Triste toda essa reação negativa em volta, comparando com o final de 'Game of Thrones' (tal comparação até faz sentido se notarmos que ambos tiveram finais apressados, mas não é para tanto). O filme não é perfeito, mas está longe de ser horrível. Realmente o que estragou os novos filmes da saga foi a divisão de visões: por um lado a Disney e o J.J. Abrams ('O Despertar da Força') queriam algo mais POP, que se espelhasse nas referências dos antigos e numa "fórmula Marvel". De outro, o Rian Johnson quis trazer novidades e quebrar expectativas ('Os Últimos Jedi'), o resultado foi uma trilogia híbrida, que toma rumos contraditórios, ao mesmo tempo em que dedica muita paixão ao passado. Esse final ficou dentro da zona de conforto, ameaçou quebrar expectativas por vezes, mas abrandou tudo por outras.
O resultado é um filme com roteiro padrão, uma repetição narrativa de 'O Retorno de Jedi', algumas voltas desnecessárias, mas com partes emocionantes, algumas despedidas emblemáticas e que traz uma interessante discussão sobre a presença do bem e do mal estarem em um mesmo indivíduo (filosofia asiática sempre presente na saga). O ritmo é muito frenético, talvez existem aqui 2 filmes em um só, se tivessem feito uma quadrilogia, por exemplo, poderíamos ter planos mais contemplativos e um desenrolar mais natural. Há alguns sustos, mas algumas cenas reconfortantes. 'A Ascensão Skywalker' é menos brilhante que o anterior no roteiro, mas ainda é um grande blockbuster, melhor que qualquer filme Marvel desse ano por exemplo, apesar dessa "Marvetização" pelo qual o cinema moderno está passando. A ação tem momentos épicos, um excelente duelo de sabre de luz, as atuações dos 2 protagonistas estão mais maduras, existe aqui uma atmosfera mais sombria, o visual é perfeito e a trilha sonora e mixagem de som são estupendas. Mesmo quando algum filme 'Star Wars' é inferior a outro dentro da saga, no todo a franquia ainda é muito boa comparando com a concorrência, e isso não é pouca coisa.
Dividirá opiniões, muitos odiarão, e entre os que queriam novidades e outros que queriam o padrão de sempre, nunca iria se conseguir agradar a todos. Mas essa nova trilogia se encerra mista, oscilando em pequenos detalhes, mas grande como entretenimento e como expansão do universo 'Star Wars', cujo nome é à prova de críticas. Quem sabe daqui um tempo, maratonando todos os filmes, tudo faça mais sentido. E que os próximos filmes que virão apontem para direções diferentes da galáxia.
Os mascotes da saga são especiais, R2-D2, C-3PO, Chewie e BB-8, contem comigo pra tudo <3 Adeus Carrie Fisher, nossa eterna Leia 😔 A experiência de viver 'Star Wars' não tem preço, independente de um ou outro filme não agradarem.
O clássico de 1994 é a melhor animação já feita, uma obra poderosa que marcou época e um de meus filmes favoritos, leia minha crítica no site Minha Visão do Cinema.
Dito isto, esta nova versão não supera o original. Esse novo é uma obra-prima visual, o CGI de última geração é hiper realista, animais e paisagens parecem de verdade, a fotografia quente é de encher os olhos, é um filme onde o visual fala por si só, muito poderoso e que pode sim sair com o Oscar de Efeitos Visuais. Mas existem problemas.
A começar que não é um live-action conforme foi vendido, é uma animação, não há animais e elementos físicos, é tudo digital. E a procura por fazer algo tão realista, às vezes parece que estamos assistindo a um documentário do Animal Planet. Isso não é algo de fato ruim, mas faltam expressões e portanto, falta sentimento aos personagens. A busca pela perfeição da embalagem acabou atrapalhando o interior, a alma, o coração do filme. Falta aquela emoção, aquele arrepio, aquele sentimento que o original trouxe. Sim, um pouco é devido o fato de ser um remake e você já viu aquilo. Mas um pouco também é por essa inexpressividade dos personagens. E algumas das dublagens do áudio original não encaixam bem, principalmente nos leões adultos (não assisti ao dublado nacional).
Mas por outro lado, o filme ganha carga dramática graças à nostalgia, que sim, isso nos pega um pouco. Acompanhar as belas canções, a recriação de algumas cenas marcantes e ver Timão e Pumba, tudo traz um reconforto e uma certa lembrança emotiva. Scar também continua ameaçador. As novas cenas e a nova canção são um bom adicional que só deixam mais explícitos alguns detalhes sugeridos na outra versão. Aliás, Timão e Pumba são maravilhosos em qualquer versão, uma das melhores duplas da história do cinema <3
Mesmo faltando um pouco de encanto, ainda é um belo filme graças a poderosa trama, que traz diversos tipos de ensinamentos e reflexões. Visualmente arrebatador e contemplativo, essa nova versão de 'O Rei Leão' é pra ser visto na melhor tela e qualidade possível, pois realmente a tecnologia utilizada aqui é estonteante. Mas se você quer se emocionar de verdade, reveja o clássico.
NOTA: 7,5
Obs: estou ansioso para ver que outros filmes com este mesmo nível visual virão por aí.
'Breaking Bad' é uma das melhores séries de todos os tempos, isso é irrefutável. Talvez a melhor? Muitos acham que sim. Então, era necessário um filme? Não, não era. Mas esse filme, assim como a série derivada 'Better Call Saul', são spin-offs que, embora não alcancem o clímax dramático e explosivo da série mãe, também não destroem com o legado da franquia. E na verdade, são belos derivados, pois ainda carregam os 3 pilares básicos de uma boa obra audiovisual: boas atuações, boa direção e bom roteiro.
'El Camino' traz uma justiça poética ao conturbado personagem Jesse Pinkman, brilhantemente atuado por Aaron Paul (o ator merecia mais destaque em outros filmes, ele tem talento). Com um elenco coadjuvante de peso, todos muito bem, o filme faz uma série de referências e celebrações à personagens e acontecimentos da série, sem deixar de trilhar seu próprio caminho e confirmar alguns desfechos. A direção de Vince Gilligan continua inspirada, cheia de cuidado estético que não distrai, mas adiciona à narrativa. Usa-se planos mais fechados no rosto dos atores para extrair de suas interpretações e usa-se planos abertos para contemplar a direção de arte e a paisagem e fotografia das locações. Alguns jogos de câmera são bem orquestrados, servindo como criação e quebra de expectativas em momentos chave.
Embora não tão poderoso quanto a série e com um certo ritmo lento no meio, o filme funciona por matar a saudade deste universo, trazer uma potente atuação de Aaron Paul, carregar uma linda identidade visual simples e orgânica, e conseguir carregar no seu roteiro características que lembram filmes de faroeste e de fuga, sempre com suspense e tensão, mas ao mesmo tempo, quebrando expectativas e tomando caminhos diferentes do que indicava. E também foi a despedida do veterano Robert Forster, que faleceu no dia da estreia do filme, na última sexta-feira.
Poderoso, provocante, complexo, questionador, reflexivo, sufocante, assustador, opressivo, desesperançoso, cruel e atual. Um estudo psicológico e sócio-político brutal, rumo à loucura e o caos.
Faltam adjetivos para descrever este filme, que carrega uma das melhores atuações dos últimos tempos, pois o que Joaquin Phoenix faz como o Coringa é de outro patamar, é sobrehumano, existe um trabalho corporal, vocal e psicológico que é arrebatador. Coringa é o melhor vilão do cinema, o melhor personagem já escrito em uma HQ e aqui é a comprovação disso. A DC entrega um de seus melhores filmes de todos os tempos, ao lado de 'Batman - O Cavaleiro das Trevas' e 'Watchmen', e estes são sem dúvidas os melhores filmes saídos de mitologias de "heróis". Aqui, há um estudo complexo de personagem, da condição mental de alguém doente, nas duas horas inteiras vemos apenas Arthur Fleck e tudo o que acontece ao seu redor, a maneira que ele enxerga algumas coisas e vamos vendo como o sistema da sociedade encara e cria um ambiente onde monstros podem se desenvolver. Com aspecto sujo, que remete aos filmes da Nova Hollywood dos anos 70 e início dos 80 ('Táxi Driver', 'O Rei da Comédia', 'Poderoso Chefão', 'Um Estranho no Ninho'), 'Coringa' traz uma construção visual impecável, tão tortuosa e desconstruída quanto seu protagonista. E a trilha sonora melancólica e nervosa ajuda nessa atmosfera, gerando momentos tensos e de calafrios. O filme possui aos menos umas 3 cenas que se tornarão icônicas, especialmente no fantástico final.
Não se engane, ele não é um herói, mas um perverso vilão, mas é mais um, dentre outros tipos de vilania. Garotos brancos endinheirados que se acham e fazem bullying também são vilões. Governos corruptos que cortam gastos (SUS, medicação, assistentes sociais, que não geram emprego e aposentadoria e outras coisas básicas) também são influência para surgir histeria coletiva e sociopatas. Burgueses escondidos no seu poder e que olham com desprezo aos menos favorecidos também somam para os abismos sociais, cada vez mais presentes em um mundo que idolatra mitos poderosos que fazem sinal da arminha, dizem palavras duras que ofendem ou esnobam parte da população, que não tem empatia pelo próximo e que só se importam com seu poder, sua influência, seus nepotismos e suas arrogantes posturas.
'Coringa' ainda traz uma questão muito séria de como a sociedade encara os transtornos mentais e como essas pessoas doentes, que precisam de todo apoio possível, são na verdade ignoradas, encaradas com preconceitos ou indiferenças, e como fazer isso pode levar insanos ao extremo da loucura. Imagine alguém que perdeu tudo na vida e a única coisa que tem é o tratamento público (tipo SUS), mas este tratamento é cortado pelos poderosos que nunca precisaram fazer uso de tal, afinal tem todos recursos para fazer isso no privado, se isso acontecer, quantos Coringas teremos à solta?
Coringa fala da desconstrução da imagem do mito e de como as pessoas gostam de idolatrá-los, muitas vezes por uma bizarra fagulha de esperança de que as coisas vão melhorar. A criatura é a pior possível, mas na tentativa de mudança, se espelha nela numa vã esperança dela fazer algo de bom (pois é Brasil). Isso tudo é fruto de uma sociedade doentia, que se espelha no poder como fonte de esperança, enquanto na verdade deveria ser a empatia pelo próximo. E quando acaba a empatia, começa a violência. Líderes "bem intencionados" não vão acalmar as coisas ignorando parte da população, pois aquela parcela que não lhe interessa ficará a mercê do que vier, e o que vier pode ser o caminho violento.
Há ainda elementos filosóficos complexos, assim como mitologia grega, note os conceitos de Narciso (orgulho) e Sísifo (estar fadado a um ciclo cotidiano de miséria). E isso tudo que estou falando é a ponta do iceberg. Extremamente atual na questão política, e um verdadeiro alerta e convite para empatia na questão mental e psicológica, é muito, mas muito bom ver um filme que deveria ser de ação e de "herói" (o que mais atrai público hoje em dia), mas como forma de pegadinha, te desmonta, te faz refletir, não te lança respostas, mas te obriga a se questionar. E se questionar é aquilo que as pessoas mais precisam fazer, mas o que os poderosos menos querem que você faça. Isso porque se questionar derruba poderosos, arranca máscaras e entrega respostas desconfortáveis, verdades inconvenientes. De uma forma ou de outra, é um filme onde carapuças servem para todos, como humanidade.
Não é um filme fácil, e nem era para ser. Um suspense dramático psicológico poderoso, melhor filme do ano até então. Uma aula de cinema, cinema de verdade.
"A pior parte de ter uma doença mental é que as pessoas esperam que você se comporte como se não tivesse."
Ao contrário de 'Bohemian Rhapsody', que até tem belos momentos dos shows, mas está repleto de problemas, como a quase vilanização do protagonista e de suas escolhas, algo possivelmente influenciado pelos integrantes vivos do Queen, 'Rocketman' acerta em ser uma produção que equilibra melhor alegria e emoção, sendo a obra uma personificação da figura ainda viva de Elton John. A direção é boa, a criação da época, figurinos e apuros técnicos são ótimos e o filme não apenas traz as canções, mas se assume como musical, com diversas cenas lúdicas onde viajamos na imaginação do cantor, suas canções fazem as pessoas flutuarem, literalmente, e isso é mágico.
Com influência do próprio Elton John, o filme é sincero em mostrar os excessos e erros do próprio. É bonito o fato dele culpar a si mesmo e dar a volta por cima, sempre em busca do seu sonho e de sua identidade. Excelente atuação de Taron Egerton, que encarna Elton com maestria e energia. O mesmo se diz de Jamie Bell como Bernie, melhor amigo do cantor, juntos são uma dupla incrível. Emocionante de forma sutil e muito divertido, é um ótimo filme, merece ser conferido!
Filme: 'Era Uma Vez em ... Hollywood' (2019, de Quentin Tarantino)
Será textão, primeira parte SEM SPOILERS, depois da nota terá.
Uma obra de homenagens. Homenagens à Era de Ouro de Hollywood, à Sharon Tate, ao ano de 1969, ao fim do sonho hippie, à arte de se fazer cinema, ao próprio Tarantino e aos sonhos perdidos de outrora.
Mesmo que com suas principais características, como humor ácido, diálogos longos e sagazes, cenas gráficas chocantes, excelente trilha sonora escolhida a dedo pelo cineasta, trama fragmentada que se encaixa ao fim, críticas sociais com uma certa representatividade, talvez este seja o filme mais descontraído, simples e maduro do diretor. Não é o melhor, mas ainda uma grande obra, é interessante como ele arrisca algumas novas nuances, mesmo dentro dos seus trejeitos. Através de quebra de expectativas por quase três horas, ele faz algumas coisas contrárias ao que o público que o conhece espera, sem deixar de ser o próprio.
Leonardo DiCaprio e Brad Pitt formam uma dupla espetacular em cena, com muito carisma e química, ambos são hilários de maneiras diferentes. DiCaprio, um dos maiores atores do cinema moderno, talvez o maior, entrega um personagem engraçado, mas com camadas dramáticas, um ator que está em uma encruzilhada entre se tornar um astro ou ser esquecido. E nesse medo de ser esquecido, entrega cômicos e bonitos momentos sobre as inseguranças de ser um ator. Pitt, conhecido por ser galã, mas não tão reconhecido por ser bom ator (e é nítido que Tarantino trabalhou em cima desses dois fatores ao longo do filme), entrega uma das melhores atuações da carreira, ele é um dublê hilário, porém com um toque mais misterioso. Aliás, na reta final do filme, é ele quem brilha.
Margot Robbie como Sharon Tate é pouco aprofundada, a personagem tem poucos diálogos ou dramas. Mas ... foi uma escolha proposital, pois o diretor a coloca o filme inteiro em situações de brilho, luz, alegria, sorrisos, com belos figurinos, uma figura quase angelical, uma forma de homenagear a atriz Sharon Tate, brutalmente assassinada na sua casa e grávida aos 8 meses na vida real. A cena em que ela está camuflada no cinema, assistindo ao próprio filme e vendo as reações das pessoas ao sorrirem por ela no filme, é linda, é uma cena emocionante, nos lembra que fazer arte e ver a reação positiva do público quanto a isto deve ser algo gratificante. Ver cenas onde Sharon Tate esbanja felicidade e vida dói, pois sabemos o seu destino. O restante do grandioso elenco aparece rapidamente, cada um com suas peculiaridades.
Aliás, existem muitas referências aos demais filmes do diretor, em um exercício metalinguístico cinematográfico, com filmes dentro do filme, takes fictícios, reconstruções e detalhes que remetem a 'Bastardos Inglórios', 'À Prova de Morte' (inclusive na presença da esquecida categoria dos dublês), 'Kill Bill', 'Django Livre' e vários outros. Há diversas personalidades e filmes da época, como um hilário Bruce Lee, menções indiretas à Sergio Leone, e por aí vai. A trilha sonora é incrível e os figurinos de época são espetaculares, algumas peças de roupa e acessórios tem cenas de destaque somente para elas. Nessa reconstrução da época, roupas, carros, bares e elementos de 1969 assumem um papel de personagens fundamentais na narrativa da trama.
O filme, por horas, pode aparentar ser longo, com diferentes situações que aparentemente não chegam em lugar algum, alguns diálogos por vezes são longos demais e talvez em alguns momentos há certos preconceitos com os hippies, através de diálogos sacanas. Mas a reta final do filme amarra tudo e compensa tudo. A cena em que Pitt chega no rancho da Família Manson é assustadora. Existe aqui uma lenta construção de tensão, por uns 10 ou 15 minutos ficamos cada vez mais tensos, num clima quase de terror, só conseguimos sentir uma energia estranha no ar e naquelas figuras hippies. Imagina o Tarantino fazendo um filme de terror nessa pegada?
O final compensa com um confronto brutal, mas ao mesmo tempo hilário. E depois de quase três horas de viagem de volta aquela época, a bonita e sutil cena final entrega algo inesperado, uma cena reflexiva. Assisti ao filme na sexta e sigo pensando nele até agora. "E se ..." talvez defina aquele final. Uma cena que te abraça de uma forma incrível.
Um filme completo, um dos melhores do ano, cinema de verdade, transitando entre a comédia, o drama e o suspense, o belo final justifica o "Era Uma Vez" do título, apesar dos históricos reais, essa é a fábula de faz de conta do mestre Tarantino, a forma dele olhar e homenagear vários pontos do passado e brincar com algumas coisas que se perderam com o tempo, com o fim de uma era, com o chocante final do movimento "paz e amor" onde acreditava-se que ser hippie salvaria o mundo. Homenageando a graça de se fazer cinema, mas sem deixar de por o dedo na ferida nas dificuldades e no cinismo que muitas vezes se encontra na indústria.
Sobre aquele final, foi a forma do diretor brincar com o "e se" a pobre Sharon Tate, que irradiava luz e talento, tivesse tido uma chance. E se heróis da ficção qualquer tivessem dado o troco na Família Manson? Os filmes do Tarantino sempre possuem justiças poéticas. Vou explicar: em 'Kill Bill' a mulher oprimida acaba com os homens opressores. Em 'Bastardos Inglórios' temos um grupo de assassinos que mata nazistas assassinos, além da mulher judia que queima fascistas. Em 'Django Livre' temos abolicionista e escravo acabando com escravagistas. Aqui nós temos a classe dos artistas acabando com os hippies assassinos de Charles Manson, que na vida real chocaram Hollywood e marcaram o fim de um sonho de estilo de vida perfeito. Nada mais justo do que colocar artistas para massacrar assassinos, é irônico, mas é justiça poética, tão presente nos filmes do diretor.
Outra justiça foi a cutucada que deram no marido da Sharon, o diretor de cinema Roman Polanski ('O Bebê de Rosemary'), que futuramente estaria envolvido em escândalos sexuais de estupro e pedofilia. Em determinado momento se dá a entender que ela era boa demais pra ele e que mais cedo ou mais tarde ele faria uma bobagem e ela deixaria ele.
O 1° filme de 2014, apesar de clichê na trama, trouxe uma mitologia própria, boas cenas de ação e o protagonismo do querido Keanu Reeves, que estava em baixa na época. O 2° filme trouxe um reencontro de Reeves com Laurence Fishburne anos após 'Matrix' e surpreendeu ao expandir ainda mais o universo da saga, além de mais e melhores sequências de ação, com muito estilo e arte, sendo um dos melhores longas de 2017. Agora o 3° surge repetindo o sucesso, expandindo a nível mundial a franquia, com cenas de ação e visual cada vez mais caprichados!
Reeves continua incrível na pele do herói e desta vez a franquia traz de volta aos holofotes dois sumidos: Halle Berry e Mark Dacascos. As cenas de ação são eletrizantes, com sequências intermináveis de cair o queixo. E apesar de toda pancadaria, das mais variadas formas possíveis, a direção se preocupa em fazer tudo com estilo, com coreografias que mais parecem danças, uso de ângulos de câmera estilosos, muitas cores neon, plano-sequências incríveis e com figurino, direção de arte e trilha sonora muito bem feitas, que ajudam na composição das cenas. Ah, aqui os amigos doguinhos tem muito mais destaque! Há uma sequência de ação inacreditável envolvendo os personagens do Keanu e da Berry e os dois cães dela, os 4 contra um exército de vilões e sinceramente me pergunto até agora como "que raios" filmaram algumas das cenas, pois são incríveis e na maior parte do tempo são os cães reais (e não CGI). Quando você ver o filme entenderá, é de cair o queixo (se fizerem um filme só com esses cachorros combatendo o crime, eu assisto haha).
A saga está em expansão constante, a cada hora as coisas vão ficando mais graves, a escala e os desafios aumentam, até no final se deixam lacunas para algo sempre maior e mais intenso para o próximo filme. 'John Wick 3' é pura ação, de tirar o fôlego, ao mesmo tempo em que é muito bem dirigido, com um roteiro bem construído e um visual cheio de arte. E falar disso em um filme que deveria ser "só mais um filme de ação" não é pouca coisa. Na verdade é um dos melhores filmes do ano. Que venha o 4 e série, que já estão em desensolvimento!
Obs: John Wick é o protetor oficial dos doguinhos? 🐶🎬
O filme tem sérios problemas técnicos, principalmente de direção e visual. O diretor Guy Ritchie parace ter sido uma escolha equivocada para comandar o filme. Ele se sai razoavelmente bem em filmes simples e de ação ou crime. Mas parece que ele não sabe comandar superproduções. A direção é engessada, não é natural, falta algo ao filme pra fluir com suavidade. No visual, o CGI é ruim a maior parte do longa, com gráficos que parecem de um game, não parece que o longa teve todo um grande orçamento, pois às vezes parece não muito bem renderizado. Assim como algumas coisas na produção são estranhas, como a chapinha do cabelo do herói. E os vilões Jafar e Iago são muito fracos, descaracterizados. Iago pouco faz e Jafar, bem, ator errado, ele não ameaça, não tem força nem na atuação corporal, quanto menos na voz.
Adaptar a clássica animação 'Aladdin' seria de fato difícil, o original de 1992 é uma das melhores obras da Disney naquela época. Mas aqui tenta-se algumas coisas novas, sem desonrar o desenho. A vibe do filme é positiva, alegre, embora seja de cultura árabe, por vezes lembra o estilo dos filmes indianos de Bollywood. As partes musicais são nostálgicas e bonitas. Existe uma nova canção que empodera a Jasmine que parece não casar bem com o estilo épico do filme, mas não é uma canção ruim e adiciona camadas na princesa. Se na animação ela já tinha uma pegada feminista, aqui abraça-se isso com eficiência, uma mulher com voz ativa (especialmente no conservadorismo patriarcal árabe) é algo que o mundo necessita e ao menos na ficção nos presenteiam com isso. Naomi Scott é excelente como Jasmine, ela tem força em cena, bela voz e fico imaginando se o filme não seria inovador e melhor se ela fosse a verdadeira protagonista da obra. Já pensou um remake live-action feminista onde inverte-se o protagonismo? Ah se eu fosse o diretor ...
Mena Massoud dá conta do recado como Aladdin e Will Smith é incrível como o gênio. Smith é um dos atores mais carismáticos de Hollywood e aqui lembramos os motivos. Ele brilha em cena, adicionando sua personalidade própria (note a pegada hip-hop da canção 'Prince Ali'). E Smith energiza o seu Gênio sem desonrar o lendário Robin Williams, que fez um dos melhores trabalhos de dublagem da história, na clássica animação. Figurino, direção de arte, os números musicais e a trilha sonora são caprichadas, ajudando a dar uma vibe alegre à obra.
O novo 'Aladdin' tem tropeços, especialmente no visual, na direção sem visão e não é melhor que o original. Mas ainda existe um encanto, o trio principal manda muito bem em carisma e o filme joga a princesa Jasmine no elemento girl power que tanto se precisa na sociedade machista hoje em dia. Vale ser assistido sem cobrar demais.
Obs: eu assistia ao desenho quando criança e sempre quis um tapete mágico pra mim. Cresci e ainda continuo querendo 😜🎬
Existem dois fatos inegáveis: o cinema sul-coreano está em alta e o diretor Bong Joon-ho é um dos maiores cineastas do momento. Ele já entregou os sólidos 'O Hospedeiro', 'Okja' e 'O Expresso do Amanhã', dentre outros. Agora ele ataca novamente com o impressionate 'Parasite'. Uma família pobre começa a se infiltrar como empregados em diferentes áreas na mansão de uma família rica, com a esperança de usufruir um pouco da "boa vida". Eles farão qualquer coisa para chegar onde querem, fato que os colocariam numa posição de vilões, mas não é bem assim.
O roteiro é genial ao abordar o lado obscuro de todos, mas sem deixar de humanizar essa família "parasita", por assim dizer. Existem motivações para eles fazerem isso e a família rica não colabora muito, na verdade eles são detestáveis, mesmo que inicialmente fossem ser "vítimas" de aproveitadores. Com um malabarismo impressionante que passa por gêneros, o filme brinca e flerta com o drama (focando no emocional das figuras centrais), a comédia (sempre em tons ácidos e sarcásticos) e o suspense (crescente e cada vez mais nervoso, chegando a um final chocante).
'Parasite' é brilhantemente dirigido por Bong Joon-ho, com um ritmo frenético, ângulos de câmera inspirados, um senso estético perfeccionista, com uma mise en scène que ajuda a compor as metáforas e críticas sociais que permeiam o sagaz e feroz enredo. O filme desafia a sua mente a se questionar sobre situações do cotidiano, como um soco na mente, te causa desconforto e aqui se discute a tal meritocracia e as diferenças de classe. A burguesia é suja e o pobre que quer ser rico terá que se sujar também. E mesmo que um rico ou patrão fique feliz com sua melhoria na vida, como não saber que aquilo é falso e na verdade ele se sente ameaçado? Obra impressionante, uma das melhores do ano até então!
Obs: fique longe da bela família feliz, cidadão de bem com dinheiro e casarão, que só quer pagar seu estilo de vida e mantê-lo assim, fique bem longe ...
Um excelente, mas excelente potencial, desperdiçado em um filme confuso. Já começa pelo título no Brasil, bastante genérico, já que o original 'Captive State' faz mais sentido. Com um ótimo elenco um tanto desperdiçado, onde vale salientar que o grande John Goodman e o protagonista Ashton Sanders entregam bons desempenhos, o filme parece perdido. Na trama, após um colapso mundial, alienígenas que invadem a Terra conseguem trazer uma "política de paz" com os humanos. É claro que não há paz, apenas mais barreiras sociais. E é claro que haverão conflitos entre os que apoiam a nova política autoritária e aqueles que resistem e lutam contra a mesma.
O filme é uma clara metáfora da resistência, da luta contra essas políticas falsamente bem intencionadas que surgiram por aí (Brasil!) e que no fundo só fazem bem pro seu próprio lado. O roteiro tentar abordar isso de forma séria, complexa e abrasiva e até é interessante. O problema é que é um filme que falta algo. Não há desenvolvimento crítico profundo para ser algo mais complexo. E não há ação ou efeitos especiais suficientes para ser algo mais puxado pro entretenimento. Então o filme não chega a divertir de forma boba como a maioria dos filmes de ação fazem, se levando a sério, mas também sem explorar os limites da seriedade a que propõe, o que é uma pena.
Há um certo valor narrativo, mas que contenta-se com um final inacabado. Perde-se a chance de se fazer algo fora da caixinha. Poderia não haver alienígena nenhum e ser tudo manipulação governamental. Ou poderia-se aprofundar mais na guerra contra o poder. Mas fica tudo no mesmo lugar, dando voltas em alguns discursos que pouco avançam na obra, uma pena. Há elementos interessantes, existe um teor realista em como funcionam as políticas "amigas' que enganam o povo pra parecer tudo bem, enquanto que na verdade a casa está caindo. Mas foi pouco explorado. Quem sabe com o tempo a obra possa ser melhor avaliada.
Filme: 'Vingadores: Ultimato' (2019, de Anthony e Joe Russo)
Breves comentários SEM SPOILERS. Futuramente farei comentários com spoilers. Mas quem já viu e quiser falar spoilers no privado, é só chamar. Só não comenta aqui em respeito a quem não viu.
Não é perfeito. Mas falar de perfeição torna-se um paradoxo cinematográfico. Filmes de super-heróis são mainstream, são para consumo rápido, com objetivo de atingir o maior público possível e vender produtos para fãs. Isso afasta aqueles que gostam de obras maduras e cult por exemplo. Não se engane, se você não gosta de fantasia e heróis, não gostará desse aqui. Na verdade já deve estar saturado de tantos comentários sobre os Vingadores. Mas se você acompanha essa saga ao longo dos seus 11 anos e 22 filmes, se você acompanha o cinema moderno e a sua principal fonte de renda (blockbusters de heróis) e se você gostou do que viu até aqui, este é seu filme.
Há problemas de excesso de piadas, pequenos furos e lacunas no roteiro, clichês, melodramas, excesso de CGI, dentre outras coisas. Mas isso são coisas mínimas distribuídas nas 3 horas de duração, onde os acertos compensam. O Ultimato é o encontro de todos universos e destinos até aqui. É fan service puro, escapismo escancarado, que abraça o impossível e não tem medo de ser feliz, nerd e maluco.
Há um certo amadurecimento na forma de se apresentar o misticismo dos heróis. Esse filme aparece como uma metáfora e sintetiza toda essa era moderna com dezenas de filmes baseados em quadrinhos. Aqui a Marvel se ajoelha diante de si mesma e cria a referência da referência. Assume-se de vez as possibilidades infinitas dos quadrinhos, mas ainda tentando homenagear quem acompanha a simplicidade do que é ser um herói, isso desde o primeiro 'Homem de Ferro'. Começaram de maneira mais realista, foram fincando os pés na fantasia e criaram assim sua saga do Infinito.
Há no filme belos momentos, alguns inesperadamente tocantes. Robert Downey Jr e seu Homem de Ferro entrega uma sólida atuação, até mesmo maior do que se exigia. Jeremy Renner e seu Gavião Arqueiro, Chris Evans como Capitão América e Scarlett Johansson como Viúva Negra também entregam belas passagens. Até Paul Rudd como o Homem-Formiga tem momentos emotivos, por mais engraçado que ele seja. Ah, Rocket é o melhor, sou fã daquele guaxinim rsrs. O elenco é grandioso, talvez um dos maiores já montados até aqui.
O início lento é necessário pra dar peso. É o tudo ou nada. A ação demora, mas engata. O final é épico e empolga qualquer um que goste de super-heróis. É um sonho nerd realizado e concretizado. E quem conseguir se envolver com esse universo, se dará ao luxo de se emocionar. Prepare-se para alguns nós na garganta.
Filmes de heróis são bobos. Nunca será diferente. E tudo bem, não existe problemas nisso. 'Vingadores: Ultimato' não será eleito o melhor filme do ano pela crítica e pelos cinéfilos exigentes. Tampouco é esta a intenção. Não será o melhor, mas será o filme do ano. Em bilheteria, em comoção pública, em momentos épicos, em debates, em novas portas que se abrem e outras que se fecham nesse universo. Vejo alguns irritados com tamanha comoção. Mas foram 11 anos cativando o público, levando milhões de pessoas por essas jornadas, fazendo a gente esquecer dos problemas diários e viajando por novos mundos. 11 anos de construção da magia e encanto. Tal sucesso torna-se inevitável. Tal sucesso torna-se merecido.
É mais que um filme. Assim como 'Avatar' ou 'Titanic', é um evento onde o mundo parará pra assistir. Mas aqui tem essa diferença de se ter construído isso e ter se cativado todo esse público. E hoje ao ver no cinema cerca de 400 pessoas rindo e chorando juntas, batendo palmas, empolgadas e desesperadas, no banheiro haviam rapazes que não se conheciam conversando e criando laços pelo filme, ver dezenas de pessoas com camisetas nerds sem se sentir ridículas, ver tudo isso confirma o motivo de toda esta comoção. É o poder que um filme popular tem. Estamos em um mundo destruído por diversos Thanos, então ver um único filme de fantasia unir e fazer pessoas tão distintas viajarem juntas, isso tem o seu valor. Pode não ser a arte na forma mais complexa, mas é a fuga do nosso cotidiano na forma mais sincera. E por tudo isso, meus parabéns Marvel. Podem vir mais 10 anos e 20 filmes. Que venham mais filmes de todos os tipos pra todas pessoas e que eles possam fazer isso em pequenas ou grandes escalas: somar a todos nós.
O diretor M. Night Shyamalan ('O Sexto Sentido') entrega com 'Vidro' o capítulo final de sua trilogia de suspense, que começou com o ótimo 'Corpo Fechado' e surpreendeu ao continuar no bom 'Fragmentado'. Porém, em 'Vidro', temos um desfecho que por vezes é interessante, mas por outro lado decepciona um pouco. Não é um filme ruim ou horrível. Há muito o que se aproveitar nessa saga do Shyamalan. Se pensarmos nos três filmes, temos um estudo psicológico, filosófico e desconstruído dos heróis, vilões e poderes. Com um viés mais realista, as fantasias das HQ's são desconstruídas por um lado mais sombrio e misterioso. Muito mais do que glamouroso, uma habilidade especial pode ser assustadora. E é isso que o cineasta fez com essa saga, dissertando em cima do imaginário que hoje permeia forte o cinema: os super-heróis.
Em 'Vidro' é interessante a forma que o diretor leva a trama. Em vez de um caminho mais grandioso, ele toma o rumo oposto e entrega um filme pequeno, intimista, sutil. O problema é que às vezes é quase chato. É salvo pelo bom elenco em cena, especialmente Samuel L. Jackson, James McAvoy e Sarah Paulson, todos os 3 brilhando em cena. Já Bruce Willis está estranhamente apagado diante o restante. E Anya Taylor-Joy, apesar de sempre competente, pouco acrescenta no longa. O visual é bem simples e limpo, mas competente. Há um jogo de cores e luzes conforme a personalidade do personagem que está em cena, o que é bem legal. A reviravolta típica dos filmes do diretor é ok dentro da trama, mas nada que surpreenda de fato. No fim, 'Vidro' é um filme ok, merece ser conferido pra fechar a trilogia e deixa uma interessante reflexão diante o fascínio atual pelos super-heróis. Mas por tomar um caminho mais contido, perdeu a chance de ser o confronto épico desejado. Preferiu ser um ensaio e uma metáfora aos heróis, vilões e poderes, do que ser um filme sobre isso mais propriamente dito.
O nome da obra vende a ideia de um trash daqueles, o que poderia render um filme divertido. Mas na verdade é um drama com trechos históricos e de caráter pseudo-conspiratório, onde na verdade a fantasia serve de pano de fundo para uma história sobre envelhecimento. Sam Elliott, que concorreu ao Oscar de Ator Coadjuvante pelo ótimo 'Nasce Uma Estrela', interpreta um veterano de guerra, cujos dias são envoltos de lembranças e nostalgia, em uma vida já cansada. Até que o governo o chama para conter um misterioso ser (um Pé-Grande?). Então ele começa a se lembrar dos tempos de guerra e de sua difícil missão, matar o próprio Hitler. Apesar de misturar duas teorias da conspiração ao mesmo tempo, o filme surge como uma espécie de metáfora sobre a velhice, olhar pra trás e se arrepender de não ter feito coisas, de não ter aproveitado a vida. Agora, será que ele realmente realizou isso tudo? Ou são devaneios?
O filme é prejudicado pelo orçamento baixo e um ritmo um tanto lento. Até os confrontos são mais lentos. Há uma interessante direção de arte de época, um dos poucos recursos visuais do longa. A direção e o roteiro parecem não saber bem que rumo tomar: será um drama, um suspense conspiratório ou uma fantasia trash? Então parece que se tivessem tomado um rumo mais cômico e dinâmico, teríamos uma grande obra. Mas contentam-se com pouco, o que tira a força sarcástica da trama. Mas a atuação de Sam Elliott carrega o filme nas costas. Seus trejeitos, tom de voz, a dinâmica com todos em cena, até o seu velho cachorro, tudo passa algo verossímel, que salva o filme de ser mais fraco. Brevemente divertido, com um bom protagonista e uma interessante crônica à velhice, é um filme mais curioso pela trama do que pela execução, mas que merece ser conferido sem preconceitos.
'Nós' traz diversos simbolismos, metáforas e referências, a maioria bem sutis e deve-se estar bem atento à detalhes, além de estar por dentro de parte da história social dos Estados Unidos. Aliás, 'Nós' pode ser considerado um quebra-cabeça social. Começando pelo nome original 'Us', que traduzindo seria o 'Nós', mas que também serve para a sigla United States, pois na trama, temos uma alusão e uma crítica ao estilo de vida das famílias americanas, além de questões sociais bem pertinentes. Uma dessas questões vem na forma das sombras, ou os acorrentados. Eles facilmente podem ser as minorias menosprezadas, mau tratadas e deixadas à deriva pelo governo e pela sociedade classe média/alta (alô Brasil). O fato das sombras atacarem faz um paralelo à violência que algumas minorias acabam recorrendo. Mas estes também podem ser encarados como os instintos adormecidos nas pessoas, que vez por outra afloram de forma destrutiva.
As luvas lembram as que os membros dos grupos Panteras Negras usavam, um partido socialista americano que lutava a favor dos negros, principalmente para combater a violência dos policiais brancos. As tesouras trazem um sentido de duplicação: duas partes iguais em um mesmo objeto. Assim como as aranhas que a protagonista enxerga no início do filme. Na psicologia e na literatura as aranhas representam duplicação. Isso eu percebi já de cara graças ao filme 'O Homem Duplicado', baseado no livro de José Saramago, onde o protagonista enxerga aranhas gigantes e sofre da síndrome da duplicação. Todos esses elementos acabam justificando a reviravolta do filme, de que a protagonista já era a "sombra", o duplicado, e não a "original" que havia ficado acorrentada nos túneis, quando elas se encontraram na infância. O medo da protagonista então não é de ter uma cópia, mas da original voltar e a desmascarar, por isso que de todas as cópias, somente a dela falava, pois era a original. Mas o fato da cópia dela falar indica que sim, as sombras poderiam então se adaptar ao nosso mundo. Tudo foi resultado de um experimento de cunho governamental e místico (religioso talvez? não se sabe). Os coelhos, além de alimento pras sombras, representam reinícios e fertilidade, explicando assim a necessidade das sombras de se libertarem das correntes e irem pra superfície, matando os originais no mundo todo e recomeçando a sociedade. Uma metáfora aos oprimidos quererem ter sua voz ouvida e recomeçarem suas vidas de igual para igual com os privilegiados. Há ainda diversas referências e easter eggs com o próprio cinema de horror, como 'Tubarão', 'Corra!' (filme anterior do diretor), 'Corrente do Mal' e outros, assim como uma homenagem aos home invasion, filmes onde assassinos invadem e atacam uma família ('Os Estranhos', 'Você é o Próximo').
A corrente de mãos dadas é uma referência a um movimento social que não deu certo (1° cena do filme, a menina assiste na TV), outra crítica a como nós falhamos como sociedade em sermos igualitários. Há muito mais a se dicutir, como duras cutucadas na era presidencial de Trump, à hipocrisias da sociedade, os excessos da polícia contra os negros (note a música fuck the police tocando em momentos chave), assim como a família de amigos brancos dos protagonistas são representações estereotipadas de famílias problemáticas (ele é um playboy malandro, ela superficial, as filhas são mimadas). No fim, 'Nós' é sobre nós, nossos problemas, nosso lado obscuro, a luta social que cada um trava e nosso fracasso coletivo como humanidade.
É complexo criticar filmes que apelam para a emoção se utilizando de animais, ainda mais se você é sensível à esta temática. 'Dumbo' é um filme que traz alguns clichês, reconta a mesma história da clássica animação Disney dos anos 40, porém com uns acréscimos de personagens e dramas humanos. É nesta parte humana que o filme não é tão bom, pois temos pouco interesse pelos humanos, quando queremos mesmo é ver o elefantinho orelhudo. Mas quando Tim Burton traz a magia e encanto com o Dumbo em cena, o filme cresce muito e é encantador. O CGI usado na criação do bichinho é surreal de tão bom, parece de fato um ser vivo em cena. Ele tem mais expressões faciais do que o elenco humano. As cenas em que ele esboça tristeza, medo, espanto, são tão críveis e sensíveis que é difícil não se emocionar.
O grandioso elenco está ok, não fazem nada muito extraordinário, mas estão para dar suporte ao Dumbo. Colin Farrel está ok, Danny DeVito é uma grata surpresa e apesar de Michael Keaton estar caricato e exagerado como o vilão, é bacana ver Keaton e DeVito novamente em um filme do Tim Burton (eles foram o Batman e o Pinguim nos anos 90, respectivamente). Ah, e é sempre bom ver Eva Green, mesmo que não tanto utilizada. A fotografia, o figurino, a maquiagem e a direção de arte são lindas, capturam o espírito circense e juntos aos bons efeitos de computação, tornam este um dos filmes mais belos de se olhar nesse início de ano. E é muito bom ver Tim Burton, depois de uns anos de trabalhos mais fracos, trazendo um filme mais bacana e que aquece o coração. Me lembrou aquele ótimo 'Peixe Grande e suas Histórias Maravihosas', um Tim Burton mais otimista e acolhedor.
Mas o importante mesmo é Dumbo e sua mensagem. São duas as lições: a primeira refere-se ao combate à violência e maus tratos com os animais, inclusive em circos e outros trabalhos; e a outra lição seria aquela história de você se sentir o "patinho feio". Em tempos intolerantes, é importante mostrar que ser diferente é normal e bonito, que cada um carrega sua beleza e que aquilo que os outros ridicularizam, pode ser seu dom especial. Bonito e emocionante, é um dos melhores live-actions da Disney. Levem seus pequenos pra assisitr, eles irão amar e você ainda poderá ensinar algumas coisas a eles. E pra finalizar, o vôo de Dumbo é libertador e simbólico, é a quebra das correntes que os outros querem impor pra cima de você!
É complexo falar de 'Nós' sem soltar spoilers, é um daqueles filmes que é um "spoiler ambulante". Mas resumidamente, é o melhor filme do ano que assisti até então. O diretor Jordan Peele, que ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original com o excelente 'Corra!', além das indicações de Diretor, Filme e outras, entrega aqui mais outro filme imponente. Se em 'Corra!' tínhamos um suspense mais crescente e sutil, com uma estrutura aparentemente simples, mas uma excelente construção da crítica racial que se fazia, aqui em 'Nós', temos um terror mais propriamente dito, com uma ideia muito mais complexa, cheia de camadas e lotada de críticas sociais, raciais, teorias da conspiração e simbolismos metafóricos e metalinguísticos.
Essa complexidade, além dos inúmeros plot twists (alguns um pouquinho previsíveis, mas vários muito bem elaborados), são coisas que podem afastar alguns. Algumas coisas aparentemente abstratas podem confundir o expectador, sem falar que em dado momento o filme aparenta tentar ser inteligente demais. Mas sinceramente, gostei muito desta inteligência. O diretor Peele prova que conhece bem o gênero terror e não tem medo de brincar com o estilo, trazendo referências, mas desconstruindo características do mesmo, dando algumas guinadas interessantes. O título original 'Us' serve tanto para a tradução 'Nós', quanto para a sigla United States, numa clara crítica aos Estados Unidos e seus diversos problemas sociais. Mas vai além disso, trazendo os problemas mais íntimos de famílias e indivíduos, de formas bastante simbólicas. Eu costumo dizer que poucas coisas assustam tanto quanto a realidade. E o que o diretor faz com seus filmes é trazer uma fantasia que na verdade traça paralelos com a realidade.
A direção é boa, com algumas cenas onde o ponto de vista varia de acordo com o personagem e o cenário. O elenco é fenomenal. Lupita Nyong'o é destruidora, uma atuação monstruosa. A moça está crescendo e já pode ser considerada uma das grandes atrizes da atualidade. Sua performance dramática, corporal e vocal é incrível, de cair o queixo em dados momentos. Mas todo restante dos atores estão bem, especialmente Elisabeth Moss.
'Nós' é enigmático, levemente divertido, bastante cruel e um complexo quebra-cabeça social e moral. Você poderá amá-lo ou odiá-lo, mas ele irá de algum modo te contar alguma coisa, seja aquilo o que você absorver.
O ator Chiwetel Ejiofor estreia na cadeira de diretor com esta emocionante história real, sobre um menino de uma pobre aldeia da África, que diante a face da seca, fome e morte, decidiu colocar seus conhecimentos em prática e construir um moinho de vento, para gerar energia elétrica e ligar a bomba de água da aldeia.
Apesar do baixo orçamento e de clichês típicos de cinebiografias na construção da narrativa, o filme te ganha pela força. Se você não se fragiliza com uma situação dessas, você não é humano, simples assim. E é impossível falar desta obra sem tocar em feridas sociais e políticas. Vamos pensar: o que impedia os vários adultos de construir moinhos e salvar vidas? O conhecimento? Até certo ponto sim, mas há muito por trás. O momento em que a trama se passa é conturbado. Temos a influência do tempo, ocasionando tanto enchentes como seca. Temos um fundo político onde o governo nada faz. Ao contrário, ainda faz-se racionamento de comida. Ajuda estrangeira não vem, ainda mais com a atenção dos Estados Unidos voltada para o Iraque logo após o 11 de Setembro (na verdade o interesse era o petróleo). A vila ainda possui um fervor religioso e tradicionalista que atrasa e impede que o conhecimento ganhe forma prática. O próprio pai do garoto é conservador e desacredita nos livros de ciência do filho, renegando a esperança do menino como simples "imaginação" ou utopia.
Sendo assim, 'O Menino que Descobriu o Vento' traz uma forte verdade que se estende por outros países, até mesmo nosso Brasil (com seu árido sertão). A política e o militarismo se lixam pra fome e sofrimento do povo, se escondendo atrás de armas, repressão e burocracia política. O povo fica cego diante costumes conservadores e religiosos, nada fazendo para solucionar o problema, esperando um milagre ou uma ação política. Tudo burocracias, tudo bobagens que matam. Pois política, armas, religiões, pré-conceitos e conservadorismos levam à ignorância. E um povo ignorante e cego mata e morre! Mas o conhecimento, os livros, a cultura, o amor ao próximo, isso colocado na prática, salva. Não estamos aqui sendo demagogos em teorias. Falamos da prática, do que torna o homem um ser vivo, humano com sentimentos e empático à dor alheia. Essa é aquela verdade incoveniente que renegamos no cotidiano, mas em que em um momento de verdadeira crise, faz toda diferença. O garoto do filme tem tudo que precisa: seus livros, sua educação, seu conhecimento. Então ele bate de frente com todo conservadorismo que for preciso, pois ele sabe que há vidas em risco, ele sente na pele a dor da perda, de ver um ser vivo ao seu lado morrer de fome descenessariamente, visto que a solução estava ali, na frente de todos, era só colocar em prática.
Emocionante do começo ao fim, tem uma cena que marcou e até agora não superei, quem já assistiu e quiser falar sobre no privado, à vontade. Um filmão atual e necessário, que rende algumas reflexões interessantes sobre a importância da educação, cultura, conhecimento, professores, livros e história, coisas cada vez mais negligenciadas por uma sociedade moderna cada vez mais hipócrita e cega, cegueira causada seja pela inútil política, seja pela comodidade dos indiferentes.
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Cinema em Cena: 'Vestígios do Dia' (1993, de James Ivory)
Nosso quadro que analisa a composição das cenas de filmes vai falar hoje sobre este tocante drama britânico. Anthony Hopkins interpreta um perfeccionista mordomo, que lidera a criadagem da mansão de um aristocrata inglês, durante a Segunda Guerra Mundial. Anos depois, ao viajar de volta ao local, o personagem de Hopkins se vê diante lembranças que o marcaram para sempre. Com uma belíssima direção de arte e fotografia, aliadas à uma direção competente de James Ivory, sempre sutil e delicada, temos uma composição de mise en scène pontual e acolhedora. Somos imersos no acompanhamento da câmera pelos cômodos da mansão, o estilo voyeur no qual espiamos os bastidores da aristocracia, em contraste com o reprimido amor entre o mordomo e a governanta (Emma Thompson em brilhante atuação). Em determinados ângulos, como em uma das imagens do post, nós vigiamos os afazeres dos empregados e os tolos mistérios dos burgueses, através do ponto de vista de portas entre abertas, janelas e objetos. Assim como a mansão e tudo que a compõe, nós somos expectadores da passividade do casal, que fica recluso de acender seu amor diante o compromisso com sua profissão. Em plena guerra, onde políticos bebem e aproveitam sua burocrática vida fútil, vemos os trabalhadores e reais protagonistas, serem incapazes de tomar as rédeas da sua vida, cegados pelo falso senso de dever, como se isso fosse a coisa mais importante de outrora. Tal análise requer traçar um paralelo com nossos dias, onde infelizmente alguns insistem em renegar suas próprias escolhas, em prol de agradar ou ganhar um favor daqueles que se acham superiores ou privilegiados de alguma forma. E isso se aplica tanto no emprego, como na política, na família e em outras situações. Tal contenção exagerada de si próprio, renegando aquilo que você já quis pra si no passado, torna tudo muito agridoce, mas poético e iluminado. Negar aquilo a que você ama e tem desejo de se dedicar irá acarretar em arrependimentos, fatos estes que ficarão em vãs lembranças do passado, lembranças essas que soam como fagulhas no tempo, breves raios de luz de um pôr do sol, vestígios de uma luz que outrora já foram um dia. Vestígios de um dia, vestígios de uma vida e vestígios de uma escolha não tomada.
O filme segue o padrão da casa Marvel/Disney, uma superprodução escapista e divertida, que mostra a origem solo da heroína título. Existem pequeninos probleminhas na estrutura e edição do filme: uma "barriga" no meio que quebra um pouco do ritmo, um ou outro efeito de CGI que poderia ser melhor trabalhado, uma ou outra piada que não funciona tanto, pequeninas coisas que poderiam ser podadas na edição e montagem da fita. Exceto estes apontamentos, é uma superprodução divertida e com alguns belos momentos. Apesar do humor de sempre da Marvel, que serve para descarregar um pouco da tensão e adrenalina, ainda é um filme um pouco mais sóbrio.
Brie Larson não é o fiasco que se apontava. A atriz, que já possui um Oscar, entrega uma protagonista que a príncípio parece séria e apática demais, mas faz parte do roteiro trazer esta mulher mais contida e perdida, afim de logo após, trazer sua "liberdade", por assim dizer. Então, Larson entrega uma heroína de porte, que pode sim ganhar mais profundidade em futuros filmes, mas que aqui ao menos segura bem o manto, ao menos ao mostrar seus poderes e salvar o dia. Samuel L. Jackson está bem e hilário como Nick Fury, rejuvenescido digitalmente em excelentes efeitos visuais. A química dele com a protagonista é boa. Lashana Lynch como a melhor amiga da Capitã está bem e representa um elo emocional à nossa heroína. O vilão de Ben Mendelsohn tem um plot bacana, Jude Law entrega a competência de sempre, Clark Gregg como o jovem Agente Coulson da S.H.I.E.L.D. é uma boa participação (também rejuvenescido digitalmente), assim como o cameo do saudoso Stan Lee, em bonitas homenagens. A grande atriz Annette Bening que parece ter sido pouco aproveitada. A gatinha Goose pode aparecer pouco, mas deixa sua marca no filme com uma maluca participação e já queremos ver mais dela.
'Capitã Marvel' sofreu boicotes antes do lançamento, com críticas negativas de um público hater "machão" que teve sua masculinidade ferida por um filme Marvel. Tal fato só prova que tem que existir filmes feministas com mulheres fortes protagonistas. E não apenas isso, como também ter mulheres no comando das câmeras. Aqui, dentre os dois diretores, Anna Boden faz história ao comandar uma superprodução de ação e de sucesso, feito que até então só ocorreu com Patty Jenkins e seu filme 'Mulher-Maravilha', da DC. Em mais de um século de cinema, poucas mulheres terem a chance de comandar filmes deste porte dentro de estúdios majoritariamente comandados por homens, torna esta representatividade válida e crucial. Sem discursos exagerados, 'Capitã Marvel' traz um feminismo natural. Ela quer ser o que ela quer, sem ter que dar satisfação a um homem que a queira manipular. É isso, simples assim. Ela tem o direito de agir como quer e lutar por aquilo que acredita. Com um heroísmo mais contido nas palavras e expressões, mas forte no coração, ela acaba sendo uma espécie de substituta para o 'Capitão América', pois já é sabido que ela será a líder dos 'Vingadores' de agora em diante, mais uma razão dos "machões" se incomodarem. Há no filme uns detalhes interessantes: a manipulação do homem em cima da mulher, seja explicitamente (os vilões invadindo a mente dela), ou sutilmente (sem detalhes pra reservar as reviravoltas). Então tais abusos dão razão pra ela ser mais "sisuda" e contida por assim dizer. Há também um paralelo em como a menina filha da amiga dela admira a heroína, tal menina é uma representação de todas menininhas desta geração, que agora podem vibrar com mulheres fortes e heróicas no cinema, como a Capitã Marvel e Mulher-Maravilha. Note como o encanto e brilho nos olhos da garota no filme representa o encanto das meninas da atual geração, que podem e devem ser aquilo que quiserem por elas mesmas, e não por escolhas dos pais, maridos, chefes, etc.
A trilha sonora grunge dos ano 90, com músicas do Nirvana, No Doubt, R.E.M. e vários outros da época, assim como as referências e criações da década, são nostálgicas. Também temos influências narrativas de filmes e séries noventistas, como cenas de perseguição de carros típicas dos filmes de ação daquela época, assim como um clima de ficção científica conspiratória (muito em alta lá nos anos 90), como 'MIB - Homens de Preto' e até mesmo a série 'Arquixo X'.
Mesmo que clichê quanto a entretenimento, é divertido, bem feito e um sopro de encorajamento para as mulheres guerreiras da vida real. Por ser homem, não tenho propriedade pra falar de feminismo, embora apoie as guerreiras mulheres, por isso, confiram a crítica do filme lá do site Minha Visão do Cinema, onde a Eduarda Souza e a Natália Vieira escreveram com detalhes da importância do filme.
E que venha 'Vingadores: Ultimato'! Quero ver a Capitã Marvel dando uma surra no Thanos!
54 anos após o clássico musical lúdico 'Mary Poppins', com os incríveis Julie Andrews e Dick Van Dyke, chegou uma improvável continuação. Conseguindo capturar o espírito leve, infantil, doce e bastante puro, temos o retorno da babá Mary Poppins à vida da família Banks. As crianças de antes agora são crescidas, com suas próprias crias e estão passando por um momento turbulento. Tais pressões do cotidiano tiraram a alegria e o encanto dos adultos que outrora acreditavam no fantástico, e isso já está afetando as crianças. É quando Poppins entra em ação, trazendo lições para os pequeninos e mais ainda aos mais velhos. Emily Blunt é encantadora no papel da firme, mas amável babá. A atriz vem se destacando muito no cinema recente e com muita versatilidade! Do drama à comédia, do infantil ao terror, ela tem se destacado demais. Vide 2018, onde ela nos deixou apreensivos em 'Um Lugar Silencioso' e depois nos reconfortou aqui neste filme em questão. Mas Lin-Manuel Miranda também demonstra seu talento como um ascendedor de lampiões, ele canta, dança e atua muito bem, se provando um artista completo à moda antiga. Digo "completo" pois houve uma época em Hollywood, entre os anos 40 e 60, que para fazer sucesso não bastava atuar. Nos musicais, os filmes colossais dessas décadas, se precisava dançar, cantar, assobiar, sapatear e muito mais. É aí que chegamos a Dick Van Dyke, que fazia isso no 'Mary Poppins' original e aqui faz uma pequena participação - bastante nostálgica e emocionante. Já bastante idoso, o ator dono de um sorriso que marcou gerações, faz uma breve cena de dança que pega o coração daqueles que conhecem o cinema daquela época.
Assim como no riginal, há uma bela sequência onde os atores contracenam com animação, é como se fosse um desenho animado dentro de um live-action. Uma cena divertida, visualmente chamativa e com uma direção diferenciada em alguns momentos (note nos ângulos de câmera contorcidos conforme a carroça anda pelas curvas do objeto de porcelana no qual estão desenhados, além do visual rachado da porcelana, é muito inventivo!). As letras das canções contém morais que criticam nitidamente o estilo de vida estressado dos adultos, lotados de afazeres, em busca frenética por dinheiro, sempre perdendo tempo com coisas menos importantes, deixando de viver bem e deixando de respeitar as diferenças das outras pessoas. Tais morais, por mais simplistas e direcionadas às crianças, reflete diretamente nos adultos, cuja felicidade se esvai quando perde-se o brilho no olhar, quando perde-se a magia das coisas, quando passa a desrespeitar quem é diferente, quando confunde-se amadurecer com tornar-se alguém amargo e sem amor.
Bonito, simples e à moda antiga, é uma bela sessão retrô.
Sensacional filme do Uruguai, um dos melhores de 2018, que narra a jornada de 3 homens que ficaram 12 anos presos, alguns destes em cárcere privado, durante a ditadura militar de seu país. Esses 12 anos são como uma obscura e longa noite, cheia de trevas, tortura e falta de liberdade. Mas é interessante como a obra se abstém de cenas mais fortes, deixando o pesado na trama e no imaginário de quem assiste (a ditadura por si só já é pesada), focando assim, de uma maneira mais branda e positiva, o psicológico destas 3 figuras. Apesar de todo sofrimento, eles utilizam de esperança, inteligência, bom humor e trabalho duro para sobreviver dia após dia, ano após ano. As atuações são todas boas e a direção de Alvaro Brechner é firme, mas também positiva, conduzindo a narrativa de forma suave, como se fosse um raio de sol iluminando a tenebrosa noite dos nossos protagonistas. Há uma bonita mensagem sobre não desistir, se manter íntegro e ajudar ao próximo que está na mesma situação, mesmo que em minoria. O roteiro é muito coerente em não exagerar nos fatos, mas focar no tratamento e na construção destes personagens. Em tempos em que no nosso país se tenta apagar a história, onde se ignora os nossos livros, se ridiculariza professores, que se boicota tudo que destoa dos falsos ideais moralistas (como o boicote ao filme do Wagner Moura, que sequer saiu aqui ainda), em tempos em que se saúda a militarização robótica de maneira histérica e afetada, com materiais vindos da "faculdade do Whatsapp"; um filme como esse sempre é bem-vindo. Lembra-nos de que só damos valor à liberdade depois que a perdemos. Que só damos valor às pessoas depois que sangue é derramado. Que trabalhar duro, manter a positividade, utilizar de intelecto e alimentar a alma é aquilo que dá forças para atravessar longos anos, anos estes que mais parecem uma longa noite de trevas.
Lindamente construído e fotografado em preto e branco, o filme polonês 'Guerra Fria' (que concorre em algumas categorias do Oscar 2019) faz um paralelo entre história, arte e romance. Um casal desconstruído e amargo, tão "frio" quanto os emaranhados fatores políticos e culturais que esvaziam o amor e a graça do dia a dia do ser humano. Se a obra deixa momentos amargos na boca, deixa lindas cenas na memória, tremendamente bem dirididas por Pawel Pawlikowski, que faz deste um deleite visual. Cada cena é bela, meticulosamente montada para parecer uma obra de arte, uma pintura que carrega histórias e figuras de outras épocas. A química do casal protagonista é impecável, de fazer inveja à Hollywood. Especialmente Joanna Kulig, hipnótica, magnética e complexa na pele de Zula. Entre encontros e desencontros por diferentes momentos históricos e políticos da Europa, que vai desde uma Polônia devastada no pós-guerra e ocupada pela Rússia, passando por uma Paris boêmia e agitada, o filme mescla um romance disfuncional com um fundo artístico. A narrativa transborda paixão pela música nativa da Polônia, mas faz uma crítica à generalização da mesma diante a indústria. Descontrói-se algumas questões como: a perda da arte diante o lucro, a perda da liberdade diante a guerra e política, a perda do amor diante as complicações do relacionamento. Com trechos que ecoam à Nouvelle Vague da França, é um belíssimo filme, indispensável para amantes de arte e de um cinema mais maduro.
Respeite o passado e os veteranos. Mas deixe-os no seu lugar e trilhe seu próprio caminho.
A franquia do 'Rocky Balboa' sempre manteve-se fiel ao seu legado. Isso inclui os atuais filmes do 'Creed'. Muito além das lutas do ringue de boxe, a saga fala sobre o ringue da vida. Enfrentar crises econômicas, o preço da fama, cuidar da família, lutar contra uma doença, lidar com o luto. São nocautes que a vida te dá e os filmes conseguem tecer este paralelo com o boxe. Apanhar, apanhar e apanhar. Mas se levantar e continuar a lutar. Na vida, não importa bater e vencer, mas aguentar a dor dos golpes que ela te dá, se manter íntegro e dar valor ao mais importante.
O primeiro 'Creed' acertou mais em trazer um frescor, adicionando elementos como representatividade, Stallone enfrentando uma doença e ainda temos a ótima direção de Ryan Coogler, que deixou de fazer o dois para dirigir o sucesso 'Pantera Negra'. Aqui, Steven Caple Jr. é quem dirige, com uma pegada menos forte e mais genérica, tornando o filme um pouco inferior ao primeiro. Também vale acentuar que uma enxugada na primeira metade da obra ajudaria no seu ritmo inicial. Mas lá pelo meio do filme a coisa engrena, estamos convencidos da trama e daí é um deleite só. Assim, 'Creed 2' perde por bem pouco para o primeiro, mas ainda é uma obra relevante. Temos aqui os conflitos entre gerações, entre treinadores e atletas, entre pais, filhos e netos. Respeitar o passado, os veteranos, aprender com os erros e a dor são coisas necessárias. Mas se desprender disso até certo ponto, trilhar seu próprio caminho e deixar cicatrizar algumas coisas, isso é essencial.
Há aqui conflitos bem interessantes. Adonis quer vingar a morte do seu pai Apollo, mas não quer viver à sombra dele. Rocky não quer que Adonis tenha o mesmo fim que Apollo, morto no ringue. Ivan (Dolph Lundgren) não quer ficar no limbo, humilhado por ter sido derrotado por Rocky no passado, usando seu filho para voltar aos holofotes. Viktor (Florian Munteanu) vive numa dividida em não decepcionar seu pai Ivan, ao mesmo tempo que não quer ser controlado sempre por ele. E ainda temos com pequeno destaque Tony (Wood Harris), filho do treinador de Apollo, que agora treina Adonis e não quer que ele fracasse sob suas mãos. Nisso tudo, temos as mulheres em cena como as sensatas: a mãe e a esposa (Tessa Thompson) de Adonis servem como o peso na balança, não o controlando, mas servindo como a voz da razão. Este interessante jogo de perspectivas dá o que pensar sobre legado, fracasso e família.
Com a metade final da obra repleta de emoções, intensas cenas de luta no ringue e belas cenas emocionais fora dele, 'Creed 2' mantém a qualidade desta longínqua e fundamental franquia. O final é ótimo, a trilha sonora empolga e temos um contemplativo take de Rocky Balboa lá pelo fim, sob uma diferente ótica do ringue, da comemoração e da perda. Simbólico ...
Star Wars, Episódio IX: A Ascensão Skywalker
3.2 1,3K Assista AgoraTriste toda essa reação negativa em volta, comparando com o final de 'Game of Thrones' (tal comparação até faz sentido se notarmos que ambos tiveram finais apressados, mas não é para tanto). O filme não é perfeito, mas está longe de ser horrível. Realmente o que estragou os novos filmes da saga foi a divisão de visões: por um lado a Disney e o J.J. Abrams ('O Despertar da Força') queriam algo mais POP, que se espelhasse nas referências dos antigos e numa "fórmula Marvel". De outro, o Rian Johnson quis trazer novidades e quebrar expectativas ('Os Últimos Jedi'), o resultado foi uma trilogia híbrida, que toma rumos contraditórios, ao mesmo tempo em que dedica muita paixão ao passado. Esse final ficou dentro da zona de conforto, ameaçou quebrar expectativas por vezes, mas abrandou tudo por outras.
O resultado é um filme com roteiro padrão, uma repetição narrativa de 'O Retorno de Jedi', algumas voltas desnecessárias, mas com partes emocionantes, algumas despedidas emblemáticas e que traz uma interessante discussão sobre a presença do bem e do mal estarem em um mesmo indivíduo (filosofia asiática sempre presente na saga). O ritmo é muito frenético, talvez existem aqui 2 filmes em um só, se tivessem feito uma quadrilogia, por exemplo, poderíamos ter planos mais contemplativos e um desenrolar mais natural. Há alguns sustos, mas algumas cenas reconfortantes. 'A Ascensão Skywalker' é menos brilhante que o anterior no roteiro, mas ainda é um grande blockbuster, melhor que qualquer filme Marvel desse ano por exemplo, apesar dessa "Marvetização" pelo qual o cinema moderno está passando. A ação tem momentos épicos, um excelente duelo de sabre de luz, as atuações dos 2 protagonistas estão mais maduras, existe aqui uma atmosfera mais sombria, o visual é perfeito e a trilha sonora e mixagem de som são estupendas. Mesmo quando algum filme 'Star Wars' é inferior a outro dentro da saga, no todo a franquia ainda é muito boa comparando com a concorrência, e isso não é pouca coisa.
Dividirá opiniões, muitos odiarão, e entre os que queriam novidades e outros que queriam o padrão de sempre, nunca iria se conseguir agradar a todos. Mas essa nova trilogia se encerra mista, oscilando em pequenos detalhes, mas grande como entretenimento e como expansão do universo 'Star Wars', cujo nome é à prova de críticas. Quem sabe daqui um tempo, maratonando todos os filmes, tudo faça mais sentido. E que os próximos filmes que virão apontem para direções diferentes da galáxia.
Os mascotes da saga são especiais, R2-D2, C-3PO, Chewie e BB-8, contem comigo pra tudo <3
Adeus Carrie Fisher, nossa eterna Leia 😔
A experiência de viver 'Star Wars' não tem preço, independente de um ou outro filme não agradarem.
O Rei Leão
3.8 1,6K Assista AgoraO clássico de 1994 é a melhor animação já feita, uma obra poderosa que marcou época e um de meus filmes favoritos, leia minha crítica no site Minha Visão do Cinema.
Dito isto, esta nova versão não supera o original. Esse novo é uma obra-prima visual, o CGI de última geração é hiper realista, animais e paisagens parecem de verdade, a fotografia quente é de encher os olhos, é um filme onde o visual fala por si só, muito poderoso e que pode sim sair com o Oscar de Efeitos Visuais. Mas existem problemas.
A começar que não é um live-action conforme foi vendido, é uma animação, não há animais e elementos físicos, é tudo digital. E a procura por fazer algo tão realista, às vezes parece que estamos assistindo a um documentário do Animal Planet. Isso não é algo de fato ruim, mas faltam expressões e portanto, falta sentimento aos personagens. A busca pela perfeição da embalagem acabou atrapalhando o interior, a alma, o coração do filme. Falta aquela emoção, aquele arrepio, aquele sentimento que o original trouxe. Sim, um pouco é devido o fato de ser um remake e você já viu aquilo. Mas um pouco também é por essa inexpressividade dos personagens. E algumas das dublagens do áudio original não encaixam bem, principalmente nos leões adultos (não assisti ao dublado nacional).
Mas por outro lado, o filme ganha carga dramática graças à nostalgia, que sim, isso nos pega um pouco. Acompanhar as belas canções, a recriação de algumas cenas marcantes e ver Timão e Pumba, tudo traz um reconforto e uma certa lembrança emotiva. Scar também continua ameaçador. As novas cenas e a nova canção são um bom adicional que só deixam mais explícitos alguns detalhes sugeridos na outra versão. Aliás, Timão e Pumba são maravilhosos em qualquer versão, uma das melhores duplas da história do cinema <3
Mesmo faltando um pouco de encanto, ainda é um belo filme graças a poderosa trama, que traz diversos tipos de ensinamentos e reflexões. Visualmente arrebatador e contemplativo, essa nova versão de 'O Rei Leão' é pra ser visto na melhor tela e qualidade possível, pois realmente a tecnologia utilizada aqui é estonteante. Mas se você quer se emocionar de verdade, reveja o clássico.
NOTA: 7,5
Obs: estou ansioso para ver que outros filmes com este mesmo nível visual virão por aí.
El Camino: Um Filme de Breaking Bad
3.7 843 Assista Agora'Breaking Bad' é uma das melhores séries de todos os tempos, isso é irrefutável. Talvez a melhor? Muitos acham que sim. Então, era necessário um filme? Não, não era. Mas esse filme, assim como a série derivada 'Better Call Saul', são spin-offs que, embora não alcancem o clímax dramático e explosivo da série mãe, também não destroem com o legado da franquia. E na verdade, são belos derivados, pois ainda carregam os 3 pilares básicos de uma boa obra audiovisual: boas atuações, boa direção e bom roteiro.
'El Camino' traz uma justiça poética ao conturbado personagem Jesse Pinkman, brilhantemente atuado por Aaron Paul (o ator merecia mais destaque em outros filmes, ele tem talento). Com um elenco coadjuvante de peso, todos muito bem, o filme faz uma série de referências e celebrações à personagens e acontecimentos da série, sem deixar de trilhar seu próprio caminho e confirmar alguns desfechos. A direção de Vince Gilligan continua inspirada, cheia de cuidado estético que não distrai, mas adiciona à narrativa. Usa-se planos mais fechados no rosto dos atores para extrair de suas interpretações e usa-se planos abertos para contemplar a direção de arte e a paisagem e fotografia das locações. Alguns jogos de câmera são bem orquestrados, servindo como criação e quebra de expectativas em momentos chave.
Embora não tão poderoso quanto a série e com um certo ritmo lento no meio, o filme funciona por matar a saudade deste universo, trazer uma potente atuação de Aaron Paul, carregar uma linda identidade visual simples e orgânica, e conseguir carregar no seu roteiro características que lembram filmes de faroeste e de fuga, sempre com suspense e tensão, mas ao mesmo tempo, quebrando expectativas e tomando caminhos diferentes do que indicava. E também foi a despedida do veterano Robert Forster, que faleceu no dia da estreia do filme, na última sexta-feira.
Coringa
4.4 4,1K Assista AgoraPoderoso, provocante, complexo, questionador, reflexivo, sufocante, assustador, opressivo, desesperançoso, cruel e atual. Um estudo psicológico e sócio-político brutal, rumo à loucura e o caos.
Faltam adjetivos para descrever este filme, que carrega uma das melhores atuações dos últimos tempos, pois o que Joaquin Phoenix faz como o Coringa é de outro patamar, é sobrehumano, existe um trabalho corporal, vocal e psicológico que é arrebatador. Coringa é o melhor vilão do cinema, o melhor personagem já escrito em uma HQ e aqui é a comprovação disso. A DC entrega um de seus melhores filmes de todos os tempos, ao lado de 'Batman - O Cavaleiro das Trevas' e 'Watchmen', e estes são sem dúvidas os melhores filmes saídos de mitologias de "heróis". Aqui, há um estudo complexo de personagem, da condição mental de alguém doente, nas duas horas inteiras vemos apenas Arthur Fleck e tudo o que acontece ao seu redor, a maneira que ele enxerga algumas coisas e vamos vendo como o sistema da sociedade encara e cria um ambiente onde monstros podem se desenvolver. Com aspecto sujo, que remete aos filmes da Nova Hollywood dos anos 70 e início dos 80 ('Táxi Driver', 'O Rei da Comédia', 'Poderoso Chefão', 'Um Estranho no Ninho'), 'Coringa' traz uma construção visual impecável, tão tortuosa e desconstruída quanto seu protagonista. E a trilha sonora melancólica e nervosa ajuda nessa atmosfera, gerando momentos tensos e de calafrios. O filme possui aos menos umas 3 cenas que se tornarão icônicas, especialmente no fantástico final.
Não se engane, ele não é um herói, mas um perverso vilão, mas é mais um, dentre outros tipos de vilania. Garotos brancos endinheirados que se acham e fazem bullying também são vilões. Governos corruptos que cortam gastos (SUS, medicação, assistentes sociais, que não geram emprego e aposentadoria e outras coisas básicas) também são influência para surgir histeria coletiva e sociopatas. Burgueses escondidos no seu poder e que olham com desprezo aos menos favorecidos também somam para os abismos sociais, cada vez mais presentes em um mundo que idolatra mitos poderosos que fazem sinal da arminha, dizem palavras duras que ofendem ou esnobam parte da população, que não tem empatia pelo próximo e que só se importam com seu poder, sua influência, seus nepotismos e suas arrogantes posturas.
'Coringa' ainda traz uma questão muito séria de como a sociedade encara os transtornos mentais e como essas pessoas doentes, que precisam de todo apoio possível, são na verdade ignoradas, encaradas com preconceitos ou indiferenças, e como fazer isso pode levar insanos ao extremo da loucura. Imagine alguém que perdeu tudo na vida e a única coisa que tem é o tratamento público (tipo SUS), mas este tratamento é cortado pelos poderosos que nunca precisaram fazer uso de tal, afinal tem todos recursos para fazer isso no privado, se isso acontecer, quantos Coringas teremos à solta?
Coringa fala da desconstrução da imagem do mito e de como as pessoas gostam de idolatrá-los, muitas vezes por uma bizarra fagulha de esperança de que as coisas vão melhorar. A criatura é a pior possível, mas na tentativa de mudança, se espelha nela numa vã esperança dela fazer algo de bom (pois é Brasil). Isso tudo é fruto de uma sociedade doentia, que se espelha no poder como fonte de esperança, enquanto na verdade deveria ser a empatia pelo próximo. E quando acaba a empatia, começa a violência. Líderes "bem intencionados" não vão acalmar as coisas ignorando parte da população, pois aquela parcela que não lhe interessa ficará a mercê do que vier, e o que vier pode ser o caminho violento.
Há ainda elementos filosóficos complexos, assim como mitologia grega, note os conceitos de Narciso (orgulho) e Sísifo (estar fadado a um ciclo cotidiano de miséria). E isso tudo que estou falando é a ponta do iceberg. Extremamente atual na questão política, e um verdadeiro alerta e convite para empatia na questão mental e psicológica, é muito, mas muito bom ver um filme que deveria ser de ação e de "herói" (o que mais atrai público hoje em dia), mas como forma de pegadinha, te desmonta, te faz refletir, não te lança respostas, mas te obriga a se questionar. E se questionar é aquilo que as pessoas mais precisam fazer, mas o que os poderosos menos querem que você faça. Isso porque se questionar derruba poderosos, arranca máscaras e entrega respostas desconfortáveis, verdades inconvenientes. De uma forma ou de outra, é um filme onde carapuças servem para todos, como humanidade.
Não é um filme fácil, e nem era para ser. Um suspense dramático psicológico poderoso, melhor filme do ano até então. Uma aula de cinema, cinema de verdade.
"A pior parte de ter uma doença mental é que as pessoas esperam que você se comporte como se não tivesse."
Rocketman
4.0 922 Assista AgoraAo contrário de 'Bohemian Rhapsody', que até tem belos momentos dos shows, mas está repleto de problemas, como a quase vilanização do protagonista e de suas escolhas, algo possivelmente influenciado pelos integrantes vivos do Queen, 'Rocketman' acerta em ser uma produção que equilibra melhor alegria e emoção, sendo a obra uma personificação da figura ainda viva de Elton John. A direção é boa, a criação da época, figurinos e apuros técnicos são ótimos e o filme não apenas traz as canções, mas se assume como musical, com diversas cenas lúdicas onde viajamos na imaginação do cantor, suas canções fazem as pessoas flutuarem, literalmente, e isso é mágico.
Com influência do próprio Elton John, o filme é sincero em mostrar os excessos e erros do próprio. É bonito o fato dele culpar a si mesmo e dar a volta por cima, sempre em busca do seu sonho e de sua identidade. Excelente atuação de Taron Egerton, que encarna Elton com maestria e energia. O mesmo se diz de Jamie Bell como Bernie, melhor amigo do cantor, juntos são uma dupla incrível. Emocionante de forma sutil e muito divertido, é um ótimo filme, merece ser conferido!
Era Uma Vez em... Hollywood
3.8 2,3K Assista AgoraFilme: 'Era Uma Vez em ... Hollywood' (2019, de Quentin Tarantino)
Será textão, primeira parte SEM SPOILERS, depois da nota terá.
Uma obra de homenagens. Homenagens à Era de Ouro de Hollywood, à Sharon Tate, ao ano de 1969, ao fim do sonho hippie, à arte de se fazer cinema, ao próprio Tarantino e aos sonhos perdidos de outrora.
Mesmo que com suas principais características, como humor ácido, diálogos longos e sagazes, cenas gráficas chocantes, excelente trilha sonora escolhida a dedo pelo cineasta, trama fragmentada que se encaixa ao fim, críticas sociais com uma certa representatividade, talvez este seja o filme mais descontraído, simples e maduro do diretor. Não é o melhor, mas ainda uma grande obra, é interessante como ele arrisca algumas novas nuances, mesmo dentro dos seus trejeitos. Através de quebra de expectativas por quase três horas, ele faz algumas coisas contrárias ao que o público que o conhece espera, sem deixar de ser o próprio.
Leonardo DiCaprio e Brad Pitt formam uma dupla espetacular em cena, com muito carisma e química, ambos são hilários de maneiras diferentes. DiCaprio, um dos maiores atores do cinema moderno, talvez o maior, entrega um personagem engraçado, mas com camadas dramáticas, um ator que está em uma encruzilhada entre se tornar um astro ou ser esquecido. E nesse medo de ser esquecido, entrega cômicos e bonitos momentos sobre as inseguranças de ser um ator. Pitt, conhecido por ser galã, mas não tão reconhecido por ser bom ator (e é nítido que Tarantino trabalhou em cima desses dois fatores ao longo do filme), entrega uma das melhores atuações da carreira, ele é um dublê hilário, porém com um toque mais misterioso. Aliás, na reta final do filme, é ele quem brilha.
Margot Robbie como Sharon Tate é pouco aprofundada, a personagem tem poucos diálogos ou dramas. Mas ... foi uma escolha proposital, pois o diretor a coloca o filme inteiro em situações de brilho, luz, alegria, sorrisos, com belos figurinos, uma figura quase angelical, uma forma de homenagear a atriz Sharon Tate, brutalmente assassinada na sua casa e grávida aos 8 meses na vida real. A cena em que ela está camuflada no cinema, assistindo ao próprio filme e vendo as reações das pessoas ao sorrirem por ela no filme, é linda, é uma cena emocionante, nos lembra que fazer arte e ver a reação positiva do público quanto a isto deve ser algo gratificante. Ver cenas onde Sharon Tate esbanja felicidade e vida dói, pois sabemos o seu destino. O restante do grandioso elenco aparece rapidamente, cada um com suas peculiaridades.
Aliás, existem muitas referências aos demais filmes do diretor, em um exercício metalinguístico cinematográfico, com filmes dentro do filme, takes fictícios, reconstruções e detalhes que remetem a 'Bastardos Inglórios', 'À Prova de Morte' (inclusive na presença da esquecida categoria dos dublês), 'Kill Bill', 'Django Livre' e vários outros. Há diversas personalidades e filmes da época, como um hilário Bruce Lee, menções indiretas à Sergio Leone, e por aí vai. A trilha sonora é incrível e os figurinos de época são espetaculares, algumas peças de roupa e acessórios tem cenas de destaque somente para elas. Nessa reconstrução da época, roupas, carros, bares e elementos de 1969 assumem um papel de personagens fundamentais na narrativa da trama.
O filme, por horas, pode aparentar ser longo, com diferentes situações que aparentemente não chegam em lugar algum, alguns diálogos por vezes são longos demais e talvez em alguns momentos há certos preconceitos com os hippies, através de diálogos sacanas. Mas a reta final do filme amarra tudo e compensa tudo. A cena em que Pitt chega no rancho da Família Manson é assustadora. Existe aqui uma lenta construção de tensão, por uns 10 ou 15 minutos ficamos cada vez mais tensos, num clima quase de terror, só conseguimos sentir uma energia estranha no ar e naquelas figuras hippies. Imagina o Tarantino fazendo um filme de terror nessa pegada?
O final compensa com um confronto brutal, mas ao mesmo tempo hilário. E depois de quase três horas de viagem de volta aquela época, a bonita e sutil cena final entrega algo inesperado, uma cena reflexiva. Assisti ao filme na sexta e sigo pensando nele até agora. "E se ..." talvez defina aquele final. Uma cena que te abraça de uma forma incrível.
Um filme completo, um dos melhores do ano, cinema de verdade, transitando entre a comédia, o drama e o suspense, o belo final justifica o "Era Uma Vez" do título, apesar dos históricos reais, essa é a fábula de faz de conta do mestre Tarantino, a forma dele olhar e homenagear vários pontos do passado e brincar com algumas coisas que se perderam com o tempo, com o fim de uma era, com o chocante final do movimento "paz e amor" onde acreditava-se que ser hippie salvaria o mundo. Homenageando a graça de se fazer cinema, mas sem deixar de por o dedo na ferida nas dificuldades e no cinismo que muitas vezes se encontra na indústria.
NOTA: 9,5
COM SPOILERS, SE NÃO VIU, NÃO LEIA
Sobre aquele final, foi a forma do diretor brincar com o "e se" a pobre Sharon Tate, que irradiava luz e talento, tivesse tido uma chance. E se heróis da ficção qualquer tivessem dado o troco na Família Manson? Os filmes do Tarantino sempre possuem justiças poéticas. Vou explicar: em 'Kill Bill' a mulher oprimida acaba com os homens opressores. Em 'Bastardos Inglórios' temos um grupo de assassinos que mata nazistas assassinos, além da mulher judia que queima fascistas. Em 'Django Livre' temos abolicionista e escravo acabando com escravagistas. Aqui nós temos a classe dos artistas acabando com os hippies assassinos de Charles Manson, que na vida real chocaram Hollywood e marcaram o fim de um sonho de estilo de vida perfeito. Nada mais justo do que colocar artistas para massacrar assassinos, é irônico, mas é justiça poética, tão presente nos filmes do diretor.
Outra justiça foi a cutucada que deram no marido da Sharon, o diretor de cinema Roman Polanski ('O Bebê de Rosemary'), que futuramente estaria envolvido em escândalos sexuais de estupro e pedofilia. Em determinado momento se dá a entender que ela era boa demais pra ele e que mais cedo ou mais tarde ele faria uma bobagem e ela deixaria ele.
John Wick 3: Parabellum
3.9 1,0K Assista AgoraO 1° filme de 2014, apesar de clichê na trama, trouxe uma mitologia própria, boas cenas de ação e o protagonismo do querido Keanu Reeves, que estava em baixa na época. O 2° filme trouxe um reencontro de Reeves com Laurence Fishburne anos após 'Matrix' e surpreendeu ao expandir ainda mais o universo da saga, além de mais e melhores sequências de ação, com muito estilo e arte, sendo um dos melhores longas de 2017. Agora o 3° surge repetindo o sucesso, expandindo a nível mundial a franquia, com cenas de ação e visual cada vez mais caprichados!
Reeves continua incrível na pele do herói e desta vez a franquia traz de volta aos holofotes dois sumidos: Halle Berry e Mark Dacascos. As cenas de ação são eletrizantes, com sequências intermináveis de cair o queixo. E apesar de toda pancadaria, das mais variadas formas possíveis, a direção se preocupa em fazer tudo com estilo, com coreografias que mais parecem danças, uso de ângulos de câmera estilosos, muitas cores neon, plano-sequências incríveis e com figurino, direção de arte e trilha sonora muito bem feitas, que ajudam na composição das cenas. Ah, aqui os amigos doguinhos tem muito mais destaque! Há uma sequência de ação inacreditável envolvendo os personagens do Keanu e da Berry e os dois cães dela, os 4 contra um exército de vilões e sinceramente me pergunto até agora como "que raios" filmaram algumas das cenas, pois são incríveis e na maior parte do tempo são os cães reais (e não CGI). Quando você ver o filme entenderá, é de cair o queixo (se fizerem um filme só com esses cachorros combatendo o crime, eu assisto haha).
A saga está em expansão constante, a cada hora as coisas vão ficando mais graves, a escala e os desafios aumentam, até no final se deixam lacunas para algo sempre maior e mais intenso para o próximo filme. 'John Wick 3' é pura ação, de tirar o fôlego, ao mesmo tempo em que é muito bem dirigido, com um roteiro bem construído e um visual cheio de arte. E falar disso em um filme que deveria ser "só mais um filme de ação" não é pouca coisa. Na verdade é um dos melhores filmes do ano. Que venha o 4 e série, que já estão em desensolvimento!
Obs: John Wick é o protetor oficial dos doguinhos? 🐶🎬
Aladdin
3.9 1,3K Assista AgoraO filme tem sérios problemas técnicos, principalmente de direção e visual. O diretor Guy Ritchie parace ter sido uma escolha equivocada para comandar o filme. Ele se sai razoavelmente bem em filmes simples e de ação ou crime. Mas parece que ele não sabe comandar superproduções. A direção é engessada, não é natural, falta algo ao filme pra fluir com suavidade. No visual, o CGI é ruim a maior parte do longa, com gráficos que parecem de um game, não parece que o longa teve todo um grande orçamento, pois às vezes parece não muito bem renderizado. Assim como algumas coisas na produção são estranhas, como a chapinha do cabelo do herói. E os vilões Jafar e Iago são muito fracos, descaracterizados. Iago pouco faz e Jafar, bem, ator errado, ele não ameaça, não tem força nem na atuação corporal, quanto menos na voz.
Adaptar a clássica animação 'Aladdin' seria de fato difícil, o original de 1992 é uma das melhores obras da Disney naquela época. Mas aqui tenta-se algumas coisas novas, sem desonrar o desenho. A vibe do filme é positiva, alegre, embora seja de cultura árabe, por vezes lembra o estilo dos filmes indianos de Bollywood. As partes musicais são nostálgicas e bonitas. Existe uma nova canção que empodera a Jasmine que parece não casar bem com o estilo épico do filme, mas não é uma canção ruim e adiciona camadas na princesa. Se na animação ela já tinha uma pegada feminista, aqui abraça-se isso com eficiência, uma mulher com voz ativa (especialmente no conservadorismo patriarcal árabe) é algo que o mundo necessita e ao menos na ficção nos presenteiam com isso. Naomi Scott é excelente como Jasmine, ela tem força em cena, bela voz e fico imaginando se o filme não seria inovador e melhor se ela fosse a verdadeira protagonista da obra. Já pensou um remake live-action feminista onde inverte-se o protagonismo? Ah se eu fosse o diretor ...
Mena Massoud dá conta do recado como Aladdin e Will Smith é incrível como o gênio. Smith é um dos atores mais carismáticos de Hollywood e aqui lembramos os motivos. Ele brilha em cena, adicionando sua personalidade própria (note a pegada hip-hop da canção 'Prince Ali'). E Smith energiza o seu Gênio sem desonrar o lendário Robin Williams, que fez um dos melhores trabalhos de dublagem da história, na clássica animação. Figurino, direção de arte, os números musicais e a trilha sonora são caprichadas, ajudando a dar uma vibe alegre à obra.
O novo 'Aladdin' tem tropeços, especialmente no visual, na direção sem visão e não é melhor que o original. Mas ainda existe um encanto, o trio principal manda muito bem em carisma e o filme joga a princesa Jasmine no elemento girl power que tanto se precisa na sociedade machista hoje em dia. Vale ser assistido sem cobrar demais.
Obs: eu assistia ao desenho quando criança e sempre quis um tapete mágico pra mim. Cresci e ainda continuo querendo 😜🎬
Parasita
4.5 3,6K Assista AgoraExistem dois fatos inegáveis: o cinema sul-coreano está em alta e o diretor Bong Joon-ho é um dos maiores cineastas do momento. Ele já entregou os sólidos 'O Hospedeiro', 'Okja' e 'O Expresso do Amanhã', dentre outros. Agora ele ataca novamente com o impressionate 'Parasite'. Uma família pobre começa a se infiltrar como empregados em diferentes áreas na mansão de uma família rica, com a esperança de usufruir um pouco da "boa vida". Eles farão qualquer coisa para chegar onde querem, fato que os colocariam numa posição de vilões, mas não é bem assim.
O roteiro é genial ao abordar o lado obscuro de todos, mas sem deixar de humanizar essa família "parasita", por assim dizer. Existem motivações para eles fazerem isso e a família rica não colabora muito, na verdade eles são detestáveis, mesmo que inicialmente fossem ser "vítimas" de aproveitadores. Com um malabarismo impressionante que passa por gêneros, o filme brinca e flerta com o drama (focando no emocional das figuras centrais), a comédia (sempre em tons ácidos e sarcásticos) e o suspense (crescente e cada vez mais nervoso, chegando a um final chocante).
'Parasite' é brilhantemente dirigido por Bong Joon-ho, com um ritmo frenético, ângulos de câmera inspirados, um senso estético perfeccionista, com uma mise en scène que ajuda a compor as metáforas e críticas sociais que permeiam o sagaz e feroz enredo. O filme desafia a sua mente a se questionar sobre situações do cotidiano, como um soco na mente, te causa desconforto e aqui se discute a tal meritocracia e as diferenças de classe. A burguesia é suja e o pobre que quer ser rico terá que se sujar também. E mesmo que um rico ou patrão fique feliz com sua melhoria na vida, como não saber que aquilo é falso e na verdade ele se sente ameaçado? Obra impressionante, uma das melhores do ano até então!
Obs: fique longe da bela família feliz, cidadão de bem com dinheiro e casarão, que só quer pagar seu estilo de vida e mantê-lo assim, fique bem longe ...
A Rebelião
2.6 126 Assista AgoraUm excelente, mas excelente potencial, desperdiçado em um filme confuso. Já começa pelo título no Brasil, bastante genérico, já que o original 'Captive State' faz mais sentido. Com um ótimo elenco um tanto desperdiçado, onde vale salientar que o grande John Goodman e o protagonista Ashton Sanders entregam bons desempenhos, o filme parece perdido. Na trama, após um colapso mundial, alienígenas que invadem a Terra conseguem trazer uma "política de paz" com os humanos. É claro que não há paz, apenas mais barreiras sociais. E é claro que haverão conflitos entre os que apoiam a nova política autoritária e aqueles que resistem e lutam contra a mesma.
O filme é uma clara metáfora da resistência, da luta contra essas políticas falsamente bem intencionadas que surgiram por aí (Brasil!) e que no fundo só fazem bem pro seu próprio lado. O roteiro tentar abordar isso de forma séria, complexa e abrasiva e até é interessante. O problema é que é um filme que falta algo. Não há desenvolvimento crítico profundo para ser algo mais complexo. E não há ação ou efeitos especiais suficientes para ser algo mais puxado pro entretenimento. Então o filme não chega a divertir de forma boba como a maioria dos filmes de ação fazem, se levando a sério, mas também sem explorar os limites da seriedade a que propõe, o que é uma pena.
Há um certo valor narrativo, mas que contenta-se com um final inacabado. Perde-se a chance de se fazer algo fora da caixinha. Poderia não haver alienígena nenhum e ser tudo manipulação governamental. Ou poderia-se aprofundar mais na guerra contra o poder. Mas fica tudo no mesmo lugar, dando voltas em alguns discursos que pouco avançam na obra, uma pena. Há elementos interessantes, existe um teor realista em como funcionam as políticas "amigas' que enganam o povo pra parecer tudo bem, enquanto que na verdade a casa está caindo. Mas foi pouco explorado. Quem sabe com o tempo a obra possa ser melhor avaliada.
Vingadores: Ultimato
4.3 2,6K Assista AgoraFilme: 'Vingadores: Ultimato' (2019, de Anthony e Joe Russo)
Breves comentários SEM SPOILERS. Futuramente farei comentários com spoilers. Mas quem já viu e quiser falar spoilers no privado, é só chamar. Só não comenta aqui em respeito a quem não viu.
Não é perfeito. Mas falar de perfeição torna-se um paradoxo cinematográfico. Filmes de super-heróis são mainstream, são para consumo rápido, com objetivo de atingir o maior público possível e vender produtos para fãs. Isso afasta aqueles que gostam de obras maduras e cult por exemplo. Não se engane, se você não gosta de fantasia e heróis, não gostará desse aqui. Na verdade já deve estar saturado de tantos comentários sobre os Vingadores. Mas se você acompanha essa saga ao longo dos seus 11 anos e 22 filmes, se você acompanha o cinema moderno e a sua principal fonte de renda (blockbusters de heróis) e se você gostou do que viu até aqui, este é seu filme.
Há problemas de excesso de piadas, pequenos furos e lacunas no roteiro, clichês, melodramas, excesso de CGI, dentre outras coisas. Mas isso são coisas mínimas distribuídas nas 3 horas de duração, onde os acertos compensam. O Ultimato é o encontro de todos universos e destinos até aqui. É fan service puro, escapismo escancarado, que abraça o impossível e não tem medo de ser feliz, nerd e maluco.
Há um certo amadurecimento na forma de se apresentar o misticismo dos heróis. Esse filme aparece como uma metáfora e sintetiza toda essa era moderna com dezenas de filmes baseados em quadrinhos. Aqui a Marvel se ajoelha diante de si mesma e cria a referência da referência. Assume-se de vez as possibilidades infinitas dos quadrinhos, mas ainda tentando homenagear quem acompanha a simplicidade do que é ser um herói, isso desde o primeiro 'Homem de Ferro'. Começaram de maneira mais realista, foram fincando os pés na fantasia e criaram assim sua saga do Infinito.
Há no filme belos momentos, alguns inesperadamente tocantes. Robert Downey Jr e seu Homem de Ferro entrega uma sólida atuação, até mesmo maior do que se exigia. Jeremy Renner e seu Gavião Arqueiro, Chris Evans como Capitão América e Scarlett Johansson como Viúva Negra também entregam belas passagens. Até Paul Rudd como o Homem-Formiga tem momentos emotivos, por mais engraçado que ele seja. Ah, Rocket é o melhor, sou fã daquele guaxinim rsrs. O elenco é grandioso, talvez um dos maiores já montados até aqui.
O início lento é necessário pra dar peso. É o tudo ou nada. A ação demora, mas engata. O final é épico e empolga qualquer um que goste de super-heróis. É um sonho nerd realizado e concretizado. E quem conseguir se envolver com esse universo, se dará ao luxo de se emocionar. Prepare-se para alguns nós na garganta.
Filmes de heróis são bobos. Nunca será diferente. E tudo bem, não existe problemas nisso. 'Vingadores: Ultimato' não será eleito o melhor filme do ano pela crítica e pelos cinéfilos exigentes. Tampouco é esta a intenção. Não será o melhor, mas será o filme do ano. Em bilheteria, em comoção pública, em momentos épicos, em debates, em novas portas que se abrem e outras que se fecham nesse universo. Vejo alguns irritados com tamanha comoção. Mas foram 11 anos cativando o público, levando milhões de pessoas por essas jornadas, fazendo a gente esquecer dos problemas diários e viajando por novos mundos. 11 anos de construção da magia e encanto. Tal sucesso torna-se inevitável. Tal sucesso torna-se merecido.
É mais que um filme. Assim como 'Avatar' ou 'Titanic', é um evento onde o mundo parará pra assistir. Mas aqui tem essa diferença de se ter construído isso e ter se cativado todo esse público. E hoje ao ver no cinema cerca de 400 pessoas rindo e chorando juntas, batendo palmas, empolgadas e desesperadas, no banheiro haviam rapazes que não se conheciam conversando e criando laços pelo filme, ver dezenas de pessoas com camisetas nerds sem se sentir ridículas, ver tudo isso confirma o motivo de toda esta comoção. É o poder que um filme popular tem. Estamos em um mundo destruído por diversos Thanos, então ver um único filme de fantasia unir e fazer pessoas tão distintas viajarem juntas, isso tem o seu valor. Pode não ser a arte na forma mais complexa, mas é a fuga do nosso cotidiano na forma mais sincera. E por tudo isso, meus parabéns Marvel. Podem vir mais 10 anos e 20 filmes. Que venham mais filmes de todos os tipos pra todas pessoas e que eles possam fazer isso em pequenas ou grandes escalas: somar a todos nós.
NOTA: 9
Vidro
3.5 1,3K Assista AgoraO diretor M. Night Shyamalan ('O Sexto Sentido') entrega com 'Vidro' o capítulo final de sua trilogia de suspense, que começou com o ótimo 'Corpo Fechado' e surpreendeu ao continuar no bom 'Fragmentado'. Porém, em 'Vidro', temos um desfecho que por vezes é interessante, mas por outro lado decepciona um pouco. Não é um filme ruim ou horrível. Há muito o que se aproveitar nessa saga do Shyamalan. Se pensarmos nos três filmes, temos um estudo psicológico, filosófico e desconstruído dos heróis, vilões e poderes. Com um viés mais realista, as fantasias das HQ's são desconstruídas por um lado mais sombrio e misterioso. Muito mais do que glamouroso, uma habilidade especial pode ser assustadora. E é isso que o cineasta fez com essa saga, dissertando em cima do imaginário que hoje permeia forte o cinema: os super-heróis.
Em 'Vidro' é interessante a forma que o diretor leva a trama. Em vez de um caminho mais grandioso, ele toma o rumo oposto e entrega um filme pequeno, intimista, sutil. O problema é que às vezes é quase chato. É salvo pelo bom elenco em cena, especialmente Samuel L. Jackson, James McAvoy e Sarah Paulson, todos os 3 brilhando em cena. Já Bruce Willis está estranhamente apagado diante o restante. E Anya Taylor-Joy, apesar de sempre competente, pouco acrescenta no longa. O visual é bem simples e limpo, mas competente. Há um jogo de cores e luzes conforme a personalidade do personagem que está em cena, o que é bem legal. A reviravolta típica dos filmes do diretor é ok dentro da trama, mas nada que surpreenda de fato. No fim, 'Vidro' é um filme ok, merece ser conferido pra fechar a trilogia e deixa uma interessante reflexão diante o fascínio atual pelos super-heróis. Mas por tomar um caminho mais contido, perdeu a chance de ser o confronto épico desejado. Preferiu ser um ensaio e uma metáfora aos heróis, vilões e poderes, do que ser um filme sobre isso mais propriamente dito.
O Homem Que Matou Hitler e o Pé Grande
2.6 35 Assista AgoraO nome da obra vende a ideia de um trash daqueles, o que poderia render um filme divertido. Mas na verdade é um drama com trechos históricos e de caráter pseudo-conspiratório, onde na verdade a fantasia serve de pano de fundo para uma história sobre envelhecimento. Sam Elliott, que concorreu ao Oscar de Ator Coadjuvante pelo ótimo 'Nasce Uma Estrela', interpreta um veterano de guerra, cujos dias são envoltos de lembranças e nostalgia, em uma vida já cansada. Até que o governo o chama para conter um misterioso ser (um Pé-Grande?). Então ele começa a se lembrar dos tempos de guerra e de sua difícil missão, matar o próprio Hitler. Apesar de misturar duas teorias da conspiração ao mesmo tempo, o filme surge como uma espécie de metáfora sobre a velhice, olhar pra trás e se arrepender de não ter feito coisas, de não ter aproveitado a vida. Agora, será que ele realmente realizou isso tudo? Ou são devaneios?
O filme é prejudicado pelo orçamento baixo e um ritmo um tanto lento. Até os confrontos são mais lentos. Há uma interessante direção de arte de época, um dos poucos recursos visuais do longa. A direção e o roteiro parecem não saber bem que rumo tomar: será um drama, um suspense conspiratório ou uma fantasia trash? Então parece que se tivessem tomado um rumo mais cômico e dinâmico, teríamos uma grande obra. Mas contentam-se com pouco, o que tira a força sarcástica da trama. Mas a atuação de Sam Elliott carrega o filme nas costas. Seus trejeitos, tom de voz, a dinâmica com todos em cena, até o seu velho cachorro, tudo passa algo verossímel, que salva o filme de ser mais fraco. Brevemente divertido, com um bom protagonista e uma interessante crônica à velhice, é um filme mais curioso pela trama do que pela execução, mas que merece ser conferido sem preconceitos.
Nós
3.8 2,3K Assista Agora*Comentário com SPOILERS, se não viu o filme, não leia!
Outro dia falei do filme sem spoilers e disse que voltaria pra falar dele com spoilers e alguns aprofundamentos e simbolismos, bem vamos lá.
'Nós' traz diversos simbolismos, metáforas e referências, a maioria bem sutis e deve-se estar bem atento à detalhes, além de estar por dentro de parte da história social dos Estados Unidos. Aliás, 'Nós' pode ser considerado um quebra-cabeça social. Começando pelo nome original 'Us', que traduzindo seria o 'Nós', mas que também serve para a sigla United States, pois na trama, temos uma alusão e uma crítica ao estilo de vida das famílias americanas, além de questões sociais bem pertinentes. Uma dessas questões vem na forma das sombras, ou os acorrentados. Eles facilmente podem ser as minorias menosprezadas, mau tratadas e deixadas à deriva pelo governo e pela sociedade classe média/alta (alô Brasil). O fato das sombras atacarem faz um paralelo à violência que algumas minorias acabam recorrendo. Mas estes também podem ser encarados como os instintos adormecidos nas pessoas, que vez por outra afloram de forma destrutiva.
As luvas lembram as que os membros dos grupos Panteras Negras usavam, um partido socialista americano que lutava a favor dos negros, principalmente para combater a violência dos policiais brancos. As tesouras trazem um sentido de duplicação: duas partes iguais em um mesmo objeto. Assim como as aranhas que a protagonista enxerga no início do filme. Na psicologia e na literatura as aranhas representam duplicação. Isso eu percebi já de cara graças ao filme 'O Homem Duplicado', baseado no livro de José Saramago, onde o protagonista enxerga aranhas gigantes e sofre da síndrome da duplicação. Todos esses elementos acabam justificando a reviravolta do filme, de que a protagonista já era a "sombra", o duplicado, e não a "original" que havia ficado acorrentada nos túneis, quando elas se encontraram na infância. O medo da protagonista então não é de ter uma cópia, mas da original voltar e a desmascarar, por isso que de todas as cópias, somente a dela falava, pois era a original. Mas o fato da cópia dela falar indica que sim, as sombras poderiam então se adaptar ao nosso mundo. Tudo foi resultado de um experimento de cunho governamental e místico (religioso talvez? não se sabe). Os coelhos, além de alimento pras sombras, representam reinícios e fertilidade, explicando assim a necessidade das sombras de se libertarem das correntes e irem pra superfície, matando os originais no mundo todo e recomeçando a sociedade. Uma metáfora aos oprimidos quererem ter sua voz ouvida e recomeçarem suas vidas de igual para igual com os privilegiados. Há ainda diversas referências e easter eggs com o próprio cinema de horror, como 'Tubarão', 'Corra!' (filme anterior do diretor), 'Corrente do Mal' e outros, assim como uma homenagem aos home invasion, filmes onde assassinos invadem e atacam uma família ('Os Estranhos', 'Você é o Próximo').
A corrente de mãos dadas é uma referência a um movimento social que não deu certo (1° cena do filme, a menina assiste na TV), outra crítica a como nós falhamos como sociedade em sermos igualitários. Há muito mais a se dicutir, como duras cutucadas na era presidencial de Trump, à hipocrisias da sociedade, os excessos da polícia contra os negros (note a música fuck the police tocando em momentos chave), assim como a família de amigos brancos dos protagonistas são representações estereotipadas de famílias problemáticas (ele é um playboy malandro, ela superficial, as filhas são mimadas). No fim, 'Nós' é sobre nós, nossos problemas, nosso lado obscuro, a luta social que cada um trava e nosso fracasso coletivo como humanidade.
E você que assistiu, o que mais notou na obra?
Dumbo
3.4 611 Assista AgoraÉ complexo criticar filmes que apelam para a emoção se utilizando de animais, ainda mais se você é sensível à esta temática. 'Dumbo' é um filme que traz alguns clichês, reconta a mesma história da clássica animação Disney dos anos 40, porém com uns acréscimos de personagens e dramas humanos. É nesta parte humana que o filme não é tão bom, pois temos pouco interesse pelos humanos, quando queremos mesmo é ver o elefantinho orelhudo. Mas quando Tim Burton traz a magia e encanto com o Dumbo em cena, o filme cresce muito e é encantador. O CGI usado na criação do bichinho é surreal de tão bom, parece de fato um ser vivo em cena. Ele tem mais expressões faciais do que o elenco humano. As cenas em que ele esboça tristeza, medo, espanto, são tão críveis e sensíveis que é difícil não se emocionar.
O grandioso elenco está ok, não fazem nada muito extraordinário, mas estão para dar suporte ao Dumbo. Colin Farrel está ok, Danny DeVito é uma grata surpresa e apesar de Michael Keaton estar caricato e exagerado como o vilão, é bacana ver Keaton e DeVito novamente em um filme do Tim Burton (eles foram o Batman e o Pinguim nos anos 90, respectivamente). Ah, e é sempre bom ver Eva Green, mesmo que não tanto utilizada. A fotografia, o figurino, a maquiagem e a direção de arte são lindas, capturam o espírito circense e juntos aos bons efeitos de computação, tornam este um dos filmes mais belos de se olhar nesse início de ano. E é muito bom ver Tim Burton, depois de uns anos de trabalhos mais fracos, trazendo um filme mais bacana e que aquece o coração. Me lembrou aquele ótimo 'Peixe Grande e suas Histórias Maravihosas', um Tim Burton mais otimista e acolhedor.
Mas o importante mesmo é Dumbo e sua mensagem. São duas as lições: a primeira refere-se ao combate à violência e maus tratos com os animais, inclusive em circos e outros trabalhos; e a outra lição seria aquela história de você se sentir o "patinho feio". Em tempos intolerantes, é importante mostrar que ser diferente é normal e bonito, que cada um carrega sua beleza e que aquilo que os outros ridicularizam, pode ser seu dom especial. Bonito e emocionante, é um dos melhores live-actions da Disney. Levem seus pequenos pra assisitr, eles irão amar e você ainda poderá ensinar algumas coisas a eles. E pra finalizar, o vôo de Dumbo é libertador e simbólico, é a quebra das correntes que os outros querem impor pra cima de você!
Nós
3.8 2,3K Assista AgoraÉ complexo falar de 'Nós' sem soltar spoilers, é um daqueles filmes que é um "spoiler ambulante". Mas resumidamente, é o melhor filme do ano que assisti até então. O diretor Jordan Peele, que ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original com o excelente 'Corra!', além das indicações de Diretor, Filme e outras, entrega aqui mais outro filme imponente. Se em 'Corra!' tínhamos um suspense mais crescente e sutil, com uma estrutura aparentemente simples, mas uma excelente construção da crítica racial que se fazia, aqui em 'Nós', temos um terror mais propriamente dito, com uma ideia muito mais complexa, cheia de camadas e lotada de críticas sociais, raciais, teorias da conspiração e simbolismos metafóricos e metalinguísticos.
Essa complexidade, além dos inúmeros plot twists (alguns um pouquinho previsíveis, mas vários muito bem elaborados), são coisas que podem afastar alguns. Algumas coisas aparentemente abstratas podem confundir o expectador, sem falar que em dado momento o filme aparenta tentar ser inteligente demais. Mas sinceramente, gostei muito desta inteligência. O diretor Peele prova que conhece bem o gênero terror e não tem medo de brincar com o estilo, trazendo referências, mas desconstruindo características do mesmo, dando algumas guinadas interessantes. O título original 'Us' serve tanto para a tradução 'Nós', quanto para a sigla United States, numa clara crítica aos Estados Unidos e seus diversos problemas sociais. Mas vai além disso, trazendo os problemas mais íntimos de famílias e indivíduos, de formas bastante simbólicas. Eu costumo dizer que poucas coisas assustam tanto quanto a realidade. E o que o diretor faz com seus filmes é trazer uma fantasia que na verdade traça paralelos com a realidade.
A direção é boa, com algumas cenas onde o ponto de vista varia de acordo com o personagem e o cenário. O elenco é fenomenal. Lupita Nyong'o é destruidora, uma atuação monstruosa. A moça está crescendo e já pode ser considerada uma das grandes atrizes da atualidade. Sua performance dramática, corporal e vocal é incrível, de cair o queixo em dados momentos. Mas todo restante dos atores estão bem, especialmente Elisabeth Moss.
'Nós' é enigmático, levemente divertido, bastante cruel e um complexo quebra-cabeça social e moral. Você poderá amá-lo ou odiá-lo, mas ele irá de algum modo te contar alguma coisa, seja aquilo o que você absorver.
Não há nada pior do que nós mesmos.
O Menino que Descobriu o Vento
4.3 741O ator Chiwetel Ejiofor estreia na cadeira de diretor com esta emocionante história real, sobre um menino de uma pobre aldeia da África, que diante a face da seca, fome e morte, decidiu colocar seus conhecimentos em prática e construir um moinho de vento, para gerar energia elétrica e ligar a bomba de água da aldeia.
Apesar do baixo orçamento e de clichês típicos de cinebiografias na construção da narrativa, o filme te ganha pela força. Se você não se fragiliza com uma situação dessas, você não é humano, simples assim. E é impossível falar desta obra sem tocar em feridas sociais e políticas. Vamos pensar: o que impedia os vários adultos de construir moinhos e salvar vidas? O conhecimento? Até certo ponto sim, mas há muito por trás. O momento em que a trama se passa é conturbado. Temos a influência do tempo, ocasionando tanto enchentes como seca. Temos um fundo político onde o governo nada faz. Ao contrário, ainda faz-se racionamento de comida. Ajuda estrangeira não vem, ainda mais com a atenção dos Estados Unidos voltada para o Iraque logo após o 11 de Setembro (na verdade o interesse era o petróleo). A vila ainda possui um fervor religioso e tradicionalista que atrasa e impede que o conhecimento ganhe forma prática. O próprio pai do garoto é conservador e desacredita nos livros de ciência do filho, renegando a esperança do menino como simples "imaginação" ou utopia.
Sendo assim, 'O Menino que Descobriu o Vento' traz uma forte verdade que se estende por outros países, até mesmo nosso Brasil (com seu árido sertão). A política e o militarismo se lixam pra fome e sofrimento do povo, se escondendo atrás de armas, repressão e burocracia política. O povo fica cego diante costumes conservadores e religiosos, nada fazendo para solucionar o problema, esperando um milagre ou uma ação política. Tudo burocracias, tudo bobagens que matam. Pois política, armas, religiões, pré-conceitos e conservadorismos levam à ignorância. E um povo ignorante e cego mata e morre! Mas o conhecimento, os livros, a cultura, o amor ao próximo, isso colocado na prática, salva. Não estamos aqui sendo demagogos em teorias. Falamos da prática, do que torna o homem um ser vivo, humano com sentimentos e empático à dor alheia. Essa é aquela verdade incoveniente que renegamos no cotidiano, mas em que em um momento de verdadeira crise, faz toda diferença. O garoto do filme tem tudo que precisa: seus livros, sua educação, seu conhecimento. Então ele bate de frente com todo conservadorismo que for preciso, pois ele sabe que há vidas em risco, ele sente na pele a dor da perda, de ver um ser vivo ao seu lado morrer de fome descenessariamente, visto que a solução estava ali, na frente de todos, era só colocar em prática.
Emocionante do começo ao fim, tem uma cena que marcou e até agora não superei, quem já assistiu e quiser falar sobre no privado, à vontade. Um filmão atual e necessário, que rende algumas reflexões interessantes sobre a importância da educação, cultura, conhecimento, professores, livros e história, coisas cada vez mais negligenciadas por uma sociedade moderna cada vez mais hipócrita e cega, cegueira causada seja pela inútil política, seja pela comodidade dos indiferentes.
Vingadores: Ultimato
4.3 2,6K Assista AgoraEstamos sorteando pares de ingressos para Vingadores: Ultimato no Instagram e no Facebook oficiais do site Minha Visão do Cinema, acessem nossas redes e participem!
Vestígios do Dia
3.8 219 Assista AgoraCinema em Cena: 'Vestígios do Dia' (1993, de James Ivory)
Nosso quadro que analisa a composição das cenas de filmes vai falar hoje sobre este tocante drama britânico. Anthony Hopkins interpreta um perfeccionista mordomo, que lidera a criadagem da mansão de um aristocrata inglês, durante a Segunda Guerra Mundial. Anos depois, ao viajar de volta ao local, o personagem de Hopkins se vê diante lembranças que o marcaram para sempre. Com uma belíssima direção de arte e fotografia, aliadas à uma direção competente de James Ivory, sempre sutil e delicada, temos uma composição de mise en scène pontual e acolhedora. Somos imersos no acompanhamento da câmera pelos cômodos da mansão, o estilo voyeur no qual espiamos os bastidores da aristocracia, em contraste com o reprimido amor entre o mordomo e a governanta (Emma Thompson em brilhante atuação). Em determinados ângulos, como em uma das imagens do post, nós vigiamos os afazeres dos empregados e os tolos mistérios dos burgueses, através do ponto de vista de portas entre abertas, janelas e objetos. Assim como a mansão e tudo que a compõe, nós somos expectadores da passividade do casal, que fica recluso de acender seu amor diante o compromisso com sua profissão. Em plena guerra, onde políticos bebem e aproveitam sua burocrática vida fútil, vemos os trabalhadores e reais protagonistas, serem incapazes de tomar as rédeas da sua vida, cegados pelo falso senso de dever, como se isso fosse a coisa mais importante de outrora. Tal análise requer traçar um paralelo com nossos dias, onde infelizmente alguns insistem em renegar suas próprias escolhas, em prol de agradar ou ganhar um favor daqueles que se acham superiores ou privilegiados de alguma forma. E isso se aplica tanto no emprego, como na política, na família e em outras situações. Tal contenção exagerada de si próprio, renegando aquilo que você já quis pra si no passado, torna tudo muito agridoce, mas poético e iluminado. Negar aquilo a que você ama e tem desejo de se dedicar irá acarretar em arrependimentos, fatos estes que ficarão em vãs lembranças do passado, lembranças essas que soam como fagulhas no tempo, breves raios de luz de um pôr do sol, vestígios de uma luz que outrora já foram um dia. Vestígios de um dia, vestígios de uma vida e vestígios de uma escolha não tomada.
Capitã Marvel
3.7 1,9K Assista AgoraO filme segue o padrão da casa Marvel/Disney, uma superprodução escapista e divertida, que mostra a origem solo da heroína título. Existem pequeninos probleminhas na estrutura e edição do filme: uma "barriga" no meio que quebra um pouco do ritmo, um ou outro efeito de CGI que poderia ser melhor trabalhado, uma ou outra piada que não funciona tanto, pequeninas coisas que poderiam ser podadas na edição e montagem da fita. Exceto estes apontamentos, é uma superprodução divertida e com alguns belos momentos. Apesar do humor de sempre da Marvel, que serve para descarregar um pouco da tensão e adrenalina, ainda é um filme um pouco mais sóbrio.
Brie Larson não é o fiasco que se apontava. A atriz, que já possui um Oscar, entrega uma protagonista que a príncípio parece séria e apática demais, mas faz parte do roteiro trazer esta mulher mais contida e perdida, afim de logo após, trazer sua "liberdade", por assim dizer. Então, Larson entrega uma heroína de porte, que pode sim ganhar mais profundidade em futuros filmes, mas que aqui ao menos segura bem o manto, ao menos ao mostrar seus poderes e salvar o dia. Samuel L. Jackson está bem e hilário como Nick Fury, rejuvenescido digitalmente em excelentes efeitos visuais. A química dele com a protagonista é boa. Lashana Lynch como a melhor amiga da Capitã está bem e representa um elo emocional à nossa heroína. O vilão de Ben Mendelsohn tem um plot bacana, Jude Law entrega a competência de sempre, Clark Gregg como o jovem Agente Coulson da S.H.I.E.L.D. é uma boa participação (também rejuvenescido digitalmente), assim como o cameo do saudoso Stan Lee, em bonitas homenagens. A grande atriz Annette Bening que parece ter sido pouco aproveitada. A gatinha Goose pode aparecer pouco, mas deixa sua marca no filme com uma maluca participação e já queremos ver mais dela.
'Capitã Marvel' sofreu boicotes antes do lançamento, com críticas negativas de um público hater "machão" que teve sua masculinidade ferida por um filme Marvel. Tal fato só prova que tem que existir filmes feministas com mulheres fortes protagonistas. E não apenas isso, como também ter mulheres no comando das câmeras. Aqui, dentre os dois diretores, Anna Boden faz história ao comandar uma superprodução de ação e de sucesso, feito que até então só ocorreu com Patty Jenkins e seu filme 'Mulher-Maravilha', da DC. Em mais de um século de cinema, poucas mulheres terem a chance de comandar filmes deste porte dentro de estúdios majoritariamente comandados por homens, torna esta representatividade válida e crucial. Sem discursos exagerados, 'Capitã Marvel' traz um feminismo natural. Ela quer ser o que ela quer, sem ter que dar satisfação a um homem que a queira manipular. É isso, simples assim. Ela tem o direito de agir como quer e lutar por aquilo que acredita. Com um heroísmo mais contido nas palavras e expressões, mas forte no coração, ela acaba sendo uma espécie de substituta para o 'Capitão América', pois já é sabido que ela será a líder dos 'Vingadores' de agora em diante, mais uma razão dos "machões" se incomodarem. Há no filme uns detalhes interessantes: a manipulação do homem em cima da mulher, seja explicitamente (os vilões invadindo a mente dela), ou sutilmente (sem detalhes pra reservar as reviravoltas). Então tais abusos dão razão pra ela ser mais "sisuda" e contida por assim dizer. Há também um paralelo em como a menina filha da amiga dela admira a heroína, tal menina é uma representação de todas menininhas desta geração, que agora podem vibrar com mulheres fortes e heróicas no cinema, como a Capitã Marvel e Mulher-Maravilha. Note como o encanto e brilho nos olhos da garota no filme representa o encanto das meninas da atual geração, que podem e devem ser aquilo que quiserem por elas mesmas, e não por escolhas dos pais, maridos, chefes, etc.
A trilha sonora grunge dos ano 90, com músicas do Nirvana, No Doubt, R.E.M. e vários outros da época, assim como as referências e criações da década, são nostálgicas. Também temos influências narrativas de filmes e séries noventistas, como cenas de perseguição de carros típicas dos filmes de ação daquela época, assim como um clima de ficção científica conspiratória (muito em alta lá nos anos 90), como 'MIB - Homens de Preto' e até mesmo a série 'Arquixo X'.
Mesmo que clichê quanto a entretenimento, é divertido, bem feito e um sopro de encorajamento para as mulheres guerreiras da vida real. Por ser homem, não tenho propriedade pra falar de feminismo, embora apoie as guerreiras mulheres, por isso, confiram a crítica do filme lá do site Minha Visão do Cinema, onde a Eduarda Souza e a Natália Vieira escreveram com detalhes da importância do filme.
E que venha 'Vingadores: Ultimato'! Quero ver a Capitã Marvel dando uma surra no Thanos!
O Retorno de Mary Poppins
3.5 343 Assista Agora54 anos após o clássico musical lúdico 'Mary Poppins', com os incríveis Julie Andrews e Dick Van Dyke, chegou uma improvável continuação. Conseguindo capturar o espírito leve, infantil, doce e bastante puro, temos o retorno da babá Mary Poppins à vida da família Banks. As crianças de antes agora são crescidas, com suas próprias crias e estão passando por um momento turbulento. Tais pressões do cotidiano tiraram a alegria e o encanto dos adultos que outrora acreditavam no fantástico, e isso já está afetando as crianças. É quando Poppins entra em ação, trazendo lições para os pequeninos e mais ainda aos mais velhos. Emily Blunt é encantadora no papel da firme, mas amável babá. A atriz vem se destacando muito no cinema recente e com muita versatilidade! Do drama à comédia, do infantil ao terror, ela tem se destacado demais. Vide 2018, onde ela nos deixou apreensivos em 'Um Lugar Silencioso' e depois nos reconfortou aqui neste filme em questão. Mas Lin-Manuel Miranda também demonstra seu talento como um ascendedor de lampiões, ele canta, dança e atua muito bem, se provando um artista completo à moda antiga. Digo "completo" pois houve uma época em Hollywood, entre os anos 40 e 60, que para fazer sucesso não bastava atuar. Nos musicais, os filmes colossais dessas décadas, se precisava dançar, cantar, assobiar, sapatear e muito mais. É aí que chegamos a Dick Van Dyke, que fazia isso no 'Mary Poppins' original e aqui faz uma pequena participação - bastante nostálgica e emocionante. Já bastante idoso, o ator dono de um sorriso que marcou gerações, faz uma breve cena de dança que pega o coração daqueles que conhecem o cinema daquela época.
Assim como no riginal, há uma bela sequência onde os atores contracenam com animação, é como se fosse um desenho animado dentro de um live-action. Uma cena divertida, visualmente chamativa e com uma direção diferenciada em alguns momentos (note nos ângulos de câmera contorcidos conforme a carroça anda pelas curvas do objeto de porcelana no qual estão desenhados, além do visual rachado da porcelana, é muito inventivo!). As letras das canções contém morais que criticam nitidamente o estilo de vida estressado dos adultos, lotados de afazeres, em busca frenética por dinheiro, sempre perdendo tempo com coisas menos importantes, deixando de viver bem e deixando de respeitar as diferenças das outras pessoas. Tais morais, por mais simplistas e direcionadas às crianças, reflete diretamente nos adultos, cuja felicidade se esvai quando perde-se o brilho no olhar, quando perde-se a magia das coisas, quando passa a desrespeitar quem é diferente, quando confunde-se amadurecer com tornar-se alguém amargo e sem amor.
Bonito, simples e à moda antiga, é uma bela sessão retrô.
A Noite de 12 Anos
4.3 302 Assista AgoraSensacional filme do Uruguai, um dos melhores de 2018, que narra a jornada de 3 homens que ficaram 12 anos presos, alguns destes em cárcere privado, durante a ditadura militar de seu país. Esses 12 anos são como uma obscura e longa noite, cheia de trevas, tortura e falta de liberdade. Mas é interessante como a obra se abstém de cenas mais fortes, deixando o pesado na trama e no imaginário de quem assiste (a ditadura por si só já é pesada), focando assim, de uma maneira mais branda e positiva, o psicológico destas 3 figuras. Apesar de todo sofrimento, eles utilizam de esperança, inteligência, bom humor e trabalho duro para sobreviver dia após dia, ano após ano. As atuações são todas boas e a direção de Alvaro Brechner é firme, mas também positiva, conduzindo a narrativa de forma suave, como se fosse um raio de sol iluminando a tenebrosa noite dos nossos protagonistas. Há uma bonita mensagem sobre não desistir, se manter íntegro e ajudar ao próximo que está na mesma situação, mesmo que em minoria. O roteiro é muito coerente em não exagerar nos fatos, mas focar no tratamento e na construção destes personagens. Em tempos em que no nosso país se tenta apagar a história, onde se ignora os nossos livros, se ridiculariza professores, que se boicota tudo que destoa dos falsos ideais moralistas (como o boicote ao filme do Wagner Moura, que sequer saiu aqui ainda), em tempos em que se saúda a militarização robótica de maneira histérica e afetada, com materiais vindos da "faculdade do Whatsapp"; um filme como esse sempre é bem-vindo. Lembra-nos de que só damos valor à liberdade depois que a perdemos. Que só damos valor às pessoas depois que sangue é derramado. Que trabalhar duro, manter a positividade, utilizar de intelecto e alimentar a alma é aquilo que dá forças para atravessar longos anos, anos estes que mais parecem uma longa noite de trevas.
Guerra Fria
3.8 326 Assista AgoraLindamente construído e fotografado em preto e branco, o filme polonês 'Guerra Fria' (que concorre em algumas categorias do Oscar 2019) faz um paralelo entre história, arte e romance. Um casal desconstruído e amargo, tão "frio" quanto os emaranhados fatores políticos e culturais que esvaziam o amor e a graça do dia a dia do ser humano. Se a obra deixa momentos amargos na boca, deixa lindas cenas na memória, tremendamente bem dirididas por Pawel Pawlikowski, que faz deste um deleite visual. Cada cena é bela, meticulosamente montada para parecer uma obra de arte, uma pintura que carrega histórias e figuras de outras épocas. A química do casal protagonista é impecável, de fazer inveja à Hollywood. Especialmente Joanna Kulig, hipnótica, magnética e complexa na pele de Zula. Entre encontros e desencontros por diferentes momentos históricos e políticos da Europa, que vai desde uma Polônia devastada no pós-guerra e ocupada pela Rússia, passando por uma Paris boêmia e agitada, o filme mescla um romance disfuncional com um fundo artístico. A narrativa transborda paixão pela música nativa da Polônia, mas faz uma crítica à generalização da mesma diante a indústria. Descontrói-se algumas questões como: a perda da arte diante o lucro, a perda da liberdade diante a guerra e política, a perda do amor diante as complicações do relacionamento. Com trechos que ecoam à Nouvelle Vague da França, é um belíssimo filme, indispensável para amantes de arte e de um cinema mais maduro.
Creed II
3.8 540Respeite o passado e os veteranos. Mas deixe-os no seu lugar e trilhe seu próprio caminho.
A franquia do 'Rocky Balboa' sempre manteve-se fiel ao seu legado. Isso inclui os atuais filmes do 'Creed'. Muito além das lutas do ringue de boxe, a saga fala sobre o ringue da vida. Enfrentar crises econômicas, o preço da fama, cuidar da família, lutar contra uma doença, lidar com o luto. São nocautes que a vida te dá e os filmes conseguem tecer este paralelo com o boxe. Apanhar, apanhar e apanhar. Mas se levantar e continuar a lutar. Na vida, não importa bater e vencer, mas aguentar a dor dos golpes que ela te dá, se manter íntegro e dar valor ao mais importante.
O primeiro 'Creed' acertou mais em trazer um frescor, adicionando elementos como representatividade, Stallone enfrentando uma doença e ainda temos a ótima direção de Ryan Coogler, que deixou de fazer o dois para dirigir o sucesso 'Pantera Negra'. Aqui, Steven Caple Jr. é quem dirige, com uma pegada menos forte e mais genérica, tornando o filme um pouco inferior ao primeiro. Também vale acentuar que uma enxugada na primeira metade da obra ajudaria no seu ritmo inicial. Mas lá pelo meio do filme a coisa engrena, estamos convencidos da trama e daí é um deleite só. Assim, 'Creed 2' perde por bem pouco para o primeiro, mas ainda é uma obra relevante. Temos aqui os conflitos entre gerações, entre treinadores e atletas, entre pais, filhos e netos. Respeitar o passado, os veteranos, aprender com os erros e a dor são coisas necessárias. Mas se desprender disso até certo ponto, trilhar seu próprio caminho e deixar cicatrizar algumas coisas, isso é essencial.
Há aqui conflitos bem interessantes. Adonis quer vingar a morte do seu pai Apollo, mas não quer viver à sombra dele. Rocky não quer que Adonis tenha o mesmo fim que Apollo, morto no ringue. Ivan (Dolph Lundgren) não quer ficar no limbo, humilhado por ter sido derrotado por Rocky no passado, usando seu filho para voltar aos holofotes. Viktor (Florian Munteanu) vive numa dividida em não decepcionar seu pai Ivan, ao mesmo tempo que não quer ser controlado sempre por ele. E ainda temos com pequeno destaque Tony (Wood Harris), filho do treinador de Apollo, que agora treina Adonis e não quer que ele fracasse sob suas mãos. Nisso tudo, temos as mulheres em cena como as sensatas: a mãe e a esposa (Tessa Thompson) de Adonis servem como o peso na balança, não o controlando, mas servindo como a voz da razão. Este interessante jogo de perspectivas dá o que pensar sobre legado, fracasso e família.
Com a metade final da obra repleta de emoções, intensas cenas de luta no ringue e belas cenas emocionais fora dele, 'Creed 2' mantém a qualidade desta longínqua e fundamental franquia. O final é ótimo, a trilha sonora empolga e temos um contemplativo take de Rocky Balboa lá pelo fim, sob uma diferente ótica do ringue, da comemoração e da perda. Simbólico ...