O filme tem sérios problemas quanto ao lugar e a condição da mulher, isso é claro.
Mas, descontando o contexto social torto em que se desenrola, explora conflitos internos e sentimentos humanos como lealdade, amor, perda e sacrifício de forma magistral, sob a liderança do casal de protagonistas, que nos presenteiam com atuações magníficas.
Não considero este filme bom por alguma mensagem que ele possa transmitir, mas pelo potencial de reflexão que ele apresenta, sobre segregação, ética, preconceito, colonialismo, violência e parentesco.
"Quando os dois transam, ela é virgem. Isso vai constar no livro?"
(Ela se refere à protagonista do romance erótico em que está trabalhando com a cunhada e a amiga)
Depois que ela disse isso, retornei a vários momentos da experiência da personagem que mudaram completamente o entendimento que tinha dela.
O tal relacionamento cujo fim a levou a Chicago nunca é explicado. Ela recusa o avanço do cara na festa e em seguida desaba. Ela recusa o avanço do Kevin na primeira vez em que vai à casa dele e na próxima cena em que aparece tem a ideia de escrever um romance erótico com Kelly, demonstrando ter um marcado interesse por essa literatura. Está sempre constrangida quando está sozinha com o Kevin. Quer comprar um presente, mas acaba não comprando por não saber qual seria o "limite", e é impactada ao receber, da parte dele, um que foi cuidadosamente pensado para ela, especificamente. Quando transa com ele, diz que está "testando" algumas coisas, para ver se gosta.
Acho que reduzir a Jenny a uma pessoa egoísta e irresponsável não leva em conta a complexidade da personagem.
O pai e a mãe dos irmãos não são mencionados em nenhum momento, embora seja natal. É o sinal de uma ausência significativa. Os da cunhada também não, o que é um sinal de identificação entre eles.
Sim, Jenny é uma personagem imatura, mas não por não ter bom caráter. Ela, mais do que tudo, é alguém extremamente frágil emocionalmente. Tão frágil que desaba quando acha que está tomando um fora, depois de o cara com quem está ficando dizer que não pode dormir com ela, porque precisa acordar cedo para ir ao encontro de natal com a mãe.
E, em meio a tudo isso, sua presença provoca mudanças positivas na vida do irmão e da cunhada como casal, abrindo novas possibilidades para arejar um contexto que poderia, com o tempo, ficar tão sufocante quanto a fumaça de uma pizza queimada se espalhando pela casa.
Com todas as falhas e imperfeições, erros e desentendimentos, o afeto se estabelece entre os personagens. Ele os fortalece como seres humanos e como família, que provavelmente nunca tiveram antes como uma real estrutura.
Extremamente relevante hoje, com enxurradas de informações falsas sendo "compartilhadas" nas redes sociais e se tornando verdade na mente das pessoas, apenas por estarem sendo reproduzidas (isso para não falar na imprensa e na mídia tradicional, que sempre teve e ainda tem esse poder de difusão de crenças e valores – no próprio filme, ela é um instrumento crucial de unificação de mentalidades, de construção e destruição de “fatos”, não só do presente, como do passado). Parece que é, mais do que nunca, necessário investigar e estar alerta à realidade que é criada e difundida, evitando acreditar automaticamente em tudo o que se lê ou ouve – principalmente quando o que lemos ou ouvimos é feito sob medida para confirmar noções que já possuímos e cultivamos. É necessário também tomar cuidado para não se tornar a "polícia do pensamento". A intolerância com opiniões e versões diferentes da realidade, muitas vezes, é pautada por emoções como as cultivadas pelo Grande Irmão - o ódio e a definição de um inimigo comum a ser massacrado e eliminado, ao invés da razão, do equilíbrio e da percepção de complexidades e nuances. O totalitarismo do pensamento nem sempre tem necessidade de um aparelho estatal tradicional e fechado para exercer e expandir o seu poder.
uma denúncia inspirada de como interesses empresariais intrometem-se na política, que se torna movida pelo dinheiro, e de como a grande imprensa (compartilhando seus interesses, já que é sustentada por eles) atua em seu favor, para moldar a opinião pública, de acordo com o que lhe é vantajoso.
Valorização dos ideais de integridade e da luta para torná-los realidade, mesmo frente a obstáculos aparentemente insuperáveis.
Fé no companheirismo e na capacidade de inspirar e elevar as pessoas a uma posição mais ética e honesta.
Ingênuo? Talvez, mas, ainda assim, necessário.
Nada mudou desde 1939, nem nos EUA, nem no Brasil, e, provavelmente, nem em nenhum lugar do mundo, mas, se nos conformarmos, nada jamais mudará.
O único que o faz hesitar é o que aceita a proposta. "Jogue duas pedras". Ele fala sobre a vida, sem medo, sem ameaças de condenação, sem julgamentos.
Observar, sentir o gosto das coisas, rir, compartilhar. Amizade e acolhimento. Ajudar com o coração. Sair de si.
Curar o dedo. Curar o olhar.
Um filme sobre suicídio, sim, mas principalmente sobre a dor da vida e tudo que ela traz como desafio para o ser humano, assim como as recompensas para quem encontra maneiras proveitosas de lidar com ela.
Apenas senti falta de uma contextualização política maior, que seria útil para quem não é familiarizado com a história, as causas e a geopolítica do conflito.
Acho que, ali, o Trevor era mais o símbolo da humanidade do que o namorado. Quando ele explode aquelas bombas do gás, ela percebe que o ser humano também é capaz de coisas boas, de se sacrificar pelo outro. É quando muda de ideia quanto a desistir de se engajar, de lutar, de se doar.
O ser humano é "tudo o que Ares diz", mas "é muito mais do que isso". Ele diz que não merecemos sua compaixão, e ela percebe o significado do que Trevor disse, sobre não ser uma questão de merecimento, mas daquilo em que se acredita. "E eu acredito no amor", ela diz.
Ela está falando de amor pela humanidade, não de amor romântico. Isso é o que eu acho que torna o filme mais bonito. É uma mensagem explícita, que ela traz ao mesmo tempo com força e delicadeza - de uma forma que só uma heroína como a Mulher-Maravilha poderia fazer.
Este filme é para refletir. Não é para diversão. Sinceramente, não vi comédia nele. Acho equivocado encará-lo como tal. O que temos aqui é um drama psicológico. Um drama bastante pesado.
O filme narra, ainda que de maneira tortuosa, a história de um psicopata emocional – o protagonista.
É um filme extremamente violento. A mim, mesmo tendo falas vagas (e talvez um pouco justamente por causa disso), ele conseguiu transmitir, através do tom das conversas, a agressão e a dor envolvidas nas relações discutidas. O protagonista tem um modo de falar e um maneirismo que se repete, que tem pouca intensidade emocional, o que representa bem o que pode ser o caráter de uma pessoa como ele, com ausência total de sensibilidade.
O aspecto emocional aflora nas ex-namoradas, que também são, em conjunto, protagonistas do filme. É através delas – não necessariamente das falas, que em geral apenas aludem aos eventos traumáticos, mas do tom, do sentimento que transmitem – que percebemos a gravidade do que foi feito com elas, da qual ele parece sequer se dar conta, como o homem totalmente sem empatia que ele é. Suas lembranças dos fatos são vagas, superficiais, ao contrário das lembranças delas, intensamente marcadas na psique.
O filme mostra, de maneira contundente, que o que fazemos aos outros, no interior das relações amorosas e sexuais, tem um efeito enorme sobre suas vidas. Mostra como é importante responsabilizar-se perante os outros. Ele aborda, especificamente, a questão do abandono.
Um término deve ser feito com respeito. Na maioria das vezes, é dolorido, mas a dor pode ser amenizada se houver uma conversa honesta, para dar um ponto final. O protagonista deste filme é o caso extremo de alguém que abandona o outro sem qualquer explicação e simplesmente some. Mas, mesmo em casos menos extremos, pode haver muita dor acumulada se não há cuidado da parte dos membros do casal que está se tornando ex-casal, se não há clareza, se um não ouvir o outro. É uma dor que pode acabar sendo carregada para além da separação.
Porém, o filme mostra também que, às vezes, é inútil esperar que o outro nos ajude a lidar com nossas feridas. As ex-namoradas do protagonista tiveram que procurar, sozinhas, com maior ou menor sucesso, alívio para o sofrimento que ele lhes infligiu. Seu retorno não teve nada a ver com uma tentativa de responsabilizar-se ou fazer reparação, como ele sugere - ele acaba, ao contrário, causando mais estragos, ao cutucar feridas antigas e fazer ressurgirem emoções complicadas e com as quais é difícil lidar. A princípio, parece que ele pode ter sido motivado por seu narcisismo, sua vontade de absolver a si mesmo dos abusos que cometeu, ou, o que é mais provável, medir o quanto suas ações afetaram as ex, para ter a sensação egocêntrica de ter tido e ainda ter poder e importância em suas vidas, como alimento para a própria vaidade.
Mas, no final, a verdadeira (ou principal) motivação é ainda pior: ele é movido por seu desejo de encontrar material para sua escrita. O desejo de manter sua reputação de "intrépido cartografista da alma", como se gaba de ter sido descrito. Trata-se de um escritor sem imaginação e criatividade, como fica subentendido em várias falas. Um escritor que precisa ser um parasita de histórias reais, que envolvem pessoas reais. Para ter sucesso em suas coletas, ele usa os instrumentos que sempre utilizou: o abuso, a mentira e o engano.
Em um momento, quando uma das ex o questiona sobre um texto que ele escreveu, que contava detalhes de seu relacionamento, ele diz que “se trata de ficção”. Mas não se trata de ficção. Trata-se de fatos verídicos com roupagem de ficção. Trata-se de usar um ser humano para ter glória e lucro.
Sou escritor e essa é uma questão e tanto. Os(as) escritores(as) não têm como não basear-se na realidade que e em que vivem. Mas é necessário haver uma ética, que preserve pessoas reais de terem suas histórias sendo passadas como ficção para um público amplo. É como os homens que colocam fotos das ex-namoradas nuas na internet. A diferença é que, no caso de um escritor como o protagonista, a nudez é emocional.
O propósito do filme, para mim, é o de um alerta. Vale como uma boa reflexão sobre relacionamentos amorosos, útil tanto para evitar dores futuras, quanto para compreender melhor dores passadas. Às vezes, só se pode superá-las entendendo que o outro simplesmente não se importava, não era a pessoa que achávamos que era, e não merece que lhe demos importância. O que precisamos fazer é nos valorizar e nos importar com nós mesmos, independente do que foi e é feito conosco.
Não considero o filme ruim. Considero o protagonista ruim. Ruim como ser humano. Ruim no sentido de que ele não é mais do que um psicopata narcisista, que deixa muito sofrimento em seu rastro. Creio que parte do incômodo que o filme causa é devido ao fato de que temos a tendência de nos identificar com os protagonistas das histórias, e identificarmo-nos com este não é nada legal.
- Definição do dicionário Houaiss de “psicopatia”:
“Distúrbio mental grave em que o enfermo apresenta comportamentos antissociais e amorais sem demonstração de arrependimento ou remorso, incapacidade para amar e se relacionar com outras pessoas com laços afetivos profundos, egocentrismo extremo e incapacidade de aprender com a experiência.”
Na primeira vez em que vi esta comédia, eu era criança e lembro de ter gargalhado durante o filme inteiro. Assisti novamente hoje e, apesar de não ter dado muitas risadas, houve vários momentos de sorriso. Há algo de muito amável e inocente no personagem sem noção de Candy, tão bem interpretado, e sua amizade com a irmã da sequestrada, tornada co-investigadora. A trama novelesca e os personagens caricaturais se casam bem com o ridiculamente divertido Harry Crumb. Independente da minha avaliação deste filme, o terei sempre com carinho na minha lembrança.
Este filme, embora extremamente pesado, é belíssimo. Poucos filmes mexeram comigo tanto quanto ele.
Não tenho muito o que dizer sobre a situação da mãe. Dizer que é terrível não vai dar conta do sofrimento que seria viver na condição dela. E infelizmente, apesar de esta história não ser baseada em fatos verídicos, tais crimes realmente acontecem.
Lembro do caso de uma mulher que ficou trancada num porão por anos, até que finalmente conseguiu escapar.
Mas não consigo conter o impulso de falar sobre um outro personagem do filme, a instituição social "imprensa", e, por extensão, da nossa sociedade como um todo.
Me considero uma pessoa pacífica, sempre buscando a paz, mesmo que falhe às vezes. Mas, vendo o filme, confesso que minha reação imediata foi uma vontade de partir para cima daquela entrevistadora, quando ela fez aquela pergunta. Acho que quem viu o filme sabe de que pergunta estou falando. Mas só pra deixar claro, é quando ela insinua que a mãe teria sido mais amorosa com o filho se tivesse pedido para o agressor largar Jack em um hospital, para ser encontrado e criado fora do cativeiro.
Não vou entrar no mérito da questão levantada por ela. Acho que esse filme e essa questão, com inúmeras complexidades, poderão gerar muitas reflexões em aulas de ética, psicologia, teologia, entre outras, além de nas conversas de pessoas como eu, que não fazem esses estudos.
Mas o ato de fazer essa pergunta - na verdade uma acusação disfarçada de pergunta - para uma pessoa que havia passado por sete anos de cativeiro, por dois anos de cativeiro antes de dar à luz, é de uma crueldade sem tamanho.
Tudo o que a mãe precisava, desesperadamente, era ser acolhida, consolada, apoiada - e, mesmo assim, as feridas não fechariam facilmente. A pergunta da entrevistadora foi como cravar um punhal em um corte que já era profundo.
O fato é que essa entrevistadora reflete muito do que é a atitude da imprensa em nosso mundo. Quantas vezes já não vimos situações semelhantes, em que os repórteres perseguem as pessoas que estão passando por momentos de dor inimaginável, querendo depoimentos que poderão aumentar a audiência de seus telejornais - ou seja, aumentar o preço a cobrar das empresas para inserções nos intervalos comerciais. Ganhar mais dinheiro explorando o sofrimento alheio.
E tal imprensa, tal comportamento da imprensa, não existiria se não houvesse demanda. Se nós, como sociedade, não tivéssemos essa curiosidade inconsequente de se sentir próximo da dor de pessoas que nem conhecemos, de que nunca tínhamos ouvido falar e que esqueceremos mais cedo do que tarde.
Lidar com perdas extremas é dificílimo, e ser assediado por estranhos dificulta ainda mais. É preciso, na imensa maioria das vezes, ter privacidade, estar junto apenas a pessoas queridas, com quem pode haver um mínimo de conforto, no contexto de uma realidade sofrida. No máximo, podem ajudar pessoas capacitadas para isso, como médicos, psicólogos, assistentes sociais, policiais, bombeiros, dependendo da tragédia de que se trata. São pessoas que podem se colocar à disposição numa tentativa verdadeira de ajudar, não de satisfazer uma curiosidade.
No final das contas, quando me acalmei um pouco, tive vontade de dizer para a entrevistadora que tenho pena dela. O mal que fazemos ao outro sempre volta para nós, e o que ela fez foi uma grande maldade.
Claro que sei que se trata de ficção e que não dá para "entrar na tela" e interagir com as personagens. Mas o filme me envolveu tanto, me tocou tanto, que parecia que eu estava ali. A ficção permite uma identificação misteriosa com as personagens, suas vivências, suas emoções, que nos faz sofrer junto com elas.
É diferente de estranhos da vida real que não estão somente na tela, na nossa imaginação, como personagens de ficção. Esses estranhos são pessoas com uma vida própria, uma vida particular, cuja privacidade e maneira de lidar com o sofrimento devem ser plenamente respeitadas. Por mais que muitas vezes nossa compaixão com elas seja sincera, o melhor que podemos fazer é, no máximo, orar à distância e enviar nossas melhores energias, deixando às pessoas próximas a elas a possibilidade de estar ao seu lado presencialmente.
Eu estava gostando muito do filme até a parte final. Gosto tanto de finais "felizes" quanto de finais que não oferecem soluções, que transmitem a ideia de lidar com a inevitabilidade de coisas difíceis. Este filme teve para mim um tom suavemente sóbrio e melancólico (o tom que Adaline emanava, numa bela interpretação de Blake Lively) que me levava na segunda direção. Por isso, ele perdeu o encanto ao mesmo tempo em que a protagonista perdeu a sua mágica. Eu teria tido uma experiência muito mais significativa caso a condição dela fosse permanente, ou, pelo menos, caso o fim deixasse a questão no ar, para cada um imaginar o seu próprio final.
Achei que o episódio da bolsa de estudos foi resolvido muito facilmente, considerando que foi uma deslealdade muito grave. Me deu a impressão de que ela o perdoa apenas para não ficar sozinha como a mãe. A ideia de que se deve evitar estar solteira(o) a qualquer custo me parece equivocada. Mesmo se tratando de uma comédia romântica, ficou faltando uma elaboração maior, algo mais significativo que fizesse o protagonista se redimir.
A resolução da trama também não me agradou, mas o episódio acima foi o que mais pesou na minha avaliação.
Que pancada. Deviam avisar que você precisará reservar um tempo livre depois de assistir, para poder digerir a experiência de vivenciar uma obra que é quase uma tragédia grega transportada para a Coreia do Sul do início do século 21.
Li alguns dos comentários abaixo e, inevitavelmente, vou repetir algumas coisas, mas vamos lá.
“Casamento de Verdade” não é um filme sobre uma história de amor entre um casal, mas sobre a história de amor de uma mulher com sua família – especialmente seu pai e sua mãe.
Embora fale-se cada vez mais abertamente a respeito dela, a homossexualidade ainda é um tabu.
O pai de Jenny diz a ela, quando ela se revela: “Não é que eu esteja vivendo no passado, não estou. Sei que os tempos mudaram. Qualquer coisa vale hoje. Eu leio os jornais, eu assisto à televisão”. Mas a televisão mostra coisas distantes (ou aparentemente distantes), e muitas pessoas não estão preparadas para quando a realidade chega mais perto. No bairro da família de Jenny, nunca houve homossexuais, ou (como afirma o pai) se houve, foram embora sem que se ficasse sabendo.
O segredo da homossexualidade de Jenny passa por vários níveis. Ela não conta para a mãe e o pai, e mente durante anos, por temer sua reação. Quando finalmente conta, os dois, por sua vez, não querem contar para os outros, por temerem o “falar pelas costas”. A princípio, parece que é apenas a mãe que quer esconder a realidade, mas mais adiante percebemos que esse também é o desejo do pai, que ele simplesmente não conseguiu expressar – talvez nem para si mesmo.
“O que as pessoas vão dizer?” é uma preocupação que tem um exemplo extremo quando envolve um tabu, mas, no fim das contas, é uma questão que todos somos levados a enfrentar. Todos queremos ser aceitos, pela família, pelos amigos, pela comunidade, e o medo da rejeição pode ser devastador para pessoas na situação de Jenny, sua mãe e seu pai. Muitas vezes, como uma espécie de mecanismo de defesa, rejeita-se o outro antes mesmo de ser rejeitado, como ilustra o caso do irmão de Jenny. Ela temia sua rejeição e se distanciou, deixando de ter a oportunidade de saber que ele seria o mais acolhedor de todos.
Ela repete esse comportamento com o pai, quando afirma que se eles não a aceitarem ela nunca mais os procurará e não sentirá sua falta – o que claramente, tendo em vista a intensidade com que a questão mexe com ela, não é verdade. Isso é confirmado ao longo de cenas seguintes, como no provador da loja de vestidos e na ocasião do aniversário do pai. Por ter passado anos reprimindo a verdade de quem ela é para a família, por temer a rejeição, e provavelmente, em algum nível, rejeitando a si mesma, ao decidir aceitar-se, o faz explosivamente e com risco de derrubar pontes preciosas.
Mas é exatamente aquilo de que sua mãe tinha medo – falarem mal dela pelas costas – o que catalisa sua aceitação definitiva da filha. Ela presencia as condenações furtivas das pessoas que tinha como amigas e não suporta ouvi-las ofender a sua filha, que é cheia de virtudes e quer apenas ser feliz em uma relação plena com a pessoa que ama. Finalmente se dá conta de que perder o amor que compartilha com a filha é muito pior do que ser rejeitada por pessoas mesquinhas.
O catalisador da aceitação, para o pai, é o seu amigo de infância, com quem trabalha desde o início de suas carreiras. Fica claro que esse amigo conhece Jenny e sabe que ela é uma boa pessoa. Aos poucos, por perceber que tudo de ruim que poderia pensar antes a respeito de homossexuais não passava de preconceito e ignorância, mudou seu ponto de vista. O ideal seria o pai de Jenny mudar o seu por si mesmo, mas estava sofrendo demais para conseguir. Aí se mostra a importância de ter amigos verdadeiros. A opinião do amigo é algo valioso, e o ajuda a se libertar da prisão em que havia se trancado. A prisão em que não existe mais amor entre pai e filha. Ou melhor dizendo: em que o amor entre os dois, que sempre existiu e sempre existirá, não flui mais, ficando estancado dentro de cada um, com todos os danos que isso pode causar.
Quanto à personagem da noiva de Jenny, senti falta de uma participação maior. Não seria para contar a história de amor das duas, mas sim a história de como o casal se integra à família de Jenny. Não há praticamente nenhum diálogo entre Kitty e a família de sua noiva. Isso é compreensível em relação ao pai, já que ele aparece apenas em cima da hora do casamento, mas creio que uma personagem como essa teria uma importância muito maior no processo de conflito e reconciliação do que o que foi exposto no filme. Mesmo os diálogos entre as duas não revelam com profundidade a intimidade e a cumplicidade que seriam de se esperar com cinco anos de relacionamento, e que certamente seriam de grande valor para Jenny no período narrado no filme. O casamento é um ritual que marca o fato de que pessoas se tornaram parte das famílias das outras, para o bem ou para o mal (ou as duas coisas). A noiva de Jenny é uma parte tão importante dessa nova família quanto a sua família original, e a integração de ambas é algo muito relevante para ser deixado de lado.
Espero que filmes como este contribuam para que esse tema deixe de ser um tabu, para que mais pessoas possam perceber que orientação sexual não tem nada a ver com caráter, e para que famílias sejam poupadas de passar por tanto sofrimento devido à cegueira do preconceito.
Seja a um endereço, a um trabalho ou a uma relação, Frances parece não pertencer, movendo-se sem ter o leme da própria vida, indo e vindo como numa dança aleatória e inconstante. Ela se ilude quanto às possibilidades de ser bem sucedida na profissão, dá às suas amizades um valor maior do que a outra pessoa provavelmente dá, não consegue uma fonte de renda estável ou suficiente para se manter em um apartamento.
Frances é uma alma ingênua, das que saem correndo e dançando pelas calçadas. É a sonhadora que se atrapalha com a vida prática, mal conseguindo pagar uma conta de restaurante, mesmo tendo dinheiro para isso. Ao mesmo tempo em que pode ser sagaz e poética, demonstra imaturidade em muito do que diz e em muitas de suas decisões. É possessiva com a melhor amiga, o que leva ao desentendimento entre as duas. Após descobrir que ela vai se mudar para o exterior e ouvir histórias sobre Paris, durante um jantar, resolve fazer uma viagem de um fim de semana à cidade, precisando se endividar.
Mas, quando se dá conta de que a vida perfeita só existe nas redes sociais, de que não é mais uma estudante, de que o tempo passou, a ponto de não ser mais uma loucura ficar grávida, ela percebe que é necessário encontrar um caminho e pôr os pés no chão, mesmo que seja áspero como o asfalto. É possível assumir as imperfeições da vida, com suas frustrações e dificuldades, e continuar rindo e dançando em torno do chafariz, transformando o que parecem ser erros em uma coreografia de costuras. O lugar não precisa ser o do encaixe perfeito. Às vezes está tudo bem não caber direito. Sempre dá para dobrar.
Várias pessoas se decepcionaram com o filme, por terem descoberto os truques na metade do filme. Porém, para mim, o que o filme oferece vai além da descoberta desses truques.
O fundamental, aqui, é a personalidade dos protagonistas e a relação entre os dois. É a carga emocional que se inicia com a ambição desmedida de Borden, que leva à morte da namorada de Angier e ao seu consequente rancor, igualmente desmedido. É o processo da obsessão que têm de descobrir o "segredo" um do outro, de superar pela inteligência um ao outro, de obter mais aplausos e mais fama do que o outro. São personagens extremos, sim, em seus ressentimentos, em sua vaidade, em seu orgulho, e têm um no outro a razão para a própria existência. De certo modo, são os gêmeos e clones um do outro, como a moeda de duas caras com que Borden presenteia o garoto da plateia, que chora porque sabe que um pássaro morreu, para que seu irmão aparecesse em seu lugar. Exatamente como um Angier morre afogado em cada apresentação e como um dos Borden morre enforcado na prisão.
Os sacrifícios que ambos fazem em prol da sua obsessão terminam em morte e vazio, seja dos próprios ilusionistas ou das pessoas que lhes são íntimas. No entanto, é espantoso observar até onde vai a sua persistência e determinação. No caso de Borden, para viver a sua arte, duas pessoas sacrificam a própria individualidade por uma vida inteira, amando sempre pela metade, um dia sim, um dia não. Angier não tem um momento de paz, abdica de uma vida afetiva e passa, vez após vez, pela agonia do afogamento, sempre muito distante de se sentir em casa, como indica Cutter no final.
Certamente não são personagens modelo. Na verdade, são imaturos e até perversos. Mas são muito interessantes em sua insanidade, fortes e fracos ao mesmo tempo.
Toda a parte técnica do filme, cenografia, figurino, maquiagem, fotografia, é excelente. E, acima de tudo, a interpretação dos atores e atrizes é magistral, conferindo aos papéis a densidade requerida, sem a qual o filme não funcionaria.
Aqueles que assistirem ao filme se focando somente no segredo dos truques possivelmente ficarão decepcionados, mas quem quiser assistir a um filme que explora, em seus extremos, a psique humana, tem chances maiores de gostar.
Chaudhvin Ka Chand - A Lua do 14º Dia
4.5 4O filme tem sérios problemas quanto ao lugar e a condição da mulher, isso é claro.
Mas, descontando o contexto social torto em que se desenrola, explora conflitos internos e sentimentos humanos como lealdade, amor, perda e sacrifício de forma magistral, sob a liderança do casal de protagonistas, que nos presenteiam com atuações magníficas.
Guru Dutt e Waheeda Rehman. Que dupla sublime.
O Passado Não Perdoa
3.6 57 Assista AgoraNão considero este filme bom por alguma mensagem que ele possa transmitir, mas pelo potencial de reflexão que ele apresenta, sobre segregação, ética, preconceito, colonialismo, violência e parentesco.
Um Novo Começo
2.6 57A última frase da personagem da Anna, na cena pós-créditos, me fez enxergar o filme de um modo totalmente novo.
"Quando os dois transam, ela é virgem. Isso vai constar no livro?"
(Ela se refere à protagonista do romance erótico em que está trabalhando com a cunhada e a amiga)
Depois que ela disse isso, retornei a vários momentos da experiência da personagem que mudaram completamente o entendimento que tinha dela.
O tal relacionamento cujo fim a levou a Chicago nunca é explicado. Ela recusa o avanço do cara na festa e em seguida desaba. Ela recusa o avanço do Kevin na primeira vez em que vai à casa dele e na próxima cena em que aparece tem a ideia de escrever um romance erótico com Kelly, demonstrando ter um marcado interesse por essa literatura. Está sempre constrangida quando está sozinha com o Kevin. Quer comprar um presente, mas acaba não comprando por não saber qual seria o "limite", e é impactada ao receber, da parte dele, um que foi cuidadosamente pensado para ela, especificamente. Quando transa com ele, diz que está "testando" algumas coisas, para ver se gosta.
Acho que reduzir a Jenny a uma pessoa egoísta e irresponsável não leva em conta a complexidade da personagem.
O pai e a mãe dos irmãos não são mencionados em nenhum momento, embora seja natal. É o sinal de uma ausência significativa. Os da cunhada também não, o que é um sinal de identificação entre eles.
Sim, Jenny é uma personagem imatura, mas não por não ter bom caráter. Ela, mais do que tudo, é alguém extremamente frágil emocionalmente. Tão frágil que desaba quando acha que está tomando um fora, depois de o cara com quem está ficando dizer que não pode dormir com ela, porque precisa acordar cedo para ir ao encontro de natal com a mãe.
E, em meio a tudo isso, sua presença provoca mudanças positivas na vida do irmão e da cunhada como casal, abrindo novas possibilidades para arejar um contexto que poderia, com o tempo, ficar tão sufocante quanto a fumaça de uma pizza queimada se espalhando pela casa.
Com todas as falhas e imperfeições, erros e desentendimentos, o afeto se estabelece entre os personagens. Ele os fortalece como seres humanos e como família, que provavelmente nunca tiveram antes como uma real estrutura.
Além da Ilusão
2.3 91Adorei a Natalie Portman falando francês.
O Preço do Amanhã
3.6 2,9K Assista Agora"Will: Como dá para você viver vendo pessoas morrerem bem ao seu lado?
Sylvia: Você não vê. Você fecha os olhos."
O mundo precisa de mais olhos abertos.
-
"Will: How can you live with yourself watching people die right next to you?
Sylvia: You don't watch. You close your eyes."
1984
3.7 540Extremamente relevante hoje, com enxurradas de informações falsas sendo "compartilhadas" nas redes sociais e se tornando verdade na mente das pessoas, apenas por estarem sendo reproduzidas (isso para não falar na imprensa e na mídia tradicional, que sempre teve e ainda tem esse poder de difusão de crenças e valores – no próprio filme, ela é um instrumento crucial de unificação de mentalidades, de construção e destruição de “fatos”, não só do presente, como do passado). Parece que é, mais do que nunca, necessário investigar e estar alerta à realidade que é criada e difundida, evitando acreditar automaticamente em tudo o que se lê ou ouve – principalmente quando o que lemos ou ouvimos é feito sob medida para confirmar noções que já possuímos e cultivamos. É necessário também tomar cuidado para não se tornar a "polícia do pensamento". A intolerância com opiniões e versões diferentes da realidade, muitas vezes, é pautada por emoções como as cultivadas pelo Grande Irmão - o ódio e a definição de um inimigo comum a ser massacrado e eliminado, ao invés da razão, do equilíbrio e da percepção de complexidades e nuances. O totalitarismo do pensamento nem sempre tem necessidade de um aparelho estatal tradicional e fechado para exercer e expandir o seu poder.
A Mulher Faz o Homem
4.3 171Além de um belo drama,
uma denúncia inspirada de como interesses empresariais intrometem-se na política, que se torna movida pelo dinheiro, e de como a grande imprensa (compartilhando seus interesses, já que é sustentada por eles) atua em seu favor, para moldar a opinião pública, de acordo com o que lhe é vantajoso.
Valorização dos ideais de integridade e da luta para torná-los realidade, mesmo frente a obstáculos aparentemente insuperáveis.
Fé no companheirismo e na capacidade de inspirar e elevar as pessoas a uma posição mais ética e honesta.
Ingênuo? Talvez, mas, ainda assim, necessário.
Nada mudou desde 1939, nem nos EUA, nem no Brasil, e, provavelmente, nem em nenhum lugar do mundo, mas, se nos conformarmos, nada jamais mudará.
Gosto de Cereja
4.0 224O único que o faz hesitar é o que aceita a proposta. "Jogue duas pedras". Ele fala sobre a vida, sem medo, sem ameaças de condenação, sem julgamentos.
Observar, sentir o gosto das coisas, rir, compartilhar. Amizade e acolhimento. Ajudar com o coração. Sair de si.
Curar o dedo. Curar o olhar.
Um filme sobre suicídio, sim, mas principalmente sobre a dor da vida e tudo que ela traz como desafio para o ser humano, assim como as recompensas para quem encontra maneiras proveitosas de lidar com ela.
Retorno a Homs
3.8 3Visceral e tocante.
Apenas senti falta de uma contextualização política maior, que seria útil para quem não é familiarizado com a história, as causas e a geopolítica do conflito.
Mulher-Maravilha
4.1 2,9K Assista AgoraHá quem pense que a motivação da Diana para liberar todos os seus poderes é
a morte do namorado. Isso realmente seria um clichê e iria contra a proposta de empoderamento para as mulheres que o filme transmite.
Mas eu interpreto de maneira diferente.
Acho que, ali, o Trevor era mais o símbolo da humanidade do que o namorado. Quando ele explode aquelas bombas do gás, ela percebe que o ser humano também é capaz de coisas boas, de se sacrificar pelo outro. É quando muda de ideia quanto a desistir de se engajar, de lutar, de se doar.
O ser humano é "tudo o que Ares diz", mas "é muito mais do que isso". Ele diz que não merecemos sua compaixão, e ela percebe o significado do que Trevor disse, sobre não ser uma questão de merecimento, mas daquilo em que se acredita. "E eu acredito no amor", ela diz.
Ela está falando de amor pela humanidade, não de amor romântico. Isso é o que eu acho que torna o filme mais bonito. É uma mensagem explícita, que ela traz ao mesmo tempo com força e delicadeza - de uma forma que só uma heroína como a Mulher-Maravilha poderia fazer.
Superman: O Retorno
2.6 778 Assista AgoraAcho engraçado que a Lois sai desse filme sem um arranhão... :)
Algumas Garotas
2.0 138Este filme é para refletir. Não é para diversão. Sinceramente, não vi comédia nele. Acho equivocado encará-lo como tal. O que temos aqui é um drama psicológico. Um drama bastante pesado.
O filme narra, ainda que de maneira tortuosa, a história de um psicopata emocional – o protagonista.
É um filme extremamente violento. A mim, mesmo tendo falas vagas (e talvez um pouco justamente por causa disso), ele conseguiu transmitir, através do tom das conversas, a agressão e a dor envolvidas nas relações discutidas. O protagonista tem um modo de falar e um maneirismo que se repete, que tem pouca intensidade emocional, o que representa bem o que pode ser o caráter de uma pessoa como ele, com ausência total de sensibilidade.
O aspecto emocional aflora nas ex-namoradas, que também são, em conjunto, protagonistas do filme. É através delas – não necessariamente das falas, que em geral apenas aludem aos eventos traumáticos, mas do tom, do sentimento que transmitem – que percebemos a gravidade do que foi feito com elas, da qual ele parece sequer se dar conta, como o homem totalmente sem empatia que ele é. Suas lembranças dos fatos são vagas, superficiais, ao contrário das lembranças delas, intensamente marcadas na psique.
O filme mostra, de maneira contundente, que o que fazemos aos outros, no interior das relações amorosas e sexuais, tem um efeito enorme sobre suas vidas. Mostra como é importante responsabilizar-se perante os outros. Ele aborda, especificamente, a questão do abandono.
Um término deve ser feito com respeito. Na maioria das vezes, é dolorido, mas a dor pode ser amenizada se houver uma conversa honesta, para dar um ponto final. O protagonista deste filme é o caso extremo de alguém que abandona o outro sem qualquer explicação e simplesmente some. Mas, mesmo em casos menos extremos, pode haver muita dor acumulada se não há cuidado da parte dos membros do casal que está se tornando ex-casal, se não há clareza, se um não ouvir o outro. É uma dor que pode acabar sendo carregada para além da separação.
Porém, o filme mostra também que, às vezes, é inútil esperar que o outro nos ajude a lidar com nossas feridas. As ex-namoradas do protagonista tiveram que procurar, sozinhas, com maior ou menor sucesso, alívio para o sofrimento que ele lhes infligiu. Seu retorno não teve nada a ver com uma tentativa de responsabilizar-se ou fazer reparação, como ele sugere - ele acaba, ao contrário, causando mais estragos, ao cutucar feridas antigas e fazer ressurgirem emoções complicadas e com as quais é difícil lidar. A princípio, parece que ele pode ter sido motivado por seu narcisismo, sua vontade de absolver a si mesmo dos abusos que cometeu, ou, o que é mais provável, medir o quanto suas ações afetaram as ex, para ter a sensação egocêntrica de ter tido e ainda ter poder e importância em suas vidas, como alimento para a própria vaidade.
Mas, no final, a verdadeira (ou principal) motivação é ainda pior: ele é movido por seu desejo de encontrar material para sua escrita. O desejo de manter sua reputação de "intrépido cartografista da alma", como se gaba de ter sido descrito. Trata-se de um escritor sem imaginação e criatividade, como fica subentendido em várias falas. Um escritor que precisa ser um parasita de histórias reais, que envolvem pessoas reais. Para ter sucesso em suas coletas, ele usa os instrumentos que sempre utilizou: o abuso, a mentira e o engano.
Em um momento, quando uma das ex o questiona sobre um texto que ele escreveu, que contava detalhes de seu relacionamento, ele diz que “se trata de ficção”. Mas não se trata de ficção. Trata-se de fatos verídicos com roupagem de ficção. Trata-se de usar um ser humano para ter glória e lucro.
Sou escritor e essa é uma questão e tanto. Os(as) escritores(as) não têm como não basear-se na realidade que e em que vivem. Mas é necessário haver uma ética, que preserve pessoas reais de terem suas histórias sendo passadas como ficção para um público amplo. É como os homens que colocam fotos das ex-namoradas nuas na internet. A diferença é que, no caso de um escritor como o protagonista, a nudez é emocional.
O propósito do filme, para mim, é o de um alerta. Vale como uma boa reflexão sobre relacionamentos amorosos, útil tanto para evitar dores futuras, quanto para compreender melhor dores passadas. Às vezes, só se pode superá-las entendendo que o outro simplesmente não se importava, não era a pessoa que achávamos que era, e não merece que lhe demos importância. O que precisamos fazer é nos valorizar e nos importar com nós mesmos, independente do que foi e é feito conosco.
Não considero o filme ruim. Considero o protagonista ruim. Ruim como ser humano. Ruim no sentido de que ele não é mais do que um psicopata narcisista, que deixa muito sofrimento em seu rastro. Creio que parte do incômodo que o filme causa é devido ao fato de que temos a tendência de nos identificar com os protagonistas das histórias, e identificarmo-nos com este não é nada legal.
- Definição do dicionário Houaiss de “psicopatia”:
“Distúrbio mental grave em que o enfermo apresenta comportamentos antissociais e amorais sem demonstração de arrependimento ou remorso, incapacidade para amar e se relacionar com outras pessoas com laços afetivos profundos, egocentrismo extremo e incapacidade de aprender com a experiência.”
Quem é Harry Crumb?
3.2 20 Assista AgoraNa primeira vez em que vi esta comédia, eu era criança e lembro de ter gargalhado durante o filme inteiro. Assisti novamente hoje e, apesar de não ter dado muitas risadas, houve vários momentos de sorriso. Há algo de muito amável e inocente no personagem sem noção de Candy, tão bem interpretado, e sua amizade com a irmã da sequestrada, tornada co-investigadora. A trama novelesca e os personagens caricaturais se casam bem com o ridiculamente divertido Harry Crumb. Independente da minha avaliação deste filme, o terei sempre com carinho na minha lembrança.
O Quarto de Jack
4.4 3,3K Assista AgoraEste filme, embora extremamente pesado, é belíssimo. Poucos filmes mexeram comigo tanto quanto ele.
Não tenho muito o que dizer sobre a situação da mãe. Dizer que é terrível não vai dar conta do sofrimento que seria viver na condição dela. E infelizmente, apesar de esta história não ser baseada em fatos verídicos, tais crimes realmente acontecem.
Lembro do caso de uma mulher que ficou trancada num porão por anos, até que finalmente conseguiu escapar.
Mas não consigo conter o impulso de falar sobre um outro personagem do filme, a instituição social "imprensa", e, por extensão, da nossa sociedade como um todo.
Me considero uma pessoa pacífica, sempre buscando a paz, mesmo que falhe às vezes. Mas, vendo o filme, confesso que minha reação imediata foi uma vontade de partir para cima daquela entrevistadora, quando ela fez aquela pergunta. Acho que quem viu o filme sabe de que pergunta estou falando. Mas só pra deixar claro, é quando ela insinua que a mãe teria sido mais amorosa com o filho se tivesse pedido para o agressor largar Jack em um hospital, para ser encontrado e criado fora do cativeiro.
Não vou entrar no mérito da questão levantada por ela. Acho que esse filme e essa questão, com inúmeras complexidades, poderão gerar muitas reflexões em aulas de ética, psicologia, teologia, entre outras, além de nas conversas de pessoas como eu, que não fazem esses estudos.
Mas o ato de fazer essa pergunta - na verdade uma acusação disfarçada de pergunta - para uma pessoa que havia passado por sete anos de cativeiro, por dois anos de cativeiro antes de dar à luz, é de uma crueldade sem tamanho.
Tudo o que a mãe precisava, desesperadamente, era ser acolhida, consolada, apoiada - e, mesmo assim, as feridas não fechariam facilmente. A pergunta da entrevistadora foi como cravar um punhal em um corte que já era profundo.
O fato é que essa entrevistadora reflete muito do que é a atitude da imprensa em nosso mundo. Quantas vezes já não vimos situações semelhantes, em que os repórteres perseguem as pessoas que estão passando por momentos de dor inimaginável, querendo depoimentos que poderão aumentar a audiência de seus telejornais - ou seja, aumentar o preço a cobrar das empresas para inserções nos intervalos comerciais. Ganhar mais dinheiro explorando o sofrimento alheio.
E tal imprensa, tal comportamento da imprensa, não existiria se não houvesse demanda. Se nós, como sociedade, não tivéssemos essa curiosidade inconsequente de se sentir próximo da dor de pessoas que nem conhecemos, de que nunca tínhamos ouvido falar e que esqueceremos mais cedo do que tarde.
Lidar com perdas extremas é dificílimo, e ser assediado por estranhos dificulta ainda mais. É preciso, na imensa maioria das vezes, ter privacidade, estar junto apenas a pessoas queridas, com quem pode haver um mínimo de conforto, no contexto de uma realidade sofrida. No máximo, podem ajudar pessoas capacitadas para isso, como médicos, psicólogos, assistentes sociais, policiais, bombeiros, dependendo da tragédia de que se trata. São pessoas que podem se colocar à disposição numa tentativa verdadeira de ajudar, não de satisfazer uma curiosidade.
No final das contas, quando me acalmei um pouco, tive vontade de dizer para a entrevistadora que tenho pena dela. O mal que fazemos ao outro sempre volta para nós, e o que ela fez foi uma grande maldade.
Claro que sei que se trata de ficção e que não dá para "entrar na tela" e interagir com as personagens. Mas o filme me envolveu tanto, me tocou tanto, que parecia que eu estava ali. A ficção permite uma identificação misteriosa com as personagens, suas vivências, suas emoções, que nos faz sofrer junto com elas.
É diferente de estranhos da vida real que não estão somente na tela, na nossa imaginação, como personagens de ficção. Esses estranhos são pessoas com uma vida própria, uma vida particular, cuja privacidade e maneira de lidar com o sofrimento devem ser plenamente respeitadas. Por mais que muitas vezes nossa compaixão com elas seja sincera, o melhor que podemos fazer é, no máximo, orar à distância e enviar nossas melhores energias, deixando às pessoas próximas a elas a possibilidade de estar ao seu lado presencialmente.
A Incrível História de Adaline
3.7 1,5K Assista AgoraEu estava gostando muito do filme até a parte final. Gosto tanto de finais "felizes" quanto de finais que não oferecem soluções, que transmitem a ideia de lidar com a inevitabilidade de coisas difíceis. Este filme teve para mim um tom suavemente sóbrio e melancólico (o tom que Adaline emanava, numa bela interpretação de Blake Lively) que me levava na segunda direção. Por isso, ele perdeu o encanto ao mesmo tempo em que a protagonista perdeu a sua mágica. Eu teria tido uma experiência muito mais significativa caso a condição dela fosse permanente, ou, pelo menos, caso o fim deixasse a questão no ar, para cada um imaginar o seu próprio final.
O Substituto
4.4 1,7KEscrevi um texto sobre este filme na revista virtual Obvious.
Aparentemente, o Filmow não permite links nos comentários, então, se alguém quiser ler, é só pesquisar o título dele no google:
o que é um final feliz em realidades precárias? obvious
Feitiço do Tempo
3.9 754Escrevi uma análise sobre este filme (que é o que eu já vi de novo mais vezes em minha vida, rs) na revista virtual Obvious. OBS: com spoilers.
Aparentemente, o Filmow não permite colocar links nos comentários. Então, se alguém quiser ler, digite o seguinte no google:
é possível fazer diferente? obvious
Sentidos do Amor
4.1 1,2KEscrevi um texto sobre este filme na revista virtual Obvious. Quem se interessar em ler, pesquise no Google o título do artigo:
O toque como último alento em um mundo vazio de sentido
Amor e Turbulência
3.2 104Gostei muito do argumento, da montagem, da cenografia e dos efeitos visuais.
Mas não de alguns detalhes importantes do roteiro.
Achei que o episódio da bolsa de estudos foi resolvido muito facilmente, considerando que foi uma deslealdade muito grave. Me deu a impressão de que ela o perdoa apenas para não ficar sozinha como a mãe. A ideia de que se deve evitar estar solteira(o) a qualquer custo me parece equivocada. Mesmo se tratando de uma comédia romântica, ficou faltando uma elaboração maior, algo mais significativo que fizesse o protagonista se redimir.
A resolução da trama também não me agradou, mas o episódio acima foi o que mais pesou na minha avaliação.
Oldboy
4.3 2,3K Assista AgoraAcabei de ver "Oldboy" pela primeira vez.
Impossível ficar indiferente a este filme.
Que pancada. Deviam avisar que você precisará reservar um tempo livre depois de assistir, para poder digerir a experiência de vivenciar uma obra que é quase uma tragédia grega transportada para a Coreia do Sul do início do século 21.
Cisne Negro
4.2 7,9K Assista AgoraEste filme incrível gerou (e provavelmente continuará gerando) uma enxurrada de artigos
das áreas da Psicologia e da Psiquiatria,
Quem quiser ler alguns, é só pesquisar
Cisne Negro esquizofrenia
Casamento de Verdade
3.2 203 Assista grátisLi alguns dos comentários abaixo e, inevitavelmente, vou repetir algumas coisas, mas vamos lá.
“Casamento de Verdade” não é um filme sobre uma história de amor entre um casal, mas sobre a história de amor de uma mulher com sua família – especialmente seu pai e sua mãe.
Embora fale-se cada vez mais abertamente a respeito dela, a homossexualidade ainda é um tabu.
O pai de Jenny diz a ela, quando ela se revela: “Não é que eu esteja vivendo no passado, não estou. Sei que os tempos mudaram. Qualquer coisa vale hoje. Eu leio os jornais, eu assisto à televisão”. Mas a televisão mostra coisas distantes (ou aparentemente distantes), e muitas pessoas não estão preparadas para quando a realidade chega mais perto. No bairro da família de Jenny, nunca houve homossexuais, ou (como afirma o pai) se houve, foram embora sem que se ficasse sabendo.
O segredo da homossexualidade de Jenny passa por vários níveis. Ela não conta para a mãe e o pai, e mente durante anos, por temer sua reação. Quando finalmente conta, os dois, por sua vez, não querem contar para os outros, por temerem o “falar pelas costas”. A princípio, parece que é apenas a mãe que quer esconder a realidade, mas mais adiante percebemos que esse também é o desejo do pai, que ele simplesmente não conseguiu expressar – talvez nem para si mesmo.
“O que as pessoas vão dizer?” é uma preocupação que tem um exemplo extremo quando envolve um tabu, mas, no fim das contas, é uma questão que todos somos levados a enfrentar. Todos queremos ser aceitos, pela família, pelos amigos, pela comunidade, e o medo da rejeição pode ser devastador para pessoas na situação de Jenny, sua mãe e seu pai. Muitas vezes, como uma espécie de mecanismo de defesa, rejeita-se o outro antes mesmo de ser rejeitado, como ilustra o caso do irmão de Jenny. Ela temia sua rejeição e se distanciou, deixando de ter a oportunidade de saber que ele seria o mais acolhedor de todos.
Ela repete esse comportamento com o pai, quando afirma que se eles não a aceitarem ela nunca mais os procurará e não sentirá sua falta – o que claramente, tendo em vista a intensidade com que a questão mexe com ela, não é verdade. Isso é confirmado ao longo de cenas seguintes, como no provador da loja de vestidos e na ocasião do aniversário do pai. Por ter passado anos reprimindo a verdade de quem ela é para a família, por temer a rejeição, e provavelmente, em algum nível, rejeitando a si mesma, ao decidir aceitar-se, o faz explosivamente e com risco de derrubar pontes preciosas.
Mas é exatamente aquilo de que sua mãe tinha medo – falarem mal dela pelas costas – o que catalisa sua aceitação definitiva da filha. Ela presencia as condenações furtivas das pessoas que tinha como amigas e não suporta ouvi-las ofender a sua filha, que é cheia de virtudes e quer apenas ser feliz em uma relação plena com a pessoa que ama. Finalmente se dá conta de que perder o amor que compartilha com a filha é muito pior do que ser rejeitada por pessoas mesquinhas.
O catalisador da aceitação, para o pai, é o seu amigo de infância, com quem trabalha desde o início de suas carreiras. Fica claro que esse amigo conhece Jenny e sabe que ela é uma boa pessoa. Aos poucos, por perceber que tudo de ruim que poderia pensar antes a respeito de homossexuais não passava de preconceito e ignorância, mudou seu ponto de vista. O ideal seria o pai de Jenny mudar o seu por si mesmo, mas estava sofrendo demais para conseguir. Aí se mostra a importância de ter amigos verdadeiros. A opinião do amigo é algo valioso, e o ajuda a se libertar da prisão em que havia se trancado. A prisão em que não existe mais amor entre pai e filha. Ou melhor dizendo: em que o amor entre os dois, que sempre existiu e sempre existirá, não flui mais, ficando estancado dentro de cada um, com todos os danos que isso pode causar.
Quanto à personagem da noiva de Jenny, senti falta de uma participação maior. Não seria para contar a história de amor das duas, mas sim a história de como o casal se integra à família de Jenny. Não há praticamente nenhum diálogo entre Kitty e a família de sua noiva. Isso é compreensível em relação ao pai, já que ele aparece apenas em cima da hora do casamento, mas creio que uma personagem como essa teria uma importância muito maior no processo de conflito e reconciliação do que o que foi exposto no filme. Mesmo os diálogos entre as duas não revelam com profundidade a intimidade e a cumplicidade que seriam de se esperar com cinco anos de relacionamento, e que certamente seriam de grande valor para Jenny no período narrado no filme. O casamento é um ritual que marca o fato de que pessoas se tornaram parte das famílias das outras, para o bem ou para o mal (ou as duas coisas). A noiva de Jenny é uma parte tão importante dessa nova família quanto a sua família original, e a integração de ambas é algo muito relevante para ser deixado de lado.
Espero que filmes como este contribuam para que esse tema deixe de ser um tabu, para que mais pessoas possam perceber que orientação sexual não tem nada a ver com caráter, e para que famílias sejam poupadas de passar por tanto sofrimento devido à cegueira do preconceito.
Frances Ha
4.1 1,5K Assista AgoraFrances Ha é um filme que fala sobre a busca de um lugar.
Seja a um endereço, a um trabalho ou a uma relação, Frances parece não pertencer, movendo-se sem ter o leme da própria vida, indo e vindo como numa dança aleatória e inconstante. Ela se ilude quanto às possibilidades de ser bem sucedida na profissão, dá às suas amizades um valor maior do que a outra pessoa provavelmente dá, não consegue uma fonte de renda estável ou suficiente para se manter em um apartamento.
Frances é uma alma ingênua, das que saem correndo e dançando pelas calçadas. É a sonhadora que se atrapalha com a vida prática, mal conseguindo pagar uma conta de restaurante, mesmo tendo dinheiro para isso. Ao mesmo tempo em que pode ser sagaz e poética, demonstra imaturidade em muito do que diz e em muitas de suas decisões. É possessiva com a melhor amiga, o que leva ao desentendimento entre as duas. Após descobrir que ela vai se mudar para o exterior e ouvir histórias sobre Paris, durante um jantar, resolve fazer uma viagem de um fim de semana à cidade, precisando se endividar.
Mas, quando se dá conta de que a vida perfeita só existe nas redes sociais, de que não é mais uma estudante, de que o tempo passou, a ponto de não ser mais uma loucura ficar grávida, ela percebe que é necessário encontrar um caminho e pôr os pés no chão, mesmo que seja áspero como o asfalto. É possível assumir as imperfeições da vida, com suas frustrações e dificuldades, e continuar rindo e dançando em torno do chafariz, transformando o que parecem ser erros em uma coreografia de costuras. O lugar não precisa ser o do encaixe perfeito. Às vezes está tudo bem não caber direito. Sempre dá para dobrar.
O Grande Truque
4.2 2,0K Assista AgoraVárias pessoas se decepcionaram com o filme, por terem descoberto os truques na metade do filme. Porém, para mim, o que o filme oferece vai além da descoberta desses truques.
O fundamental, aqui, é a personalidade dos protagonistas e a relação entre os dois. É a carga emocional que se inicia com a ambição desmedida de Borden, que leva à morte da namorada de Angier e ao seu consequente rancor, igualmente desmedido. É o processo da obsessão que têm de descobrir o "segredo" um do outro, de superar pela inteligência um ao outro, de obter mais aplausos e mais fama do que o outro. São personagens extremos, sim, em seus ressentimentos, em sua vaidade, em seu orgulho, e têm um no outro a razão para a própria existência. De certo modo, são os gêmeos e clones um do outro, como a moeda de duas caras com que Borden presenteia o garoto da plateia, que chora porque sabe que um pássaro morreu, para que seu irmão aparecesse em seu lugar. Exatamente como um Angier morre afogado em cada apresentação e como um dos Borden morre enforcado na prisão.
Os sacrifícios que ambos fazem em prol da sua obsessão terminam em morte e vazio, seja dos próprios ilusionistas ou das pessoas que lhes são íntimas. No entanto, é espantoso observar até onde vai a sua persistência e determinação. No caso de Borden, para viver a sua arte, duas pessoas sacrificam a própria individualidade por uma vida inteira, amando sempre pela metade, um dia sim, um dia não. Angier não tem um momento de paz, abdica de uma vida afetiva e passa, vez após vez, pela agonia do afogamento, sempre muito distante de se sentir em casa, como indica Cutter no final.
Certamente não são personagens modelo. Na verdade, são imaturos e até perversos. Mas são muito interessantes em sua insanidade, fortes e fracos ao mesmo tempo.
Toda a parte técnica do filme, cenografia, figurino, maquiagem, fotografia, é excelente. E, acima de tudo, a interpretação dos atores e atrizes é magistral, conferindo aos papéis a densidade requerida, sem a qual o filme não funcionaria.
Aqueles que assistirem ao filme se focando somente no segredo dos truques possivelmente ficarão decepcionados, mas quem quiser assistir a um filme que explora, em seus extremos, a psique humana, tem chances maiores de gostar.