O ponto de unanimidade nessa série é a trilha sonora maravilhosa:
1. Acabou Chorare - Novos Baianos 2. After Life - Arcade Fire 3. Amor Perfeito - Roberto Carlos 4. O Bobo - Cícero 5. Cama e Mesa - Roberto Carlos 6. Chão de Giz - Zé Ramalho 7. A Cidade - Chico Science & Nação Zumbi 8. Crua - Otto 9. Dona da Minha Cabeça - Geraldo Azevedo 10. Gente Aberta - Erasmo Carlos 11. Hallelujah - Rufus Wainwright 12. Hoje, Amanhã e Depois - Nação Zumbi 13. Meu Esquema - Mundo Livre S/A 14. O Que Será (A Flor da Pele) - Milton Nascimento & Chico Buarque 15. Pedaço de Mim - Zizi Possi & Chico Buarque 16. Pense em Mim - Johnny Hooker & Eduardo Queiroz 17. Revelação - Fagner 18. Risoflora - Elba Ramalho 19. Último Romance - Los Hermanos 20. Vamos Fugir - Gilberto Gil 21. Você Ainda Pensa? - Johnny Hooker
Com menos de 10 minutos, somos apresentados a versão teen do pitboy de condomínio. Entre aulas de judô e brigas despropositadas, o fascínio de Rogério pelos ~jogos violentos~ surge como a cereja do bolo na construção do primeiro personagem detestável da série. Ladainha de tiozão.
2) SÉRGIO INSTRUTOR DE TIRO
No segundo episódio, Cibele, que havia comprado (por impulso) uma arma de seu vizinho miliciano para "proteger" a sua família, surge praticando tiros junto a Sérgio enquanto ele sussurra palavras de motivação e "tira uma casquinha" da pobre mãe desamparada. Sexualização péssima.
3) AMÂNCIO DAS CASAS BAHIA
Chegando ao tragicômico terceiro episódio, é possível identificar o interesse de Amâncio, o bundão, em Mila, a vulnerável, mas fascinante mesmo é a percepção de que um vendedor das Casas Bahia tem passe livre no trabalho e consegue manter a sua família num condomínio na Barra.
4) TIRO ACIDENTAL
Mas como o dramalhão não pode parar, que tal o teen que sofre bullying furtar a arma da mãe, pra ameaçar o bullynador, enquanto o seu pai inicia um caso extraconjugal com a genitora do valentão? O tiro acidental acabou sendo igualmente previsível e constrangedor. Uma salada só.
5) CASOS DE FAMÍLIA
A essa altura, comecei a achar que a aceitação da série e a chuva de elogios tivesse calcada em seu caráter satírico. A cena da "audiência de conciliação" entre as famílias, orquestrada pelo vizinho miliciano, só poderia ser uma espécie de piada velada.. Impossível levar a sério.
6) ESPELHO ÍNTIMO
Pausa dramática para a cena do "encontro com o feminino" que dispensa maiores comentários. Estética de gosto, no mínimo, duvidosíssimo. Coitada da Mila.
7) COBRANÇA PÓS TRAIÇÃO/ESTUPRO
Superada a cena final do episódio 4, em que a direção opta por apelar ao invés de transmitir uma sugestão mais inteligente, chegamos a um dos piores diálogos da trama. A postura patética de Amâncio é tão pouco crível que a aversão pelo personagem se volta contra a obra. Tosco!
8) XIXI NA PIZZA
Nesse momento aqui eu me contorci de tanta vergonha alheia que também aproveitei pra tirar a água do joelho. Era o melhor a se fazer.
9) RIVAIS NO COUNTER-STRIKE
Instantes depois, chegamos ao tão sonhado encontro de titãs entre Marcinho e Rogério. Como criatividade é o que não falta em tela, que tal uma partidinha de algum jogo de tiro enquanto as mães de família buscam uma conciliação pra lá de forçada? Patético do patético.
10) TATUAGEM DE BANDIDO
Nesse frame aqui eu só registro em ata a minha boladeza. Estigmatização de tatuagem em julho de 2023? Faça-me o favor...
11) PRIMEIRO BASEADO
Confesso que no episódio 6, exatamente na metade da série, o ritmo melhora e a familiarização com a infinidade de subtramas nos leva a focar no desenvolvimento dos atos, mas essa cena do primeiro baseado... Minha nossa senhora... O que foi que esse menino fumou?
12) FLAGRA NA VARANDA
Já essa cena aqui, que embora tenha funcionado como um dos gatilhos mais eficazes de toda a temporada, é projetada de uma maneira tão caricata que acaba contaminando todo o restante do episódio com aquela clássica sensação de "ah, não me diga, Wando". No limite do óbvio.
13) CACHORRO VAMPIRO
Confesso que o Lulu da Pomerânia tomando suco de groselha causou uma vergonha boa. Uma coisa meio tarantinesca. Ri genuinamente.
14) CACHORRO NO VENTILADOR
E mal sabia ele que o feitiço iria virar contra o feiticeiro...
15) DELEGADO RENDIDO
Nos instantes finais do 8º episódio, ainda restou tempo para nos deliciarmos com um adolescente desarmando um delegado de polícia, dentro de uma unidade repleta de agentes, sem que um mísero disparo fosse efetuado. Fiquemos com a esperança de que a vida realmente imite a arte...
16) MC MARCINHO
Confesso que não sei se cochilei em algum momento, mas quando Marcinho surgiu, absolutamente do nada, trajado de "MC Vergonha Alheia" e prontinho pra arrebentar no ~baile barrense~ com seu batom vermelho, eu perdi de vez as esperanças. Qualquer coisa poderia acontecer.
17) GLORY HOLE
No antepenúltimo episódio, o clímax do constrangimento ficou por conta de um "glory hole" de dedos, na vez de Cibele se reconectar com a sua feminilidade. Mais um momento bastante exótico.
18) BOLSA DE MILHÕES
Na reta final, Rogério se revelou o adolescente menos curioso da história da humanidade e acabou, de uma vez por todas, com o resquício de paciência deste espectador.
19) ASSALTO EMO
Mas ainda haveria tempo pra que integrantes da banda Simple Plan roubassem algo em torno de quarenta mil reais de Lorraine e Marcinho (que estavam armados) numa passarela do subúrbio carioca.
20) O MILAGRE
Por fim, o GRANDE PLOT, mastigado até o último milésimo de segundo, cuspido pra prender o grande público em mais alguns meses de espera até o lançamento da segunda temporada. Suco da preguiça.
Com todo respeito, quem gostou dessa série deve ter parado de prestar atenção nela enquanto ia sendo consumido pelos mais profundos sentimentos de tristeza e inconformismo nutridos pela própria magnitude da tragédia em si.
Porque eu não sei o que foi pior...
O gauchês extremamente forçado, caminhando na linha tênue do "insuportável" com o "vergonha alheia"?
Os defeitos especiais à lá "Linha Direta"?
A evolução do roteiro que divide a obra esdruxulamente em "noite da tragédia" vs "tribunais infrutíferos", sem entregar mais nada?
A péssima tentativa de humanização de determinados personagens, sem que fôssemos suficientemente inseridos na vida pessoal de cada um deles?
Alguns diálogos mais rasos que uma poça de xixi?
O clamor por "justiça" empacotado por sentimentos clichês de apelo social e vingança jurídica?
As falsas simetrias e informações incongruentes sobre uma infinidade de contextos técnicos?
Muito vem sendo falado sobre a sensibilidade dessa série, da sua qualidade acima da média em inúmeros aspectos, da potência dos personagens, do plano sequência inacreditável do penúltimo episódio, dos inúmeros abraços que os diálogos são capazes de nos dar, mas eu confesso que demorei horas tentando aceitar que o ator protagonista não se tratava de Rob Schneider, do filme ANIMAL (2001). Isso pode ter prejudicado a minha experiência.
Difícil não se incomodar com a multietnicidade alegórica dessa temporada. Um falatório danado sem ninguém entender nada. Inimigos do silêncio em cena. Trilha sonora cansada e extremamente incongruente. Elementos de efeitos especiais meio feiosos. Referências excessivas à "Dark". Evolução do roteiro muito lenta. Atuações dramáticas pouco convincentes. Soluções preguiçosas. Plot, do plot, do plot, apenas pelo plot. Sei lá, achei bem mais ou menos do início ao fim. Sem contar no chatíssimo medo constante de deixar passar algum "sinal"... Série mequetrefe!
Po, a rapaziada é muito resistente com produção nacional, né?! Geral criticando um besteirol gostosinho desses, cheio de reviravoltas forçadas, que faz uma salada com várias pautas relevantes, recriando o galã das 8 em psicopata excêntrico, dando aquela aceleradinha boa no peito... Chatos!
Segui inquieto e apreensivo em diversos momentos nessa segunda trama. Creio que a violência real enfrentada pela Klara Castanho potencializou ainda mais o peso dos episódios sob os meus olhos. A violência escondida nas feições que gritam por socorro desde o inicio são um show à parte.
Se a personagem da Verônica fosse um pouco mais sensata e ponderada, o roteiro teria menos furos. Também senti falta do sadismo da primeira temporada, mas entendo a dificuldade de seguir a linha e criar novas pontes neste sentido. A verdade é que só os mama-rola de gringo não se divertiram com a série.
Agora é esperar para ver o que vem por aí com a terceira temporada...
Muito respeito pela trajetória de vida do Casagrande e tal, me comovi em alguns momentos, mas que puta documentário fraco! Roteiro preguiçoso demais, evolução completamente apressada, depoimentos pouco profundos, fora as "animações" feiosas. Fiquei bastante insatisfeito. De bom, curti os bastidores da passagem pelo Ascoli, além das pinceladas pela "Democracia Corinthiano". De resto, achei o resultado muito basicão.
Um dos motivos pelos quais o cagador de regra que vos fala optou pela graduação em Direito, no longínquo ano de 2012, mesmo ano da tragédia que envolveu a família Matsunaga, foi justamente a análise desses casos criminais comprometidos pelo nosso “jornalismo investigativo”.
Lembro que durante algum daqueles testes vocacionais mequetrefes do ensino médio, um episódio do saudoso “Linha Direta” serviu de pano de fundo para que noções iniciais de Direito Penal me fossem apresentadas e me despertassem para um possível envolvimento profissional neste universo.
Até hoje eu tenho sérias dificuldades de compreender aquele sujeito que presta vestibular para Direito, ingressa a uma boa universidade e tem a pachorra de dizer que não gosta de Penal. Acho que isso deve representar algum tipo de desvio de caráter, mas não estou aqui para atacar os meus colegas amantes de burocracia e apaixonados pela indústria do dano moral.
Fato é que essa curiosidade em torno do que choca e o interesse pelas profundezas da mente humana, acaba transformando as angústias e os conflitos do processo penal em uma ferramenta extremamente sedutora quando o assunto é o engajamento popular em torno de um crime midiático.
Eu nutro até um certo apreço pelo imbecis que, mesmo leigos, discutem a eficácia de medicamentos, se recusam a tomar vacinas testadas ou questionam o formato do mundo. O criminalista sempre precisou conviver com esse tipo de “opinião”. Gera um certo alívio ver mais gente sentindo na pele como é difícil passar anos desenvolvendo construções teóricas, embasamentos técnicos, até surgir um abutre qualquer e colocar tudo por terra.
O próprio catálogo de filmes, séries, e documentários que buscam revisitar os crimes mais chocantes do nosso passado recente, são a prova viva de que a espetacularização do papel de juízes, promotores, delegados e até mesmo advogados, é uma rica e eficaz fonte de entretenimento.
Isso já virou até gênero: o true crime.
Ora, se temos um true crime onde a ré confessa transformou o seu então marido bilionário em strogonoff, por quê não percorrermos o seu passado maltratado e colocarmos uma sonoplastia de filme de suspense para tentar desmistificar as nuances por trás dos fatos?
Melhor… E se pegarmos um bando de machos obsoletos que tiveram um papel decisivo naquele processo e ensaiarmos algumas discussões acerca da manutenção do poder primário e da predominância de homens em funções de controle e privilégio?
Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime estreou na Netflix com a fórmula perfeita para chocar novamente, refrescar a curiosidade das pessoas e tentar desmontar alguns estereótipos criados em torno de um julgamento que entrou no imaginário do público a ponto de fazer com que quase todo mundo se interessasse pela obra.
De um modo geral, eu tendo a desaprovar situações em que pessoas são alçadas a uma condição de acuamento, independente do delito cometido ou da acusação a ser questionada. A minha empatia pela Elize parte antes mesmo do documentário se iniciar, o que me fez detestar o formato “embelezador” de como a filmagem foi produzida.
Entre as péssimas alternâncias cronológicas e as entrevistas desconfortáveis, a diretora Eliza Capai trabalha para montar uma protagonista frágil, machucada, de origem humilde e heranças traumáticas, que em um momento de destempero e abuso psicológico teria cometido um dos crimes de maior repercussão no Brasil. Reinicia-se o conflito de ação vs reação no caso.
O problema é que a produção não se mostra nem um pouco interessada em trazer elementos novos, criar dúvidas sobre momentos determinantes da tragédia ou fazer o que o true crime faz de melhor: criar uma tensão na sua narrativa transcendente aos fatos.
O que o documentário tem de mais interessante, provavelmente a matéria que o Fantástico exibiu em 2012 também teve. A propósito, a sétima temporada da série “Investigação Criminal” traz um episódio de 45 minutos sobre o caso que faz o mesmo serviço.
Sob o grande álibi da entrevista inédita, tendo em vista que Elize Matsunaga jamais se pronunciou publicamente sobre os fatos, a obra finge tentar compreender as motivações por trás do crime, mas acaba criando uma caricatura da personagem pela qual havia uma tentativa de humanização. As próprias inserções da Elize contribuem para um efeito narrativo sensacionalista ao sugerir elementos ocultos e segredos inconfessáveis dignos de novela.
Reconheço que não há como ser indiferente ao que Elize Matsunaga: Era Uma Vez um Crime exibe em seus quatro episódios de cinquenta minutos. A história é montada com diversas imagens da cobertura jornalística do caso, bem como registros do acervo pessoal do casal e uma série de depoimentos.
Acontece que essa coletânea de faíscas do crime, por si só, não me fizeram ter um pingo de tesão ao final de cada episódio. Tudo parecia um grande programa do Datena ao contrário.
Se o objetivo da Elize era mesmo deixar um material comovente e relevante para a reconstrução dos seus laços com a filha fadada a arcar para sempre com uma história tão macabra, lamento dizer que não rolou.
Se o objetivo da diretora era mesmo trazer um lado humano da sua protagonista, reforçar dúvidas sobre as motivações para o crime e criar compensações entre patriarcado e esquartejamento, lamento dizer que não rolou.
Se o objetivo do delegado, do promotor e dos demais depoentes homens, era mesmo consolidar a historinha de que a puta oportunista premeditou toda a barbárie para meter a mão na grana, lamento dizer que não rolou.
Para mim, quase nada rolou.
Confira essa e outras críticas minhas via @metafictions_
Seja lá qual for a atividade ilícita, o crime organizado tende a manter uma metodologia de centralização das principais decisões, de ramificação nas cadeias de comando e divisão hierárquica capaz de montar um quadro social que dê estrutura paras as ações, muitas vezes sustentadas pela captação de agentes públicos. A corrupção é praticamente a alma do negócio.
Na nova série Globoplay intitulada Doutor Castor, dirigida por Marco Antonio Araujo, conhecemos alguns detalhes interessantes sobre a vida de um senhor estudado, aliás, meu colega de Faculdade Nacional de Direito, que entendeu perfeitamente como seguir essas fórmulas até se tornar virtualmente inalcançável através do “inofensivo” Jogo do Bicho.
Simpatize você ou não, Castor Gonçalves de Andrade e Silva foi uma das figuras mais populares e carismáticas ao longo das décadas de setenta, oitenta e noventa num Rio de Janeiro desde sempre apaixonado por futebol e samba. Presidente de honra da Mocidade Independente de Padre Miguel e praticamente dono do Bangu Atlético Clube, o tal Dr. Castor gerenciava os seus negócios ao melhor estilo cover de poderoso chefão.
A série dividida em quatro episódios, mostra bem alguns bastidores deste período atrelado a um Bangu quase vitorioso que viveu o seu apogeu impulsionado pelo dinheiro e pela influência do seu homem forte, se tornando uma potência do futebol nacional.
No samba não foi diferente. Depois de se tornar um dos principais responsáveis pela criação da Liga Independente Das Escolas de Samba, o que colaborou imensamente para a profissionalização do carnaval carioca na década de oitenta, Castor de Andrade levou a Mocidade aos principais títulos da sua história, ganhando pompa de herói.
Através de imagens de arquivos e repleta de depoimentos de pessoas que conviveram de perto com o famoso contraventor, os quatro episódios de uma hora permeiam essa atmosfera de malandragem suburbana e institucionalização do crime organizado de uma maneira capaz de despertar o interesse do espectador. É o famoso “suco de carioquice”.
Entre relatos de atletas, ex-funcionários, advogados, juízes, jornalistas e amigos pessoais, a história narrada de ascensão e queda de um dos maiores bicheiros de todos os tempos, nos exibe uma figura excêntrica e capaz de transitar por todas as camadas da sociedade com uma habilidade inigualável.
Seja confabulando com seus capangas truculentos, flertando com a ditadura militar, almoçando com importantes dirigentes do futebol internacional ou erguido pelos braços da sua comunidade, o protagonismo das suas interações sociais parece trazer um ar de legitimidade às ações tomadas por Castor de Andrade, um ser praticamente intocável (ainda que discorde a Dra. Denise Frossard).
Ao contrário de Pablo Escobar ou Al Capone, a série induz que o bicheiro não era bem visto apenas na sua zona de atuação, no subúrbio do Rio de Janeiro, chegando a se relacionar muito bem com as famílias de presidentes da república e membros da elite da sociedade, tendo uma influência política clara e requisitada.
No fim das contas, a Globoplay reúne um material de qualidade que nos revela, entre o pão, o circo e o sangue, que Castor de Andrade foi um personagem controverso, carismático e multifacetado, se tornando um dos maiores símbolos para o seu clube, para a sua escola de samba e para o seu bairro.
Uma pena que a lógica operacional responsável por financiar isso tudo continue explodindo a cabeça de uns e outros até os dias de hoje.
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Talvez pelo fato de eu ter passado os últimos anos da minha vida entrando e saindo de delegacias entranhadas no ócio, sentindo na prática a lógica falaciosa do Direito Criminal, eu acabei nutrindo uma preguiça absurda pelo tal gênero “suspense policial” que o brasileiro tanto venera no audiovisual.
Para a minha sorte, a nova série da Netflix Brasil, Bom dia, Verônica, baseada na obra da criminóloga Ilana Casoy e do romancista Raphael Montes, vai muito além de indícios de materialidade, organogramas e luminol, alçando as personagens femininas, imersas numa lógica de opressão, a um protagonismo inédito no gênero.
A premissa do roteiro parte da atuação de sua protagonista Verônica (Tainá Müller) como escrivã da Polícia Civil de São Paulo que, ao presenciar um suicídio na angustiante cena de abertura, se vê obstinada a fazer justiça dando voz a mulheres vítimas de abusos físicos e psicológicos dentro de seus relacionamentos abusivos.
Essa primeira temporada se divide em oito episódios de quarenta e poucos minutos focados em percorrer os inúmeros métodos de violência contra a mulher. Como os abusos vão acontecendo de maneira assíncrona e em diferentes potencialidades, a direção consegue enfiar a caixa do pôster na nossa cabeça e só nos dá um buraquinho para que tentemos sobreviver com um pouco menos culpa.
A vida pretérita, o lamaçal que reveste as nossas instituições e os traumas familiares de Verônica constroem uma personalidade potente e dão o tom natural de justiceira que a protagonista precisa. As diferentes fases da jornada de uma personagem que sucumbe às suas próprias obsessões e impotências, ganham vida nos olhos de Tainá Müller a cada passada de lápis, a cada guerra.
Quando o principal arco paralelo vem à tona e o roteiro invade a masmorra de Janete (Camila Morgado) e Brandão (Eduardo Moscovis), a série muda de patamar. Du Moscovis encarna um Coronel da Polícia Militar aterrorizantemente desprezível sem precisar elevar o tom da sua voz. Camila Morgado, que é uma das minha atrizes brasileiras favoritas desde “Olga”, tem mais um desempenho sensacional. Eu sentia um soco a cada sorriso forçado esboçado.
Eu, como homem, no curso de um constante processo de desintoxicação das minhas amarras machistas, fiquei completamente incomodado nos momentos de carta branca que precediam os surtos de Brandão. A série é espetacular ao escancarar esses diferentes loops dentro de um relacionamento no qual a submissão ultrapassa a própria existência. Janete simplesmente deixou de existir graças ao marido. A volatilidade do sentimento de culpa só destroçava mais ainda.
Ainda que Verônica e Janete sejam inseridas como fios separados no roteiro, o laço acaba sendo natural e convincente, o que só facilita a vida dos adeptos a maratona de episódios. A tensão visual é presente do início ao fim, mesmo com uma evolução acelerada e uma série de eventos chocantes, o que faz por agregar valor a obra.
Embora a produção tenha se esforçado horrores para não caricaturizar uma temática tão sensível no 5º país da lista mundial de feminicídios, alguns elementos do Terror podem ser digeridos mais lentamente por quem tem repulsa pelo gênero. Contudo, é inegável que o choque, o desespero e a ansiedade encaixaram muito bem nas metáforas transportadas.
Não estou exatamente convencido sobre a relevância das relações espirituais de Brandão com a proposta de reflexão trazida pela série. Pintar o macho agressor de maluco, psicopata, serial killer e fã de magia negra pode distanciar um espectador mais desatento do caráter expositivo da série. Há que se entender como uma obra de advertência e não como ficção. Parece óbvio, mas é sempre bom frisar.
De qualquer forma, Bom dia, Verônica é uma série que satisfaz, tanto como suspense policial, terror psicológico ou pedido de socorro. A trilha sonora é excelente, a frequência cardíaca é alta, o trio principal é do caralho e as reflexões são dignas de horas e horas de psicanálise. Se algum gatilho tiver te pegado desprevenida, não hesite em procurar ajuda.
Assistam, passarinhos. E saiam da caixa.
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Antes de mais nada, eu me sinto na obrigação de confessar que o tesão por zumbis nunca foi um fetiche que me fisgou. No auge do meu ócio, eu segui incapaz de dar play em obras como “Walking Dead”, “Resident Evil” ou “Zumbilândia”, então a análise nada técnica deste lançamento vai ser feita com doses ainda mais cavalares de cagação de regra e antipatia.
Pois bem. A ligeiríssima primeira temporada de Betaal, série indiana de terror original Netflix, busca construir algumas pontes entre as crenças de seus povos e um cenário histórico de independência, contextualizando as suas desigualdades ainda latentes por meio de uma abordagem com críticas sociais implícitas.
Numa pequena aldeia localizada ao lado da Montanha Betaal, a população nativa supostamente garante a manutenção de uma divindade perigosa enclausurada em um túnel. Quando o governo ordena à Surya Construction que desenvolva uma via expressa nesta região, toda a problemática do roteiro está montada.
Ajay Mudhalvan (Jitendra Joshi), o empreiteiro ganancioso, contrata uma espécie de Bope indiano para fazer a limpa no local e, inexplicavelmente, leva a sua esposa e filha nesta missão. Os moradores tentam impedir a reabertura da passagem construída pelos britânicos durante a guerra, mas depois de um clássico banho de sangue, a antiga maldição acaba sendo invocada.
Descobre-se então que o antigo coronel inglês Lynedoch (Richard Dillane) e os seus soldados haviam sido enterrados vivos no túnel e agora estariam dispostos a reconquistar a Índia. É a partir deste momento que a equipe de elite contratada para evacuar o local passa a ter protagonismo na trama, encabeçados pela comandante Tyagi (Suchitra Pillai) e pelo seu subordinado Sirohi (Vineet Kiinumar), aquele clássico personagem de herói que precisa se redimir de seus pecados do passado.
Revestido da minha petulância ocidental, arrisco a dizer que todo o quadro histórico abordado até então serve como mero pretexto do roteiro para dar o aval que a direção precisa para imergir aos elementos mais bregas do terror, com direito a muito sangue espirrando, cabeça girando, faca no pescoço, fotografia quase toda no escuro e sustinhos barulhentos. É exatamente aí que o caldo entorna. A evolução da história me pareceu extremamente confusa e forçada, sem que fosse possível alcançar um suspense de zumbis, e que tampouco gerou a tensão necessária em detrimento das nuances de espiritualidade e possessão.
Ao que me consta, os zumbis geralmente são retratados como seres mortos-vivos, o que não deveria ter relação com aqueles soldados de infantaria possuídos pelo coronel endiabrado, funcionando como meros fantoches. Não vou nem gastar saliva com a composição terrível das criaturas. Uns canibais esquisitos com dentes de vampiro e olhos vermelhos brilhantes diretamente de quatro décadas atrás.
Assim como os encapetados, os outros personagens da série também são facilmente manipulados, não possuem profundidade e estão presentes apenas para vincular um conjunto básico de instruções sem qualquer tipo de peculiaridade nos diálogos.
A composição em quatro episódios não é o maior dos defeitos da série, mas torna inevitável o questionamento: “essa porra não poderia ter tido o formato de longa?”. Caso de fato haja uma segunda temporada, conforme o último episódio tenta sugerir, será interessante ver em que direção o roteiro seguirá e se conseguirá reverter o dano causado pela preguiça de seus idealizadores. Há algum potencial escondido nas questões mais folclóricas da trama.
Como mais vale um passarinho na mão do que dois voando, para evitar qualquer tragédia, eu deixaria Betaal presa dentro do túnel.
Acompanhe essa e outras críticas via @metafictions_
Não sei em que universo paralelo eu habitava para jamais ter ouvido falar nessa história de Wallace Souza e as consequências do programa manauara Canal Livre. Série Documental muito bem produzida que se desenvolve sob uma ótica relativista de algumas bizarrices fragmentadas.
Não consigo nutrir nenhuma empatia pelo "cidadão de bem" que arquiteta um programa higienista vendendo a falácia da crucificação do pseudo criminoso comum. Etiquetamento nu e cru que se potencializa com o espetáculo de horrores desses tempos sombrios. Feitiço contra o feiticeiro.
O que também não me leva a crer, em contrapartida, que a tal Força Tarefa tenha conseguido demonstrar aquele emaranhado de acusações fortuitas de maneira minimamente comprobatória. Uma bagunça só. Arbitrariedade para todos os lados. Cenário repleto de lobos em pele de cordeiro.
chove o tempo inteiro, não existe guarda-chuva na cidade, ninguém fica gripado, todo mundo tem o dente amarelo, ninguém joga lixo no chão a não ser papel de chocolate, floresta mal assombrada, portal de Nárnia na caverna, passado do pretérito do futuro imperfeito.
Justiça (1ª Temporada)
4.3 321O ponto de unanimidade nessa série é a trilha sonora maravilhosa:
1. Acabou Chorare - Novos Baianos
2. After Life - Arcade Fire
3. Amor Perfeito - Roberto Carlos
4. O Bobo - Cícero
5. Cama e Mesa - Roberto Carlos
6. Chão de Giz - Zé Ramalho
7. A Cidade - Chico Science & Nação Zumbi
8. Crua - Otto
9. Dona da Minha Cabeça - Geraldo Azevedo
10. Gente Aberta - Erasmo Carlos
11. Hallelujah - Rufus Wainwright
12. Hoje, Amanhã e Depois - Nação Zumbi
13. Meu Esquema - Mundo Livre S/A
14. O Que Será (A Flor da Pele) - Milton Nascimento & Chico Buarque
15. Pedaço de Mim - Zizi Possi & Chico Buarque
16. Pense em Mim - Johnny Hooker & Eduardo Queiroz
17. Revelação - Fagner
18. Risoflora - Elba Ramalho
19. Último Romance - Los Hermanos
20. Vamos Fugir - Gilberto Gil
21. Você Ainda Pensa? - Johnny Hooker
Os Outros (1ª Temporada)
4.0 256Com todo respeito a ~legião de fãs~ aqui presentes, separei os 20 momentos em que eu quase desmaiei de tanta vergonha alheia com a série "Os Outros".
Thread disponibilizada com os frames das cenas via @caioeshenriques no Twitter.
Alguém precisava te dizer a verdade! Contém spoilers:
1) MARCINHO GAMER
Com menos de 10 minutos, somos apresentados a versão teen do pitboy de condomínio. Entre aulas de judô e brigas despropositadas, o fascínio de Rogério pelos ~jogos violentos~ surge como a cereja do bolo na construção do primeiro personagem detestável da série. Ladainha de tiozão.
2) SÉRGIO INSTRUTOR DE TIRO
No segundo episódio, Cibele, que havia comprado (por impulso) uma arma de seu vizinho miliciano para "proteger" a sua família, surge praticando tiros junto a Sérgio enquanto ele sussurra palavras de motivação e "tira uma casquinha" da pobre mãe desamparada. Sexualização péssima.
3) AMÂNCIO DAS CASAS BAHIA
Chegando ao tragicômico terceiro episódio, é possível identificar o interesse de Amâncio, o bundão, em Mila, a vulnerável, mas fascinante mesmo é a percepção de que um vendedor das Casas Bahia tem passe livre no trabalho e consegue manter a sua família num condomínio na Barra.
4) TIRO ACIDENTAL
Mas como o dramalhão não pode parar, que tal o teen que sofre bullying furtar a arma da mãe, pra ameaçar o bullynador, enquanto o seu pai inicia um caso extraconjugal com a genitora do valentão? O tiro acidental acabou sendo igualmente previsível e constrangedor. Uma salada só.
5) CASOS DE FAMÍLIA
A essa altura, comecei a achar que a aceitação da série e a chuva de elogios tivesse calcada em seu caráter satírico. A cena da "audiência de conciliação" entre as famílias, orquestrada pelo vizinho miliciano, só poderia ser uma espécie de piada velada.. Impossível levar a sério.
6) ESPELHO ÍNTIMO
Pausa dramática para a cena do "encontro com o feminino" que dispensa maiores comentários. Estética de gosto, no mínimo, duvidosíssimo. Coitada da Mila.
7) COBRANÇA PÓS TRAIÇÃO/ESTUPRO
Superada a cena final do episódio 4, em que a direção opta por apelar ao invés de transmitir uma sugestão mais inteligente, chegamos a um dos piores diálogos da trama. A postura patética de Amâncio é tão pouco crível que a aversão pelo personagem se volta contra a obra. Tosco!
8) XIXI NA PIZZA
Nesse momento aqui eu me contorci de tanta vergonha alheia que também aproveitei pra tirar a água do joelho. Era o melhor a se fazer.
9) RIVAIS NO COUNTER-STRIKE
Instantes depois, chegamos ao tão sonhado encontro de titãs entre Marcinho e Rogério. Como criatividade é o que não falta em tela, que tal uma partidinha de algum jogo de tiro enquanto as mães de família buscam uma conciliação pra lá de forçada? Patético do patético.
10) TATUAGEM DE BANDIDO
Nesse frame aqui eu só registro em ata a minha boladeza. Estigmatização de tatuagem em julho de 2023? Faça-me o favor...
11) PRIMEIRO BASEADO
Confesso que no episódio 6, exatamente na metade da série, o ritmo melhora e a familiarização com a infinidade de subtramas nos leva a focar no desenvolvimento dos atos, mas essa cena do primeiro baseado... Minha nossa senhora... O que foi que esse menino fumou?
12) FLAGRA NA VARANDA
Já essa cena aqui, que embora tenha funcionado como um dos gatilhos mais eficazes de toda a temporada, é projetada de uma maneira tão caricata que acaba contaminando todo o restante do episódio com aquela clássica sensação de "ah, não me diga, Wando". No limite do óbvio.
13) CACHORRO VAMPIRO
Confesso que o Lulu da Pomerânia tomando suco de groselha causou uma vergonha boa. Uma coisa meio tarantinesca. Ri genuinamente.
14) CACHORRO NO VENTILADOR
E mal sabia ele que o feitiço iria virar contra o feiticeiro...
15) DELEGADO RENDIDO
Nos instantes finais do 8º episódio, ainda restou tempo para nos deliciarmos com um adolescente desarmando um delegado de polícia, dentro de uma unidade repleta de agentes, sem que um mísero disparo fosse efetuado. Fiquemos com a esperança de que a vida realmente imite a arte...
16) MC MARCINHO
Confesso que não sei se cochilei em algum momento, mas quando Marcinho surgiu, absolutamente do nada, trajado de "MC Vergonha Alheia" e prontinho pra arrebentar no ~baile barrense~ com seu batom vermelho, eu perdi de vez as esperanças. Qualquer coisa poderia acontecer.
17) GLORY HOLE
No antepenúltimo episódio, o clímax do constrangimento ficou por conta de um "glory hole" de dedos, na vez de Cibele se reconectar com a sua feminilidade. Mais um momento bastante exótico.
18) BOLSA DE MILHÕES
Na reta final, Rogério se revelou o adolescente menos curioso da história da humanidade e acabou, de uma vez por todas, com o resquício de paciência deste espectador.
19) ASSALTO EMO
Mas ainda haveria tempo pra que integrantes da banda Simple Plan roubassem algo em torno de quarenta mil reais de Lorraine e Marcinho (que estavam armados) numa passarela do subúrbio carioca.
20) O MILAGRE
Por fim, o GRANDE PLOT, mastigado até o último milésimo de segundo, cuspido pra prender o grande público em mais alguns meses de espera até o lançamento da segunda temporada. Suco da preguiça.
Concorda comigo?
Todo Dia a Mesma Noite
4.0 288 Assista AgoraCom todo respeito, quem gostou dessa série deve ter parado de prestar atenção nela enquanto ia sendo consumido pelos mais profundos sentimentos de tristeza e inconformismo nutridos pela própria magnitude da tragédia em si.
Porque eu não sei o que foi pior...
O gauchês extremamente forçado, caminhando na linha tênue do "insuportável" com o "vergonha alheia"?
Os defeitos especiais à lá "Linha Direta"?
A evolução do roteiro que divide a obra esdruxulamente em "noite da tragédia" vs "tribunais infrutíferos", sem entregar mais nada?
A péssima tentativa de humanização de determinados personagens, sem que fôssemos suficientemente inseridos na vida pessoal de cada um deles?
Alguns diálogos mais rasos que uma poça de xixi?
O clamor por "justiça" empacotado por sentimentos clichês de apelo social e vingança jurídica?
As falsas simetrias e informações incongruentes sobre uma infinidade de contextos técnicos?
Achei essa produção um lixo!
Meus mais profundos sentimentos às famílias...
O Urso (1ª Temporada)
4.3 411 Assista AgoraMuito vem sendo falado sobre a sensibilidade dessa série, da sua qualidade acima da média em inúmeros aspectos, da potência dos personagens, do plano sequência inacreditável do penúltimo episódio, dos inúmeros abraços que os diálogos são capazes de nos dar, mas eu confesso que demorei horas tentando aceitar que o ator protagonista não se tratava de Rob Schneider, do filme ANIMAL (2001). Isso pode ter prejudicado a minha experiência.
1899 (1ª Temporada)
3.6 394 Assista AgoraDifícil não se incomodar com a multietnicidade alegórica dessa temporada. Um falatório danado sem ninguém entender nada. Inimigos do silêncio em cena. Trilha sonora cansada e extremamente incongruente. Elementos de efeitos especiais meio feiosos. Referências excessivas à "Dark". Evolução do roteiro muito lenta. Atuações dramáticas pouco convincentes. Soluções preguiçosas. Plot, do plot, do plot, apenas pelo plot. Sei lá, achei bem mais ou menos do início ao fim. Sem contar no chatíssimo medo constante de deixar passar algum "sinal"... Série mequetrefe!
Bom Dia, Verônica (2ª Temporada)
3.8 258 Assista AgoraPo, a rapaziada é muito resistente com produção nacional, né?! Geral criticando um besteirol gostosinho desses, cheio de reviravoltas forçadas, que faz uma salada com várias pautas relevantes, recriando o galã das 8 em psicopata excêntrico, dando aquela aceleradinha boa no peito... Chatos!
Segui inquieto e apreensivo em diversos momentos nessa segunda trama. Creio que a violência real enfrentada pela Klara Castanho potencializou ainda mais o peso dos episódios sob os meus olhos. A violência escondida nas feições que gritam por socorro desde o inicio são um show à parte.
Se a personagem da Verônica fosse um pouco mais sensata e ponderada, o roteiro teria menos furos. Também senti falta do sadismo da primeira temporada, mas entendo a dificuldade de seguir a linha e criar novas pontes neste sentido. A verdade é que só os mama-rola de gringo não se divertiram com a série.
Agora é esperar para ver o que vem por aí com a terceira temporada...
Casão: Num Jogo Sem Regras
3.9 8Muito respeito pela trajetória de vida do Casagrande e tal, me comovi em alguns momentos, mas que puta documentário fraco! Roteiro preguiçoso demais, evolução completamente apressada, depoimentos pouco profundos, fora as "animações" feiosas. Fiquei bastante insatisfeito. De bom, curti os bastidores da passagem pelo Ascoli, além das pinceladas pela "Democracia Corinthiano". De resto, achei o resultado muito basicão.
Elize Matsunaga: Era Uma Vez um Crime
3.4 387Um dos motivos pelos quais o cagador de regra que vos fala optou pela graduação em Direito, no longínquo ano de 2012, mesmo ano da tragédia que envolveu a família Matsunaga, foi justamente a análise desses casos criminais comprometidos pelo nosso “jornalismo investigativo”.
Lembro que durante algum daqueles testes vocacionais mequetrefes do ensino médio, um episódio do saudoso “Linha Direta” serviu de pano de fundo para que noções iniciais de Direito Penal me fossem apresentadas e me despertassem para um possível envolvimento profissional neste universo.
Até hoje eu tenho sérias dificuldades de compreender aquele sujeito que presta vestibular para Direito, ingressa a uma boa universidade e tem a pachorra de dizer que não gosta de Penal. Acho que isso deve representar algum tipo de desvio de caráter, mas não estou aqui para atacar os meus colegas amantes de burocracia e apaixonados pela indústria do dano moral.
Fato é que essa curiosidade em torno do que choca e o interesse pelas profundezas da mente humana, acaba transformando as angústias e os conflitos do processo penal em uma ferramenta extremamente sedutora quando o assunto é o engajamento popular em torno de um crime midiático.
Eu nutro até um certo apreço pelo imbecis que, mesmo leigos, discutem a eficácia de medicamentos, se recusam a tomar vacinas testadas ou questionam o formato do mundo. O criminalista sempre precisou conviver com esse tipo de “opinião”. Gera um certo alívio ver mais gente sentindo na pele como é difícil passar anos desenvolvendo construções teóricas, embasamentos técnicos, até surgir um abutre qualquer e colocar tudo por terra.
O próprio catálogo de filmes, séries, e documentários que buscam revisitar os crimes mais chocantes do nosso passado recente, são a prova viva de que a espetacularização do papel de juízes, promotores, delegados e até mesmo advogados, é uma rica e eficaz fonte de entretenimento.
Isso já virou até gênero: o true crime.
Ora, se temos um true crime onde a ré confessa transformou o seu então marido bilionário em strogonoff, por quê não percorrermos o seu passado maltratado e colocarmos uma sonoplastia de filme de suspense para tentar desmistificar as nuances por trás dos fatos?
Melhor… E se pegarmos um bando de machos obsoletos que tiveram um papel decisivo naquele processo e ensaiarmos algumas discussões acerca da manutenção do poder primário e da predominância de homens em funções de controle e privilégio?
Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime estreou na Netflix com a fórmula perfeita para chocar novamente, refrescar a curiosidade das pessoas e tentar desmontar alguns estereótipos criados em torno de um julgamento que entrou no imaginário do público a ponto de fazer com que quase todo mundo se interessasse pela obra.
De um modo geral, eu tendo a desaprovar situações em que pessoas são alçadas a uma condição de acuamento, independente do delito cometido ou da acusação a ser questionada. A minha empatia pela Elize parte antes mesmo do documentário se iniciar, o que me fez detestar o formato “embelezador” de como a filmagem foi produzida.
Entre as péssimas alternâncias cronológicas e as entrevistas desconfortáveis, a diretora Eliza Capai trabalha para montar uma protagonista frágil, machucada, de origem humilde e heranças traumáticas, que em um momento de destempero e abuso psicológico teria cometido um dos crimes de maior repercussão no Brasil. Reinicia-se o conflito de ação vs reação no caso.
O problema é que a produção não se mostra nem um pouco interessada em trazer elementos novos, criar dúvidas sobre momentos determinantes da tragédia ou fazer o que o true crime faz de melhor: criar uma tensão na sua narrativa transcendente aos fatos.
O que o documentário tem de mais interessante, provavelmente a matéria que o Fantástico exibiu em 2012 também teve. A propósito, a sétima temporada da série “Investigação Criminal” traz um episódio de 45 minutos sobre o caso que faz o mesmo serviço.
Sob o grande álibi da entrevista inédita, tendo em vista que Elize Matsunaga jamais se pronunciou publicamente sobre os fatos, a obra finge tentar compreender as motivações por trás do crime, mas acaba criando uma caricatura da personagem pela qual havia uma tentativa de humanização. As próprias inserções da Elize contribuem para um efeito narrativo sensacionalista ao sugerir elementos ocultos e segredos inconfessáveis dignos de novela.
Reconheço que não há como ser indiferente ao que Elize Matsunaga: Era Uma Vez um Crime exibe em seus quatro episódios de cinquenta minutos. A história é montada com diversas imagens da cobertura jornalística do caso, bem como registros do acervo pessoal do casal e uma série de depoimentos.
Acontece que essa coletânea de faíscas do crime, por si só, não me fizeram ter um pingo de tesão ao final de cada episódio. Tudo parecia um grande programa do Datena ao contrário.
Se o objetivo da Elize era mesmo deixar um material comovente e relevante para a reconstrução dos seus laços com a filha fadada a arcar para sempre com uma história tão macabra, lamento dizer que não rolou.
Se o objetivo da diretora era mesmo trazer um lado humano da sua protagonista, reforçar dúvidas sobre as motivações para o crime e criar compensações entre patriarcado e esquartejamento, lamento dizer que não rolou.
Se o objetivo do delegado, do promotor e dos demais depoentes homens, era mesmo consolidar a historinha de que a puta oportunista premeditou toda a barbárie para meter a mão na grana, lamento dizer que não rolou.
Para mim, quase nada rolou.
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Doutor Castor
4.4 77Seja lá qual for a atividade ilícita, o crime organizado tende a manter uma metodologia de centralização das principais decisões, de ramificação nas cadeias de comando e divisão hierárquica capaz de montar um quadro social que dê estrutura paras as ações, muitas vezes sustentadas pela captação de agentes públicos. A corrupção é praticamente a alma do negócio.
Na nova série Globoplay intitulada Doutor Castor, dirigida por Marco Antonio Araujo, conhecemos alguns detalhes interessantes sobre a vida de um senhor estudado, aliás, meu colega de Faculdade Nacional de Direito, que entendeu perfeitamente como seguir essas fórmulas até se tornar virtualmente inalcançável através do “inofensivo” Jogo do Bicho.
Simpatize você ou não, Castor Gonçalves de Andrade e Silva foi uma das figuras mais populares e carismáticas ao longo das décadas de setenta, oitenta e noventa num Rio de Janeiro desde sempre apaixonado por futebol e samba. Presidente de honra da Mocidade Independente de Padre Miguel e praticamente dono do Bangu Atlético Clube, o tal Dr. Castor gerenciava os seus negócios ao melhor estilo cover de poderoso chefão.
A série dividida em quatro episódios, mostra bem alguns bastidores deste período atrelado a um Bangu quase vitorioso que viveu o seu apogeu impulsionado pelo dinheiro e pela influência do seu homem forte, se tornando uma potência do futebol nacional.
No samba não foi diferente. Depois de se tornar um dos principais responsáveis pela criação da Liga Independente Das Escolas de Samba, o que colaborou imensamente para a profissionalização do carnaval carioca na década de oitenta, Castor de Andrade levou a Mocidade aos principais títulos da sua história, ganhando pompa de herói.
Através de imagens de arquivos e repleta de depoimentos de pessoas que conviveram de perto com o famoso contraventor, os quatro episódios de uma hora permeiam essa atmosfera de malandragem suburbana e institucionalização do crime organizado de uma maneira capaz de despertar o interesse do espectador. É o famoso “suco de carioquice”.
Entre relatos de atletas, ex-funcionários, advogados, juízes, jornalistas e amigos pessoais, a história narrada de ascensão e queda de um dos maiores bicheiros de todos os tempos, nos exibe uma figura excêntrica e capaz de transitar por todas as camadas da sociedade com uma habilidade inigualável.
Seja confabulando com seus capangas truculentos, flertando com a ditadura militar, almoçando com importantes dirigentes do futebol internacional ou erguido pelos braços da sua comunidade, o protagonismo das suas interações sociais parece trazer um ar de legitimidade às ações tomadas por Castor de Andrade, um ser praticamente intocável (ainda que discorde a Dra. Denise Frossard).
Ao contrário de Pablo Escobar ou Al Capone, a série induz que o bicheiro não era bem visto apenas na sua zona de atuação, no subúrbio do Rio de Janeiro, chegando a se relacionar muito bem com as famílias de presidentes da república e membros da elite da sociedade, tendo uma influência política clara e requisitada.
No fim das contas, a Globoplay reúne um material de qualidade que nos revela, entre o pão, o circo e o sangue, que Castor de Andrade foi um personagem controverso, carismático e multifacetado, se tornando um dos maiores símbolos para o seu clube, para a sua escola de samba e para o seu bairro.
Uma pena que a lógica operacional responsável por financiar isso tudo continue explodindo a cabeça de uns e outros até os dias de hoje.
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Bom Dia, Verônica (1ª Temporada)
4.2 760 Assista AgoraTalvez pelo fato de eu ter passado os últimos anos da minha vida entrando e saindo de delegacias entranhadas no ócio, sentindo na prática a lógica falaciosa do Direito Criminal, eu acabei nutrindo uma preguiça absurda pelo tal gênero “suspense policial” que o brasileiro tanto venera no audiovisual.
Para a minha sorte, a nova série da Netflix Brasil, Bom dia, Verônica, baseada na obra da criminóloga Ilana Casoy e do romancista Raphael Montes, vai muito além de indícios de materialidade, organogramas e luminol, alçando as personagens femininas, imersas numa lógica de opressão, a um protagonismo inédito no gênero.
A premissa do roteiro parte da atuação de sua protagonista Verônica (Tainá Müller) como escrivã da Polícia Civil de São Paulo que, ao presenciar um suicídio na angustiante cena de abertura, se vê obstinada a fazer justiça dando voz a mulheres vítimas de abusos físicos e psicológicos dentro de seus relacionamentos abusivos.
Essa primeira temporada se divide em oito episódios de quarenta e poucos minutos focados em percorrer os inúmeros métodos de violência contra a mulher. Como os abusos vão acontecendo de maneira assíncrona e em diferentes potencialidades, a direção consegue enfiar a caixa do pôster na nossa cabeça e só nos dá um buraquinho para que tentemos sobreviver com um pouco menos culpa.
A vida pretérita, o lamaçal que reveste as nossas instituições e os traumas familiares de Verônica constroem uma personalidade potente e dão o tom natural de justiceira que a protagonista precisa. As diferentes fases da jornada de uma personagem que sucumbe às suas próprias obsessões e impotências, ganham vida nos olhos de Tainá Müller a cada passada de lápis, a cada guerra.
Quando o principal arco paralelo vem à tona e o roteiro invade a masmorra de Janete (Camila Morgado) e Brandão (Eduardo Moscovis), a série muda de patamar. Du Moscovis encarna um Coronel da Polícia Militar aterrorizantemente desprezível sem precisar elevar o tom da sua voz. Camila Morgado, que é uma das minha atrizes brasileiras favoritas desde “Olga”, tem mais um desempenho sensacional. Eu sentia um soco a cada sorriso forçado esboçado.
Eu, como homem, no curso de um constante processo de desintoxicação das minhas amarras machistas, fiquei completamente incomodado nos momentos de carta branca que precediam os surtos de Brandão. A série é espetacular ao escancarar esses diferentes loops dentro de um relacionamento no qual a submissão ultrapassa a própria existência. Janete simplesmente deixou de existir graças ao marido. A volatilidade do sentimento de culpa só destroçava mais ainda.
Ainda que Verônica e Janete sejam inseridas como fios separados no roteiro, o laço acaba sendo natural e convincente, o que só facilita a vida dos adeptos a maratona de episódios. A tensão visual é presente do início ao fim, mesmo com uma evolução acelerada e uma série de eventos chocantes, o que faz por agregar valor a obra.
Embora a produção tenha se esforçado horrores para não caricaturizar uma temática tão sensível no 5º país da lista mundial de feminicídios, alguns elementos do Terror podem ser digeridos mais lentamente por quem tem repulsa pelo gênero. Contudo, é inegável que o choque, o desespero e a ansiedade encaixaram muito bem nas metáforas transportadas.
Não estou exatamente convencido sobre a relevância das relações espirituais de Brandão com a proposta de reflexão trazida pela série. Pintar o macho agressor de maluco, psicopata, serial killer e fã de magia negra pode distanciar um espectador mais desatento do caráter expositivo da série. Há que se entender como uma obra de advertência e não como ficção. Parece óbvio, mas é sempre bom frisar.
De qualquer forma, Bom dia, Verônica é uma série que satisfaz, tanto como suspense policial, terror psicológico ou pedido de socorro. A trilha sonora é excelente, a frequência cardíaca é alta, o trio principal é do caralho e as reflexões são dignas de horas e horas de psicanálise. Se algum gatilho tiver te pegado desprevenida, não hesite em procurar ajuda.
Assistam, passarinhos. E saiam da caixa.
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Betaal (1ª Temporada)
2.6 30Antes de mais nada, eu me sinto na obrigação de confessar que o tesão por zumbis nunca foi um fetiche que me fisgou. No auge do meu ócio, eu segui incapaz de dar play em obras como “Walking Dead”, “Resident Evil” ou “Zumbilândia”, então a análise nada técnica deste lançamento vai ser feita com doses ainda mais cavalares de cagação de regra e antipatia.
Pois bem. A ligeiríssima primeira temporada de Betaal, série indiana de terror original Netflix, busca construir algumas pontes entre as crenças de seus povos e um cenário histórico de independência, contextualizando as suas desigualdades ainda latentes por meio de uma abordagem com críticas sociais implícitas.
Numa pequena aldeia localizada ao lado da Montanha Betaal, a população nativa supostamente garante a manutenção de uma divindade perigosa enclausurada em um túnel. Quando o governo ordena à Surya Construction que desenvolva uma via expressa nesta região, toda a problemática do roteiro está montada.
Ajay Mudhalvan (Jitendra Joshi), o empreiteiro ganancioso, contrata uma espécie de Bope indiano para fazer a limpa no local e, inexplicavelmente, leva a sua esposa e filha nesta missão. Os moradores tentam impedir a reabertura da passagem construída pelos britânicos durante a guerra, mas depois de um clássico banho de sangue, a antiga maldição acaba sendo invocada.
Descobre-se então que o antigo coronel inglês Lynedoch (Richard Dillane) e os seus soldados haviam sido enterrados vivos no túnel e agora estariam dispostos a reconquistar a Índia. É a partir deste momento que a equipe de elite contratada para evacuar o local passa a ter protagonismo na trama, encabeçados pela comandante Tyagi (Suchitra Pillai) e pelo seu subordinado Sirohi (Vineet Kiinumar), aquele clássico personagem de herói que precisa se redimir de seus pecados do passado.
Revestido da minha petulância ocidental, arrisco a dizer que todo o quadro histórico abordado até então serve como mero pretexto do roteiro para dar o aval que a direção precisa para imergir aos elementos mais bregas do terror, com direito a muito sangue espirrando, cabeça girando, faca no pescoço, fotografia quase toda no escuro e sustinhos barulhentos. É exatamente aí que o caldo entorna. A evolução da história me pareceu extremamente confusa e forçada, sem que fosse possível alcançar um suspense de zumbis, e que tampouco gerou a tensão necessária em detrimento das nuances de espiritualidade e possessão.
Ao que me consta, os zumbis geralmente são retratados como seres mortos-vivos, o que não deveria ter relação com aqueles soldados de infantaria possuídos pelo coronel endiabrado, funcionando como meros fantoches. Não vou nem gastar saliva com a composição terrível das criaturas. Uns canibais esquisitos com dentes de vampiro e olhos vermelhos brilhantes diretamente de quatro décadas atrás.
Assim como os encapetados, os outros personagens da série também são facilmente manipulados, não possuem profundidade e estão presentes apenas para vincular um conjunto básico de instruções sem qualquer tipo de peculiaridade nos diálogos.
A composição em quatro episódios não é o maior dos defeitos da série, mas torna inevitável o questionamento: “essa porra não poderia ter tido o formato de longa?”. Caso de fato haja uma segunda temporada, conforme o último episódio tenta sugerir, será interessante ver em que direção o roteiro seguirá e se conseguirá reverter o dano causado pela preguiça de seus idealizadores. Há algum potencial escondido nas questões mais folclóricas da trama.
Como mais vale um passarinho na mão do que dois voando, para evitar qualquer tragédia, eu deixaria Betaal presa dentro do túnel.
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Bandidos na TV
4.2 260 Assista AgoraNão sei em que universo paralelo eu habitava para jamais ter ouvido falar nessa história de Wallace Souza e as consequências do programa manauara Canal Livre. Série Documental muito bem produzida que se desenvolve sob uma ótica relativista de algumas bizarrices fragmentadas.
Não consigo nutrir nenhuma empatia pelo "cidadão de bem" que arquiteta um programa higienista vendendo a falácia da crucificação do pseudo criminoso comum. Etiquetamento nu e cru que se potencializa com o espetáculo de horrores desses tempos sombrios. Feitiço contra o feiticeiro.
O que também não me leva a crer, em contrapartida, que a tal Força Tarefa tenha conseguido demonstrar aquele emaranhado de acusações fortuitas de maneira minimamente comprobatória. Uma bagunça só. Arbitrariedade para todos os lados. Cenário repleto de lobos em pele de cordeiro.
Brasilzão puro.
Dark (1ª Temporada)
4.4 1,6KSinopse:
chove o tempo inteiro, não existe guarda-chuva na cidade, ninguém fica gripado, todo mundo tem o dente amarelo, ninguém joga lixo no chão a não ser papel de chocolate, floresta mal assombrada, portal de Nárnia na caverna, passado do pretérito do futuro imperfeito.