com o mínimo de recursos. Com o tempo surgem a fome, a sede, o cansaço e os delírios, as máscaras vão caindo e o resultado é o lado animalesco do ser-humano sendo revelado como se fossem seres da idade da pedra. O final é de gargalhar, tanto pelo local em que se passa quanto por imaginarmos o que viria a se suceder ali.
Acho incrível como Hayao Miyazaki insere mensagens para as crianças nessas fábulas sutis e cheias de graça. A inocência das atitudes das personagens, o respeito pelos mais velhos e o amor pelo próximo sem dúvida deve ter influenciado muitas gerações no Japão.
PS: o gato Jiji é um dos melhores personagens do estúdio.
A paixão de Hayao Miyazaki pelo céu e pela aviação se materializa em Porco Rosso, personagem que traz em suas características antropomórficas a pitada de magia tão presente nas animações do Studio Ghibli: ele é um piloto caçador de piratas do ar que foi amaldiçoado e tem a aparência de um porco.
Porco Rosso difere muito do que vi de Miyazaki até então. É um longa mais adulto e com um protagonista homem, no entanto isso não impede que as mulheres sejam fortes (outra marca dos filmes de Miyazaki), Fio é uma bela jovem que faz seu serviço (consertar o avião do piloto) e o encanta. Fica explícito em diálogos como o conteúdo é bem mais adulto, seja nos comentários do Porco sobre a jovem ou na Grande Depressão que está ali como um pano de fundo para a história.
Há sequências belíssimas e emocionantes - como é de se esperar de um filme com a assinatura Ghibli - a cena do "mundo acima das nuvens" é um dos momentos mais lindos que vi em anos numa animação (e no cinema como um todo também). E, tal qual o Porco que vê inspiração na aviação, vejo em seu personagem uma identificação comigo mesmo tanto por sua vontade de ser só e livre quanto por seu jeito espirituoso e arredio de ser.
Ainda que a animação não seja grande coisa se comparado aos outros filmes do Studio Ghibli, é uma história bem simples e tocante e aborda uma passagem recorrente aos jovens: os romances de ensino médio. Fofinho.
É genial a forma com que Eduardo Coutinho se adapta às desavenças da produção de Cabra Marcado para Morrer para continuar contando histórias. O que seria uma ficção inspirada em fatos se torna um dos documentários mais incríveis do nosso cinema, uma página, dentre inúmeras, daquilo que a ditadura retirou de pessoas e famílias inteiras e que a arte, pelas mãos de Coutinho e sua equipe, foi capaz de reunir, ainda que em frangalhos, anos depois. Lindão.
Certa vez eu li em algum lugar que - me desculpem a memória, pois não sei quem falou - nos filmes de Elia Kazan os atores devem gritar seus diálogos, pois bem, assim como Marlon Brando que aos 27 anos deu aula de atuação em Uma Rua Chamada Pecado e imortalizou o seu "Stellaaa!!!", neste Clamor do Sexo a jovem Natalie Wood, aos 23, já tinha uma vida tão trágica que vivera Deanie com exímia intensidade, parecendo doar um pedaço de si a sua personagem.
Sem James Dean, com quem trabalhara em Vidas Amargas (1955), Kazan escalou o novato Warren Beatty - em sua estreia no cinema - como o protagonista desta história sobre uma juventude em ebulição na época mais importante de suas vidas e a opressão da sociedade e da família sobre estes jovens apaixonados que pulsavam sexo, sonhos, libido e desejo de liberdade.
Era a virada de uma geração na qual as mulheres eram obrigadas a se comportarem, caso não, seriam vistas como Ginny, a irmã do personagem de Beatty, vivida com ousadia e uma desenvoltura apaixonante por Barbara Loden, infelizmente uma personagem desperdiçada e abandonada no meio do caminho, parece que até sobre ela a mão da moral recaíra.
Kazan faz de Clamor do Sexo o seu Juventude Transviada. Beatty emula James Dean. Natalie Wood, agora 6 anos mais velha e mais madura, revive a parceira romântica do protagonista, só que dessa vez ela rouba todas as atenções para si. Seus rompantes de fúria e ataques de estresse, como se fosse um vulcão prestes a entrar em erupção (a cena da banheira com a fumaça subindo é emblemática), denotam uma pessoa querendo viver mas proibida e contida pela moral, bons costumes da época, família rigorosa e até mesmo por aquele quem ama.
Um tema que até então poucas vezes fora retratado em Hollywood: a transição da juventude para a vida adulta, algo ainda visto como um bicho de 7 cabeças pela sociedade conservadora e repressiva da época, e pensar que duas décadas depois - coincidindo com a trágica época da morte de Wood - se tornaria um dos subgêneros mais difusos do cinema norte-americano. Kazan já dava a sua deixa.
William Wyler, pelo roteiro de Lillian Hellman, propõe um ensaio antropológico sobre o poder do dinheiro e da cobiça sobre as "raposas" do título original. Teresa Wright estreava nos cinemas. Bette Davis já era a grande atriz de sua era. Por incrível que pareça o embate nem é tanto entre as duas, que vivem mãe e filha, e, mesmo assim, o final é memorável: uma emputecida e assustada Davis olha a filha pela janela e talvez imaginando que nunca terá aquilo com o qual a jovem está correndo: amor, liberdade e sua moral intacta.
Em um dia de férias em Sintra, Portugal, três gerações de uma família enfrentam experiências que mudarão suas vidas pra sempre.
Essa linha de sinopse e as personagens da alta classe emulam o cinema do diretor Hong Sang-soo (já que o cinema sul-coreano tá na moda), comparação essa que muitos colegas de crítica têm feito, já que aqui o diretor Ira Sachs propõe divagações sobre a brevidade da vida e a banalidade e futilidade das pessoas e seus relacionamentos. E realmente, há uma essência andarilha e melancólica presente a todo instante em Frankie, título emprestado do apelido da protagonista Françoise Crémont, interpretada por Isabelle Huppert, que curiosamente já trabalhou em um filme de Sang-soo: A Câmera de Claire, onde vagava por Cannes. Aqui ela vaga por Sintra, cidade na região montanhosa de Portugal que traz paisagens belissimamente fotografadas por Rui Poças - de Zama e Tabu, outros filmes preocupados em integrar a natureza local ao dilema das pessoas - e contempladas pela câmera de Sachs.
A bem da verdade é que o novo longa de Sachs é muito errático. Não só pelas constantes andanças de Frankie, mas também pela miscelânea de personagens que causa um estranhamento. Falta maior apelo emocional em cada um deles e, mesmo adorando Huppert, tenho ressalvas com sua presença aqui (confesso que preferiria Catherine Deneuve ou até mesmo Juliette Binoche no papel principal). A atriz de carreira marcada por personagens frias e fortes, neste Frankie interpreta uma personagem tão contida que a reunião com os demais familiares nunca parece uma despedida, tudo é muito solto e distante, como na de abertura, onde ela nada com os seios à mostra em uma piscina e não se importa, afinal, não será notada por ninguém.
Entre tantos coadjuvantes, o conformado marido Jimmy (Brendan Gleeson), o ex-marido Michel (Pascal Greggory), o filho do primeiro casamento (Jérémie Renier) e a enteada Sylvia (Vinette Robinson) que traz os agregados: o marido Ian e a filha adolescente Maya - o trio sempre em cenas que incham a trama - quem mais se destaca é Marisa Tomei, interpretando Ilene, amiga de longa data de Frankie. E é justamente quando Tomei e Huppert estão juntas que o longa tem seus melhores momentos, e está aí o maior erro de Sachs: se perder em outros núcleos enquanto a força dramática de seu filme estava em ambas atrizes. Minha vontade era que a história ficasse apenas nelas, até o final, assim como para Frankie aquela viagem a Sintra poderia ser eternizada.
Um drama de despedida levado em banho-maria até o final que por vezes parece servir de propaganda turística para a cidade de Sintra.
Sucesso de público na França, fazendo mais de 1 milhão de espectadores, As Invisíveis conta a história de quatro assistentes sociais que possuem apenas 3 meses para reintegrar um grupo de mulheres sem-teto, uma vez que o abrigo em que elas vivem será fechado por ordem da prefeitura. Elas irão fazer tudo o que podem: mexer pauzinhos, distorcer a verdade e até mesmo algumas mentiras.
Acompanhamos o dia a dia daquele abrigo pela perspectiva das quatro personagens principais Audrey (Audrey Lamy do excelente Polissia), Angélique (Déborah Lukumuena do ótimo Divinas), Manu (Corinne Masiero) e Hélène (Noémie Lvovsky). Elas são vistas como as salvadoras daquelas mulheres sem-teto que estão prestes a perderem o abrigo, com isso, elas se esforçam para conseguir emprego para elas, ressocializá-las, arrumam locais proibidos para elas dormirem, qualquer mínima conquista é vista como uma grande vitória, recorrer às lei nunca parece ser uma escolha, As Invisíveis são realmente invisíveis, e não só as mulheres que vivem na rua e são ignoradas pelos transeuntes (lembram-se do que o Coringa falou?), mas também as assistentes sociais perante a figura do Estado.
Chegando por aqui algumas semanas após o indicado ao Oscar, Os Miseráveis, que trazia também um cinema social mas mais voltado ao político e ao autoral, As Invisíveis, do jovem diretor e roteirista Louis-Julien Petit, de 36 anos, traz uma essência de feel good movie consigo. É uma comédia feita para agradar toda a família, desde os franceses às audiências do mundo todo. Nota-se que as mazelas nos são privadas, há um esforço para que os dramas daquelas pessoas não se tornem motivo para termos piedade delas, ainda que elas sejam interpretadas por não atrizes, que viveram nas ruas, mas que hoje estão "estabilizadas" ou em lares adotivos (algumas são uma figura). Aceita-se a triste condição, mas ela nunca é explorada com estofo. A proposta é acalentar o espectador. Mostrar a ele como ainda há bondade num mundo de desgovernos, leis anti-imigração e conservadorismo. Pra sair da sessão com um misto de tristeza e esperança.
Alguns filmes parecem encomendados, ou pra temporada de premiações ou para chocar a audiência, ainda mais quando falamos sobre o descaso da Justiça que incrimina pessoas por sua cor e etnia, deixando inocentes por anos a fio no corredor da morte sem qualquer oportunidade de uma defesa minimamente digna (um direito de todo cidadão em países democráticos). Luta por Justiça se encaixa nesses dois quesitos: é um filme onde o tema caminha à frente de seus personagens, de seu enredo e de seu desenvolvimento, sempre com a intenção de fazer o espectador se emocionar e se chocar.
Comigo não rolou. Luta por Justiça é o típico filme que tenta se sustentar pelo tema forte e pelas caras conhecidas do elenco, recheado de atores famosos: de Michael B. Jordan a Brie Larson (limitada a falar palavrões e fazer gracinha). Os personagens são unilaterais e rasos como um pires (Jamie Foxx e Rob Morgan ainda se esforçam), eles mais parecem peças em um tabuleiro, com movimentos já pré-definidos, e não é difícil que o espectador mais atento e acostumado ao gênero preveja falas e até o andamento de algumas cenas - como no caso da cena que remete a À Espera de Um Milagre ou as sequências de tribunal.
Inspirado no livro escrito pelo próprio advogado Bryan Stevenson, interpretado no filme por B. Jordan, Luta por Justiça tem um roteiro esquemático e como cinema funciona pouco. É apenas uma história - importante sim - contada sem qualquer tipo de personalidade pelo diretor Destin Daniel Cretton. E é uma pena ver como sua carreira vem decaindo filme após filme desde sua ótima estreia em Temporário 12 (2013), esse sim um drama com causas sociais genuinamente abordadas, livre de qualquer fórmula e com personagens humanizados, reais e autênticos.
Luta por Justiça é um filme sem alma, com suas boas intenções, mas que se baseia em arquétipos, a exemplo do protagonista vivido por B. Jordan, bem aquém do que Gregory Peck já interpretara no clássico O Sol é Para Todos (1962) - que também se passa no Alabama, terra natal da autora Harper Lee - e com apenas uma intenção: por favor, espectador, chore. Não chorou até o final? O filme reservou uma cena pós-créditos especial pra você.
Me lembrou bastante THX 1138, o filme de estreia de George Lucas. Mas enquanto lá Lucas assumia a ficção científica e o tom de crítica social era uma subtrama que movia os personagens, aqui Adirley Queirós realiza um trabalho no qual ele mistura de cinema de gênero e crítica social com personagens reais que já entram na história com seus traumas e fardos. O filme fica muito preso a esse exercício documental/sci-fi e os personagens são mal explorados, algo que poderia ser melhor resolvido se o filme seguisse de fato pro documental.
De qualquer forma, é uma proposta ousada e diferenciada que poderia retratar uma sociedade antepassada daquela vista em Divino Amor, aquele no futuro dominado pelo governo religioso e autoritário, esse aqui numa cidade satélite de Brasília onde só restaram os relegados e párias que não tiveram a oportunidade de "evoluir" enquanto cidadãos.
Nos últimos anos, três diretores surgiram como os salvadores do terror de gênero: Jordan Peele, Robert Eggers e Ari Aster. Seus filmes mais famosos - Corra!, A Bruxa e Hereditário - figuraram entre os melhores de seus respectivos anos e até foram classificados por alguns como "pós-horror", termo que felizmente não vingou. Em paralelo a eles estava Oz Perkins, diretor que tem uma relação familiar e consanguínea com o suspense. Ele é filho de Anthony Perkins, sim, o Norman Bates de Psicose.
Assim como seus colegas de câmera, Perkins já tem um estilo próprio. Seus três filmes são dotados de uma atmosfera hostil e embalados por uma estética que pouco se vê no terror mainstream. Nem mesmo os filmes do Invocaverso de James Wan, principalmente os mais recentes, apresentam um design de produção e fotografia tão rebuscados, enquanto Perkins prima por sua assinatura, sempre entregando algo próximo ao autoral.
E para o bem e para o mal, ele faz isso neste Maria e João: O Conto das Bruxas. Para o bem porque, dessa forma, a cinematografia imersiva nos fisga desde seus minutos iniciais. Acompanhamos Maria (Sophia Lillis) e João (Samuel Leakey), sempre ao centro do enquadramento, engolidos por aquela imensidão sombria de folhas e galhos secos da floresta. E para o mal porque, assim como em seu longa antecessor - O Último Capítulo (2016) -, ritmado pelo slow born, Perkins depende tanto da atmosfera que cria, aliado à fotografia e ao design de produção, que parece refém daquele desfile estilístico.
O resultado é decepcionante, Maria e João parece ser um projeto feito para agradar ao estúdio (a classificação indicativa limita o horror), ainda que a assinatura de Perkins esteja ali, os jumpscares são fracos, os personagens a partir de certo ponto não se desenvolvem e a história dá voltas e mais voltas sem sair do lugar, falta um apelo revisionista e substancial para a proposta feminista. Tal qual no recorrente triângulo que surge como simbolismo, as 3 pontas do filme (o protagonismo feminino, o estilo de Oz e a fotografia) delimitam um grande vazio. É pena que os três juntos não definam Maria e João como um conto assustador, sendo apenas uma experiência de belo visual.
Exceptuando-se as produções da Netflix que visam prêmios, como Roma, O Irlandês e História de Um Casamento, confesso preferência pelas produções que eles adquirem os direitos de distribuição em grandes festivais, como esta Entre Realidades, que teve sua premiere no festival de Sundance desse ano e já está disponível no catálogo do serviço de streaming.
Consigo contar nos dedos os longas da Netflix que me surpreenderam, The Other Side of the Wind, Divinas, Beasts of no Nation e Eu Não Sou Um Homem Fácil são alguns. Logicamente, a maioria deles a Netflix já compra prontos apenas para distribuir, de qualquer forma, é gratificante quando produções com autenticidade são oferecidas em meio a um catálogo abarrotado de produções medíocres que apenas nos fazem perder vários minutos escolhendo o que assistir e acabando não escolhendo nada.
Entre Realidades é o tipo de filme que engana, para o bem ou para o mal. O espectador da Netflix não está acostumado com uma obra assim. E é louvável como o diretor Jeff Baena conduz a trama de maneira tão instigante e complexa, tal qual sua protagonista, vivida brilhantemente por Alison Brie numa daquelas atuações que a gente já deixa o asterisco pras listas de final de ano. Ouso dizer que dessas produções menos badaladas da Netflix (e aqui excluo as presentes nas duas últimas edições do Oscar) Brie está parelha com a atuação de Idris Elba em Beasts of no Nation, compramos a paranoia de sua personagem sem saber bem se tudo aquilo é realidade ou coisa de sua cabeça.
Depois de muitas alucinações, o filme só perde força justamente no terço final, quando Baena e a própria Brie, que também assina o roteiro, parecem querer dar conta da paranoia da personagem - e, consequentemente, da nossa dúvida - de maneira mais direta e racional. Ainda assim, Entre Realidades exala autenticidade nessa proposta ousada que geralmente não vemos funcionar tão bem nos filmes da Netflix, aqui ornou, talvez porque queira, por grande parte, não sugerir respostas, mas sim nos envolver com a personagem e suas loucuras.
Entre Realidades pode não ser a 8ª maravilha da ficção científica a chegar Netflix, mas só por nos permitir embarcar numa história que abraça o mindblowing sem subestimar o espectador, pra mim, já é válido.
Se Bette Davis tem sua Jezebel, Joan Crawford tem sua Mildred Pierce. Uma atuação gigantesca que rendeu o Oscar de melhor atriz a Joan. Um ponto fora da curva na carreira da atriz, ela que sempre fez a durona, aqui faz uma mãe boazinha e dedicada que enche os olhos de lágrimas a cada 5 minutos. E mesmo assim, é possível ver a leoa que Joan trazia dentro de si.
O diretor Michael Curtiz - daquele que talvez seja o maior romance da Hollywood clássica: Casablanca - mescla muito bem o drama com o noir, conduzindo seu melodrama com elementos típicos do gênero policial (como a fotografia em preto e branco) ainda que seu escopo novelesco seja o fio condutor da narrativa: Joan é Mildred, uma mulher abandonada pelo marido que se desdobra de trabalhar para dar conforto à filha Veda, patricinha mimada que quer viver do bom e do melhor.
Assim como em Crepúsculo dos Deuses, lançado 5 anos depois, um assassinato abre a história. Mildred é levada à delegacia para depor e, embora não seja reconhecida como a principal suspeita, atribui a si a autoria do crime. Passamos a acompanhar então, a partir de flashbacks narrados por ela, a história de sua vida, conhecendo aqueles em sua volta, seus amores, suas amigas e suas filhas.
Neste drama de ares novelescos, Curtiz tira do noir os diálogos afiados e as atuações fortes (a cena da escadaria entre Mildred e Veda é espetacular) e costura essa teia de mistério finalizando de maneira satisfatória, mostrando que o que realmente importa em Alma em Suplício são suas personagens, todos muito bem desenvolvidos, dos homens (difícil saber qual presta menos) às mulheres, principalmente Mildred, da qual Joan Crawford tira mais do que o necessário e prova porque foi uma das grandes atrizes do cinema.
Inspirado no personagem criado pela Sega em 1991, Sonic: O Filme traz o ouriço alienígena - tal qual Superman, ele veio do espaço - vivendo em Green Hill - numa clara referência à primeira fase de seu jogo - de onde o xerife Tom (James Marsden) está prestes a se mudar com sua esposa Maddie (Tika Sumpter). Sozinho e sem ninguém para chamar de amigo, Sonic causa um blecaute na cidade com seus poderes supersônicos e chama a atenção do Doutor Robotnik (Jim Carrey de volta aos velhos tempos fazendo suas caras e bocas), um cientista maluco contratado pelo governo para apurar o apagão. Robotnik passa a perseguir Sonic a fim de capturá-lo e usá-lo como fonte de energia para seu arsenal tecnológico.
Enquanto outras adaptações de games não se adaptavam bem ao formato cinematográfico, o roteiro escrito a 5 mãos (!) faz bom uso dos elementos clássicos do jogo de forma que eles tenham uso funcional na narrativa. Os anéis dourados são como portais que levam Sonic para onde ele quiser, o visual clássico do Dr. Robotnik de bigode espalhafatoso e físico rechonchudo não foi aplicado em Jim Carrey, como visto no trailer, mas aguarde até a primeira cena pós-crédito que valerá à pena - a segunda vale ainda mais -, enquanto o visual do Sonic traz as luvinhas brancas e seu sapatinho vermelho, ou seja, sua identidade visual foi preservada.
No meio desse filme família que remete a Meu Amigo Dragão (2016) - ou até E.T. (1982) se você quiser ir mais longe -, o diretor Jeff Fowler se permite fazer algumas piadinhas politicamente incorretas - como a da criança presa na bolsa - e até dá indícios de uma relação homo-afetiva entre Robotnik e seu ajudante Stone (Lee Majdoub) sem ridicularizá-los, a brincadeira aparece também nas cenas de ação, onde é aproveitada a ultravelocidade de Sonic para deixar tudo em câmera lenta e o ouriço se deleitar durante uma briga de bar - sabe aquela cena do Mercúrio em X-Men? Nesse estilo - até mesmo referências cinematográficas aparecem aqui e ali - Sonic adora Velocidade Máxima - e o resultado acaba sendo uma sessão prazerosa onde o principal combustível está no carisma do protagonista e no ritmo acelerado que nunca cansa o espectador.
Esse é o terceiro longa consecutivo de Todd Haynes em que ele não assina o roteiro, e é provavelmente o que menos tem sua cara. Isso é um demérito, já que o diretor sempre traz consigo uma assinatura bastante particular de quem conhece parte de sua filmografia - Carol, Não Estou Lá e Velvet Goldmine estão aí pra provar. Aqui, uma narrativa clássica permanece, Haynes praticamente some nessas "dark waters", o que por um lado é ruim e até desapontador, parece que qualquer um poderia ter feito, mas não deixa de ser um thriller investigativo com um tema relevante e dignamente apresentado.
O sugestivo título original "Dark Waters" emprega, sozinho, uma aura de terror ao longa. O próprio Haynes se encarrega de filmar galhos secos de árvores, campos destruídos e animais mortos arquitetando esse clima pesado em torno de seu argumento. Já o título nacional - O Preço da Verdade - se apega muito mais aos esforços do advogado Robert Billott, vivido por Mark Ruffalo, personagem tão esforçado quanto o jornalista que ele interpreta em Spotlight, onde ele também lutava para denunciar uma grande corporação, lá a Igreja Católica, aqui a DuPont, empresa química que poluiu as águas de West Virginia fazendo um número incontável de vítimas, de pessoas a animais, afetando também o solo e todo um bioma.
Billott é contratado por um pequeno fazendeiro para lutar por justiça. Diante do cenário desolador que encontra na propriedade do homem, Billott aceita ajudá-lo, sabendo que não será fácil lutar contra a DuPont. A fotografia densa de Edward Lachman emula toda essa sensação de pequenez daquelas pessoas diante de um inimigo tão poderoso. Em certa cena do longa, o personagem do incrível Tim Robbins - que bom vê-lo atuando de novo e em ótimo nível - diz que até mesmo o governo dos Estados Unidos precisa da empresa. É uma luta contra um inimigo impossível de ser vencido, a linha do tempo vai avançando anos a fio - e Haynes coloca a passagem dos anos literalmente na tela para elucidar essa batalha sem fim - ao final, sabemos que todos perdemos e que os valores simbólicos pagos pela empresa não comprarão nada de volta.
Vejo ótimas intenções em Taika Waititi ao mostrar o nazismo a partir dos olhos de uma criança, o jovem Jojo (Roman Griffin Davis, excelente), porém, isso funciona até a segunda página, ou melhor, até o fim da sequência de abertura com jovens em êxtase.
O mundo de faz-de-conta criado por Taika é inofensivo e refém de suas próprias traquinagens: as sequentes esquetes a la Trapalhões e Zorra Total (na fase ruim) com uma péssima Rebel Wilson ou com a dupla de capitães gays (Sam Rockwell e Alfie Allen) tornam o filme um draminha água com açúcar que me fez lembrar até Green Book no sentido de que não fede nem cheira, é só fofinho, como um coelhinho branco mastigando sua cenoura sem reagir a nada.
Um dos maiores trunfos das sátiras é mostrar como aquele elemento que está sendo ridicularizado realmente existe/existiu e é/foi perigoso. E isso só acontece em Jojo Rabbit em uma cena isolada e gratuita, quase tudo é banal, o longa tem um sério problema com situações que acontecem por mero acaso e conveniência de roteiro, como Yorki (Archie Yates), amiguinho de Jojo, que vai e vem apenas pra nos fazer rir e falar "oh que fofo" ou no quinteto nazista que invade a casa de Jojo e são apenas... idiotas.
Pelo menos Scarlett Johansson, em toda sua graciosidade, é a personagem adulta que realmente parece viver naquele mundo afetado pelo nazismo e pela 2ª Guerra. Assim como a "inquilina" vivida por Thomasin McKenzie, outra que sempre surge de maneira gratificante para dar um tapa de realidade no nazistinha Jojo. É pena que com os demais personagens Taika se limite ao pastiche do que Charles Chaplin e Alexandr Sokurov já fizeram. Falta acidez e inteligência no discurso.
Assistindo ao filme me peguei lembrando de Triunfo da Vontade, de Leni Riefenstahl, um documentário de propaganda nazista no qual Hitler aparece sendo saudado por soldados, crianças e mulheres. E essa inflamação da época nunca é vista aqui, Taika guia seu filme pelo lúdico sem qualquer outro propósito. Ao final, a mensagem de Jojo Rabbit é tão boba quanto pintar nazista de gay (sério?), Hitler de um bobalhão imaginário e judeus de monstros que leem mentes. O humor de Taika, definitivamente, não é pra mim.
É praticamente um coming of age em formato documental. Acompanhamos a cantora Taylor Swift desde os primeiros anos de sua pré-adolescência até seus atuais 30 anos e como ela foi moldada durante todo esse tempo para se tornar uma superstar que sentia a necessidade de ser considerada boa. A ela era negado o direito de ser alguém com personalidade além palco, apenas ser a artista que cantava e vendia, como se fosse uma máquina.
A diretora Lana Wilson não foge de uma linguagem cinematográfica convencional, cabendo à equipe de montagem dar dinâmica à narrativa. A condução da história é moldada pelas transições entre shows, vídeos caseiros e gravações em estúdios. Aqui, Swift se despe daquela personagem outrora criada e nos convida para sentar confortavelmente no sofá da sala - afinal, o filme está na Netflix - e ouvi-la nos confessar alguns de seus sentimentos, segredos e angústias.
Há registro bem lamentáveis, como quando ela é confrontada pelo rapper Kanye West durante o VMA, em 2009, após ganhar um prêmio que, para ele, deveria ter ido para Beyoncé. A frustração da jovem cantora, à época com apenas 19 anos, enquanto Kanye tinha 32, é de partir o coração, justamente por ser uma atitude grosseira, machista e agressiva de alguém que ela provavelmente admirava de alguma forma.
Todo o backlash gerado pela situação, intimidade e relacionamentos expostos, a exigência das gravadoras para produzir mais e cada vez melhor e toda a luta para se manter dentro dos padrões estéticos impostos pela sociedade foram minando a artista e a pessoa que, em certo momento de sua vida, após ganhar e faturar tanto, notou que não tinha alguém íntimo o bastante para ligar e comemorar suas conquistas.
A virada em sua carreira, e consequentemente em sua vida, é fantástica, seu novo posicionamento - principalmente na esfera política - devolvem a Swift o papel de miss que ela sempre teve, só que, dessa vez, ela é quem comanda as rédeas da situação, muito mais segura de si mesma. Quem dera se todo artista tivesse a mesma consciência do poder que tem em mãos para influenciar e politizar e não apenas ser visto como uma pessoa perfeita. Afinal, quem é? Palmas para Taylor Swift.
Parece que a Warner/DC aprendeu com os próprios erros e também com os acertos dos outros. Desde o início de Aves de Rapina, fica nítida a influência de Deadpool, principalmente na narrativa, repleta de tiradinhas e quebras de quarta parede. A narração em off de Arlequina (Margot Robbie) chega a ser irritante em alguns momentos, já que acompanhamos toda a história a partir de sua perspectiva, mas diverte na mesma medida. Dessa forma, o longa de Cathy Yan passa boa parte dependendo de exibir as loucuras cometidas por Harley, agora livre do Coringa. Se a princípio essa emancipação é vista por ela como um grito de liberdade, logo ela se vê tendo que se virar sozinha numa Gotham City cheia de bandidos e vilões.
Sem descontinuar Esquadrão Suicida e salvando a única coisa que funcionava lá, o protagonismo dado a Harley emprega duas coisas à história: irritante como só, ela mexe não só na montagem do filme - montando e desmontando o 1º ato - como também em sua estética que se assume kitsch em diversos momentos e, embora seja um filme intitulado "Aves de Rapina", a história trata muito mais da "sua Emancipação Fantabulosa", do subtítulo.
Ao som de uma trilha sonora composta por vozes femininas, aos poucos, a emancipação da Arlequina se estende às demais personagens, que surgem sempre desacreditadas, seja na esfera familiar (no caso da Caçadora de Mary Elizabeth Winstead) ou na profissional (no caso da detetive Montoya de Rosie Perez). Dentre elas, Dinah Lance (a Canário Negro de Jurnee Smollett-Bell) é a que mais rouba a cena, tanto por suas cenas de luta bem coreografadas quanto por se encaixar bem no termo super-heroína.
O filme só escorrega ao inserir a Caçadora no grupo, ela é bem deslocada das demais - e não apenas por seu jeitão de durona que não curte piadinhas - e ao concluir o arco do vilão Máscara Negra (Ewan McGregor), lhe dando um final bem anti-climático, mas talvez, tal qual em Batman Begins, e lhes peço permissão para supor, os planos para o futuro das Aves de Rapina sejam ainda maiores. É como a própria Montoya diz: mais vilões irão atrás delas. Nos resta esperar pra ver.
Pra uma história tão pesada que documenta a triste realidade de feridos da guerra civil da Síria que são levados a um hospital subterrâneo na província de Ghouta faltou a Feras Fayyad se fruir da situação desesperadora e fluir por uma perspectiva mais impactante da situação. A câmera de Fayyad - que já havia sido indicado a melhor documentário no Oscar por Last Men in Aleppo - está tão próxima e ao mesmo tempo parece tão distante - me passa uma sensação de voyeurismo.
Em uma sequência de The Cave, a médica Amani Ballour fala com uma criança e pergunta a ela qual o sentido da vida, a criança não sabe responder. "Para sermos pessoas importantes.", diz a médica. Em outra passagem, uma médica comenta que ver as crianças rindo em meio a tanta tragédia lhe dava esperança. Apesar desses dois emocionantes registros, falta a The Cave fortalecer esse aspecto das crianças que trazem, ao mesmo tempo, a esperança contida em um sorriso e a tristeza por sequer saberem dizer porque estão vivas já que vivem cercadas de tanta morte.
O filme nos cativa muito mais pela rotina do hospital e daquelas pessoas - algo bem trivial mesmo - do que pela ameaça que vem lá de cima. O medo é quase secundário - talvez seja um sacrilégio falar isso já que não estou lá para sentir aquilo na pele -, e é até gratificante que Fayyad valorize aquelas pessoas ao invés de explorar as mazelas da guerra, que de alguma forma acabam chegando lá, ainda assim, falta se aprofundar mais na vida delas e em alguns temas que chega a pincelar, como o machismo e a religião. Nem de longe me impactou como For Sama, esse sim, transita com muito mais intensidade entre o íntimo de suas pessoas e na destruição causada pela guerra sem precisar de uma trilha intrusiva como a daqui.
A Hora da Sua Morte
2.5 558Não é de hoje que a tecnologia é utilizada nos filmes de terror como uma forma de canalizar alguns medos da sociedade. Este A Hora da Sua Morte faz de um aplicativo de celular o gatilho principal para desencadear alguns dos dilemas da atual geração de jovens. Há certas referências pops no longa, a começar pela protagonista vivida por Elizabeth Lail, rosto conhecido para a audiência da série You, da Netflix. Ela é Quinn Harris, uma enfermeira que sofre frequentes investidas do cirurgião chefe de seu plantão, vivido por Peter Facinelli - o Carlisle Cullen de Crepúsculo, quem lembra? - Pois é, além de ter que fugir da morte, numa vibe à la Premonição, ela também tem que se livrar do patrão abusivo.
O mais gozado no longa é que, apesar de ter jumpscares previsíveis e clichês, que mesmo assim podem te fazer pular algumas vezes da cadeira - eu mesmo pulei em uma cena - este não é um filme assustador e nem parece querer ser. Por mais que a premissa seja sufocante: os personagens baixam um aplicativo que lhes informa quanto tempo de vista lhes resta, o diretor Justin Dec sempre insere na história personagens que funcionam como alívio cômico: de um padre/exorcista engraçadão a um emburrecido atendente de loja de eletrônicos - onde inclusive acontece uma das cenas mais hilárias do longa.
Sem se aprofundar em praticamente nada que aborda - Dec só parece querer zoar mesmo, sobra até pros terraplanistas e veganos -, A Hora de Sua Morte assume o tom pastelão, há erros estúpidos de roteiro como o aplicativo de 60GB que é baixado em questão de segundos ou a ala proibida do hospital que permanece acessível a qualquer um. Apesar dos pesares, é interessante notar como a morte é vista pelos dois aspectos: da razão e da emoção. Ora, qual pessoa para melhor lidar com a morte senão alguém que estuda medicina? E qual a pessoa mais sensata para se procurar com a morte iminente senão um padre? Os médicos são mais céticos, enquanto o padre recorre a lendas e rituais.
Logicamente, A Hora da Sua Morte não traz respostas para nos confortar na hora da morte (transformada aqui num vilão de múltiplas facetas e formas mas que nunca impõe medo), nem funciona como um estudo antropológico de jovens conectados e famílias desestruturadas. O conflito entre razão e fé/emoção e ciência também é capenga, e o que sobra mesmo dessa sessão descompromissada é a sua boa vontade para rir ou não daqueles personagens tentando sobreviver ao inevitável.
Antiga Alegria
3.5 29A "antiga alegria" do título é como um remember de uma época que já se foi e que nunca mais será a mesma. A diretora Kelly Reichardt coloca seus dois personagens, Mark (Daniel London) e Kurt (Will Oldham), numa espécie de road movie bucólico. O que parece incitar O Segredo de Brokeback Mountain (principalmente na cena das banheiras aquecidas) já que foi lançado um ano após esse, na verdade lida com a passagem do tempo para dois homens adultos: um (Mark) com um bebê a caminho, o outro (Kurt) com um futuro incerto, como é possível percebermos apenas na cena final. Para Kurt, rever o amigo de longa data é como estar à vontade e, ao mesmo tempo, tentar transpassar a barreira invisível atrás da qual o outro parece se esconder, já em Mark fica visível o incômodo, seja nas perguntas e divagações do amigo, nos silêncios, na massagem, na nudez, etc. A câmera de Reichardt busca os prédios, as paisagens, as copas das árvores contemplando o mundo à volta daqueles dois homens comuns. O filme é um rito de passagem morno que deixa muita coisa nas entrelinhas.
Esse Obscuro Objeto do Desejo
4.2 87Um curioso jogo de sedução proposto por Luis Buñuel. O velho magnata que deseja a virgindade da jovem moça de 18 anos. As trocas entre Carole Bouquet e Ángela Molina (essa me lembrou muito Ana de Armas) no papel de Conchita deixam claro que para Mathieu não importa quem ela seja, como ela seja e como ela reage, mas sim o que ela guarda. Dessa forma, Buñuel priva seu protagonista do tal ouro de tolo, que Raul Seixas certa vez cantou, ora, o ricaço tem tudo (bem, quase tudo) e, embora não seja mais jovem e belo, ele crê que seu poder financeiro lhe permita ter aquilo que mais quer. Buñuel finaliza com sua assinatura, deixando o espectador com sua sacada de mestre, SPOILER: o bordado que simboliza a virgindade rompida e o atentado do grupo terrorista sobre nossa dupla, afinal, cederam aos desejos carnais.
Fala Comigo
2.9 183 Assista AgoraTalvez não dê conta da complexidade dos assuntos que pincela, como a solidão, a ética, a moral, a sexualidade, a puberdade e o amor proibido e irresponsável, no entanto, para um primeiro trabalho, me agrada bastante, ainda que tenha momentos descartáveis e mal resolvidos. Vale por uma Karine Teles arrasando na insegurança de sua personagem e Denise Fraga poderosa como a mãe protetora. O diálogo desta com o filho após descobrir seu segredo é ótimo. Aliás, o garoto Tom Karabachian nada contra a maré de jovens atores do nosso cinema e manda muito bem. Me surpreendeu.
O Anjo Exterminador
4.3 377 Assista AgoraUm filme de final aberto. Sadicamente aberto. Luis Buñuel primeiramente ensaia e experimenta com pessoas da alta classe em uma situação bastante excêntrica: o sujeito oculto e bíblico do título age de forma misteriosa prendendo de forma abstrata e surreal aquelas pessoas numa sala após um refinado jantar, elas então passam a conviver com o mínimo de recursos. Com o tempo surgem a fome, a sede, o cansaço e os delírios, as máscaras vão caindo e o resultado é o lado animalesco do ser-humano sendo revelado como se fossem seres da idade da pedra. O final é de gargalhar, tanto pelo local em que se passa quanto por imaginarmos o que viria a se suceder ali.
O Serviço de Entregas da Kiki
4.3 776 Assista AgoraAcho incrível como Hayao Miyazaki insere mensagens para as crianças nessas fábulas sutis e cheias de graça. A inocência das atitudes das personagens, o respeito pelos mais velhos e o amor pelo próximo sem dúvida deve ter influenciado muitas gerações no Japão.
PS: o gato Jiji é um dos melhores personagens do estúdio.
Porco Rosso: O Último Herói Romântico
3.9 286 Assista AgoraA paixão de Hayao Miyazaki pelo céu e pela aviação se materializa em Porco Rosso, personagem que traz em suas características antropomórficas a pitada de magia tão presente nas animações do Studio Ghibli: ele é um piloto caçador de piratas do ar que foi amaldiçoado e tem a aparência de um porco.
Porco Rosso difere muito do que vi de Miyazaki até então. É um longa mais adulto e com um protagonista homem, no entanto isso não impede que as mulheres sejam fortes (outra marca dos filmes de Miyazaki), Fio é uma bela jovem que faz seu serviço (consertar o avião do piloto) e o encanta. Fica explícito em diálogos como o conteúdo é bem mais adulto, seja nos comentários do Porco sobre a jovem ou na Grande Depressão que está ali como um pano de fundo para a história.
Há sequências belíssimas e emocionantes - como é de se esperar de um filme com a assinatura Ghibli - a cena do "mundo acima das nuvens" é um dos momentos mais lindos que vi em anos numa animação (e no cinema como um todo também). E, tal qual o Porco que vê inspiração na aviação, vejo em seu personagem uma identificação comigo mesmo tanto por sua vontade de ser só e livre quanto por seu jeito espirituoso e arredio de ser.
Eu Posso Ouvir o Oceano
3.2 222 Assista AgoraAinda que a animação não seja grande coisa se comparado aos outros filmes do Studio Ghibli, é uma história bem simples e tocante e aborda uma passagem recorrente aos jovens: os romances de ensino médio. Fofinho.
Cabra Marcado Para Morrer
4.5 253 Assista AgoraÉ genial a forma com que Eduardo Coutinho se adapta às desavenças da produção de Cabra Marcado para Morrer para continuar contando histórias. O que seria uma ficção inspirada em fatos se torna um dos documentários mais incríveis do nosso cinema, uma página, dentre inúmeras, daquilo que a ditadura retirou de pessoas e famílias inteiras e que a arte, pelas mãos de Coutinho e sua equipe, foi capaz de reunir, ainda que em frangalhos, anos depois. Lindão.
Clamor do Sexo
4.2 92 Assista AgoraCerta vez eu li em algum lugar que - me desculpem a memória, pois não sei quem falou - nos filmes de Elia Kazan os atores devem gritar seus diálogos, pois bem, assim como Marlon Brando que aos 27 anos deu aula de atuação em Uma Rua Chamada Pecado e imortalizou o seu "Stellaaa!!!", neste Clamor do Sexo a jovem Natalie Wood, aos 23, já tinha uma vida tão trágica que vivera Deanie com exímia intensidade, parecendo doar um pedaço de si a sua personagem.
Sem James Dean, com quem trabalhara em Vidas Amargas (1955), Kazan escalou o novato Warren Beatty - em sua estreia no cinema - como o protagonista desta história sobre uma juventude em ebulição na época mais importante de suas vidas e a opressão da sociedade e da família sobre estes jovens apaixonados que pulsavam sexo, sonhos, libido e desejo de liberdade.
Era a virada de uma geração na qual as mulheres eram obrigadas a se comportarem, caso não, seriam vistas como Ginny, a irmã do personagem de Beatty, vivida com ousadia e uma desenvoltura apaixonante por Barbara Loden, infelizmente uma personagem desperdiçada e abandonada no meio do caminho, parece que até sobre ela a mão da moral recaíra.
Kazan faz de Clamor do Sexo o seu Juventude Transviada. Beatty emula James Dean. Natalie Wood, agora 6 anos mais velha e mais madura, revive a parceira romântica do protagonista, só que dessa vez ela rouba todas as atenções para si. Seus rompantes de fúria e ataques de estresse, como se fosse um vulcão prestes a entrar em erupção (a cena da banheira com a fumaça subindo é emblemática), denotam uma pessoa querendo viver mas proibida e contida pela moral, bons costumes da época, família rigorosa e até mesmo por aquele quem ama.
Um tema que até então poucas vezes fora retratado em Hollywood: a transição da juventude para a vida adulta, algo ainda visto como um bicho de 7 cabeças pela sociedade conservadora e repressiva da época, e pensar que duas décadas depois - coincidindo com a trágica época da morte de Wood - se tornaria um dos subgêneros mais difusos do cinema norte-americano. Kazan já dava a sua deixa.
Pérfida
4.2 80William Wyler, pelo roteiro de Lillian Hellman, propõe um ensaio antropológico sobre o poder do dinheiro e da cobiça sobre as "raposas" do título original. Teresa Wright estreava nos cinemas. Bette Davis já era a grande atriz de sua era. Por incrível que pareça o embate nem é tanto entre as duas, que vivem mãe e filha, e, mesmo assim, o final é memorável: uma emputecida e assustada Davis olha a filha pela janela e talvez imaginando que nunca terá aquilo com o qual a jovem está correndo: amor, liberdade e sua moral intacta.
Frankie
2.9 22Em um dia de férias em Sintra, Portugal, três gerações de uma família enfrentam experiências que mudarão suas vidas pra sempre.
Essa linha de sinopse e as personagens da alta classe emulam o cinema do diretor Hong Sang-soo (já que o cinema sul-coreano tá na moda), comparação essa que muitos colegas de crítica têm feito, já que aqui o diretor Ira Sachs propõe divagações sobre a brevidade da vida e a banalidade e futilidade das pessoas e seus relacionamentos. E realmente, há uma essência andarilha e melancólica presente a todo instante em Frankie, título emprestado do apelido da protagonista Françoise Crémont, interpretada por Isabelle Huppert, que curiosamente já trabalhou em um filme de Sang-soo: A Câmera de Claire, onde vagava por Cannes. Aqui ela vaga por Sintra, cidade na região montanhosa de Portugal que traz paisagens belissimamente fotografadas por Rui Poças - de Zama e Tabu, outros filmes preocupados em integrar a natureza local ao dilema das pessoas - e contempladas pela câmera de Sachs.
A bem da verdade é que o novo longa de Sachs é muito errático. Não só pelas constantes andanças de Frankie, mas também pela miscelânea de personagens que causa um estranhamento. Falta maior apelo emocional em cada um deles e, mesmo adorando Huppert, tenho ressalvas com sua presença aqui (confesso que preferiria Catherine Deneuve ou até mesmo Juliette Binoche no papel principal). A atriz de carreira marcada por personagens frias e fortes, neste Frankie interpreta uma personagem tão contida que a reunião com os demais familiares nunca parece uma despedida, tudo é muito solto e distante, como na de abertura, onde ela nada com os seios à mostra em uma piscina e não se importa, afinal, não será notada por ninguém.
Entre tantos coadjuvantes, o conformado marido Jimmy (Brendan Gleeson), o ex-marido Michel (Pascal Greggory), o filho do primeiro casamento (Jérémie Renier) e a enteada Sylvia (Vinette Robinson) que traz os agregados: o marido Ian e a filha adolescente Maya - o trio sempre em cenas que incham a trama - quem mais se destaca é Marisa Tomei, interpretando Ilene, amiga de longa data de Frankie. E é justamente quando Tomei e Huppert estão juntas que o longa tem seus melhores momentos, e está aí o maior erro de Sachs: se perder em outros núcleos enquanto a força dramática de seu filme estava em ambas atrizes. Minha vontade era que a história ficasse apenas nelas, até o final, assim como para Frankie aquela viagem a Sintra poderia ser eternizada.
Um drama de despedida levado em banho-maria até o final que por vezes parece servir de propaganda turística para a cidade de Sintra.
As Invisíveis
4.0 6 Assista AgoraSucesso de público na França, fazendo mais de 1 milhão de espectadores, As Invisíveis conta a história de quatro assistentes sociais que possuem apenas 3 meses para reintegrar um grupo de mulheres sem-teto, uma vez que o abrigo em que elas vivem será fechado por ordem da prefeitura. Elas irão fazer tudo o que podem: mexer pauzinhos, distorcer a verdade e até mesmo algumas mentiras.
Acompanhamos o dia a dia daquele abrigo pela perspectiva das quatro personagens principais Audrey (Audrey Lamy do excelente Polissia), Angélique (Déborah Lukumuena do ótimo Divinas), Manu (Corinne Masiero) e Hélène (Noémie Lvovsky). Elas são vistas como as salvadoras daquelas mulheres sem-teto que estão prestes a perderem o abrigo, com isso, elas se esforçam para conseguir emprego para elas, ressocializá-las, arrumam locais proibidos para elas dormirem, qualquer mínima conquista é vista como uma grande vitória, recorrer às lei nunca parece ser uma escolha, As Invisíveis são realmente invisíveis, e não só as mulheres que vivem na rua e são ignoradas pelos transeuntes (lembram-se do que o Coringa falou?), mas também as assistentes sociais perante a figura do Estado.
Chegando por aqui algumas semanas após o indicado ao Oscar, Os Miseráveis, que trazia também um cinema social mas mais voltado ao político e ao autoral, As Invisíveis, do jovem diretor e roteirista Louis-Julien Petit, de 36 anos, traz uma essência de feel good movie consigo. É uma comédia feita para agradar toda a família, desde os franceses às audiências do mundo todo. Nota-se que as mazelas nos são privadas, há um esforço para que os dramas daquelas pessoas não se tornem motivo para termos piedade delas, ainda que elas sejam interpretadas por não atrizes, que viveram nas ruas, mas que hoje estão "estabilizadas" ou em lares adotivos (algumas são uma figura). Aceita-se a triste condição, mas ela nunca é explorada com estofo. A proposta é acalentar o espectador. Mostrar a ele como ainda há bondade num mundo de desgovernos, leis anti-imigração e conservadorismo. Pra sair da sessão com um misto de tristeza e esperança.
Luta Por Justiça
4.2 250 Assista AgoraAlguns filmes parecem encomendados, ou pra temporada de premiações ou para chocar a audiência, ainda mais quando falamos sobre o descaso da Justiça que incrimina pessoas por sua cor e etnia, deixando inocentes por anos a fio no corredor da morte sem qualquer oportunidade de uma defesa minimamente digna (um direito de todo cidadão em países democráticos). Luta por Justiça se encaixa nesses dois quesitos: é um filme onde o tema caminha à frente de seus personagens, de seu enredo e de seu desenvolvimento, sempre com a intenção de fazer o espectador se emocionar e se chocar.
Comigo não rolou. Luta por Justiça é o típico filme que tenta se sustentar pelo tema forte e pelas caras conhecidas do elenco, recheado de atores famosos: de Michael B. Jordan a Brie Larson (limitada a falar palavrões e fazer gracinha). Os personagens são unilaterais e rasos como um pires (Jamie Foxx e Rob Morgan ainda se esforçam), eles mais parecem peças em um tabuleiro, com movimentos já pré-definidos, e não é difícil que o espectador mais atento e acostumado ao gênero preveja falas e até o andamento de algumas cenas - como no caso da cena que remete a À Espera de Um Milagre ou as sequências de tribunal.
Inspirado no livro escrito pelo próprio advogado Bryan Stevenson, interpretado no filme por B. Jordan, Luta por Justiça tem um roteiro esquemático e como cinema funciona pouco. É apenas uma história - importante sim - contada sem qualquer tipo de personalidade pelo diretor Destin Daniel Cretton. E é uma pena ver como sua carreira vem decaindo filme após filme desde sua ótima estreia em Temporário 12 (2013), esse sim um drama com causas sociais genuinamente abordadas, livre de qualquer fórmula e com personagens humanizados, reais e autênticos.
Luta por Justiça é um filme sem alma, com suas boas intenções, mas que se baseia em arquétipos, a exemplo do protagonista vivido por B. Jordan, bem aquém do que Gregory Peck já interpretara no clássico O Sol é Para Todos (1962) - que também se passa no Alabama, terra natal da autora Harper Lee - e com apenas uma intenção: por favor, espectador, chore. Não chorou até o final? O filme reservou uma cena pós-créditos especial pra você.
Branco Sai, Preto Fica
3.5 173Me lembrou bastante THX 1138, o filme de estreia de George Lucas. Mas enquanto lá Lucas assumia a ficção científica e o tom de crítica social era uma subtrama que movia os personagens, aqui Adirley Queirós realiza um trabalho no qual ele mistura de cinema de gênero e crítica social com personagens reais que já entram na história com seus traumas e fardos. O filme fica muito preso a esse exercício documental/sci-fi e os personagens são mal explorados, algo que poderia ser melhor resolvido se o filme seguisse de fato pro documental.
De qualquer forma, é uma proposta ousada e diferenciada que poderia retratar uma sociedade antepassada daquela vista em Divino Amor, aquele no futuro dominado pelo governo religioso e autoritário, esse aqui numa cidade satélite de Brasília onde só restaram os relegados e párias que não tiveram a oportunidade de "evoluir" enquanto cidadãos.
Maria e João: O Conto das Bruxas
2.6 527Nos últimos anos, três diretores surgiram como os salvadores do terror de gênero: Jordan Peele, Robert Eggers e Ari Aster. Seus filmes mais famosos - Corra!, A Bruxa e Hereditário - figuraram entre os melhores de seus respectivos anos e até foram classificados por alguns como "pós-horror", termo que felizmente não vingou. Em paralelo a eles estava Oz Perkins, diretor que tem uma relação familiar e consanguínea com o suspense. Ele é filho de Anthony Perkins, sim, o Norman Bates de Psicose.
Assim como seus colegas de câmera, Perkins já tem um estilo próprio. Seus três filmes são dotados de uma atmosfera hostil e embalados por uma estética que pouco se vê no terror mainstream. Nem mesmo os filmes do Invocaverso de James Wan, principalmente os mais recentes, apresentam um design de produção e fotografia tão rebuscados, enquanto Perkins prima por sua assinatura, sempre entregando algo próximo ao autoral.
E para o bem e para o mal, ele faz isso neste Maria e João: O Conto das Bruxas. Para o bem porque, dessa forma, a cinematografia imersiva nos fisga desde seus minutos iniciais. Acompanhamos Maria (Sophia Lillis) e João (Samuel Leakey), sempre ao centro do enquadramento, engolidos por aquela imensidão sombria de folhas e galhos secos da floresta. E para o mal porque, assim como em seu longa antecessor - O Último Capítulo (2016) -, ritmado pelo slow born, Perkins depende tanto da atmosfera que cria, aliado à fotografia e ao design de produção, que parece refém daquele desfile estilístico.
O resultado é decepcionante, Maria e João parece ser um projeto feito para agradar ao estúdio (a classificação indicativa limita o horror), ainda que a assinatura de Perkins esteja ali, os jumpscares são fracos, os personagens a partir de certo ponto não se desenvolvem e a história dá voltas e mais voltas sem sair do lugar, falta um apelo revisionista e substancial para a proposta feminista. Tal qual no recorrente triângulo que surge como simbolismo, as 3 pontas do filme (o protagonismo feminino, o estilo de Oz e a fotografia) delimitam um grande vazio. É pena que os três juntos não definam Maria e João como um conto assustador, sendo apenas uma experiência de belo visual.
Entre Realidades
2.9 307 Assista AgoraExceptuando-se as produções da Netflix que visam prêmios, como Roma, O Irlandês e História de Um Casamento, confesso preferência pelas produções que eles adquirem os direitos de distribuição em grandes festivais, como esta Entre Realidades, que teve sua premiere no festival de Sundance desse ano e já está disponível no catálogo do serviço de streaming.
Consigo contar nos dedos os longas da Netflix que me surpreenderam, The Other Side of the Wind, Divinas, Beasts of no Nation e Eu Não Sou Um Homem Fácil são alguns. Logicamente, a maioria deles a Netflix já compra prontos apenas para distribuir, de qualquer forma, é gratificante quando produções com autenticidade são oferecidas em meio a um catálogo abarrotado de produções medíocres que apenas nos fazem perder vários minutos escolhendo o que assistir e acabando não escolhendo nada.
Entre Realidades é o tipo de filme que engana, para o bem ou para o mal. O espectador da Netflix não está acostumado com uma obra assim. E é louvável como o diretor Jeff Baena conduz a trama de maneira tão instigante e complexa, tal qual sua protagonista, vivida brilhantemente por Alison Brie numa daquelas atuações que a gente já deixa o asterisco pras listas de final de ano. Ouso dizer que dessas produções menos badaladas da Netflix (e aqui excluo as presentes nas duas últimas edições do Oscar) Brie está parelha com a atuação de Idris Elba em Beasts of no Nation, compramos a paranoia de sua personagem sem saber bem se tudo aquilo é realidade ou coisa de sua cabeça.
Depois de muitas alucinações, o filme só perde força justamente no terço final, quando Baena e a própria Brie, que também assina o roteiro, parecem querer dar conta da paranoia da personagem - e, consequentemente, da nossa dúvida - de maneira mais direta e racional. Ainda assim, Entre Realidades exala autenticidade nessa proposta ousada que geralmente não vemos funcionar tão bem nos filmes da Netflix, aqui ornou, talvez porque queira, por grande parte, não sugerir respostas, mas sim nos envolver com a personagem e suas loucuras.
Entre Realidades pode não ser a 8ª maravilha da ficção científica a chegar Netflix, mas só por nos permitir embarcar numa história que abraça o mindblowing sem subestimar o espectador, pra mim, já é válido.
Alma em Suplício
4.2 140 Assista AgoraSe Bette Davis tem sua Jezebel, Joan Crawford tem sua Mildred Pierce. Uma atuação gigantesca que rendeu o Oscar de melhor atriz a Joan. Um ponto fora da curva na carreira da atriz, ela que sempre fez a durona, aqui faz uma mãe boazinha e dedicada que enche os olhos de lágrimas a cada 5 minutos. E mesmo assim, é possível ver a leoa que Joan trazia dentro de si.
O diretor Michael Curtiz - daquele que talvez seja o maior romance da Hollywood clássica: Casablanca - mescla muito bem o drama com o noir, conduzindo seu melodrama com elementos típicos do gênero policial (como a fotografia em preto e branco) ainda que seu escopo novelesco seja o fio condutor da narrativa: Joan é Mildred, uma mulher abandonada pelo marido que se desdobra de trabalhar para dar conforto à filha Veda, patricinha mimada que quer viver do bom e do melhor.
Assim como em Crepúsculo dos Deuses, lançado 5 anos depois, um assassinato abre a história. Mildred é levada à delegacia para depor e, embora não seja reconhecida como a principal suspeita, atribui a si a autoria do crime. Passamos a acompanhar então, a partir de flashbacks narrados por ela, a história de sua vida, conhecendo aqueles em sua volta, seus amores, suas amigas e suas filhas.
Neste drama de ares novelescos, Curtiz tira do noir os diálogos afiados e as atuações fortes (a cena da escadaria entre Mildred e Veda é espetacular) e costura essa teia de mistério finalizando de maneira satisfatória, mostrando que o que realmente importa em Alma em Suplício são suas personagens, todos muito bem desenvolvidos, dos homens (difícil saber qual presta menos) às mulheres, principalmente Mildred, da qual Joan Crawford tira mais do que o necessário e prova porque foi uma das grandes atrizes do cinema.
Sonic: O Filme
3.4 712 Assista AgoraInspirado no personagem criado pela Sega em 1991, Sonic: O Filme traz o ouriço alienígena - tal qual Superman, ele veio do espaço - vivendo em Green Hill - numa clara referência à primeira fase de seu jogo - de onde o xerife Tom (James Marsden) está prestes a se mudar com sua esposa Maddie (Tika Sumpter). Sozinho e sem ninguém para chamar de amigo, Sonic causa um blecaute na cidade com seus poderes supersônicos e chama a atenção do Doutor Robotnik (Jim Carrey de volta aos velhos tempos fazendo suas caras e bocas), um cientista maluco contratado pelo governo para apurar o apagão. Robotnik passa a perseguir Sonic a fim de capturá-lo e usá-lo como fonte de energia para seu arsenal tecnológico.
Enquanto outras adaptações de games não se adaptavam bem ao formato cinematográfico, o roteiro escrito a 5 mãos (!) faz bom uso dos elementos clássicos do jogo de forma que eles tenham uso funcional na narrativa. Os anéis dourados são como portais que levam Sonic para onde ele quiser, o visual clássico do Dr. Robotnik de bigode espalhafatoso e físico rechonchudo não foi aplicado em Jim Carrey, como visto no trailer, mas aguarde até a primeira cena pós-crédito que valerá à pena - a segunda vale ainda mais -, enquanto o visual do Sonic traz as luvinhas brancas e seu sapatinho vermelho, ou seja, sua identidade visual foi preservada.
No meio desse filme família que remete a Meu Amigo Dragão (2016) - ou até E.T. (1982) se você quiser ir mais longe -, o diretor Jeff Fowler se permite fazer algumas piadinhas politicamente incorretas - como a da criança presa na bolsa - e até dá indícios de uma relação homo-afetiva entre Robotnik e seu ajudante Stone (Lee Majdoub) sem ridicularizá-los, a brincadeira aparece também nas cenas de ação, onde é aproveitada a ultravelocidade de Sonic para deixar tudo em câmera lenta e o ouriço se deleitar durante uma briga de bar - sabe aquela cena do Mercúrio em X-Men? Nesse estilo - até mesmo referências cinematográficas aparecem aqui e ali - Sonic adora Velocidade Máxima - e o resultado acaba sendo uma sessão prazerosa onde o principal combustível está no carisma do protagonista e no ritmo acelerado que nunca cansa o espectador.
O Preço da Verdade
3.9 209 Assista AgoraEsse é o terceiro longa consecutivo de Todd Haynes em que ele não assina o roteiro, e é provavelmente o que menos tem sua cara. Isso é um demérito, já que o diretor sempre traz consigo uma assinatura bastante particular de quem conhece parte de sua filmografia - Carol, Não Estou Lá e Velvet Goldmine estão aí pra provar. Aqui, uma narrativa clássica permanece, Haynes praticamente some nessas "dark waters", o que por um lado é ruim e até desapontador, parece que qualquer um poderia ter feito, mas não deixa de ser um thriller investigativo com um tema relevante e dignamente apresentado.
O sugestivo título original "Dark Waters" emprega, sozinho, uma aura de terror ao longa. O próprio Haynes se encarrega de filmar galhos secos de árvores, campos destruídos e animais mortos arquitetando esse clima pesado em torno de seu argumento. Já o título nacional - O Preço da Verdade - se apega muito mais aos esforços do advogado Robert Billott, vivido por Mark Ruffalo, personagem tão esforçado quanto o jornalista que ele interpreta em Spotlight, onde ele também lutava para denunciar uma grande corporação, lá a Igreja Católica, aqui a DuPont, empresa química que poluiu as águas de West Virginia fazendo um número incontável de vítimas, de pessoas a animais, afetando também o solo e todo um bioma.
Billott é contratado por um pequeno fazendeiro para lutar por justiça. Diante do cenário desolador que encontra na propriedade do homem, Billott aceita ajudá-lo, sabendo que não será fácil lutar contra a DuPont. A fotografia densa de Edward Lachman emula toda essa sensação de pequenez daquelas pessoas diante de um inimigo tão poderoso. Em certa cena do longa, o personagem do incrível Tim Robbins - que bom vê-lo atuando de novo e em ótimo nível - diz que até mesmo o governo dos Estados Unidos precisa da empresa. É uma luta contra um inimigo impossível de ser vencido, a linha do tempo vai avançando anos a fio - e Haynes coloca a passagem dos anos literalmente na tela para elucidar essa batalha sem fim - ao final, sabemos que todos perdemos e que os valores simbólicos pagos pela empresa não comprarão nada de volta.
Jojo Rabbit
4.2 1,6K Assista AgoraVejo ótimas intenções em Taika Waititi ao mostrar o nazismo a partir dos olhos de uma criança, o jovem Jojo (Roman Griffin Davis, excelente), porém, isso funciona até a segunda página, ou melhor, até o fim da sequência de abertura com jovens em êxtase.
O mundo de faz-de-conta criado por Taika é inofensivo e refém de suas próprias traquinagens: as sequentes esquetes a la Trapalhões e Zorra Total (na fase ruim) com uma péssima Rebel Wilson ou com a dupla de capitães gays (Sam Rockwell e Alfie Allen) tornam o filme um draminha água com açúcar que me fez lembrar até Green Book no sentido de que não fede nem cheira, é só fofinho, como um coelhinho branco mastigando sua cenoura sem reagir a nada.
Um dos maiores trunfos das sátiras é mostrar como aquele elemento que está sendo ridicularizado realmente existe/existiu e é/foi perigoso. E isso só acontece em Jojo Rabbit em uma cena isolada e gratuita, quase tudo é banal, o longa tem um sério problema com situações que acontecem por mero acaso e conveniência de roteiro, como Yorki (Archie Yates), amiguinho de Jojo, que vai e vem apenas pra nos fazer rir e falar "oh que fofo" ou no quinteto nazista que invade a casa de Jojo e são apenas... idiotas.
Pelo menos Scarlett Johansson, em toda sua graciosidade, é a personagem adulta que realmente parece viver naquele mundo afetado pelo nazismo e pela 2ª Guerra. Assim como a "inquilina" vivida por Thomasin McKenzie, outra que sempre surge de maneira gratificante para dar um tapa de realidade no nazistinha Jojo. É pena que com os demais personagens Taika se limite ao pastiche do que Charles Chaplin e Alexandr Sokurov já fizeram. Falta acidez e inteligência no discurso.
Assistindo ao filme me peguei lembrando de Triunfo da Vontade, de Leni Riefenstahl, um documentário de propaganda nazista no qual Hitler aparece sendo saudado por soldados, crianças e mulheres. E essa inflamação da época nunca é vista aqui, Taika guia seu filme pelo lúdico sem qualquer outro propósito. Ao final, a mensagem de Jojo Rabbit é tão boba quanto pintar nazista de gay (sério?), Hitler de um bobalhão imaginário e judeus de monstros que leem mentes. O humor de Taika, definitivamente, não é pra mim.
Taylor Swift: Miss Americana
4.0 215 Assista AgoraÉ praticamente um coming of age em formato documental. Acompanhamos a cantora Taylor Swift desde os primeiros anos de sua pré-adolescência até seus atuais 30 anos e como ela foi moldada durante todo esse tempo para se tornar uma superstar que sentia a necessidade de ser considerada boa. A ela era negado o direito de ser alguém com personalidade além palco, apenas ser a artista que cantava e vendia, como se fosse uma máquina.
A diretora Lana Wilson não foge de uma linguagem cinematográfica convencional, cabendo à equipe de montagem dar dinâmica à narrativa. A condução da história é moldada pelas transições entre shows, vídeos caseiros e gravações em estúdios. Aqui, Swift se despe daquela personagem outrora criada e nos convida para sentar confortavelmente no sofá da sala - afinal, o filme está na Netflix - e ouvi-la nos confessar alguns de seus sentimentos, segredos e angústias.
Há registro bem lamentáveis, como quando ela é confrontada pelo rapper Kanye West durante o VMA, em 2009, após ganhar um prêmio que, para ele, deveria ter ido para Beyoncé. A frustração da jovem cantora, à época com apenas 19 anos, enquanto Kanye tinha 32, é de partir o coração, justamente por ser uma atitude grosseira, machista e agressiva de alguém que ela provavelmente admirava de alguma forma.
Todo o backlash gerado pela situação, intimidade e relacionamentos expostos, a exigência das gravadoras para produzir mais e cada vez melhor e toda a luta para se manter dentro dos padrões estéticos impostos pela sociedade foram minando a artista e a pessoa que, em certo momento de sua vida, após ganhar e faturar tanto, notou que não tinha alguém íntimo o bastante para ligar e comemorar suas conquistas.
A virada em sua carreira, e consequentemente em sua vida, é fantástica, seu novo posicionamento - principalmente na esfera política - devolvem a Swift o papel de miss que ela sempre teve, só que, dessa vez, ela é quem comanda as rédeas da situação, muito mais segura de si mesma. Quem dera se todo artista tivesse a mesma consciência do poder que tem em mãos para influenciar e politizar e não apenas ser visto como uma pessoa perfeita. Afinal, quem é? Palmas para Taylor Swift.
Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa
3.4 1,4KParece que a Warner/DC aprendeu com os próprios erros e também com os acertos dos outros. Desde o início de Aves de Rapina, fica nítida a influência de Deadpool, principalmente na narrativa, repleta de tiradinhas e quebras de quarta parede. A narração em off de Arlequina (Margot Robbie) chega a ser irritante em alguns momentos, já que acompanhamos toda a história a partir de sua perspectiva, mas diverte na mesma medida. Dessa forma, o longa de Cathy Yan passa boa parte dependendo de exibir as loucuras cometidas por Harley, agora livre do Coringa. Se a princípio essa emancipação é vista por ela como um grito de liberdade, logo ela se vê tendo que se virar sozinha numa Gotham City cheia de bandidos e vilões.
Sem descontinuar Esquadrão Suicida e salvando a única coisa que funcionava lá, o protagonismo dado a Harley emprega duas coisas à história: irritante como só, ela mexe não só na montagem do filme - montando e desmontando o 1º ato - como também em sua estética que se assume kitsch em diversos momentos e, embora seja um filme intitulado "Aves de Rapina", a história trata muito mais da "sua Emancipação Fantabulosa", do subtítulo.
Ao som de uma trilha sonora composta por vozes femininas, aos poucos, a emancipação da Arlequina se estende às demais personagens, que surgem sempre desacreditadas, seja na esfera familiar (no caso da Caçadora de Mary Elizabeth Winstead) ou na profissional (no caso da detetive Montoya de Rosie Perez). Dentre elas, Dinah Lance (a Canário Negro de Jurnee Smollett-Bell) é a que mais rouba a cena, tanto por suas cenas de luta bem coreografadas quanto por se encaixar bem no termo super-heroína.
O filme só escorrega ao inserir a Caçadora no grupo, ela é bem deslocada das demais - e não apenas por seu jeitão de durona que não curte piadinhas - e ao concluir o arco do vilão Máscara Negra (Ewan McGregor), lhe dando um final bem anti-climático, mas talvez, tal qual em Batman Begins, e lhes peço permissão para supor, os planos para o futuro das Aves de Rapina sejam ainda maiores. É como a própria Montoya diz: mais vilões irão atrás delas. Nos resta esperar pra ver.
The Cave
3.9 48Pra uma história tão pesada que documenta a triste realidade de feridos da guerra civil da Síria que são levados a um hospital subterrâneo na província de Ghouta faltou a Feras Fayyad se fruir da situação desesperadora e fluir por uma perspectiva mais impactante da situação. A câmera de Fayyad - que já havia sido indicado a melhor documentário no Oscar por Last Men in Aleppo - está tão próxima e ao mesmo tempo parece tão distante - me passa uma sensação de voyeurismo.
Em uma sequência de The Cave, a médica Amani Ballour fala com uma criança e pergunta a ela qual o sentido da vida, a criança não sabe responder. "Para sermos pessoas importantes.", diz a médica. Em outra passagem, uma médica comenta que ver as crianças rindo em meio a tanta tragédia lhe dava esperança. Apesar desses dois emocionantes registros, falta a The Cave fortalecer esse aspecto das crianças que trazem, ao mesmo tempo, a esperança contida em um sorriso e a tristeza por sequer saberem dizer porque estão vivas já que vivem cercadas de tanta morte.
O filme nos cativa muito mais pela rotina do hospital e daquelas pessoas - algo bem trivial mesmo - do que pela ameaça que vem lá de cima. O medo é quase secundário - talvez seja um sacrilégio falar isso já que não estou lá para sentir aquilo na pele -, e é até gratificante que Fayyad valorize aquelas pessoas ao invés de explorar as mazelas da guerra, que de alguma forma acabam chegando lá, ainda assim, falta se aprofundar mais na vida delas e em alguns temas que chega a pincelar, como o machismo e a religião. Nem de longe me impactou como For Sama, esse sim, transita com muito mais intensidade entre o íntimo de suas pessoas e na destruição causada pela guerra sem precisar de uma trilha intrusiva como a daqui.