que filme mais bonito! acho lindo o cacho de bananas na primeira cena. acho incrivel a mulher indo dormir toda maquiada. o drama. a leitora. que personagem interessante esta luciana, mas melhor ainda que não seja apenas ela a personagem principal. gilberto e marina são fundamentais para todo o debate de classes que o filme propõe.
o acidente com gilberto e todas suas consequências são uma parte muito bem construída da narrativa. toda a cena em que ele cai, que o vemos de cima como este michelangelo a pintar a sistina, o que já implica uma retirada de cena, mas que ainda o mantém parte dela. o artista que aparece para causar um acidente. o trabalho artístico pressupõe o perigo. e é ao interromper o romance entre luciana e o outro homem, que notamos sua presença. a iluminação radical de sombras na cena em que luciana conversa com o médico. a cruz como parte da estrutura da cama. o jeito que a câmera começa deitada e se levanta na cena em que gilberto já está se recuperando. e, por fim, a cena em que volta para casa, que tem tanto uma função narrativa (ele corre, logo, já está fisicamente recuperado) quanto uma função subjetiva (o homem correr para longe de sua cuidadora e em direção a sua família, de volta ao campo, ao mundo conhecido)
todo o debate sobre o fazer artístico é de fazer sorrir os olhos. eles trazem roquette pinto! a música de villa-lobos! o dia de são joão em que marina sofre pela ausência, sente a solidão, mas diante da noite, uma festa ao redor da fogueira. dançar o fogo. o fogo que faz movimentar. "não deixa apagar seu balão", cantam para o santo. e marina sorri :) engraçadíssima a forma que ele coloca a aristocracia como esse grupo amante da grécia, dos helênicos, olavo bilac, casimiro de abreu. engraçadíssimo o crítico que é contra qualquer ideia de brasil, mas que não sabe quem foi pitágoras, chamar-se barróca, um estranhamento e um reconhecimento. não à toa a argila, o barro, a escultura, a manufatura. ao homem pobre, a crueza da inspiração, da força do gênio, uma naturalidade nos movimentos; que é insistentemente minado pelo sistema mecanicizante dos procedimentos. também falamos sobre reprodutibilidade e originalidade. o homem diante da máquina, diante do castelo. o rio de janeiro lembra o de machado, mesmo sendo praticamente de 100 anos depois. machado nasceu em 1839, argila em 1940. os negros marginilizados, mas os que mais estão presentes na festa com dança, com música. comemoram a vida. o índio como exercício artístico para a classe rica, aos olhos do estrangeiro, do exotismo. mas a performance da índia está no filme. acho lindos o título e/com o fim!
incrivel. quando o documentario sobre um outro filme se torna uma declaração de amor a esse filme, aos documentários ou a todo o cinema. e mesmo sendo o filme de um outro, straub faz questão de dizer. e aponta, critica, analisa. com o filme do outro. reparemos que a voz de pedro costa não está. de quem é o filme? este é apenas um comentário do outro. talvez como todo filme comenta algum que veio antes dele. um livro. uma história. um mito. aqui não é de autoria que falamos. falamos de cinema. e por isso straub não precisa nomear hölderlin quando lê o empédocles. ele se apodera do texto, assim como hölderlin fez ao traduzir sófocles. é um método. uma forma de ler. é straub o comunista. e faz questão de dizê-lo! dentre meus 22 filmes, não me posicionei. mas o empédocles foi o segundo em que disse: e quando digo, preciso dizer do comunismo. é verdadeiro e é o discurso de um homem com consciência do tempo. quando fala em baudelaire, fala para dizer que é mais velho que ele jamais foi. ele afirma que devemos perceber a gravidade de estarmos diante da violência extrema, diante da morte diária. precisamos entender a força da mortalidade, da união, do amor. é também, é claro, um filme de amor. o título fala em sorriso. melhor, pergunta. investiga onde se esconde o sentimento em meio a toda a dureza (até mesmo do diálogo entre os dois). porque para alguém que assiste aos filmes de straub & huillet num primeiro momento poderá vê-los como áridos, cansativos, monótonos. mas é claro, cinema fala de tempo. e é também por isso que o filme, às vezes, parece quase uma palestra para editores. a montagem de pedro costa entra no tempo de huillet, da técnica manual do corte, enquanto straub fala e fala e fala sobre a montagem. chega a dizer que a vida não funciona como a montagem! e isso é dizer muito quando o cinema que é mais assistido hoje valoriza a invisibilidade no corte. já huillet & straub planejam cortes dinâmicos: ora cortam com a ajuda dos movimentos, não por quererem invisibilizar o movimento, mas evidenciá-lo, ora os cortes somem, um longo plano... um longo plano pode ser também um respiro, ou um grande salto. a montagem ensina a respirar. não me parece à toa esta relação constante que mantêm com a divindade. a respiração é nossa primeira meditação. quem sabe a última? porque straub afirma: é preciso existir algo depois da banalização da violência. onde jazerá, então, seu sorriso? e não à toa o título se faz pergunta, porque straub alerta: é preciso desconfiar dos filmes. e que melhor momento para desconfiar, se não na sala de edição? o filme se faz, se realiza, se formula, se formata, se materializa na sala de montagem. vejam, aqui, como se faz um filme. um filme é montado, inventado, manufaturado. hoje, quando pedi ajuda para encontrar um livro na cultura, a atendente falou que os livros de ficção ficavam em outra seção. eu estava na prateleira de romances. viro pra ela e pergunto se ali não são livros de ficção. ela diz que não: "são só algumas histórias aleatórias". será que chegamos ao ponto que a única ficção que parece de fato uma invenção é a ficção científica? e até mesmo as distopias passam a parecer reais... ah, que importante o exercício de olhar para trás e valorizar a arte que veio antes de nós. de um outro tempo, contemporâneo ao nosso. incrivel.
muito lindo! e isso já seria suficiente pra fazer a experiência do filme única. mas cada plano é escolhido com cuidado. como quando a câmera parece acompanhar o ritmo do vento na mata e logo depois corta-se para um plongee onde vemos, principalmente, a terra. do ar para a terra. e o homem, constantemente caminhando nesta terra, olhando para ela, para baixo, para dentro. nem sempre vemos seu rosto. os pés, presos ao chão. a mente, aérea. não existe nome para este humano, não existe definição. são figuras, espectros. o homem e sua relação horizontal, terrena. e quando pensa que está próximo de deus, a câmera assume um contra plongee tambem radical, que coloca o homem alinhado com a montanha ao fundo, e acima dele, o céu branco, enorme. é possível encarar a face de deus? o elemento da água é dominante, vital, devastador.
me dá calafrios imaginar a origem do brasil. como numa das primeiras imagens do filme, o fogo. o homem civilizado indo iluminar as terras tomadas pela escuridão. é assustadora a imagem da frota à noite. as tochas, o genocídio indígena é uma caça às bruxas. a descoberta do fogo sempre se justificou por ter acontecido em nome do progresso. que progresso é esse pelo qual lutamos? e a imagem final do filme, os homens abaixo da cruz, os que de fato construirão esse novo mundo. trabalham em nome de quem, que rei, que divindade? por que inventaram o brasil? para que saímos de casa? descobertar a américa da europa, sempre em nome da europa. a europa traz a cruz, traz o paraíso perdido, traz a utopia, traz o impossível, traz o futuro. o que é o brasil? quem o nomeou? a que se refere essa palavra quando penso numa grande terra marcada pelo genocídio e já essa palavra cala e reverbera ordem e progresso ordem e progresso. que história eu conto quando falo "brasil"?
fiquei pensando se a questão principal não seria a relação com o trauma. em nenhum momento conhecemos da história desse personagem antes do incidente culminante de violência. não sabemos de quem ele está acompanhado, onde está situada aquela criança no mundo. aquele momento no aeroporto é como um nascimento, o instante original. tudo que sabemos é que algo de errado vai acontecer (já vimos os prenúncios/sonhos), algo que não sabemos exatamente, não lembramos exatamente, mas que retorna, que reaparece, sempre novo, sempre diferente, sempre o mesmo. sempre para aquele momento, quando a violência do mundo te retira de toda a segurança (eu geração harry potter lembro dos cavalos invisíveis que carregam os alunos que não são primeiranistas para o castelo: somente quem já encarou a morte consegue enxergá-los. estar diante da morte te faz ver de outra forma.) e aqui a imagem significa ainda mais, porque é a morte de si mesmo. num movimento eterno de repetição, onde o fim encontra o início. por isso que o filme precisava ser uma ficção científica, e também uma distopia onde o ego é fraco, drogado, louco, corrompido, fora do controle muitas vezes, porque o trauma funciona anulando a continuidade do tempo, logo, também do próprio ego, retirado de seu tempo. o que morre no passado, morre de tanto passado. o passado se continua para o presente, um presente extendido, eternamente algo que já aconteceu. e o próprio personagem diz que ele foi colocado nessa missão exatamente porque ele tem uma boa memória. aqui, ter uma boa memória não é lembrar de tudo exatamente como aconteceu, mas trazer sempre de volta para o presente aquilo que estava no passado. saber de cor aquilo que já aconteceu. e aí a primeira imagem do filme (dps dos 12 macacos signos apóstolos girando-girando) fica ainda mais forte: os olhos do menino no momento do trauma, quando ele vê a própria morte. a visão da morte, a visão da guerra e, por fim, do apocalipse. recomendo um texto curtinho e fortíssimo do blanchot chamado "o instante da minha morte", fácil de achar em pdf online.
QUE FILMAÇO! e que final bizarro de incrível! me lembro de várias coisas. primeiro, kafka e o artista da fome, quando a fome já não é uma questão, mas uma técnica, uma arte, que gera também um prazer estético. este prazer é gerado em nome de algo como a diversão, o riso fácil, ou simplesmente a felicidade, mas produzido apesar de todo um sistema que também explora e se aproveita daqueles que não têm acesso à informação, a oportunidades, à representação política. corroi o corpo, ataca, suga por dentro. a fome e o prazer, quando já não são dualidades. difícil não pensar em hellraiser alguns anos depois desse. claro que lá escolhendo trabalhar com imagens de prazer sexual e de tortura, enquanto aqui de castidade e afronta a deus. e essa relação com a divindade é tão fundamental que não tem como não pensar em flávio de carvalho dizendo que o primeiro deus do homem é a fome. a cena com sacrifício da vaca é das mais fortes que eu já vi. a relação ritual da carne, da culinária que existe em todo o mundo rural. onde está o respeito com a vida? com a nossa, com a do próximo? quando paramos e pensamos pelo bem de toda nossa comunidade, e não apenas de nós mesmos? quando sou em comum? a imagem dos homens de frente à câmera, um grupo grande e ao fundo uma pequena elevação no terreno, olham para nós. nos reconhece? a reconhecemos? lembro de tarsila pintando as várias faces na cidade, quando seu campo era tão esvaziado de pessoas. por que será? a qual comunidade queremos fazer parte no futuro? é muito curioso pensar em futuro depois desse filme, que questiona não apenas o limite do mortal que ultrapassa o tempo e escapa para o infinito, mas que parece também voltar a uma origem quando acreditar em deuses era a primeira e mais irredutível vontade, quando o mito é necessário, potente, vital. já não estamos nesse tempo. existe a fome. uma criança com fome. o homem considera comer a si mesmo, devorar-se. e não à toa é uma criança que joão tenta comer em seu ato desesperado no circo. é o início da vida, imagem do recomeço, escatológico. esta origem animalesca nos coloca também diante da divindade mais básica. o corpo e a fé estão conectados em experiência. flávio de carvalho, mais uma vez. mas também reconhecemos muito do percurso de simone weil. de seu voto de fome. sua consequente morte. viagem ao fim do mundo de fernando campos tinha saído só dois anos antes; lá estávamos diante de seu pensamento vivo, presente e voando de costas para o futuro (angelus novus, klee [w.b.]). e pensar no futuro (quem sabe, este super-homem?), no homem que chega à lua (méliès), é necessariamente voltar para o passado, revisitar a história, jamais chegar à origem, senão, para recomeçá-la. e a lona se monta outra vez. a boca abre e sai um grito de fome, de medo, de felicidade. A CULTURA BRASILEIRA É LINDA DEMAIS
quando falamos em leveza, é sobre peso que se fala; pensar o desastre é também considerar o milagre. esse jogo está visível no filme, trazendo uma sensação etérea de inconstância para ele. o formato flui - quase um não-formato. talvez seja melhor pensar numa organicidade, o que possibilita que o filme não se limite apenas a escolhas definidoras (como ao separar parte das imagens por algoritmos romanos), mas também se abrindo para o uso das palavras. a palavra é a primeira e última abertura. já as datas de nascimento e de morte dos personagens, que poderiam ser apenas dados técnicos e oficiais, aparecem muito mais como sugestão de pensarmos a longevidade ou, melhor: até quando duramos, permanecemos, demoramos, continuamos? o que nos faz demorar? pelo que continuamos? ao que queremos dar continuidade? quem está em continuidade conosco? um ótimo exercício com a memória, ver a força e o vício do brasil, que errância....... e que lindo ver leonilson nessa biblioteca.
COMUNIDADE, franz kafka // "Somos cinco amigos, certa vez saímos um atrás do outro de uma casa, logo de início saiu o primeiro e se pôs ao lado do portão da rua, depois saiu o segundo, ou melhor: deslizou leve como uma bolinha de mercúrio, pela porta, e se colocou não muito distante do primeiro, depois o terceiro, em seguida o quarto, depois o quinto. No fim estávamos todos formando uma fila, em pé. As pessoas voltaram a atenção para nós, apontaram-nos e disseram “os cinco acabaram de sair daquela casa”. Desde então vivemos juntos; seria uma vida pacífica se um sexto não se imiscuísse sempre. Ele não faz nada, mas nos aborrece, e isto basta: por que é que ele se intromete à força onde não querem saber dele? Não o conhecemos e não queremos acolhê-lo. Nós cinco também não nos conhecíamos antes e, se quiserem, ainda agora não nos conhecemos um ao outro; mas o que entre nós cinco é possível e tolerado não o é com o sexto. Além do mais somos cinco e não queremos ser seis. E se é que esse estar junto constante tem algum sentido, para nós cinco não tem, mas agora já estamos reunidos e vamos ficar assim; não queremos, porém, uma nova união justamente com base nas nossas experiências. Mas como é possível tornar isso claro ao sexto? Longas explicações significariam, em nosso círculo, quase uma acolhida, por isso preferimos não explicar nada e não o acolhemos. Por mais que ele torça os lábios, nós o repelimos com o cotovelo; no entanto, por mais que o afastemos, ele volta sempre." (tradução Modesto Caronte)
o apocalipse cotidiano, apenas o caos, pelo caos, em nome disto que se insere como oposição à rigidez, ao silêncio ou a todo este vasto mundo de opiniões. o que existe é a imaginação, o humor, o romance, o horror, o medo, a morte, a injustiça, a fraqueza. está tudo aqui como uma amostra de toda a nossa história (também um filme sobre o diabo que existe e apavora toda a luta social). liberdade, é este o som que ressoa durante todo o filme. e repete repete recomeça reconecta com outras histórias-possibilidades-lutas. múltiplo, muitos, sem forma fixa, sem exigências, sem limites. caminha com a canção com a arquitetura com o documentário com a literatura como se a arte toda fosse sempre e desde o princípio este ato de fazer com imagens, transformar e imaginar, criar este mundo que é nosso, mas pode tão logo deixar de ser. mesmo assim, enquanto tivermos acesso a um filme como este, podemos pensar talvez em ter alguma calma: ainda temos a capacidade de imaginar, logo, a de recomeçar. BASICAMENTE UM FILME LINDO e que atuação incrível da tallulah campos a partir do pensamento, da força de simone weil. bela homenagem.
Argila
3.3 6que filme mais bonito! acho lindo o cacho de bananas na primeira cena. acho incrivel a mulher indo dormir toda maquiada. o drama. a leitora. que personagem interessante esta luciana, mas melhor ainda que não seja apenas ela a personagem principal. gilberto e marina são fundamentais para todo o debate de classes que o filme propõe.
o acidente com gilberto e todas suas consequências são uma parte muito bem construída da narrativa. toda a cena em que ele cai, que o vemos de cima como este michelangelo a pintar a sistina, o que já implica uma retirada de cena, mas que ainda o mantém parte dela. o artista que aparece para causar um acidente. o trabalho artístico pressupõe o perigo. e é ao interromper o romance entre luciana e o outro homem, que notamos sua presença. a iluminação radical de sombras na cena em que luciana conversa com o médico. a cruz como parte da estrutura da cama. o jeito que a câmera começa deitada e se levanta na cena em que gilberto já está se recuperando. e, por fim, a cena em que volta para casa, que tem tanto uma função narrativa (ele corre, logo, já está fisicamente recuperado) quanto uma função subjetiva (o homem correr para longe de sua cuidadora e em direção a sua família, de volta ao campo, ao mundo conhecido)
todo o debate sobre o fazer artístico é de fazer sorrir os olhos. eles trazem roquette pinto! a música de villa-lobos! o dia de são joão em que marina sofre pela ausência, sente a solidão, mas diante da noite, uma festa ao redor da fogueira. dançar o fogo. o fogo que faz movimentar. "não deixa apagar seu balão", cantam para o santo. e marina sorri :)
engraçadíssima a forma que ele coloca a aristocracia como esse grupo amante da grécia, dos helênicos, olavo bilac, casimiro de abreu. engraçadíssimo o crítico que é contra qualquer ideia de brasil, mas que não sabe quem foi pitágoras, chamar-se barróca, um estranhamento e um reconhecimento. não à toa a argila, o barro, a escultura, a manufatura. ao homem pobre, a crueza da inspiração, da força do gênio, uma naturalidade nos movimentos; que é insistentemente minado pelo sistema mecanicizante dos procedimentos. também falamos sobre reprodutibilidade e originalidade. o homem diante da máquina, diante do castelo. o rio de janeiro lembra o de machado, mesmo sendo praticamente de 100 anos depois. machado nasceu em 1839, argila em 1940. os negros marginilizados, mas os que mais estão presentes na festa com dança, com música. comemoram a vida. o índio como exercício artístico para a classe rica, aos olhos do estrangeiro, do exotismo. mas a performance da índia está no filme.
acho lindos o título e/com o fim!
Onde Jaz o Teu Sorriso?
4.4 3incrivel. quando o documentario sobre um outro filme se torna uma declaração de amor a esse filme, aos documentários ou a todo o cinema. e mesmo sendo o filme de um outro, straub faz questão de dizer. e aponta, critica, analisa. com o filme do outro. reparemos que a voz de pedro costa não está. de quem é o filme? este é apenas um comentário do outro. talvez como todo filme comenta algum que veio antes dele. um livro. uma história. um mito. aqui não é de autoria que falamos. falamos de cinema. e por isso straub não precisa nomear hölderlin quando lê o empédocles. ele se apodera do texto, assim como hölderlin fez ao traduzir sófocles. é um método. uma forma de ler. é straub o comunista. e faz questão de dizê-lo! dentre meus 22 filmes, não me posicionei. mas o empédocles foi o segundo em que disse: e quando digo, preciso dizer do comunismo. é verdadeiro e é o discurso de um homem com consciência do tempo. quando fala em baudelaire, fala para dizer que é mais velho que ele jamais foi. ele afirma que devemos perceber a gravidade de estarmos diante da violência extrema, diante da morte diária. precisamos entender a força da mortalidade, da união, do amor. é também, é claro, um filme de amor. o título fala em sorriso. melhor, pergunta. investiga onde se esconde o sentimento em meio a toda a dureza (até mesmo do diálogo entre os dois). porque para alguém que assiste aos filmes de straub & huillet num primeiro momento poderá vê-los como áridos, cansativos, monótonos. mas é claro, cinema fala de tempo. e é também por isso que o filme, às vezes, parece quase uma palestra para editores. a montagem de pedro costa entra no tempo de huillet, da técnica manual do corte, enquanto straub fala e fala e fala sobre a montagem. chega a dizer que a vida não funciona como a montagem! e isso é dizer muito quando o cinema que é mais assistido hoje valoriza a invisibilidade no corte. já huillet & straub planejam cortes dinâmicos: ora cortam com a ajuda dos movimentos, não por quererem invisibilizar o movimento, mas evidenciá-lo, ora os cortes somem, um longo plano... um longo plano pode ser também um respiro, ou um grande salto. a montagem ensina a respirar. não me parece à toa esta relação constante que mantêm com a divindade. a respiração é nossa primeira meditação. quem sabe a última? porque straub afirma: é preciso existir algo depois da banalização da violência. onde jazerá, então, seu sorriso? e não à toa o título se faz pergunta, porque straub alerta: é preciso desconfiar dos filmes. e que melhor momento para desconfiar, se não na sala de edição? o filme se faz, se realiza, se formula, se formata, se materializa na sala de montagem. vejam, aqui, como se faz um filme. um filme é montado, inventado, manufaturado. hoje, quando pedi ajuda para encontrar um livro na cultura, a atendente falou que os livros de ficção ficavam em outra seção. eu estava na prateleira de romances. viro pra ela e pergunto se ali não são livros de ficção. ela diz que não: "são só algumas histórias aleatórias". será que chegamos ao ponto que a única ficção que parece de fato uma invenção é a ficção científica? e até mesmo as distopias passam a parecer reais... ah, que importante o exercício de olhar para trás e valorizar a arte que veio antes de nós. de um outro tempo, contemporâneo ao nosso. incrivel.
Limite
4.0 168 Assista Agoramuito lindo! e isso já seria suficiente pra fazer a experiência do filme única. mas cada plano é escolhido com cuidado. como quando a câmera parece acompanhar o ritmo do vento na mata e logo depois corta-se para um plongee onde vemos, principalmente, a terra. do ar para a terra. e o homem, constantemente caminhando nesta terra, olhando para ela, para baixo, para dentro. nem sempre vemos seu rosto. os pés, presos ao chão. a mente, aérea. não existe nome para este humano, não existe definição. são figuras, espectros. o homem e sua relação horizontal, terrena. e quando pensa que está próximo de deus, a câmera assume um contra plongee tambem radical, que coloca o homem alinhado com a montanha ao fundo, e acima dele, o céu branco, enorme. é possível encarar a face de deus? o elemento da água é dominante, vital, devastador.
O Descobrimento do Brasil
3.1 19me dá calafrios imaginar a origem do brasil. como numa das primeiras imagens do filme, o fogo. o homem civilizado indo iluminar as terras tomadas pela escuridão. é assustadora a imagem da frota à noite. as tochas, o genocídio indígena é uma caça às bruxas. a descoberta do fogo sempre se justificou por ter acontecido em nome do progresso. que progresso é esse pelo qual lutamos? e a imagem final do filme, os homens abaixo da cruz, os que de fato construirão esse novo mundo. trabalham em nome de quem, que rei, que divindade? por que inventaram o brasil? para que saímos de casa? descobertar a américa da europa, sempre em nome da europa. a europa traz a cruz, traz o paraíso perdido, traz a utopia, traz o impossível, traz o futuro. o que é o brasil? quem o nomeou? a que se refere essa palavra quando penso numa grande terra marcada pelo genocídio e já essa palavra cala e reverbera ordem e progresso ordem e progresso. que história eu conto quando falo "brasil"?
Cosmópolis
2.7 1,0K Assista Agora"a vida é contemporânea demais" ou "jamais fomos modernos"
Monika e o Desejo
4.0 120 Assista AgoraQUE FILMAÇO. a relação da água tanto com a liberdade quanto com a memória é mt linda. eu to apaixonado por um drama.
Os 12 Macacos
3.9 1,1K Assista Agorafiquei pensando se a questão principal não seria a relação com o trauma. em nenhum momento conhecemos da história desse personagem antes do incidente culminante de violência. não sabemos de quem ele está acompanhado, onde está situada aquela criança no mundo. aquele momento no aeroporto é como um nascimento, o instante original. tudo que sabemos é que algo de errado vai acontecer (já vimos os prenúncios/sonhos), algo que não sabemos exatamente, não lembramos exatamente, mas que retorna, que reaparece, sempre novo, sempre diferente, sempre o mesmo. sempre para aquele momento, quando a violência do mundo te retira de toda a segurança (eu geração harry potter lembro dos cavalos invisíveis que carregam os alunos que não são primeiranistas para o castelo: somente quem já encarou a morte consegue enxergá-los. estar diante da morte te faz ver de outra forma.) e aqui a imagem significa ainda mais, porque é a morte de si mesmo. num movimento eterno de repetição, onde o fim encontra o início. por isso que o filme precisava ser uma ficção científica, e também uma distopia onde o ego é fraco, drogado, louco, corrompido, fora do controle muitas vezes, porque o trauma funciona anulando a continuidade do tempo, logo, também do próprio ego, retirado de seu tempo. o que morre no passado, morre de tanto passado. o passado se continua para o presente, um presente extendido, eternamente algo que já aconteceu. e o próprio personagem diz que ele foi colocado nessa missão exatamente porque ele tem uma boa memória. aqui, ter uma boa memória não é lembrar de tudo exatamente como aconteceu, mas trazer sempre de volta para o presente aquilo que estava no passado. saber de cor aquilo que já aconteceu. e aí a primeira imagem do filme (dps dos 12 macacos signos apóstolos girando-girando) fica ainda mais forte: os olhos do menino no momento do trauma, quando ele vê a própria morte. a visão da morte, a visão da guerra e, por fim, do apocalipse. recomendo um texto curtinho e fortíssimo do blanchot chamado "o instante da minha morte", fácil de achar em pdf online.
O Profeta da Fome
3.9 15QUE FILMAÇO! e que final bizarro de incrível! me lembro de várias coisas. primeiro, kafka e o artista da fome, quando a fome já não é uma questão, mas uma técnica, uma arte, que gera também um prazer estético. este prazer é gerado em nome de algo como a diversão, o riso fácil, ou simplesmente a felicidade, mas produzido apesar de todo um sistema que também explora e se aproveita daqueles que não têm acesso à informação, a oportunidades, à representação política. corroi o corpo, ataca, suga por dentro. a fome e o prazer, quando já não são dualidades. difícil não pensar em hellraiser alguns anos depois desse. claro que lá escolhendo trabalhar com imagens de prazer sexual e de tortura, enquanto aqui de castidade e afronta a deus. e essa relação com a divindade é tão fundamental que não tem como não pensar em flávio de carvalho dizendo que o primeiro deus do homem é a fome. a cena com sacrifício da vaca é das mais fortes que eu já vi. a relação ritual da carne, da culinária que existe em todo o mundo rural. onde está o respeito com a vida? com a nossa, com a do próximo? quando paramos e pensamos pelo bem de toda nossa comunidade, e não apenas de nós mesmos? quando sou em comum? a imagem dos homens de frente à câmera, um grupo grande e ao fundo uma pequena elevação no terreno, olham para nós. nos reconhece? a reconhecemos? lembro de tarsila pintando as várias faces na cidade, quando seu campo era tão esvaziado de pessoas. por que será? a qual comunidade queremos fazer parte no futuro? é muito curioso pensar em futuro depois desse filme, que questiona não apenas o limite do mortal que ultrapassa o tempo e escapa para o infinito, mas que parece também voltar a uma origem quando acreditar em deuses era a primeira e mais irredutível vontade, quando o mito é necessário, potente, vital. já não estamos nesse tempo. existe a fome. uma criança com fome. o homem considera comer a si mesmo, devorar-se. e não à toa é uma criança que joão tenta comer em seu ato desesperado no circo. é o início da vida, imagem do recomeço, escatológico. esta origem animalesca nos coloca também diante da divindade mais básica. o corpo e a fé estão conectados em experiência. flávio de carvalho, mais uma vez. mas também reconhecemos muito do percurso de simone weil. de seu voto de fome. sua consequente morte. viagem ao fim do mundo de fernando campos tinha saído só dois anos antes; lá estávamos diante de seu pensamento vivo, presente e voando de costas para o futuro (angelus novus, klee [w.b.]). e pensar no futuro (quem sabe, este super-homem?), no homem que chega à lua (méliès), é necessariamente voltar para o passado, revisitar a história, jamais chegar à origem, senão, para recomeçá-la. e a lona se monta outra vez. a boca abre e sai um grito de fome, de medo, de felicidade. A CULTURA BRASILEIRA É LINDA DEMAIS
Cinema, Aspirinas e Urubus
3.9 364 Assista Agora"feliz do bicho que come o outro", estado de sítio, o fim dos males é o fim dos tempos
Varda Por Agnès
4.4 40 Assista Agoraascendente em câncer <3
Otelo
3.9 26 Assista Agorato lie, to lay
Nós que Aqui Estamos Por Vós Esperamos
4.3 416quando falamos em leveza, é sobre peso que se fala; pensar o desastre é também considerar o milagre. esse jogo está visível no filme, trazendo uma sensação etérea de inconstância para ele. o formato flui - quase um não-formato. talvez seja melhor pensar numa organicidade, o que possibilita que o filme não se limite apenas a escolhas definidoras (como ao separar parte das imagens por algoritmos romanos), mas também se abrindo para o uso das palavras. a palavra é a primeira e última abertura. já as datas de nascimento e de morte dos personagens, que poderiam ser apenas dados técnicos e oficiais, aparecem muito mais como sugestão de pensarmos a longevidade ou, melhor: até quando duramos, permanecemos, demoramos, continuamos? o que nos faz demorar? pelo que continuamos? ao que queremos dar continuidade? quem está em continuidade conosco? um ótimo exercício com a memória, ver a força e o vício do brasil, que errância....... e que lindo ver leonilson nessa biblioteca.
O Invasor
3.6 171COMUNIDADE, franz kafka // "Somos cinco amigos, certa vez saímos um atrás do outro de uma casa, logo de início saiu o primeiro e se pôs ao lado do portão da rua, depois saiu o segundo, ou melhor: deslizou leve como uma bolinha de mercúrio, pela porta, e se colocou não muito distante do primeiro, depois o terceiro, em seguida o quarto, depois o quinto. No fim estávamos todos formando uma fila, em pé. As pessoas voltaram a atenção para nós, apontaram-nos e disseram “os cinco acabaram de sair daquela casa”. Desde então vivemos juntos; seria uma vida pacífica se um sexto não se imiscuísse sempre. Ele não faz nada, mas nos aborrece, e isto basta: por que é que ele se intromete à força onde não querem saber dele? Não o conhecemos e não queremos acolhê-lo. Nós cinco também não nos conhecíamos antes e, se quiserem, ainda agora não nos conhecemos um ao outro; mas o que entre nós cinco é possível e tolerado não o é com o sexto. Além do mais somos cinco e não queremos ser seis. E se é que esse estar junto constante tem algum sentido, para nós cinco não tem, mas agora já estamos reunidos e vamos ficar assim; não queremos, porém, uma nova união justamente com base nas nossas experiências. Mas como é possível tornar isso claro ao sexto? Longas explicações significariam, em nosso círculo, quase uma acolhida, por isso preferimos não explicar nada e não o acolhemos. Por mais que ele torça os lábios, nós o repelimos com o cotovelo; no entanto, por mais que o afastemos, ele volta sempre." (tradução Modesto Caronte)
O Invasor
3.6 171filmaço daporraaa
O Signo do Caos
3.8 34um lance de dados jamais abolirá o caos
Viagem ao Fim do Mundo
4.0 16e que crítica a nós, leitores destas imagens. estejamos sempre atentos.
Viagem ao Fim do Mundo
4.0 16o apocalipse cotidiano, apenas o caos, pelo caos, em nome disto que se insere como oposição à rigidez, ao silêncio ou a todo este vasto mundo de opiniões. o que existe é a imaginação, o humor, o romance, o horror, o medo, a morte, a injustiça, a fraqueza. está tudo aqui como uma amostra de toda a nossa história (também um filme sobre o diabo que existe e apavora toda a luta social). liberdade, é este o som que ressoa durante todo o filme. e repete repete recomeça reconecta com outras histórias-possibilidades-lutas. múltiplo, muitos, sem forma fixa, sem exigências, sem limites. caminha com a canção com a arquitetura com o documentário com a literatura como se a arte toda fosse sempre e desde o princípio este ato de fazer com imagens, transformar e imaginar, criar este mundo que é nosso, mas pode tão logo deixar de ser. mesmo assim, enquanto tivermos acesso a um filme como este, podemos pensar talvez em ter alguma calma: ainda temos a capacidade de imaginar, logo, a de recomeçar. BASICAMENTE UM FILME LINDO e que atuação incrível da tallulah campos a partir do pensamento, da força de simone weil. bela homenagem.
Viagem ao Fim do Mundo
4.0 16que filme! que filme!
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