Após uma longa espera, na qual estão incluídos os inúmeros atrasos que esta produção teve devido à pandemia, finalmente pude assistir "Killers of the Flower Moon" e todas as expectativas que tinha foram devidamente atendidas. Um dos meus diretores preferidos, Scorsese mostra, mais uma vez, que envelhece como vinho, apresentando, em grande direção, uma das conspirações mais absurdas da história dos Estados Unidos, em um filme que utiliza como base um livro homônimo e também uma extensa pesquisa do cineasta acerca da tribo Osage.
Em síntese, a película traz a história da descoberta de petróleo por indígenas americanos no início do século passado. Se, por um lado, o famoso "Ouro Negro" garantiu uma repentina prosperidade ao povo local, também trouxe, na mesma proporção, oportunistas interessados em se apropriar das riquezas encontradas e capazes de utilizar todos os meios necessários para alcançar tal objetivo.
A história é complexa, densa e pesada, o que explica a longa duração do filme. Em minha avaliação, a obra não perde tempo, por exemplo, com cenas desnecessárias, mas procura contar, na medida do possível, a trama no máximo dos detalhes, visando ser historicamente fiel e justa com o povo Osage afetado pelos crimes. Dessa maneira, Scorsese, acostumado a dirigir narrativas de ascensão e queda, tem novamente em mãos um enredo do tipo, adotando um ritmo ideal, isto é, nem muito rápido e nem muito lento, mas contando os acontecimentos com a velocidade adequada.
Além disso, se a temática criminal é conhecida da carreira do diretor, aqui temos um elemento novo para o cineasta: a tensão racial. O rápido enriquecimento dos Osage fez com que um povo anteriormente esquecido se transformasse na elite local, adquirindo grandes quantias de dinheiro, terras e negócios e possuindo, inclusive, empregados brancos. Os preconceitos existentes fazem com que os brancos tenham o pensamento de que os indígenas, vistos como inocentes, não possuem a inteligência necessária para administrar tantas riquezas. Por outro lado, os nativos não confiam plenamente nos brancos, mas não deixam de conviver com os mesmos ou até de ter relações mais próximas. Ambos os povos estão juntos, mas sempre alimentando desconfianças e tensões, que são muito bem construídas ao longo de toda a história.
Quanto às atuações, não há muito o que falar, pois todo o elenco está excelente, com destaque maior ao trio principal de atores: DiCaprio, DeNiro e Gladstone - em seu primeiro grande papel. O primeiro interpreta um personagem complexo e de diversas facetas, o segundo um vilão inescrupuloso e a terceira, por sua vez, uma esposa perspicaz, mas sufocada por inúmeras suspeita e temores. Também destaco a participação de Jesse Plemons, originalmente cotado para assumir o papel de Ernest, que está presente apenas na terceira - e última - parte do filme, mas em boa performance.
Não se assustem pelas três horas de duração, pois é mais um filmaço do mestre Scorsese e que vale muito à pena assistir. Recomendado.
A premissa do filme é simples, criativa e interessante, mostrando, através de viagens no tempo, como algumas coisas que fazemos em nossas vidas podem afetar significativamente não apenas a cada um de nós, mas também as vidas das pessoas ao nosso redor - inclusive, de formas que nem imaginamos. No entanto, se a ideia é boa, a execução deixa bastante a desejar, com um roteiro confuso e repleto de furos, mal desenvolvimento das personagens e um final que foge completamente ao que a história vinha mostrando.
Um dos problemas que me chamaram a atenção nas viagens no tempo mostradas na trama é que elas acabam tornando o enredo previsível em determinados momentos. Embora não saibamos o que vai acontecer em seguida, sempre sabemos que alguma coisa ruim ocorrerá e que eventualmente o protagonista irá viajar novamente para tentar consertar o erro, e isso se repete inúmeras vezes. É como se o protagonista nunca estivesse realmente em perigo e tivesse o poder de reverter os acontecimentos quantas vezes quisesse até obter um final razoável.
Existem diversas películas que abordam o conceito de viagens temporais de maneira muito mais inteligente e bem feita do que foi mostrado aqui, que até teve, em várias cenas, um aspecto bem trash e de "filme B". A proposta é ótima, mas passou longe de me convencer.
Diferente da maioria das cinebiografias, que retratam personalidades conhecidas e que dispensam maiores apresentações ao público, em "Tár" temos uma personagem fictícia. Logo, o espectador, antes de começar a assistir, apenas tem noção, através da sinopse, de se tratar de uma regente mundialmente famosa e, dessa maneira, o diretor tem a tarefa de, dentre outras coisas, fazê-lo conhecer mais da figura em questão, corretamente o apresentando, logo nas primeiras cenas, aos seus feitos, isto é, tudo aquilo que a fez se tornar célebre no mundo da música clássica, com as outras características do seu trabalho e de sua vida pessoal sendo reveladas gradativamente.
Além disso, vale destacar que a compositora e regente Lydia Tár foi construída, por Todd Field, pensando-se exatamente em Cate Blanchett para interpretá-la, o que é algo relativamente incomum no mundo cinematográfico. Na película, a atriz nos mostra que os realizadores do filme não poderiam estar mais certos em dedicar essa personagem a ela, com uma atuação gigantesca, mostrando as diferentes facetas de uma artista complexa e com certeza em uma das melhores performances de sua carreira.
O principal problema do filme, em minha avaliação, é que a obra é excessivamente longa, perdendo muito tempo com cenas e diálogos desnecessários e com inúmeras referências artísticas de difícil compreensão não somente para mim, mas também para a maioria do público. A história se arrasta um pouco na sua primeira metade, apenas ganhando um bom ritmo na reta final, que acredito ser a melhor parte da película.
De uma maneira geral, a trama, apesar de várias vezes trazer informações mais específicas acerca da música clássica, não tem o gênero musical em questão como o seu ponto central. O grande tema do filme é, na verdade, acerca do poder nas sociedades modernas, e como esse poder pode ser alterado pelas redes sociais, sobretudo com a famosa "cultura do cancelamento". Lydia, tão acostumada em ter o controle de tudo, tanto durante uma apresentação quanto em sua vida pessoal, vê sua vida mudar com acusações feitas contra ela - algumas justas e outras falsas - e tem sua reputação, que demorou tanto tempo para ser construída, abalada em um "piscar de olhos".
Aos mais bem informados acerca do universo da música clássica, não tenho dúvidas que "Tár" deve ser um prato cheio e um deleite. Para aqueles, como eu, que até gostam do estilo musical, mas não são profundos conhecedores do assunto, o filme poder ser demasiadamente longo, mas, ainda assim, é bom e com uma grande atuação de Blanchett.
Existem alguns filmes que conseguem ir além das intenções dos próprios autores e ter distintos significados de acordo com cada espectador. Creio que "O Poço" é uma dessas películas, pois, embora o diretor Galder Gaztelu-Urrutia já tenha declarado que a obra é uma crítica ao capitalismo, acredito que isso seja uma incoerência, pois o verdadeiro sistema sócio-econômico em que há uma desigualdade forçada - com poucos tendo acesso a muito e muitos tendo acesso a pouco - é, de fato, o socialismo. No entanto, o filme também funciona para aqueles que, assim como eu, discordam da opinião de Galder, pois, analisando sob outro ângulo, a história apresentada também pode ser vista como uma crítica à natureza humana de uma maneira geral e daquilo que o homem é capaz de fazer em situações extremas, provocando interessantes reflexões.
Na estrutura do poço, os que estão em cima têm acesso à fartura, enquanto os de níveis inferiores têm de se contentar apenas com as sobras das refeições dos outros - e, para os níveis realmente mais próximos do final, muitas vezes nem as sobras permanecem, com as pessoas que lá estão tendo de suportar a fome por várias semanas. Quem está acima não se preocupa com os de baixo, mesmo sabendo que, no mês seguinte, as posições podem se inverter, e procuram aproveitar a posição privilegiada enquanto podem.
No lugar de haver uma noção de solidariedade e preocupação ao próximo, com cada um comendo pouco e, dessa maneira, permitindo que todos tenham acesso à comida, o que vemos é que, na prática, todos desconfiam de todos e comem tudo aquilo que podem no pouco tempo que é permitido, pois nem sempre o ato de generosidade de um pode ser retribuído pelo outro. Além disso, quem já passou pela fome e hoje está em níveis superiores, ao invés de ter mais compaixão com os que agora passam pela mesma situação, apenas se preocupa em se esbaldar o máximo possível e compensar o período em que comeu pouco. Sentimentos de dignidade, respeito e justiça ficam em segundo plano quando a própria sobrevivência está em jogo, sendo impossível o espectador, ao ver tais cenas, não se indagar se, na pele das personagens, faria as mesmas coisas ou agiria de forma diferente.
O filme, por outro lado, peca com alguns problemas no roteiro, tornando-se um tanto repetitivo no meio da história. E também é necessário mencionar que o final é pouco satisfatório, provocando a sensação de que o diretor e os roteiristas poderiam ter ido além e explorado mais a trama construída, mas, por algum motivo, optaram por encerrar mais cedo, como se quisessem deixar a obra incompleta.
Apesar dos pesares, o filme é bom e, qualquer que seja a sua visão de mundo, é possível interpretar as críticas e reflexões nele presentes de distintas maneiras.
Para quem gosta de suspenses e dramas investigativos, "O Corpo" é, sem dúvida, um prato cheio. Com um roteiro bem elaborado e várias reviravoltas, o filme prende a atenção do espectador e nos deixa, até os últimos instantes, com sérias dúvidas acerca das verdadeiras intenções das personagens envolvidas e do que realmente aconteceu, apenas sendo tudo concluído com o plot twist final, que, pelo menos para mim, é inesperado e encaixa, com precisão, todas as peças do quebra cabeça construído ao longo da história.
Um aspecto interessante é a inserção de flashbacks durante o filme, que parece nos deixar a par do que está acontecendo, mas isso é somente um ligeiro engano - e um recurso inteligente, utilizado pelos roteiristas, para reforçar o mistério. A verdade é que somos meros espectadores desse crime, e os flashbacks nos ajudam a entender o contexto somente naquele momento específico que é mostrado, e apenas sob uma certa perspectiva. Dessa maneira, somos levados, no decorrer da película, a diferentes conclusões, sendo que, em alguns momentos, todas as opções que temos em mente parecem ser plausíveis.
Uma obra feita sob os mínimos detalhes e com muita qualidade. Recomendado.
Não sei o que os jurados de Cannes viram neste filme para o premiarem, mas, na humilde opinião deste quem vos fala, "Triângulo da Tristeza" não me convenceu. A ideia de crítica social aos mais ricos vai na onda de diversas outras produções recentes - como, por exemplo, o filme "Parasita" e a série "The White Lotus" - e é válida, mas esta película, ao meu ver, passa longe de ter a mesma qualidade de outras obras com temática similar.
A história é dividida em três partes. A primeira, focando no casal, tem um problema muito simples: apesar dos esforços dos atores envolvidos, as personagens são insuportáveis e o "drama" envolvido é fraco, o que naturalmente provoca um desinteresse por parte do espectador. A segunda, já no iate, foca na clientela rica que irá curtir a viagem e as interações entre eles e também com a tripulação, mas perde diversas oportunidades de aprofundar melhor os arcos dos personagens envolvidos, apresenta uma quantidade excessiva de cenas desconfortáveis e escatológicas que não contribuem em muita coisa e ainda se perde com uma tentativa muito forçada de passar alguma mensagem política.
A terceira parte, por sua vez, é a mais interessante, em que os poucos sobreviventes, sendo alguns ricos e outros membros da tripulação, tentam se virar em uma ilha aparentemente deserta. Já que apenas uma das funcionárias do navio era habilidosa em algumas práticas necessárias à sobrevivência no local, como a pesca, as posições das personagens acabam se invertendo, com os mais abastados tendo de seguir as ordens daquela que antes era apenas mais uma tripulante, o que é uma crítica social bem feita.
No entanto, mesmo essa última parte, que é a melhor do filme, acaba se perdendo em um arco romântico constrangedor, diversos furos de roteiro e um final desnecessariamente deixado em aberto. Em alguns filmes, um final inconclusivo pode funcionar caso seja melhor estabelecer uma dúvida no espectador ou a possibilidade de distintos desfechos, mas aqui esse recurso é usado de maneira pouco inteligente, apenas tornando o filme incompleto.
O filme agrada aquele público apenas interessado em ver "rico se dando mal", mas desagrada quem, como era o meu caso, espera um bom humor ácido e inteligente, pois vai acabar se deparando com aquilo que é apenas, infelizmente, uma pretensa e rasa tentativa de crítica social.
É impossível negar que Tenório Cavalcanti foi, para o bem ou para o mal, uma das figuras mais fascinantes da história política brasileira. Um alagoano que nasce na pobreza, perde o pai assassinado na infância, migra ainda muito jovem - e sem nada - ao Rio de Janeiro e lá se torna um verdadeiro "coronel" político à moda antiga, morando em uma fortaleza, caminhando com sua capa preta e sempre acompanhado de uma submetralhadora. Uma figura que, se não tivesse existido de fato, diriam que foi inventada.
Esta obra, que retrata sua biografia, consegue mostrar bem o lado aventureiro de Tenório e fatos marcantes em sua vida, alternando elementos de drama político e filmes de gângster e prendendo a atenção do espectador. No entanto, erra em uma excessiva romantização da história, que, de tão absurda e surreal, tranquilamente dispensa algumas alterações que aqui ocorreram. Além disso, também peca um pouco na temporalidade dos acontecimentos e na falta de um melhor desenvolvimento da sua relação familiar.
Também é necessário destacar a grande atuação de José Wilker, que incorpora, muito bem, não somente o personagem em si, mas todos os seus trejeitos, sua ambição como político e sua valentia. Um aspecto curioso é que Wilker igualmente foi um nordestino que teve de ir muito jovem ao Rio de Janeiro para fazer o seu nome, assim como Tenório - embora, obviamente, ressalto a grande diferença das profissões que ambos exerceram .
O diretor Jonathan Demme procura nos mostrar a realização de um casamento por uma ótica à qual não estamos acostumados em filmes, isto é, como se estivéssemos acompanhando um documentário ou um reality show. Dessa maneira, o diretor nos coloca no meio dessa família instável e problemática, como se fossemos "penetras" em toda essa história, acompanhando os acontecimentos de forma crua e realista.
O problema é que o aspecto mais interessante do filme também é, por outro lado, o seu ponto mais negativo, pois, nessa tentativa de imprimir um realismo à trama, a obra também se torna excessivamente monótona e chata. Essa lentidão dura até a metade da película, a partir da qual o drama familiar começa a se elevar, prendendo mais a atenção do espectador. No entanto, logo depois tudo retorna à monotonia e, ao término, é apresentado um final previsível e pouco ousado.
O filme vale pela atuação da Anne Hathaway e por algumas cenas interessantes ao longo da história, mas ficou a sensação de que foi muito lento durante a maior parte do tempo e de que faltou muita coisa para tornar o enredo mais completo. É um filme esquecível.
Assisti apenas por curiosidade, já com expectativas baixas e o filme não me surpreendeu: é tão ruim, previsível e superestimado quanto eu imaginava anteriormente. Nem todo o hype construído nas mídias e o marketing dos produtores é capaz de mascarar que o filme tem, na verdade, poucas coisas a serem elogiadas, muitos problemas no roteiro e uma trama tão profunda quanto um pires.
Sendo justo, elogio a escolha do elenco - Margot Robbie e Gosling, sobretudo, estão perfeitos em seus respectivos papéis - e os aspectos visuais, mas os pontos positivos, infelizmente, param por aí. Após um início até divertido e interessante, o filme não consegue, ao longo do resto da trama, manter uma regularidade e nem desenvolver bem as suas personagens, indo por caminhos previsíveis e pouco criativos. Mesclando comédia com momentos dramáticos, a produção não consegue convencer nem como uma coisa e nem como outra, isto é: como comédia, não é engraçado e, como drama, não é dramático o suficiente.
Além disso, também se perde muito - e muito por culpa da diretora, que aparentemente fez isso de maneira intencional - em uma militância forçada, fazendo um filme sobre bonecas se transformar mais em um panfleto feminista do que qualquer outra coisa - como muito bem comentaram anteriormente por aqui, até parece que o enredo foi escrito por twitteiros e não por roteiristas profissionais. No entanto, se houvesse esse mesmo discurso no filme, acompanhado com um roteiro bem elaborado e uma história interessante, até dava para suportar, porém não é isso que acontece em "Barbie".
Em conclusão, a sensação final é de que o filme foi, pelo menos para mim, uma grande perda de tempo.
Sem dúvidas, "Oldboy" não é para qualquer um e, com certeza, também não é o filme que eu imaginava que seria. Esperava, por exemplo, mais cenas de ação, e recebi, por outro lado, uma interessante trama que foca mais no lado do thriller. No caso, um grande mistério é construído desde o início e o protagonista passa a maior parte da história procurando descobrir a verdade por trás de tudo que passou e as motivações que levaram a toda essa situação - e o telespectador acompanha a desmontagem desse bem elaborado quebra cabeça.
No entanto, vale destacar que, embora não tenha tantas cenas de ação como imaginava antes de assistir, as poucas que existem são brutais, sanguinárias, muito bem feitas e, por conta disso, marcantes - sobretudo, a célebre cena da luta no corredor. O mais impressionante, na verdade, é que qualquer violência que tais cenas apresentem, ainda assim não chegam sequer perto de serem tão chocantes e perturbadoras quanto o plot twist final do filme, que fecha todo o quebra cabeça montado ao longo do enredo e realmente deixa o telespectador de boca aberta.
Infelizmente, "Oldboy" tem diversos furos de roteiro - alguns mais e outros menos importantes - e fatos não muito bem explicados, tais quais como Woo-jin conseguiu se tornar tão poderoso e como criou Mi-do durante tanto tempo. Além disso, para um plano tão bem arquitetado, pareceu-me bastante arriscado apostar em uma coincidência, como a de Dae-su ir exatamente ao restaurante em questão. E, na cena final, o porquê do protagonista ser ajudado pela mulher que o hipnotizou também não me pareceu muito sólido. Os pontos positivos da obra compensam esses erros, mas não posso negar que me incomodaram um pouco.
E, quanto ao término do filme, verifiquei, após uma rápida pesquisa, que o diretor realmente buscou deixar a cena final ambígua, o que considero um acerto, pois, para qualquer que seja o desfecho, ele é igualmente trágico. Se Dae-su continua se lembrando do que aconteceu, significa que terá de viver com isso para o resto da vida. No entanto, se ele não se lembra mais do teor incestuoso da relação, talvez seja até pior, pois ela continuará indefinidamente.
A maior lição dessa trágica história talvez seja a de que a vingança é, de fato, uma causa perdida e, após alcançada, a única coisa que existe em seguida é o vazio. A violência, nesse caso, seria uma prisão tão insensata quanto o quarto horrível em que Dae-su estava preso, mas com única diferença: sem perspectiva de libertação.
Um ótimo filme para quem deseja conhecer mais do cinema sul-coreano e "sair da mesmice" das produções hollywoodianas. Porém, aviso: tem que ter estômago para assistir.
Também sou um daqueles que não assistiu o clássico de Akira Kurosawa, então não conseguirei avaliar se o remake faz jus à obra original. No entanto, posso dizer que "Living" é, sem dúvida, um filme sensível e com uma temática simples, porém tocante, de um homem comum e burocrático que busca aproveitar da melhor maneira possível os últimos meses de vida. E, ao fazê-lo, não somente se sente mais feliz consigo mesmo, mas também consegue ajudar as pessoas ao seu redor e deixar uma marca positiva.
A atuação de Bill Nighy é ótima e uma aula de como um ator não precisa de excessos - o famoso overacting - para representar bem o seu personagem, mas pode expressar suas emoções de forma contida. No entanto, se a grande performance do ator é o ponto alto da obra, por outro lado ficou a sensação de que o filme coloca demasiadamente nas costas de Nighy o sucesso da história. Em outras palavras: sem o ator na tela, o filme não possui outros personagens interessantes, nem diálogos marcantes ou cenas que mereçam algum maior elogio, mas gira completamente em torno da personagem principal.
Pode desagradar àqueles que não gostam de uma narrativa mais lenta e, sem dúvida, tem os seus problemas no roteiro e nas personagens secundárias, mas, no geral, o filme é bom e traz uma mensagem bonita.
Depois de trabalhos um tanto decepcionantes em "Tenet" e "Dunkirk", "Oppenheimer" marca o retorno triunfal de Nolan, um dos meus diretores favoritos, ao patamar que nos acostumamos a vê-lo, em uma obra muito bem produzida e visualmente impactante.
Apesar das três horas de duração, devo dizer, indo na contramão de muitos, que em momento algum me senti entediado ou cansado, pois o diretor conseguiu, de maneira inteligente, manter o filme sempre a um bom ritmo. Aqui a história não fica presa a situações monótonas, mas consegue, seja com diversos momentos de tensão ou seja com suas constantes alternâncias no tempo, prender bem a atenção do espectador e dissecar acontecimentos importantes da vida do famoso físico americano unindo precisão histórica e dramaticidade. E, apesar de ser um filme biográfico, vai além de descrever a vida do indivíduo em questão e nos faz aprender mais sobre fatos relevantes da história da humanidade e refletir sobre questões importantes, como, por exemplo, a utilização de armas de destruição em massa.
Um aspecto interessante é que Oppenheimer, a figura central de toda essa trama, não é aqui idealizado e nem a sua figura colocada como herói ou vilão. No filme, é mostrada toda a complexidade de sua personalidade, isto é, de um lado a genialidade e, do outro, todos os seus defeitos, dúvidas e decepções que carrega ao longo da vida pessoal e profissional. E obviamente essa construção da personagem passa muito pela atuação gigantesca de Cillian Murphy - que é acompanhada de outras excelentes performances, sobretudo a de Robert Downey Jr.
É também impossível deixar de mencionar os brilhantes aspectos técnicos. É como se estivéssemos acompanhando uma grande ópera envolvendo personagens históricos, com um visual e trilha sonora hipnotizantes. Nolan, um diretor tão conhecido por seus diálogos e roteiros, aqui usa também bastante o poder da imagem para nos mostrar tudo aquilo, como a intensidade da força nuclear, que é difícil explicar com palavras.
Único aspecto negativo possa ser a presença de Jean Tatlock e Katherine Oppenheimer na história, pois ambas, muito importantes na vida do físico, são aqui reduzidas a personagens meramente secundárias e que não contribuem, de fato, com os dois principais temas do enredo: o papel do cientista na criação da bomba e a perseguição que sofreu nos anos posteriores à guerra. Talvez em uma série, com vários episódios, os papéis de ambas poderiam ser melhor explicados, mas, mesmo em um filme de longa duração, as duas pareceram aqui peças que não se encaixavam com o restante do quebra cabeça.
A proposta do filme é bem interessante: a de mostrar como a busca desenfreada pelo dinheiro e por pertencer a uma elite pode atrapalhar a vida pessoal de alguém, corroer as relações familiares e, no final das contas, sequer conseguir alcançar o objetivo almejado - e, aliás, até realizar o contrário, isto é, prejudicar o indivíduo financeiramente.
Um dos protagonistas da história, Rony, teve uma infância com diversas dificuldades, o que o fez tornar um adulto com grande vontade de ser rico e compensar tudo o que não teve quando jovem. Da mesma maneira, também procuraria fornecer, aos seus filhos, todas as benesses que seus pais não puderam dar a ele.
No entanto, se por um lado é perfeitamente compreensível e até benéfico que um pai queira prover sua prole da melhor maneira possível, até mesmo esse desejo pode, se levado ao extremo, ser negativo. No caso de Rony, esse pensamento faz com que ele arrisque tudo, mude-se de volta à sua terra natal e aposte todas as fichas em acordos ousados em uma empresa. Além disso, faz o máximo esforço não somente para ser rico, mas também para parecer rico, a fim de impressionar potenciais clientes e ajudar nos negócios.
O problema é que, quando alguém vive excessivamente de aparências, isso acaba por destruir lentamente a pessoa, pois ela fica consumida por suas próprias mentiras, não conseguindo sequer entender mais quem ela realmente é. E, se isso não bastasse, a busca desenfreada por garantir todo o luxo à sua família, acaba por fazer com que Rony esquecesse de elementos essenciais que um pai deve dar aos filhos e a esposa, acima do dinheiro e dos status: amor e atenção.
Essa mensagem deixada pelo filme é muito poderosa, no entanto, infelizmente não foi tão bem executada. A verdade é que "O Refúgio", na tentativa de ser realista, é demasiadamente lento e entedia o espectador com inúmeras cenas em que nada acontece. Isso sem falar de várias partes da história não serem bem explicadas ou até serem descartáveis à trama principal, como a cena final do cavalo e o passado familiar de Rony, dando a sensação de que a história é apresentada de maneira incompleta.
A minha opinião é que a obra poderia ter sido bem melhor desenvolvida se houvesse mais ousadia, por parte dos roteiristas e do diretor, de mostrar algo a mais. Realismo é bom, mas realismo em excesso é prejudicial. Se os espectador quiser realismo de verdade ele vai se preocupar com os problemas da própria vida e não com os problemas de personagens fictícios, então é bom que o filme proporcione momentos além do que estamos acostumados a ver no dia a dia, caso contrário inevitavelmente vai se tornar entediante.
Com esse título e essa sinopse, é inegável que "Urso do Pó Branco" chama bastante a atenção e, meramente por curiosidade, decidi assistir. O filme, em resumo, é uma mistura de terror, comédia e, sobretudo no final, um pouquinho de drama, o que combina com a história bizarra - e apenas levemente baseada em fatos reais, pois, na realidade, o urso morre de overdose logo após ingerir a droga.
Se o espectador assistir de forma descontraída, é possível, de certa maneira, deixar passar os inúmeros furos de roteiro e cenas desnecessárias e se divertir. No entanto, não dá para ignorar, após analisar com mais tranquilidade, que Elizabeth Banks, cuja carreira como diretora ainda não decolou, comete um grande erro ao não abraçar, por completo, as bizarrices da história e, ao invés disso, perder muito tempo com arcos e personagens descartáveis.
As melhores cenas dessa maluca produção são as envolvendo, por razões óbvias, o urso sob efeito das drogas, com todo o gore que elas podem fornecer, que é exatamente o que todos aqueles que decidiram ver o filme gostariam de presenciar. Em outras palavras: os melhores momentos do filme são aqueles em que o filme não se leva muito à sério e incorpora os absurdos do enredo.
Como foi comentado por aqui anteriormente, se literalmente toda a história se baseasse nos traficantes, ou turista e moradores locais, passando por perrengues contra um urso drogado e isso fosse bem explorado com humor negro, o filme seria bem melhor e um grande clássico trash. No final das contas, acabou sendo uma boa tentativa desperdiçada.
Comecei assistindo com expectativas baixas, e surpreendeu-me positivamente não somente por seus aspectos técnicos, mas sobretudo por realizar, entre erros e acertos, uma espécie de "releitura" da história do Homem Morcego, com uma abordagem mais noir, investigativa e humana do herói. Mesmo que a sua história, tanto pelos quadrinhos quanto pelas adaptações anteriores, já seja bastante conhecida, é apresentada, em "The Batman", com um grande ar de mistério, como se estivéssemos redescobrindo um personagem que nos acostumamos tanto a ver nas telas.
Aqui temos um Batman ainda nos primeiros anos de sua trajetória na luta contra o crime, o que explica as dúvidas dele acerca de si próprio e muitos dos erros que comete ao longo do filme. Ele ainda está aprendendo em como realizar aquilo que se tornará basicamente a sua "vida" pelos próximos anos, sendo primeiro motivado meramente pelo desejo de vingança, mas aos poucos começando a encontrar outras motivações que o impulsionem a prosseguir em sua caminhada. E este é o ponto que talvez algumas pessoas não compreenderam bem e criticaram o filme por isso: aqui, pelo menos ao meu ver, não se está querendo tornar o Batman aquilo que ele não é ou distorcer o personagem, mas, na verdade, mostrar como ele começou sua caminhada como vigilante e foi, aos poucos, tornando-se aquele Batman que todos nós conhecemos e nos acostumamos, logo é por esse motivo que, nesta história, ele está diferente.
Tinha muito receio quanto ao Robert Pattinson como Bruce Wayne, mas ele entrega uma boa atuação, assim como o resto do elenco. Paul Dano é um ótimo ator e aqui cumpre bem o papel que lhe foi pedido, mas a forma como retrataram o Charada ganha pontos apenas pela ousadia em mostrar esse vilão de uma maneira diferente, pois, pessoalmente, não me agradou muito. Da mesma maneira, o seu "plano" final não foi dos mais empolgantes ou inusitados e poderia ter sido melhor elaborado - e, sendo ele o vilão principal, isso também comprometeu o filme.
Um outro ponto negativo foi a lentidão em vários momentos, o que acabou resultando em um filme de duração maior do que deveria ter e um tanto arrastado. Não peço que o filme seja "corrido" e nem se apresse em detalhar sua história, mas claramente poderia ter sido, no mínimo, encurtado uma meia hora, em especial retirando aquela parte relacionada ao passado do Thomas Wayne, que foi desnecessária, irrelevante e apenas tomou tempo da película.
Sendo assim, "The Batman" não é nem uma obra-prima como muitos erroneamente disseram - e está muito longe dos melhores filmes do Homem Morcego, mas também não é horrível como vi alguns comentários dizendo. O diretor Matt Reeves, apesar de também ter sido um tanto previsível em algumas partes, ousou em mostrar uma abordagem diferente acerca dos primeiros anos do herói, e isso naturalmente é arriscado e pode dividir opiniões, mas, no geral, creio que o filme teve mais acertos do que erros e entregou bons momentos - embora, ressalto, não precisava ser tão longo.
Depois do sucesso que foi "Band of Brothers", é natural que "The Pacific", outra produção da HBO sobre a Segunda Guerra, seja bastante comparada a sua predecessora. No entanto, embora ambas compartilhem o mesmo altíssimo nível de qualidade e impecáveis aspectos técnicos, as duas excelentes produções possuem diferentes estilos com os quais os retratam suas respectivas histórias, que, diga-se de passagem, são bem distintas.
Apesar de estarem inseridas no mesmo evento - isto é, a Segunda Guerra Mundial, as batalhas travadas no Pacífico, como sabemos, foram muito mais sanguinárias e destrutivas, além das condições pelas quais os soldados envolvidos tiveram que enfrentar, que aqui foram bem mais adversas. Enquanto os combatentes em solo europeu, que também tiveram que passar por inúmeros problemas e dificuldades, tiveram a oportunidade, enquanto não estavam em confrontos armados, de conhecer belas cidades e paisagens do Velho Continente, aqui, mesmo em períodos de folga, os soldados ainda tinham que conviver com malária, chuvas frequentes, solos lamacentos e grandes populações de ratos em ilhas longínquas e desconhecidas - a única exceção foi a ocasião em que as tropas americanas permaneceram em Melbourne.
Sendo assim, a guerra na Europa, embora também brutal, foi mais "glamourosa", enquanto a travada no Pacífico, travada em condições quase sub humanas e contra um inimigo que simplesmente não possuía medo de morrer, deixou um rastro muito superior de mortos, feridos e até mesmo de sobreviventes com graves sequelas psicológicas. E no momento em que esses acontecimentos apresentam tantas diferenças como essas, não seria coerente que as séries retratassem esses eventos da mesma maneira.
Logo, se em "Band of Brothers", primeiro conhecemos os personagens envolvidos - desde o treinamento - e somente depois vemos eles em combate, em "The Pacific" já no primeiro episódio somos inseridos na batalha, mesmo conhecendo muito pouco das vidas pregressas dos soldados, e apenas com o tempo, gradativamente e também dividindo o período com confrontos sangrentos e momentos de alta tensão e desespero, vamos sendo apresentados a mais detalhes sobre cada um. Além disso, os soldados aqui não possuem muitos momentos de descontração entre si, mas tem que conviver, constantemente, com o medo da morte, seja de dia, seja de noite. Esses detalhes podem não ter agradado a todos, mas retratam, com fidelidade e realismo, os acontecimentos narrados e creio que os produtores e roteiristas fizeram o correto com essa abordagem mais direta, dando uma identidade única à obra e evitando se espelhar - ou imitar - o seriado anterior.
Portanto, "The Pacific" é mais uma grande produção da HBO, desde o roteiro até os aspectos visuais, e um retrato fiel e brutal de eventos importantes na história da humanidade, além de um grande tributo aos soldados que enfrentaram o "inferno" nas batalhas contra as tropas japonesas.
Mantendo a essência de "dramédia" com doses de humor negro, a segunda temporada de "White Lotus" apresenta, ao meu ver, um roteiro mais coeso e consistente do que o visto na primeira. O seriado abandona um pouco as críticas sociais e se aprofunda mais em uma reflexão acerca dos relacionamentos amorosos de uma maneira geral e em como, apesar de todo o dinheiro ou inteligência que possamos ter, o sexo, um instinto tão primitivo, ainda representa um fator importante e que nos move mesmo que inconscientemente.
Além disso, as personagens, embora longe de serem perfeitas, são bem menos detestáveis e irritantes do que na temporada anterior, o que permite uma maior identificação e conexão com o espectador. E, claro, as belíssimas paisagens, as obras de arte - com referências artísticas aos acontecimentos do enredo - e a excelente trilha sonora também ajudam - e muito - a elevar o nível da produção, fornecendo um visual mais imponente à história.
Os únicos pontos negativos talvez tenham sido o ritmo muito lento e monótono em alguns episódios e o arco envolvendo a Tanya - que não foi ruim, mas poderia ter sido melhor elaborado, em minha avaliação.
Creio que a série claramente não conseguiu, ao longo dessa temporada, ir além das mesmas tramas já batidas, cenas repetitivas e previsíveis (sempre que algum personagem se encontrava em apuros utilizava a mesma cartada da "chantagem") e mal desenvolvimento das personagens, além de mais uma vez tentar espelhar acontecimentos da política americana ao invés de desenvolver a sua própria história.
O primeiro episódio é muito bom, mas o nível não é mantido e cai bastante nos episódios seguintes. São tantos aspectos negativos, erros e furos de roteiro que nem os poucos pontos positivos - como a revelação de alguns segredos sórdidos da Vought, que eu considerei algo bem interessante e que poderia ter sido melhor explorado - dessa vez conseguem salvar.
Quanto aos personagens remanescentes, o Homelander continua sendo um ótimo elemento na trama, mas, enquanto na primeira temporada havia uma certa dúvida positiva e salutar ao enredo acerca de suas reais intenções (se ele realmente é um indivíduo mau ou apenas é alguém que tem uma visão deturpada do que é bom e ruim), aqui forçaram excessivamente a barra quanto a ele ser "o homem mau", de maneira até mesmo caricata e desnecessária. O arco envolvendo o The Deep continua sendo irrelevante e o envolvendo o Frenchie e os outros membros do grupo deu a sensação de ter estagnado.
Com relação aos novos que foram adicionados, a Tormenta é simplesmente muito irritante e insuportável e a sua presença nos Sete é bem estranha, por sinal, ainda mais tendo sido colocado pelo próprio dono da empresa. Única adição positiva foi a da Becca, que eu, inclusive, gostaria de ter visto mais.
A minha impressão é que os roteiristas se perderam e estão andando em círculos, não conseguindo mais explorar um enredo que tinha bastante potencial - a primeira temporada, em comparação, também tem vários problemas, mas ao menos consegue manter mais acertos do que erros. Não irei prosseguir assistindo e, para falar a verdade, mal consegui terminar essa segunda temporada direito de tão decepcionante que foi.
Inspirando-se em uma HQ de mesmo nome e mostrando uma abordagem diferente nas histórias de super heróis, "The Boys" apresenta uma premissa muito interessante: a de representar os "heróis de capa" de uma maneira mais humana e menos romantizada ou idealizada. Logo, vai por um caminho oposto ao que nos acostumamos a ver na maioria dos filmes e séries do gênero - e, por outro lado, com um estilo semelhante ao que existe em "Watchmen", por exemplo.
Sendo assim, aqui os heróis, apesar dos seus super poderes, possuem tantos ou até mais defeitos do que qualquer outro ser humano normal, isto é, vaidade, egoísmo, falsidade, dentre outros. Dessa maneira, não são deuses e nem seres puros, como a maioria das pessoas acredita, mas sim indivíduos capazes de mentir e dissuadir o público, além de possuírem desejos sexuais e até algumas perversões eróticas.
E a série não se limita a mostrá-los combatendo o crime, mas procura simular o que realmente aconteceria se entidades como essas surgissem no mundo, isto é, como uma sociedade cada vez mais focada em dinheiro e aparências iria receber os super heróis. Assim, presenciamos que eles são "apropriados" pelas grandes corporações - sobretudo a Vought, que é a detentora oficial dos heróis", vistos por ela quase como uma patente - e tornam-se não somente combatentes do crime, mas também peça fundamental de uma indústria que, desde filmes, musicais e brinquedos até operações militares, iria movimentar bilhões por ano. A forma com a qual a série mostra isso, alternando entre cenas de brutalidade e doses de humor negro, e constrói esse mundo não tão diferente do nosso é o seu grande ponto forte e sua principal marca, sobretudo nos episódios iniciais, que apresentam muito bem essa perspectiva ao espectador.
Nesse cenário construído pelo seriado, obviamente é impossível não mencionar o personagem que melhor representa essa dualidade dos super heróis e que é também um dos outros pontos de destaque de "The Boys": o Homelander. Em grande atuação de Antony Starr, ele é, simultaneamente, assustador, carismático, sádico e infantil, o que é fruto não somente de ter de conviver com poderes superiores a qualquer outro ser na face da Terra, mas também de suas origens, de sua solidão e da "marca" que tem de sustentar perante o público. A sua presença ao longo dessa história é sempre acompanhada de cenas marcantes e grandes momentos.
No entanto, a série também tem os seus vários aspectos negativos. Em primeiro lugar, se o início é muito bom, o desenvolvimento do resto da história não mantêm o mesmo nível, com o seriado "derrapando" de forma considerável, sobretudo entre os episódios 4 e 6 - e apenas recuperando-se mais para os episódios finais, pelo mal aprofundamento de diversos personagens e pela tentativa, que me incomodou um pouco, de tentar fazer um paralelo com o panorama político americano e outras discussões ideológicas e religiosas. Caso os roteiristas tivessem focado mais em desenvolver melhor alguns heróis, como a Maeve, e menos em fazer uma crítica velada a determinados grupos políticos, acredito que teria sido mais produtivo.
Além disso, não dá para ignorar os diversos furos de roteiro e acontecimentos mal explicados que acontecem durante essa temporada. Como os heróis conseguem andar por aí com os seus rostos à mostra e muitas vezes sequer serem reconhecidos? O romance entre o Francês e a Kimiko é bonito, mas é bem forçado e não faz sentido pelas características das personagens. Qual a história por trás da mulher com a qual Maeve conversava? O Homelander, no último episódio, explica que era ele o responsável por espalhar, junto com o Trem-Bala, o Componente V para diversas parte do mundo e até para alguns terroristas, mas porque essa declaração dele, que deveria ser encarada como algo chocante e extremamente revelador, não surpreende a vice diretora da empresa? E, se ele realmente fez isso, porque entregou uma amostra do componente para as forças especiais do exército? Como o Trem-Bala sabia que o Hughie e os outros do grupo haviam escapado da prisão e chegou exatamente na hora em que eles estavam deixando o local? Essas são apenas algumas das coisas que não foram bem elaboradas e, embora não dê para levar extremamente à sério uma história que aborde super heróis, ainda assim qualquer bom enredo tem de possuir uma certa lógica e coerência, o que faltou em vários momentos no seriado.
Entre erros e acertos, a série é interessante, mas creio que o potencial da história poderia ter sido bem melhor aproveitado. Sendo assim, o veredito: é boa, mas talvez não tão boa quanto todo o hype que recebeu possa indicar - pelo menos, na primeira temporada. O surpreendente plot twist do último episódio, no entanto, me deixou com muita vontade de ver a continuação, o que provavelmente farei em breve.
Abordando diversos temas importantes, possuindo ótimos aspectos visuais e apresentando um roteiro simultaneamente insano e genial, "Ruptura" com certeza é um oásis de criatividade e inovação em meio a um mundo artístico cada vez mais repetitivo e nos brinda, logo em sua temporada inicial, com uma das melhores temporadas de uma série nos últimos anos.
Um dos pontos centrais da série, ao meu ver, é: liberdade de escolha. Ao aceitar fazer parte desse procedimento, o indivíduo externo, sem saber o que realmente iria acontecer, livra-se dos aborrecimentos do trabalho e de todo o cansaço inerente, mas, ao mesmo tempo, desconhece completamente o que faz no escritório e o propósito de todo o tempo que passa na empresa. É um ser alienado acerca do seu próprio ofício, mas aceita fazer isso pelo dinheiro e pela oportunidade do emprego, além de outros motivos pessoais, como, por exemplo, buscar esquecer, pelo menos por algumas horas, alguma lembrança triste do passado. Por outro lado, no entanto, o seu indivíduo interno encontra-se aprisionado no trabalho. Ele não escolheu esse destino, não foi indagado acerca e sequer compreende o porquê do seu externo ter tomado essa decisão, mas é obrigado a aceitá-lo pelo período que o seu externo desejar, sendo refém da empresa e vendo a realidade de acordo com aquilo que os patrões e os manuais lhe dizem.
Algo absurdo, radical e inconcebível em uma sociedade normal e saudável, mas existente em um mundo cada vez mais escravo do dinheiro e das grandes corporações, que se aproveitariam disso, e cada vez mais distante do conceito de bioética, com inovações científicas moralmente questionáveis. Então, quando inserido dentro da empresa, irá cultuar os donos, ver os manuais e procedimentos internos como manuscritos sagrados e pregar lealdade aos patrões. Enquanto pensava ser parte de algo maior e grandioso - mas que não compreendia ao todo, apenas estava sendo escravizado sem perceber.
Afinal, há liberdade de escolha quando uma pessoa escolhe algo, mas não foi explicado a ela exatamente o que iria ocorrer? É justo que uma parte de alguém seja condenada a fazer algo por que uma outra parte assim decidiu? Devemos encarar essa situação como duas pessoas diferentes ou uma só? Aliás, quem é o verdadeiro "eu" de cada um dos personagens envolvidos: o seu externo, o seu interno ou ambos? São reflexões e questionamentos válidos e pertinentes durante a brilhante história apresentada.
Aliás, a criativa história é o grande ponto positivo da série, em meio a vários. Misturando elementos de drama, ficção científica e terror psicológico, não somente aborda todas essas questões relevantes e atuais mencionadas previamente, mas também nos apresenta ótimos personagens, com interpretações excelentes de todo o elenco. E tudo sustentado por um ótimo e bem amarrado roteiro, que, ao seu próprio ritmo e alternando entre momentos mais lentos e de maior tensão, prende a atenção do espectador com reviravoltas e com a manutenção de uma constante aura de mistério envolvendo a trama, desembocando em um season finale espetacular, surpreendente e que deixa grande expectativa para a segunda temporada.
Com relação a algumas críticas quanto ao transcorrer mais "monótono" da série em alguns momentos, parece-me que vem mais da incompreensão de que a série quis fazer as coisas dessa forma mesmo, isto é, nos mostrar o real ambiente de um escritório, com toda a lentidão e monotonia naturais de tal meio, e nos apresentar como esse ambiente poderia ser gradativamente alterado a partir do surgimento de mais questionamentos acerca do propósito do trabalho realizado no local e até mesmo da própria existência dos funcionários em questão. Sendo assim, a série apresenta como era o ambiente de trabalho antes de tudo começar e como ele vai mudando ao longo do tempo, e, obviamente, isso não ocorre de um dia para o outro, mas leva tempo.
Logo, "Ruptura" merece, sem dúvida, cada elogio que recebeu, desde os aspectos visuais à direção e da atuação do elenco ao roteiro criativo, é impactante e nos traz muitas reflexões morais e éticas - com certeza mais do que cabem em um comentário do Filmow. E, se não bastasse tudo isso, ainda nos deixa ansiosos por uma segunda temporada que tende a ser ainda melhor - se aqui a série prezou pelo mistério, a continuação tenderá, creio eu, a ser mais reveladora. Para quem não gostou ou não entendeu, eu respeito cada opinião, mas não deixo de sugerir assistir uma outra vez, talvez dando mais atenção a alguns detalhes e nuances.
Misturando elementos de comédia e drama e vários personagens detestáveis, "The White Lotus", ao meu ver, apresenta uma bem elaborada sátira não somente dos mais ricos, mas também das relações modernas de uma maneira geral - seja entre marido e mulher, como também entre pais e filhos. Sendo assim, no meio de todos os seus loucos e bizarros acontecimentos, nos faz refletir sobre a superficialidade e o excesso de materialismo nos relacionamentos atuais.
O roteiro é interessante e nos surpreende em diversos momentos, mantendo o espectador atento e sempre à espera do que vai acontecer em seguida. No entanto, o mesmo roteiro que é um dos pontos fortes também é, por outro lado, um dos fracos, em especial nos episódios finais, em que existem alguns "furos" e aspectos mal explicados, além de algumas cenas mais explícitas um tanto desnecessárias. A minha impressão é que a história é boa e bem desenvolvida, mas o seu encerramento não foi dos melhores.
Os personagens, por sua vez, muito bem interpretados pelo elenco, são também um ponto positivo, sobretudo o Armond, em grande atuação de Murray Bartlett.
Definitivamente não é a melhor produção da HBO, mas também está longe de ser uma das piores. Garante boas risadas, prende bem a atenção e, entre pontos positivos e negativos, tem mais acertos do que erros.
Apesar de, em minha opinião, não estar à altura de todos os elogios que vi receber nos últimos anos, "O Mandaloriano" é, sem dúvida, uma rara boa produção da Disney, após o desastre da nova trilogia, no Universo Star Wars, apresentando originalidade e personagens interessantes e conservando os elementos que os fãs da franquia mais apreciam.
Os aspectos técnicos são os que mais chamam a atenção de início. A combinação entre trilha sonora, efeitos práticos e fotografia proporcionam uma excelente ambientação ao espectador, além de ser perceptível o cuidado que se teve na preparação de cada um dos locais onde a história acontece, além dos personagens que aparecem na tela. A sensação é, sobretudo, que a série possui um visual perfeitamente identificável com os filmes clássicos, mas ao mesmo tempo não deixando de apresentar uma identidade própria.
O principal problema, por outro lado, encontra-se no roteiro. A história é interessante, mas muitas cenas são desnecessárias e apresentam pouca conexão com a trama central, determinados diálogos se estendem de maneira excessiva e vários furos de roteiro são flagrantes. Todo o cuidado que se teve no visual acabou faltando nessa parte que, pelo menos para mim, é fundamental em qualquer filme ou série.
Então, o veredito: "O Mandaloriano" é divertido e honra bem as histórias clássicas do Star Wars, mas também não é nada além disso. Acredito que para crianças e adolescentes esta produção seja mais apropriada, porém, para adultos, é mais um passatempo do que qualquer outra coisa.
Absurdo, assustador e, acima de tudo, revoltante. São algumas palavras que inicialmente me vinham à mente sempre que lia ou ouvia qualquer coisa relacionada ao acidente nuclear de Chernobyl. No entanto, ao ver esta magnífica minissérie (aliás, mais uma grande produção da HBO) e após conhecer mais sobre o ocorrido, todos os sentimentos que tinha anteriormente são agora reforçados, sendo esse, talvez, o maior legado que essa produção de cinco episódios nos deixa: o de divulgar ainda mais ao mundo inteiro, até para aqueles que já conheciam acerca do assunto superficialmente, e deixar registrada a verdade envolvendo o maior desastre provocado pelo homem.
Em primeiro lugar, destaco o elenco, muito bem escalado e com grandes interpretações, e os aspectos técnicos, que são impecáveis. A direção e a música provocam uma sensação de tensão e imersão do espectador na história, como se estivéssemos sendo "sugados" para dentro de algo de proporções gigantescas e além de nossa compreensão, o que, de certa forma, também é a sensação das personagens envolvidas, que encontram-se inseridas no meio desses surreais acontecimentos e têm suas vidas completamente alteradas por isso. Os dois episódios iniciais são frenéticos, prendendo completamente a atenção e nos deixando quase que "sufocados" nas primeiras horas após a explosão. Nos capítulos seguintes, a série adota um ritmo um pouco mais lento, mas não menos interessante, e, sempre se atentando aos mínimos detalhes, explica como cientistas e autoridades públicas tiveram que fazer "o possível e o impossível" a fim de controlar os efeitos da radiação nos meses seguintes e nos mostra as consequências da catástrofe nas suas principais vítimas: a população local e a natureza.
Além de fazer os devidos registros do ocorrido, esta obra também deixa uma crítica duríssima ao regime soviético, que, com o seu gigantismo estatal, sua extensa burocracia e um interminável número de secretários, ministros e comitês, foi diretamente responsável, junto aos despreparados funcionários que trabalhavam no local, pela explosão em Chernobyl, devido a sua incompetência na administração da usina, sua lentidão nas primeiras horas após o incidente e, sobretudo, pela supressão da verdade e pela propagação de mentiras, colocando os interesses do Estado e do Partido acima do bem estar da própria população. Obviamente esta parte pode ser mais polêmica para alguns, mas não creio que a série fez, diferente de outras produções americanas, uma crítica escancarada ou espalhafatosa à URSS, mas optou por simplesmente mostrar o que realmente aconteceu e todos os erros cometidos que resultaram no desastre e, a partir daí, o espectador poderia ver com os próprios olhos e ter a sua própria interpretação - embora, a incompetência e falsidade das autoridades governamentais envolvidas foi tamanha que é até difícil chegar a outra conclusão senão a de uma enorme negligência ou, se preferir, um crime de consequências incalculáveis.
No entanto, a pesada crítica deixada não se resume somente aos soviéticos, mas é bastante atual e também pode ser direcionada a qualquer governo que suprima a verdade, espalhe notícias falsas de maneira contumaz e coloque as vidas de inocentes em perigo por motivos meramente ideológicos, e a qualquer governante que acredite que o aparato estatal está acima do povo, e não a serviço dele.
Grande produção. Recomendo, mas aviso: tenha estômago forte para assistir.
Minissérie de altíssima qualidade, desde os aspectos técnicos até as atuações de todo o elenco. Também cabe destacar o realismo na produção desta obra, que passa longe de romantizar a guerra ou os confrontos armados de uma maneira geral, mas busca mostrar o verdadeiro sofrimento dos soldados em meio ao conflito, o medo da morte sentido por cada um e os laços de afeto e união construídos, entre si, dos campos de treinamentos às trincheiras.
Os depoimentos dos veteranos no início de cada episódio contribuíam muito para fornecer uma aproximação do espectador com a história narrada, pois uma coisa é ver a dramatização, muito bem feita, dos acontecimentos reais, e outra diferente é presenciar os depoimentos das verdadeiras pessoas envolvidas nos acontecimentos e a emoção na fala de cada um. Foram 10 episódios, mas passaram "voando", com a vontade de assistir o próximo episódio sendo imediata ao término de um e o espectador com a atenção presa em busca de saber o que vai acontecer em seguida.
Outro ponto interessante é que, em Band of Brothers, os soldados alemães não são tratados como "demônios", monstros ou seres de outro planeta, mas, inclusive, são feitos interessantes paralelos entre os dois lados do confronto, com a série mostrando as semelhanças entre os soldados. Os mesmos laços de fraternidade construídos pelos combatentes americanos também eram construídos entre os germânicos e histórias parecidas como as narradas na série também podem ter sido vividas no lado derrotado do conflito.
Assassinos da Lua das Flores
4.1 615 Assista AgoraApós uma longa espera, na qual estão incluídos os inúmeros atrasos que esta produção teve devido à pandemia, finalmente pude assistir "Killers of the Flower Moon" e todas as expectativas que tinha foram devidamente atendidas. Um dos meus diretores preferidos, Scorsese mostra, mais uma vez, que envelhece como vinho, apresentando, em grande direção, uma das conspirações mais absurdas da história dos Estados Unidos, em um filme que utiliza como base um livro homônimo e também uma extensa pesquisa do cineasta acerca da tribo Osage.
Em síntese, a película traz a história da descoberta de petróleo por indígenas americanos no início do século passado. Se, por um lado, o famoso "Ouro Negro" garantiu uma repentina prosperidade ao povo local, também trouxe, na mesma proporção, oportunistas interessados em se apropriar das riquezas encontradas e capazes de utilizar todos os meios necessários para alcançar tal objetivo.
A história é complexa, densa e pesada, o que explica a longa duração do filme. Em minha avaliação, a obra não perde tempo, por exemplo, com cenas desnecessárias, mas procura contar, na medida do possível, a trama no máximo dos detalhes, visando ser historicamente fiel e justa com o povo Osage afetado pelos crimes. Dessa maneira, Scorsese, acostumado a dirigir narrativas de ascensão e queda, tem novamente em mãos um enredo do tipo, adotando um ritmo ideal, isto é, nem muito rápido e nem muito lento, mas contando os acontecimentos com a velocidade adequada.
Além disso, se a temática criminal é conhecida da carreira do diretor, aqui temos um elemento novo para o cineasta: a tensão racial. O rápido enriquecimento dos Osage fez com que um povo anteriormente esquecido se transformasse na elite local, adquirindo grandes quantias de dinheiro, terras e negócios e possuindo, inclusive, empregados brancos. Os preconceitos existentes fazem com que os brancos tenham o pensamento de que os indígenas, vistos como inocentes, não possuem a inteligência necessária para administrar tantas riquezas. Por outro lado, os nativos não confiam plenamente nos brancos, mas não deixam de conviver com os mesmos ou até de ter relações mais próximas. Ambos os povos estão juntos, mas sempre alimentando desconfianças e tensões, que são muito bem construídas ao longo de toda a história.
Quanto às atuações, não há muito o que falar, pois todo o elenco está excelente, com destaque maior ao trio principal de atores: DiCaprio, DeNiro e Gladstone - em seu primeiro grande papel. O primeiro interpreta um personagem complexo e de diversas facetas, o segundo um vilão inescrupuloso e a terceira, por sua vez, uma esposa perspicaz, mas sufocada por inúmeras suspeita e temores. Também destaco a participação de Jesse Plemons, originalmente cotado para assumir o papel de Ernest, que está presente apenas na terceira - e última - parte do filme, mas em boa performance.
Não se assustem pelas três horas de duração, pois é mais um filmaço do mestre Scorsese e que vale muito à pena assistir. Recomendado.
Efeito Borboleta
4.0 2,9K Assista AgoraA premissa do filme é simples, criativa e interessante, mostrando, através de viagens no tempo, como algumas coisas que fazemos em nossas vidas podem afetar significativamente não apenas a cada um de nós, mas também as vidas das pessoas ao nosso redor - inclusive, de formas que nem imaginamos. No entanto, se a ideia é boa, a execução deixa bastante a desejar, com um roteiro confuso e repleto de furos, mal desenvolvimento das personagens e um final que foge completamente ao que a história vinha mostrando.
Um dos problemas que me chamaram a atenção nas viagens no tempo mostradas na trama é que elas acabam tornando o enredo previsível em determinados momentos. Embora não saibamos o que vai acontecer em seguida, sempre sabemos que alguma coisa ruim ocorrerá e que eventualmente o protagonista irá viajar novamente para tentar consertar o erro, e isso se repete inúmeras vezes. É como se o protagonista nunca estivesse realmente em perigo e tivesse o poder de reverter os acontecimentos quantas vezes quisesse até obter um final razoável.
Existem diversas películas que abordam o conceito de viagens temporais de maneira muito mais inteligente e bem feita do que foi mostrado aqui, que até teve, em várias cenas, um aspecto bem trash e de "filme B". A proposta é ótima, mas passou longe de me convencer.
Tár
3.7 395 Assista AgoraDiferente da maioria das cinebiografias, que retratam personalidades conhecidas e que dispensam maiores apresentações ao público, em "Tár" temos uma personagem fictícia. Logo, o espectador, antes de começar a assistir, apenas tem noção, através da sinopse, de se tratar de uma regente mundialmente famosa e, dessa maneira, o diretor tem a tarefa de, dentre outras coisas, fazê-lo conhecer mais da figura em questão, corretamente o apresentando, logo nas primeiras cenas, aos seus feitos, isto é, tudo aquilo que a fez se tornar célebre no mundo da música clássica, com as outras características do seu trabalho e de sua vida pessoal sendo reveladas gradativamente.
Além disso, vale destacar que a compositora e regente Lydia Tár foi construída, por Todd Field, pensando-se exatamente em Cate Blanchett para interpretá-la, o que é algo relativamente incomum no mundo cinematográfico. Na película, a atriz nos mostra que os realizadores do filme não poderiam estar mais certos em dedicar essa personagem a ela, com uma atuação gigantesca, mostrando as diferentes facetas de uma artista complexa e com certeza em uma das melhores performances de sua carreira.
O principal problema do filme, em minha avaliação, é que a obra é excessivamente longa, perdendo muito tempo com cenas e diálogos desnecessários e com inúmeras referências artísticas de difícil compreensão não somente para mim, mas também para a maioria do público. A história se arrasta um pouco na sua primeira metade, apenas ganhando um bom ritmo na reta final, que acredito ser a melhor parte da película.
De uma maneira geral, a trama, apesar de várias vezes trazer informações mais específicas acerca da música clássica, não tem o gênero musical em questão como o seu ponto central. O grande tema do filme é, na verdade, acerca do poder nas sociedades modernas, e como esse poder pode ser alterado pelas redes sociais, sobretudo com a famosa "cultura do cancelamento". Lydia, tão acostumada em ter o controle de tudo, tanto durante uma apresentação quanto em sua vida pessoal, vê sua vida mudar com acusações feitas contra ela - algumas justas e outras falsas - e tem sua reputação, que demorou tanto tempo para ser construída, abalada em um "piscar de olhos".
Aos mais bem informados acerca do universo da música clássica, não tenho dúvidas que "Tár" deve ser um prato cheio e um deleite. Para aqueles, como eu, que até gostam do estilo musical, mas não são profundos conhecedores do assunto, o filme poder ser demasiadamente longo, mas, ainda assim, é bom e com uma grande atuação de Blanchett.
O Poço
3.7 2,1K Assista AgoraExistem alguns filmes que conseguem ir além das intenções dos próprios autores e ter distintos significados de acordo com cada espectador. Creio que "O Poço" é uma dessas películas, pois, embora o diretor Galder Gaztelu-Urrutia já tenha declarado que a obra é uma crítica ao capitalismo, acredito que isso seja uma incoerência, pois o verdadeiro sistema sócio-econômico em que há uma desigualdade forçada - com poucos tendo acesso a muito e muitos tendo acesso a pouco - é, de fato, o socialismo. No entanto, o filme também funciona para aqueles que, assim como eu, discordam da opinião de Galder, pois, analisando sob outro ângulo, a história apresentada também pode ser vista como uma crítica à natureza humana de uma maneira geral e daquilo que o homem é capaz de fazer em situações extremas, provocando interessantes reflexões.
Na estrutura do poço, os que estão em cima têm acesso à fartura, enquanto os de níveis inferiores têm de se contentar apenas com as sobras das refeições dos outros - e, para os níveis realmente mais próximos do final, muitas vezes nem as sobras permanecem, com as pessoas que lá estão tendo de suportar a fome por várias semanas. Quem está acima não se preocupa com os de baixo, mesmo sabendo que, no mês seguinte, as posições podem se inverter, e procuram aproveitar a posição privilegiada enquanto podem.
No lugar de haver uma noção de solidariedade e preocupação ao próximo, com cada um comendo pouco e, dessa maneira, permitindo que todos tenham acesso à comida, o que vemos é que, na prática, todos desconfiam de todos e comem tudo aquilo que podem no pouco tempo que é permitido, pois nem sempre o ato de generosidade de um pode ser retribuído pelo outro. Além disso, quem já passou pela fome e hoje está em níveis superiores, ao invés de ter mais compaixão com os que agora passam pela mesma situação, apenas se preocupa em se esbaldar o máximo possível e compensar o período em que comeu pouco. Sentimentos de dignidade, respeito e justiça ficam em segundo plano quando a própria sobrevivência está em jogo, sendo impossível o espectador, ao ver tais cenas, não se indagar se, na pele das personagens, faria as mesmas coisas ou agiria de forma diferente.
O filme, por outro lado, peca com alguns problemas no roteiro, tornando-se um tanto repetitivo no meio da história. E também é necessário mencionar que o final é pouco satisfatório, provocando a sensação de que o diretor e os roteiristas poderiam ter ido além e explorado mais a trama construída, mas, por algum motivo, optaram por encerrar mais cedo, como se quisessem deixar a obra incompleta.
Apesar dos pesares, o filme é bom e, qualquer que seja a sua visão de mundo, é possível interpretar as críticas e reflexões nele presentes de distintas maneiras.
O Corpo
4.1 1,0KPara quem gosta de suspenses e dramas investigativos, "O Corpo" é, sem dúvida, um prato cheio. Com um roteiro bem elaborado e várias reviravoltas, o filme prende a atenção do espectador e nos deixa, até os últimos instantes, com sérias dúvidas acerca das verdadeiras intenções das personagens envolvidas e do que realmente aconteceu, apenas sendo tudo concluído com o plot twist final, que, pelo menos para mim, é inesperado e encaixa, com precisão, todas as peças do quebra cabeça construído ao longo da história.
Um aspecto interessante é a inserção de flashbacks durante o filme, que parece nos deixar a par do que está acontecendo, mas isso é somente um ligeiro engano - e um recurso inteligente, utilizado pelos roteiristas, para reforçar o mistério. A verdade é que somos meros espectadores desse crime, e os flashbacks nos ajudam a entender o contexto somente naquele momento específico que é mostrado, e apenas sob uma certa perspectiva. Dessa maneira, somos levados, no decorrer da película, a diferentes conclusões, sendo que, em alguns momentos, todas as opções que temos em mente parecem ser plausíveis.
Uma obra feita sob os mínimos detalhes e com muita qualidade. Recomendado.
Triângulo da Tristeza
3.6 730 Assista AgoraNão sei o que os jurados de Cannes viram neste filme para o premiarem, mas, na humilde opinião deste quem vos fala, "Triângulo da Tristeza" não me convenceu. A ideia de crítica social aos mais ricos vai na onda de diversas outras produções recentes - como, por exemplo, o filme "Parasita" e a série "The White Lotus" - e é válida, mas esta película, ao meu ver, passa longe de ter a mesma qualidade de outras obras com temática similar.
A história é dividida em três partes. A primeira, focando no casal, tem um problema muito simples: apesar dos esforços dos atores envolvidos, as personagens são insuportáveis e o "drama" envolvido é fraco, o que naturalmente provoca um desinteresse por parte do espectador. A segunda, já no iate, foca na clientela rica que irá curtir a viagem e as interações entre eles e também com a tripulação, mas perde diversas oportunidades de aprofundar melhor os arcos dos personagens envolvidos, apresenta uma quantidade excessiva de cenas desconfortáveis e escatológicas que não contribuem em muita coisa e ainda se perde com uma tentativa muito forçada de passar alguma mensagem política.
A terceira parte, por sua vez, é a mais interessante, em que os poucos sobreviventes, sendo alguns ricos e outros membros da tripulação, tentam se virar em uma ilha aparentemente deserta. Já que apenas uma das funcionárias do navio era habilidosa em algumas práticas necessárias à sobrevivência no local, como a pesca, as posições das personagens acabam se invertendo, com os mais abastados tendo de seguir as ordens daquela que antes era apenas mais uma tripulante, o que é uma crítica social bem feita.
No entanto, mesmo essa última parte, que é a melhor do filme, acaba se perdendo em um arco romântico constrangedor, diversos furos de roteiro e um final desnecessariamente deixado em aberto. Em alguns filmes, um final inconclusivo pode funcionar caso seja melhor estabelecer uma dúvida no espectador ou a possibilidade de distintos desfechos, mas aqui esse recurso é usado de maneira pouco inteligente, apenas tornando o filme incompleto.
O filme agrada aquele público apenas interessado em ver "rico se dando mal", mas desagrada quem, como era o meu caso, espera um bom humor ácido e inteligente, pois vai acabar se deparando com aquilo que é apenas, infelizmente, uma pretensa e rasa tentativa de crítica social.
O Homem da Capa Preta
3.6 59 Assista AgoraÉ impossível negar que Tenório Cavalcanti foi, para o bem ou para o mal, uma das figuras mais fascinantes da história política brasileira. Um alagoano que nasce na pobreza, perde o pai assassinado na infância, migra ainda muito jovem - e sem nada - ao Rio de Janeiro e lá se torna um verdadeiro "coronel" político à moda antiga, morando em uma fortaleza, caminhando com sua capa preta e sempre acompanhado de uma submetralhadora. Uma figura que, se não tivesse existido de fato, diriam que foi inventada.
Esta obra, que retrata sua biografia, consegue mostrar bem o lado aventureiro de Tenório e fatos marcantes em sua vida, alternando elementos de drama político e filmes de gângster e prendendo a atenção do espectador. No entanto, erra em uma excessiva romantização da história, que, de tão absurda e surreal, tranquilamente dispensa algumas alterações que aqui ocorreram. Além disso, também peca um pouco na temporalidade dos acontecimentos e na falta de um melhor desenvolvimento da sua relação familiar.
Também é necessário destacar a grande atuação de José Wilker, que incorpora, muito bem, não somente o personagem em si, mas todos os seus trejeitos, sua ambição como político e sua valentia. Um aspecto curioso é que Wilker igualmente foi um nordestino que teve de ir muito jovem ao Rio de Janeiro para fazer o seu nome, assim como Tenório - embora, obviamente, ressalto a grande diferença das profissões que ambos exerceram .
Um bom filme nacional.
O Casamento de Rachel
3.3 511O diretor Jonathan Demme procura nos mostrar a realização de um casamento por uma ótica à qual não estamos acostumados em filmes, isto é, como se estivéssemos acompanhando um documentário ou um reality show. Dessa maneira, o diretor nos coloca no meio dessa família instável e problemática, como se fossemos "penetras" em toda essa história, acompanhando os acontecimentos de forma crua e realista.
O problema é que o aspecto mais interessante do filme também é, por outro lado, o seu ponto mais negativo, pois, nessa tentativa de imprimir um realismo à trama, a obra também se torna excessivamente monótona e chata. Essa lentidão dura até a metade da película, a partir da qual o drama familiar começa a se elevar, prendendo mais a atenção do espectador. No entanto, logo depois tudo retorna à monotonia e, ao término, é apresentado um final previsível e pouco ousado.
O filme vale pela atuação da Anne Hathaway e por algumas cenas interessantes ao longo da história, mas ficou a sensação de que foi muito lento durante a maior parte do tempo e de que faltou muita coisa para tornar o enredo mais completo. É um filme esquecível.
Barbie
3.9 1,6K Assista AgoraAssisti apenas por curiosidade, já com expectativas baixas e o filme não me surpreendeu: é tão ruim, previsível e superestimado quanto eu imaginava anteriormente. Nem todo o hype construído nas mídias e o marketing dos produtores é capaz de mascarar que o filme tem, na verdade, poucas coisas a serem elogiadas, muitos problemas no roteiro e uma trama tão profunda quanto um pires.
Sendo justo, elogio a escolha do elenco - Margot Robbie e Gosling, sobretudo, estão perfeitos em seus respectivos papéis - e os aspectos visuais, mas os pontos positivos, infelizmente, param por aí. Após um início até divertido e interessante, o filme não consegue, ao longo do resto da trama, manter uma regularidade e nem desenvolver bem as suas personagens, indo por caminhos previsíveis e pouco criativos. Mesclando comédia com momentos dramáticos, a produção não consegue convencer nem como uma coisa e nem como outra, isto é: como comédia, não é engraçado e, como drama, não é dramático o suficiente.
Além disso, também se perde muito - e muito por culpa da diretora, que aparentemente fez isso de maneira intencional - em uma militância forçada, fazendo um filme sobre bonecas se transformar mais em um panfleto feminista do que qualquer outra coisa - como muito bem comentaram anteriormente por aqui, até parece que o enredo foi escrito por twitteiros e não por roteiristas profissionais. No entanto, se houvesse esse mesmo discurso no filme, acompanhado com um roteiro bem elaborado e uma história interessante, até dava para suportar, porém não é isso que acontece em "Barbie".
Em conclusão, a sensação final é de que o filme foi, pelo menos para mim, uma grande perda de tempo.
Oldboy
4.3 2,3K Assista AgoraSem dúvidas, "Oldboy" não é para qualquer um e, com certeza, também não é o filme que eu imaginava que seria. Esperava, por exemplo, mais cenas de ação, e recebi, por outro lado, uma interessante trama que foca mais no lado do thriller. No caso, um grande mistério é construído desde o início e o protagonista passa a maior parte da história procurando descobrir a verdade por trás de tudo que passou e as motivações que levaram a toda essa situação - e o telespectador acompanha a desmontagem desse bem elaborado quebra cabeça.
No entanto, vale destacar que, embora não tenha tantas cenas de ação como imaginava antes de assistir, as poucas que existem são brutais, sanguinárias, muito bem feitas e, por conta disso, marcantes - sobretudo, a célebre cena da luta no corredor. O mais impressionante, na verdade, é que qualquer violência que tais cenas apresentem, ainda assim não chegam sequer perto de serem tão chocantes e perturbadoras quanto o plot twist final do filme, que fecha todo o quebra cabeça montado ao longo do enredo e realmente deixa o telespectador de boca aberta.
Infelizmente, "Oldboy" tem diversos furos de roteiro - alguns mais e outros menos importantes - e fatos não muito bem explicados, tais quais como Woo-jin conseguiu se tornar tão poderoso e como criou Mi-do durante tanto tempo. Além disso, para um plano tão bem arquitetado, pareceu-me bastante arriscado apostar em uma coincidência, como a de Dae-su ir exatamente ao restaurante em questão. E, na cena final, o porquê do protagonista ser ajudado pela mulher que o hipnotizou também não me pareceu muito sólido. Os pontos positivos da obra compensam esses erros, mas não posso negar que me incomodaram um pouco.
E, quanto ao término do filme, verifiquei, após uma rápida pesquisa, que o diretor realmente buscou deixar a cena final ambígua, o que considero um acerto, pois, para qualquer que seja o desfecho, ele é igualmente trágico. Se Dae-su continua se lembrando do que aconteceu, significa que terá de viver com isso para o resto da vida. No entanto, se ele não se lembra mais do teor incestuoso da relação, talvez seja até pior, pois ela continuará indefinidamente.
A maior lição dessa trágica história talvez seja a de que a vingança é, de fato, uma causa perdida e, após alcançada, a única coisa que existe em seguida é o vazio. A violência, nesse caso, seria uma prisão tão insensata quanto o quarto horrível em que Dae-su estava preso, mas com única diferença: sem perspectiva de libertação.
Um ótimo filme para quem deseja conhecer mais do cinema sul-coreano e "sair da mesmice" das produções hollywoodianas. Porém, aviso: tem que ter estômago para assistir.
Viver
3.3 76Também sou um daqueles que não assistiu o clássico de Akira Kurosawa, então não conseguirei avaliar se o remake faz jus à obra original. No entanto, posso dizer que "Living" é, sem dúvida, um filme sensível e com uma temática simples, porém tocante, de um homem comum e burocrático que busca aproveitar da melhor maneira possível os últimos meses de vida. E, ao fazê-lo, não somente se sente mais feliz consigo mesmo, mas também consegue ajudar as pessoas ao seu redor e deixar uma marca positiva.
A atuação de Bill Nighy é ótima e uma aula de como um ator não precisa de excessos - o famoso overacting - para representar bem o seu personagem, mas pode expressar suas emoções de forma contida. No entanto, se a grande performance do ator é o ponto alto da obra, por outro lado ficou a sensação de que o filme coloca demasiadamente nas costas de Nighy o sucesso da história. Em outras palavras: sem o ator na tela, o filme não possui outros personagens interessantes, nem diálogos marcantes ou cenas que mereçam algum maior elogio, mas gira completamente em torno da personagem principal.
Pode desagradar àqueles que não gostam de uma narrativa mais lenta e, sem dúvida, tem os seus problemas no roteiro e nas personagens secundárias, mas, no geral, o filme é bom e traz uma mensagem bonita.
Oppenheimer
4.0 1,1KDepois de trabalhos um tanto decepcionantes em "Tenet" e "Dunkirk", "Oppenheimer" marca o retorno triunfal de Nolan, um dos meus diretores favoritos, ao patamar que nos acostumamos a vê-lo, em uma obra muito bem produzida e visualmente impactante.
Apesar das três horas de duração, devo dizer, indo na contramão de muitos, que em momento algum me senti entediado ou cansado, pois o diretor conseguiu, de maneira inteligente, manter o filme sempre a um bom ritmo. Aqui a história não fica presa a situações monótonas, mas consegue, seja com diversos momentos de tensão ou seja com suas constantes alternâncias no tempo, prender bem a atenção do espectador e dissecar acontecimentos importantes da vida do famoso físico americano unindo precisão histórica e dramaticidade. E, apesar de ser um filme biográfico, vai além de descrever a vida do indivíduo em questão e nos faz aprender mais sobre fatos relevantes da história da humanidade e refletir sobre questões importantes, como, por exemplo, a utilização de armas de destruição em massa.
Um aspecto interessante é que Oppenheimer, a figura central de toda essa trama, não é aqui idealizado e nem a sua figura colocada como herói ou vilão. No filme, é mostrada toda a complexidade de sua personalidade, isto é, de um lado a genialidade e, do outro, todos os seus defeitos, dúvidas e decepções que carrega ao longo da vida pessoal e profissional. E obviamente essa construção da personagem passa muito pela atuação gigantesca de Cillian Murphy - que é acompanhada de outras excelentes performances, sobretudo a de Robert Downey Jr.
É também impossível deixar de mencionar os brilhantes aspectos técnicos. É como se estivéssemos acompanhando uma grande ópera envolvendo personagens históricos, com um visual e trilha sonora hipnotizantes. Nolan, um diretor tão conhecido por seus diálogos e roteiros, aqui usa também bastante o poder da imagem para nos mostrar tudo aquilo, como a intensidade da força nuclear, que é difícil explicar com palavras.
Único aspecto negativo possa ser a presença de Jean Tatlock e Katherine Oppenheimer na história, pois ambas, muito importantes na vida do físico, são aqui reduzidas a personagens meramente secundárias e que não contribuem, de fato, com os dois principais temas do enredo: o papel do cientista na criação da bomba e a perseguição que sofreu nos anos posteriores à guerra. Talvez em uma série, com vários episódios, os papéis de ambas poderiam ser melhor explicados, mas, mesmo em um filme de longa duração, as duas pareceram aqui peças que não se encaixavam com o restante do quebra cabeça.
Recomendado.
O Refúgio
3.3 69 Assista AgoraA proposta do filme é bem interessante: a de mostrar como a busca desenfreada pelo dinheiro e por pertencer a uma elite pode atrapalhar a vida pessoal de alguém, corroer as relações familiares e, no final das contas, sequer conseguir alcançar o objetivo almejado - e, aliás, até realizar o contrário, isto é, prejudicar o indivíduo financeiramente.
Um dos protagonistas da história, Rony, teve uma infância com diversas dificuldades, o que o fez tornar um adulto com grande vontade de ser rico e compensar tudo o que não teve quando jovem. Da mesma maneira, também procuraria fornecer, aos seus filhos, todas as benesses que seus pais não puderam dar a ele.
No entanto, se por um lado é perfeitamente compreensível e até benéfico que um pai queira prover sua prole da melhor maneira possível, até mesmo esse desejo pode, se levado ao extremo, ser negativo. No caso de Rony, esse pensamento faz com que ele arrisque tudo, mude-se de volta à sua terra natal e aposte todas as fichas em acordos ousados em uma empresa. Além disso, faz o máximo esforço não somente para ser rico, mas também para parecer rico, a fim de impressionar potenciais clientes e ajudar nos negócios.
O problema é que, quando alguém vive excessivamente de aparências, isso acaba por destruir lentamente a pessoa, pois ela fica consumida por suas próprias mentiras, não conseguindo sequer entender mais quem ela realmente é. E, se isso não bastasse, a busca desenfreada por garantir todo o luxo à sua família, acaba por fazer com que Rony esquecesse de elementos essenciais que um pai deve dar aos filhos e a esposa, acima do dinheiro e dos status: amor e atenção.
Essa mensagem deixada pelo filme é muito poderosa, no entanto, infelizmente não foi tão bem executada. A verdade é que "O Refúgio", na tentativa de ser realista, é demasiadamente lento e entedia o espectador com inúmeras cenas em que nada acontece. Isso sem falar de várias partes da história não serem bem explicadas ou até serem descartáveis à trama principal, como a cena final do cavalo e o passado familiar de Rony, dando a sensação de que a história é apresentada de maneira incompleta.
A minha opinião é que a obra poderia ter sido bem melhor desenvolvida se houvesse mais ousadia, por parte dos roteiristas e do diretor, de mostrar algo a mais. Realismo é bom, mas realismo em excesso é prejudicial. Se os espectador quiser realismo de verdade ele vai se preocupar com os problemas da própria vida e não com os problemas de personagens fictícios, então é bom que o filme proporcione momentos além do que estamos acostumados a ver no dia a dia, caso contrário inevitavelmente vai se tornar entediante.
O Urso do Pó Branco
2.9 332 Assista AgoraCom esse título e essa sinopse, é inegável que "Urso do Pó Branco" chama bastante a atenção e, meramente por curiosidade, decidi assistir. O filme, em resumo, é uma mistura de terror, comédia e, sobretudo no final, um pouquinho de drama, o que combina com a história bizarra - e apenas levemente baseada em fatos reais, pois, na realidade, o urso morre de overdose logo após ingerir a droga.
Se o espectador assistir de forma descontraída, é possível, de certa maneira, deixar passar os inúmeros furos de roteiro e cenas desnecessárias e se divertir. No entanto, não dá para ignorar, após analisar com mais tranquilidade, que Elizabeth Banks, cuja carreira como diretora ainda não decolou, comete um grande erro ao não abraçar, por completo, as bizarrices da história e, ao invés disso, perder muito tempo com arcos e personagens descartáveis.
As melhores cenas dessa maluca produção são as envolvendo, por razões óbvias, o urso sob efeito das drogas, com todo o gore que elas podem fornecer, que é exatamente o que todos aqueles que decidiram ver o filme gostariam de presenciar. Em outras palavras: os melhores momentos do filme são aqueles em que o filme não se leva muito à sério e incorpora os absurdos do enredo.
Como foi comentado por aqui anteriormente, se literalmente toda a história se baseasse nos traficantes, ou turista e moradores locais, passando por perrengues contra um urso drogado e isso fosse bem explorado com humor negro, o filme seria bem melhor e um grande clássico trash. No final das contas, acabou sendo uma boa tentativa desperdiçada.
Batman
4.0 1,9K Assista AgoraComecei assistindo com expectativas baixas, e surpreendeu-me positivamente não somente por seus aspectos técnicos, mas sobretudo por realizar, entre erros e acertos, uma espécie de "releitura" da história do Homem Morcego, com uma abordagem mais noir, investigativa e humana do herói. Mesmo que a sua história, tanto pelos quadrinhos quanto pelas adaptações anteriores, já seja bastante conhecida, é apresentada, em "The Batman", com um grande ar de mistério, como se estivéssemos redescobrindo um personagem que nos acostumamos tanto a ver nas telas.
Aqui temos um Batman ainda nos primeiros anos de sua trajetória na luta contra o crime, o que explica as dúvidas dele acerca de si próprio e muitos dos erros que comete ao longo do filme. Ele ainda está aprendendo em como realizar aquilo que se tornará basicamente a sua "vida" pelos próximos anos, sendo primeiro motivado meramente pelo desejo de vingança, mas aos poucos começando a encontrar outras motivações que o impulsionem a prosseguir em sua caminhada. E este é o ponto que talvez algumas pessoas não compreenderam bem e criticaram o filme por isso: aqui, pelo menos ao meu ver, não se está querendo tornar o Batman aquilo que ele não é ou distorcer o personagem, mas, na verdade, mostrar como ele começou sua caminhada como vigilante e foi, aos poucos, tornando-se aquele Batman que todos nós conhecemos e nos acostumamos, logo é por esse motivo que, nesta história, ele está diferente.
Tinha muito receio quanto ao Robert Pattinson como Bruce Wayne, mas ele entrega uma boa atuação, assim como o resto do elenco. Paul Dano é um ótimo ator e aqui cumpre bem o papel que lhe foi pedido, mas a forma como retrataram o Charada ganha pontos apenas pela ousadia em mostrar esse vilão de uma maneira diferente, pois, pessoalmente, não me agradou muito. Da mesma maneira, o seu "plano" final não foi dos mais empolgantes ou inusitados e poderia ter sido melhor elaborado - e, sendo ele o vilão principal, isso também comprometeu o filme.
Um outro ponto negativo foi a lentidão em vários momentos, o que acabou resultando em um filme de duração maior do que deveria ter e um tanto arrastado. Não peço que o filme seja "corrido" e nem se apresse em detalhar sua história, mas claramente poderia ter sido, no mínimo, encurtado uma meia hora, em especial retirando aquela parte relacionada ao passado do Thomas Wayne, que foi desnecessária, irrelevante e apenas tomou tempo da película.
Sendo assim, "The Batman" não é nem uma obra-prima como muitos erroneamente disseram - e está muito longe dos melhores filmes do Homem Morcego, mas também não é horrível como vi alguns comentários dizendo. O diretor Matt Reeves, apesar de também ter sido um tanto previsível em algumas partes, ousou em mostrar uma abordagem diferente acerca dos primeiros anos do herói, e isso naturalmente é arriscado e pode dividir opiniões, mas, no geral, creio que o filme teve mais acertos do que erros e entregou bons momentos - embora, ressalto, não precisava ser tão longo.
O Pacífico
4.4 265 Assista AgoraDepois do sucesso que foi "Band of Brothers", é natural que "The Pacific", outra produção da HBO sobre a Segunda Guerra, seja bastante comparada a sua predecessora. No entanto, embora ambas compartilhem o mesmo altíssimo nível de qualidade e impecáveis aspectos técnicos, as duas excelentes produções possuem diferentes estilos com os quais os retratam suas respectivas histórias, que, diga-se de passagem, são bem distintas.
Apesar de estarem inseridas no mesmo evento - isto é, a Segunda Guerra Mundial, as batalhas travadas no Pacífico, como sabemos, foram muito mais sanguinárias e destrutivas, além das condições pelas quais os soldados envolvidos tiveram que enfrentar, que aqui foram bem mais adversas. Enquanto os combatentes em solo europeu, que também tiveram que passar por inúmeros problemas e dificuldades, tiveram a oportunidade, enquanto não estavam em confrontos armados, de conhecer belas cidades e paisagens do Velho Continente, aqui, mesmo em períodos de folga, os soldados ainda tinham que conviver com malária, chuvas frequentes, solos lamacentos e grandes populações de ratos em ilhas longínquas e desconhecidas - a única exceção foi a ocasião em que as tropas americanas permaneceram em Melbourne.
Sendo assim, a guerra na Europa, embora também brutal, foi mais "glamourosa", enquanto a travada no Pacífico, travada em condições quase sub humanas e contra um inimigo que simplesmente não possuía medo de morrer, deixou um rastro muito superior de mortos, feridos e até mesmo de sobreviventes com graves sequelas psicológicas. E no momento em que esses acontecimentos apresentam tantas diferenças como essas, não seria coerente que as séries retratassem esses eventos da mesma maneira.
Logo, se em "Band of Brothers", primeiro conhecemos os personagens envolvidos - desde o treinamento - e somente depois vemos eles em combate, em "The Pacific" já no primeiro episódio somos inseridos na batalha, mesmo conhecendo muito pouco das vidas pregressas dos soldados, e apenas com o tempo, gradativamente e também dividindo o período com confrontos sangrentos e momentos de alta tensão e desespero, vamos sendo apresentados a mais detalhes sobre cada um. Além disso, os soldados aqui não possuem muitos momentos de descontração entre si, mas tem que conviver, constantemente, com o medo da morte, seja de dia, seja de noite. Esses detalhes podem não ter agradado a todos, mas retratam, com fidelidade e realismo, os acontecimentos narrados e creio que os produtores e roteiristas fizeram o correto com essa abordagem mais direta, dando uma identidade única à obra e evitando se espelhar - ou imitar - o seriado anterior.
Portanto, "The Pacific" é mais uma grande produção da HBO, desde o roteiro até os aspectos visuais, e um retrato fiel e brutal de eventos importantes na história da humanidade, além de um grande tributo aos soldados que enfrentaram o "inferno" nas batalhas contra as tropas japonesas.
Recomendado.
The White Lotus (2ª Temporada)
4.2 346 Assista AgoraMantendo a essência de "dramédia" com doses de humor negro, a segunda temporada de "White Lotus" apresenta, ao meu ver, um roteiro mais coeso e consistente do que o visto na primeira. O seriado abandona um pouco as críticas sociais e se aprofunda mais em uma reflexão acerca dos relacionamentos amorosos de uma maneira geral e em como, apesar de todo o dinheiro ou inteligência que possamos ter, o sexo, um instinto tão primitivo, ainda representa um fator importante e que nos move mesmo que inconscientemente.
Além disso, as personagens, embora longe de serem perfeitas, são bem menos detestáveis e irritantes do que na temporada anterior, o que permite uma maior identificação e conexão com o espectador. E, claro, as belíssimas paisagens, as obras de arte - com referências artísticas aos acontecimentos do enredo - e a excelente trilha sonora também ajudam - e muito - a elevar o nível da produção, fornecendo um visual mais imponente à história.
Os únicos pontos negativos talvez tenham sido o ritmo muito lento e monótono em alguns episódios e o arco envolvendo a Tanya - que não foi ruim, mas poderia ter sido melhor elaborado, em minha avaliação.
Recomendado.
The Boys (2ª Temporada)
4.3 647 Assista AgoraCreio que a série claramente não conseguiu, ao longo dessa temporada, ir além das mesmas tramas já batidas, cenas repetitivas e previsíveis (sempre que algum personagem se encontrava em apuros utilizava a mesma cartada da "chantagem") e mal desenvolvimento das personagens, além de mais uma vez tentar espelhar acontecimentos da política americana ao invés de desenvolver a sua própria história.
O primeiro episódio é muito bom, mas o nível não é mantido e cai bastante nos episódios seguintes. São tantos aspectos negativos, erros e furos de roteiro que nem os poucos pontos positivos - como a revelação de alguns segredos sórdidos da Vought, que eu considerei algo bem interessante e que poderia ter sido melhor explorado - dessa vez conseguem salvar.
Quanto aos personagens remanescentes, o Homelander continua sendo um ótimo elemento na trama, mas, enquanto na primeira temporada havia uma certa dúvida positiva e salutar ao enredo acerca de suas reais intenções (se ele realmente é um indivíduo mau ou apenas é alguém que tem uma visão deturpada do que é bom e ruim), aqui forçaram excessivamente a barra quanto a ele ser "o homem mau", de maneira até mesmo caricata e desnecessária. O arco envolvendo o The Deep continua sendo irrelevante e o envolvendo o Frenchie e os outros membros do grupo deu a sensação de ter estagnado.
Com relação aos novos que foram adicionados, a Tormenta é simplesmente muito irritante e insuportável e a sua presença nos Sete é bem estranha, por sinal, ainda mais tendo sido colocado pelo próprio dono da empresa. Única adição positiva foi a da Becca, que eu, inclusive, gostaria de ter visto mais.
A minha impressão é que os roteiristas se perderam e estão andando em círculos, não conseguindo mais explorar um enredo que tinha bastante potencial - a primeira temporada, em comparação, também tem vários problemas, mas ao menos consegue manter mais acertos do que erros. Não irei prosseguir assistindo e, para falar a verdade, mal consegui terminar essa segunda temporada direito de tão decepcionante que foi.
The Boys (1ª Temporada)
4.3 820 Assista AgoraInspirando-se em uma HQ de mesmo nome e mostrando uma abordagem diferente nas histórias de super heróis, "The Boys" apresenta uma premissa muito interessante: a de representar os "heróis de capa" de uma maneira mais humana e menos romantizada ou idealizada. Logo, vai por um caminho oposto ao que nos acostumamos a ver na maioria dos filmes e séries do gênero - e, por outro lado, com um estilo semelhante ao que existe em "Watchmen", por exemplo.
Sendo assim, aqui os heróis, apesar dos seus super poderes, possuem tantos ou até mais defeitos do que qualquer outro ser humano normal, isto é, vaidade, egoísmo, falsidade, dentre outros. Dessa maneira, não são deuses e nem seres puros, como a maioria das pessoas acredita, mas sim indivíduos capazes de mentir e dissuadir o público, além de possuírem desejos sexuais e até algumas perversões eróticas.
E a série não se limita a mostrá-los combatendo o crime, mas procura simular o que realmente aconteceria se entidades como essas surgissem no mundo, isto é, como uma sociedade cada vez mais focada em dinheiro e aparências iria receber os super heróis. Assim, presenciamos que eles são "apropriados" pelas grandes corporações - sobretudo a Vought, que é a detentora oficial dos heróis", vistos por ela quase como uma patente - e tornam-se não somente combatentes do crime, mas também peça fundamental de uma indústria que, desde filmes, musicais e brinquedos até operações militares, iria movimentar bilhões por ano. A forma com a qual a série mostra isso, alternando entre cenas de brutalidade e doses de humor negro, e constrói esse mundo não tão diferente do nosso é o seu grande ponto forte e sua principal marca, sobretudo nos episódios iniciais, que apresentam muito bem essa perspectiva ao espectador.
Nesse cenário construído pelo seriado, obviamente é impossível não mencionar o personagem que melhor representa essa dualidade dos super heróis e que é também um dos outros pontos de destaque de "The Boys": o Homelander. Em grande atuação de Antony Starr, ele é, simultaneamente, assustador, carismático, sádico e infantil, o que é fruto não somente de ter de conviver com poderes superiores a qualquer outro ser na face da Terra, mas também de suas origens, de sua solidão e da "marca" que tem de sustentar perante o público. A sua presença ao longo dessa história é sempre acompanhada de cenas marcantes e grandes momentos.
No entanto, a série também tem os seus vários aspectos negativos. Em primeiro lugar, se o início é muito bom, o desenvolvimento do resto da história não mantêm o mesmo nível, com o seriado "derrapando" de forma considerável, sobretudo entre os episódios 4 e 6 - e apenas recuperando-se mais para os episódios finais, pelo mal aprofundamento de diversos personagens e pela tentativa, que me incomodou um pouco, de tentar fazer um paralelo com o panorama político americano e outras discussões ideológicas e religiosas. Caso os roteiristas tivessem focado mais em desenvolver melhor alguns heróis, como a Maeve, e menos em fazer uma crítica velada a determinados grupos políticos, acredito que teria sido mais produtivo.
Além disso, não dá para ignorar os diversos furos de roteiro e acontecimentos mal explicados que acontecem durante essa temporada. Como os heróis conseguem andar por aí com os seus rostos à mostra e muitas vezes sequer serem reconhecidos? O romance entre o Francês e a Kimiko é bonito, mas é bem forçado e não faz sentido pelas características das personagens. Qual a história por trás da mulher com a qual Maeve conversava? O Homelander, no último episódio, explica que era ele o responsável por espalhar, junto com o Trem-Bala, o Componente V para diversas parte do mundo e até para alguns terroristas, mas porque essa declaração dele, que deveria ser encarada como algo chocante e extremamente revelador, não surpreende a vice diretora da empresa? E, se ele realmente fez isso, porque entregou uma amostra do componente para as forças especiais do exército? Como o Trem-Bala sabia que o Hughie e os outros do grupo haviam escapado da prisão e chegou exatamente na hora em que eles estavam deixando o local? Essas são apenas algumas das coisas que não foram bem elaboradas e, embora não dê para levar extremamente à sério uma história que aborde super heróis, ainda assim qualquer bom enredo tem de possuir uma certa lógica e coerência, o que faltou em vários momentos no seriado.
Entre erros e acertos, a série é interessante, mas creio que o potencial da história poderia ter sido bem melhor aproveitado. Sendo assim, o veredito: é boa, mas talvez não tão boa quanto todo o hype que recebeu possa indicar - pelo menos, na primeira temporada. O surpreendente plot twist do último episódio, no entanto, me deixou com muita vontade de ver a continuação, o que provavelmente farei em breve.
Ruptura (1ª Temporada)
4.5 751 Assista AgoraAbordando diversos temas importantes, possuindo ótimos aspectos visuais e apresentando um roteiro simultaneamente insano e genial, "Ruptura" com certeza é um oásis de criatividade e inovação em meio a um mundo artístico cada vez mais repetitivo e nos brinda, logo em sua temporada inicial, com uma das melhores temporadas de uma série nos últimos anos.
Um dos pontos centrais da série, ao meu ver, é: liberdade de escolha. Ao aceitar fazer parte desse procedimento, o indivíduo externo, sem saber o que realmente iria acontecer, livra-se dos aborrecimentos do trabalho e de todo o cansaço inerente, mas, ao mesmo tempo, desconhece completamente o que faz no escritório e o propósito de todo o tempo que passa na empresa. É um ser alienado acerca do seu próprio ofício, mas aceita fazer isso pelo dinheiro e pela oportunidade do emprego, além de outros motivos pessoais, como, por exemplo, buscar esquecer, pelo menos por algumas horas, alguma lembrança triste do passado. Por outro lado, no entanto, o seu indivíduo interno encontra-se aprisionado no trabalho. Ele não escolheu esse destino, não foi indagado acerca e sequer compreende o porquê do seu externo ter tomado essa decisão, mas é obrigado a aceitá-lo pelo período que o seu externo desejar, sendo refém da empresa e vendo a realidade de acordo com aquilo que os patrões e os manuais lhe dizem.
Algo absurdo, radical e inconcebível em uma sociedade normal e saudável, mas existente em um mundo cada vez mais escravo do dinheiro e das grandes corporações, que se aproveitariam disso, e cada vez mais distante do conceito de bioética, com inovações científicas moralmente questionáveis. Então, quando inserido dentro da empresa, irá cultuar os donos, ver os manuais e procedimentos internos como manuscritos sagrados e pregar lealdade aos patrões. Enquanto pensava ser parte de algo maior e grandioso - mas que não compreendia ao todo, apenas estava sendo escravizado sem perceber.
Afinal, há liberdade de escolha quando uma pessoa escolhe algo, mas não foi explicado a ela exatamente o que iria ocorrer? É justo que uma parte de alguém seja condenada a fazer algo por que uma outra parte assim decidiu? Devemos encarar essa situação como duas pessoas diferentes ou uma só? Aliás, quem é o verdadeiro "eu" de cada um dos personagens envolvidos: o seu externo, o seu interno ou ambos? São reflexões e questionamentos válidos e pertinentes durante a brilhante história apresentada.
Aliás, a criativa história é o grande ponto positivo da série, em meio a vários. Misturando elementos de drama, ficção científica e terror psicológico, não somente aborda todas essas questões relevantes e atuais mencionadas previamente, mas também nos apresenta ótimos personagens, com interpretações excelentes de todo o elenco. E tudo sustentado por um ótimo e bem amarrado roteiro, que, ao seu próprio ritmo e alternando entre momentos mais lentos e de maior tensão, prende a atenção do espectador com reviravoltas e com a manutenção de uma constante aura de mistério envolvendo a trama, desembocando em um season finale espetacular, surpreendente e que deixa grande expectativa para a segunda temporada.
Com relação a algumas críticas quanto ao transcorrer mais "monótono" da série em alguns momentos, parece-me que vem mais da incompreensão de que a série quis fazer as coisas dessa forma mesmo, isto é, nos mostrar o real ambiente de um escritório, com toda a lentidão e monotonia naturais de tal meio, e nos apresentar como esse ambiente poderia ser gradativamente alterado a partir do surgimento de mais questionamentos acerca do propósito do trabalho realizado no local e até mesmo da própria existência dos funcionários em questão. Sendo assim, a série apresenta como era o ambiente de trabalho antes de tudo começar e como ele vai mudando ao longo do tempo, e, obviamente, isso não ocorre de um dia para o outro, mas leva tempo.
Logo, "Ruptura" merece, sem dúvida, cada elogio que recebeu, desde os aspectos visuais à direção e da atuação do elenco ao roteiro criativo, é impactante e nos traz muitas reflexões morais e éticas - com certeza mais do que cabem em um comentário do Filmow. E, se não bastasse tudo isso, ainda nos deixa ansiosos por uma segunda temporada que tende a ser ainda melhor - se aqui a série prezou pelo mistério, a continuação tenderá, creio eu, a ser mais reveladora. Para quem não gostou ou não entendeu, eu respeito cada opinião, mas não deixo de sugerir assistir uma outra vez, talvez dando mais atenção a alguns detalhes e nuances.
Recomendo.
The White Lotus (1ª Temporada)
3.9 400 Assista AgoraMisturando elementos de comédia e drama e vários personagens detestáveis, "The White Lotus", ao meu ver, apresenta uma bem elaborada sátira não somente dos mais ricos, mas também das relações modernas de uma maneira geral - seja entre marido e mulher, como também entre pais e filhos. Sendo assim, no meio de todos os seus loucos e bizarros acontecimentos, nos faz refletir sobre a superficialidade e o excesso de materialismo nos relacionamentos atuais.
O roteiro é interessante e nos surpreende em diversos momentos, mantendo o espectador atento e sempre à espera do que vai acontecer em seguida. No entanto, o mesmo roteiro que é um dos pontos fortes também é, por outro lado, um dos fracos, em especial nos episódios finais, em que existem alguns "furos" e aspectos mal explicados, além de algumas cenas mais explícitas um tanto desnecessárias. A minha impressão é que a história é boa e bem desenvolvida, mas o seu encerramento não foi dos melhores.
Os personagens, por sua vez, muito bem interpretados pelo elenco, são também um ponto positivo, sobretudo o Armond, em grande atuação de Murray Bartlett.
Definitivamente não é a melhor produção da HBO, mas também está longe de ser uma das piores. Garante boas risadas, prende bem a atenção e, entre pontos positivos e negativos, tem mais acertos do que erros.
O Mandaloriano: Star Wars (1ª Temporada)
4.4 532 Assista AgoraApesar de, em minha opinião, não estar à altura de todos os elogios que vi receber nos últimos anos, "O Mandaloriano" é, sem dúvida, uma rara boa produção da Disney, após o desastre da nova trilogia, no Universo Star Wars, apresentando originalidade e personagens interessantes e conservando os elementos que os fãs da franquia mais apreciam.
Os aspectos técnicos são os que mais chamam a atenção de início. A combinação entre trilha sonora, efeitos práticos e fotografia proporcionam uma excelente ambientação ao espectador, além de ser perceptível o cuidado que se teve na preparação de cada um dos locais onde a história acontece, além dos personagens que aparecem na tela. A sensação é, sobretudo, que a série possui um visual perfeitamente identificável com os filmes clássicos, mas ao mesmo tempo não deixando de apresentar uma identidade própria.
O principal problema, por outro lado, encontra-se no roteiro. A história é interessante, mas muitas cenas são desnecessárias e apresentam pouca conexão com a trama central, determinados diálogos se estendem de maneira excessiva e vários furos de roteiro são flagrantes. Todo o cuidado que se teve no visual acabou faltando nessa parte que, pelo menos para mim, é fundamental em qualquer filme ou série.
Então, o veredito: "O Mandaloriano" é divertido e honra bem as histórias clássicas do Star Wars, mas também não é nada além disso. Acredito que para crianças e adolescentes esta produção seja mais apropriada, porém, para adultos, é mais um passatempo do que qualquer outra coisa.
Chernobyl
4.7 1,4K Assista AgoraAbsurdo, assustador e, acima de tudo, revoltante. São algumas palavras que inicialmente me vinham à mente sempre que lia ou ouvia qualquer coisa relacionada ao acidente nuclear de Chernobyl. No entanto, ao ver esta magnífica minissérie (aliás, mais uma grande produção da HBO) e após conhecer mais sobre o ocorrido, todos os sentimentos que tinha anteriormente são agora reforçados, sendo esse, talvez, o maior legado que essa produção de cinco episódios nos deixa: o de divulgar ainda mais ao mundo inteiro, até para aqueles que já conheciam acerca do assunto superficialmente, e deixar registrada a verdade envolvendo o maior desastre provocado pelo homem.
Em primeiro lugar, destaco o elenco, muito bem escalado e com grandes interpretações, e os aspectos técnicos, que são impecáveis. A direção e a música provocam uma sensação de tensão e imersão do espectador na história, como se estivéssemos sendo "sugados" para dentro de algo de proporções gigantescas e além de nossa compreensão, o que, de certa forma, também é a sensação das personagens envolvidas, que encontram-se inseridas no meio desses surreais acontecimentos e têm suas vidas completamente alteradas por isso. Os dois episódios iniciais são frenéticos, prendendo completamente a atenção e nos deixando quase que "sufocados" nas primeiras horas após a explosão. Nos capítulos seguintes, a série adota um ritmo um pouco mais lento, mas não menos interessante, e, sempre se atentando aos mínimos detalhes, explica como cientistas e autoridades públicas tiveram que fazer "o possível e o impossível" a fim de controlar os efeitos da radiação nos meses seguintes e nos mostra as consequências da catástrofe nas suas principais vítimas: a população local e a natureza.
Além de fazer os devidos registros do ocorrido, esta obra também deixa uma crítica duríssima ao regime soviético, que, com o seu gigantismo estatal, sua extensa burocracia e um interminável número de secretários, ministros e comitês, foi diretamente responsável, junto aos despreparados funcionários que trabalhavam no local, pela explosão em Chernobyl, devido a sua incompetência na administração da usina, sua lentidão nas primeiras horas após o incidente e, sobretudo, pela supressão da verdade e pela propagação de mentiras, colocando os interesses do Estado e do Partido acima do bem estar da própria população. Obviamente esta parte pode ser mais polêmica para alguns, mas não creio que a série fez, diferente de outras produções americanas, uma crítica escancarada ou espalhafatosa à URSS, mas optou por simplesmente mostrar o que realmente aconteceu e todos os erros cometidos que resultaram no desastre e, a partir daí, o espectador poderia ver com os próprios olhos e ter a sua própria interpretação - embora, a incompetência e falsidade das autoridades governamentais envolvidas foi tamanha que é até difícil chegar a outra conclusão senão a de uma enorme negligência ou, se preferir, um crime de consequências incalculáveis.
No entanto, a pesada crítica deixada não se resume somente aos soviéticos, mas é bastante atual e também pode ser direcionada a qualquer governo que suprima a verdade, espalhe notícias falsas de maneira contumaz e coloque as vidas de inocentes em perigo por motivos meramente ideológicos, e a qualquer governante que acredite que o aparato estatal está acima do povo, e não a serviço dele.
Grande produção. Recomendo, mas aviso: tenha estômago forte para assistir.
Irmãos de Guerra
4.7 621 Assista AgoraMinissérie de altíssima qualidade, desde os aspectos técnicos até as atuações de todo o elenco. Também cabe destacar o realismo na produção desta obra, que passa longe de romantizar a guerra ou os confrontos armados de uma maneira geral, mas busca mostrar o verdadeiro sofrimento dos soldados em meio ao conflito, o medo da morte sentido por cada um e os laços de afeto e união construídos, entre si, dos campos de treinamentos às trincheiras.
Os depoimentos dos veteranos no início de cada episódio contribuíam muito para fornecer uma aproximação do espectador com a história narrada, pois uma coisa é ver a dramatização, muito bem feita, dos acontecimentos reais, e outra diferente é presenciar os depoimentos das verdadeiras pessoas envolvidas nos acontecimentos e a emoção na fala de cada um. Foram 10 episódios, mas passaram "voando", com a vontade de assistir o próximo episódio sendo imediata ao término de um e o espectador com a atenção presa em busca de saber o que vai acontecer em seguida.
Outro ponto interessante é que, em Band of Brothers, os soldados alemães não são tratados como "demônios", monstros ou seres de outro planeta, mas, inclusive, são feitos interessantes paralelos entre os dois lados do confronto, com a série mostrando as semelhanças entre os soldados. Os mesmos laços de fraternidade construídos pelos combatentes americanos também eram construídos entre os germânicos e histórias parecidas como as narradas na série também podem ter sido vividas no lado derrotado do conflito.
Excelente produção. Recomendado.