Francesamente doce. A dublagem é simplesmente apaixonante. E é de se fascinar como o universo dividido entre ratos e ursos é caracterizado em torno da ideia dos dentes.
Graças ao talento de Célestine, os traços aquarelados são metalinguísticos, o que eleva a animação a uma união onírica entre o diegético e o imaginário. O abraço no meio da rua engole a cidade e tudo em volta dos dois fica branco porque nada mais importa.
Sandra Bullock tem uma atuação satisfatória, enquanto George Clooney me remete ao seu personagem de "Amor Sem Escalas" (Up In The Air) com sua temperança e seu sorriso confiante. Apesar disso, acredito que "atores menores" não fariam muita diferença, e que o elenco só funciona como atrativo para dar peso ao longa.
Tenso, agoniante, uma enorme sensação de desamparo. Mediante às incríveis imagens construídas e uma experiência 3D que vale muito a pena, existe uma reflexão muito interessante que me deixou bastante melancólico. Essa ideia dá nome ao filme.
Fazendo uma crítica ao nosso próprio mundo, as pessoas estão todas sujeitas a uma inércia que nos distancia cada vez mais da vida. Trata-se do automatismo e, em uma instância mais básica, tudo aquilo que passamos a dar valor, que nos torna humanos. O latido de um cachorro, o choro de um bebê, qualquer coisa que nos faça colocar os pés no chão e seguir em frente: gravidade. Onde está a sua gravidade?
A da Dra. Ryan está em um lugar distante, mas que não pode ser mais alcançada, não importa o quanto suba. E da cabine embrionária emerge da água, disposta a uma nova vida. Devo concordar com a personagem, por fim, que todos também odiamos esse "espaço" entre nós e eles.
Coisas que eu estava doido pra ver: Heimdall em ação (mesmo que só um pouquinho); Thor lutando usando raios; e, claro, ver Loki sendo Loki outra vez. Gostei muito de poder vê-los mais, entender mais detalhes desse universo e acabei adorando Thor 2. Pra mim, dessa nova onda Marvel, o melhor dos filmes depois de "Avengers".
Das coisas que eu acho que podiam ser melhor aproveitadas, de longe, o vilão, Malekith. Os vilões parecem ser o grande ponto fraco da Marvel, enfim (ainda bem que eles têm o Loki). Gostaria de ver aquela turma de guerreiros asgardianos em situações mais concretas e não só meramente "usados" - em destaque Sif, que já deveria ter ganhado mais relevância na história há muito tempo. Aquela criatura monstruosa que cai em Londres, pra onde foi? "Ah, mas aí o filme teria 3 horas", sim, e o "O Senhor dos Anéis" tá aí pra contestar esse argumento né. Aliás, há quem diga que existem em Thor 2 algumas semelhanças à trilogia.
Eu gosto muito do primeiro filme (na página dele eu explico o porquê) e AINDA BEM que esse segundo não me decepcionou, muito pelo contrário, superou e MUITO. Muitas quebras de expectativa, muita ação, muito humor e muito disso tudo misturado. Engraçado como o roteiro é sempre posto em análise primeiro quando o assunto é Marvel (óbvio), mas é impossível não mencionar as incríveis paisagens ou a trilha épica. Não só fascina mas também surpreende. Valeu muito a pena ter assistido no cinema e já tenho vontade de assistir de novo.
Uma resposta às palavras de Capitão América: "Fica grandão com sua armadura, mas tirando isso, o que sobra de você? Você luta apenas por si mesmo. Você não é o tipo de homem que se sacrifica."
Então, mantém Tony Stark sem armadura praticamente o tempo todo, mas de um jeito que também a faça presente. Além disso, consegue ainda demonstrar a evolução de sua tecnologia em que agora ele consegue guiá-la à distância. Três em um. A crise de identidade heroica vai refletir na escolha do vilão, Mandarim (Kingsley). Apenas a fachada, uma casca, uma "armadura".
Considerando ainda a dispensa de Robert Downey Jr. como Homem de Ferro na franquia, o filme termina com a decisão de um recomeço de vida (sem armaduras, sem mansão, sem nada), onde deixa em aberto se aquele continuará sendo o herói nos próximos filmes ou não. Então, nesse sentido, o roteiro é muito bem elaborado.
Mantendo o bom humor, carrega algumas aproximações com o primeiro Thor (sacrifício perante a perda dos poderes), o que também foi outro risco pra quem gosta do Iron Man. Não me entenda mal, acho o Downey Jr. insubstituível como Iron Man, um grande ator mesmo. Mas, pessoalmente, como espectador que acha o Homem de Ferro superestimado demais dentre os Vingadores, gostei muito de ver ele se ferrando. PENA, que o vilão é tão genérico. Acho que se fosse o personagem do Ben Kingsley mesmo seria bem mais interessante. Outra decepção foi ter visto as armaduras diferentes tão pouco, se comparado a toda o alarde feito no trailer. Portanto, achei um filme bem fraco.
A pergunta que me resta é: será que o erro está em mim, que estou tomando "Os Vingadores" como parâmetro de bom filme ou o erro está neles de confiarem cegamente no sucesso de personagens já tão consagrados?
Fantástico, doloroso e encantador. Cenas como a de Guido traduzindo o oficial alemão ou a frase "buongiorno principessa" nunca mais vão sair da minha memória.
Em tom mitológico, a trama adaptada da obra de Jo Nesbø pode ser analisada, a princípio, em torno da ideia de caça. Roger Brown, nosso anti-herói, é um “caça cabeças”, algo como “caça talentos” para altos postos empresariais. E essa função não passa de uma fachada para o que realmente faz: seleciona vítimas para seus golpes. Então, em um sentido primitivo, ele está mesmo caçando, avaliando seus alvos mascaradamente.
Sua verdadeira intenção, portanto, nos leva à esfera da arte, mais precisamente dos quadros, quando surge a oportunidade de roubar um quadro da coleção do pintor Peter Paul Rubens (1577-1640). O quadro, cujo nome contém a palavra “caça”, é baseado na obra “Metamorfoses” do poeta latino Ovídio (daí a introdução do personagem Ove, que representa o acesso à pintura). Para reforçar a hipótese, descobri que em uma das histórias em “Metamorfoses” encontramos a deusa da caça, Diana, que no filme não é ninguém menos que a esposa de Brown, ou seja, aquela a quem ele “cultua”, atribui “oferendas”. E é essa devoção que justifica o estilo de vida do protagonista. Roger é baixinho, mas luta para jogar com os maiores utilizando de uma importante ferramenta que usa com bastante astúcia e habilidade: a farsa. Brown prefere chamar de “reputação”. Se “caça” é o verbo, “farsa” é o adjetivo que traduz e pode ser estendido por todo o longa.
Quando Claus Greve é inserido na trama, o jogo fica interessante porque acompanhamos o caçador se tornando a caça e vice-versa. A farsa, que antes era uma forte aliada, se torna sua pior inimiga, invade sua casa, corrompe sua esposa e nada mais ao seu redor é confiável. O casal não aparece mais juntos na cama, forte símbolo matrimonial, mas parecem agora revezar, fingindo não existir graves tensões entre eles. No decorrer de sua falência moral, Roger abdica de tudo que lhe é material buscando uma espécie de purificação (presença do rio), incluindo sua aliança de casamento, representando seu divórcio com o ofício da caça. Mais tarde, ele também é levado a deixar o quadro pra trás, sendo justamente forçado a executar Ove, uma ruptura definitiva com a vida de farsas. Roger desce ao fundo do poço, fica na merda, literalmente, se transforma em uma verdadeira besta acuada, um javali fugindo em desespero. Seu cabelo dourado, objeto de vaidade, equipara-se a uma coroa, que também é obrigado a se desfazer. É possível dizer, em termos “Ovidinianos”, que Roger Brown se salva pelo amor verdadeiro.
A narrativa é surpreendente, belissimamente estruturada, tem um ritmo envolvente, um roteiro inteligente, atuações sensacionais (em destaque a entrega de Aksel), uma trilha espetacular, momentos cômicos e inúmeros outros aspectos dignos de elogios. Já o tão criticado desfecho, que muito se pode comparar ao estilo guyritchiano, poderia ser menos topetudo e optar por algo mais sutil, mas não ofusca a brilhante produção norueguesa e alemã. Que, inclusive, o cinema americano já tá de olho, sedento por um remake.
A Disney Pixar mantém a trajetória de filmes para família e sobre família, na linha de "Os Incríveis". Com o sucesso de "Como Treinar seu Dragão", "Valente" também retoma alguns séculos passados de uma Escócia que não se consegue muito bem identificar seu período devido à confusão de referências (ao invés disso constrói o imaginário popular). E, diferente de "Procurando Nemo", podemos dizer que uma das exclusividades do longa é sua perspectiva feminina (alguns até diriam feminista).
Alguns podem até priorizar a associação com "Irmão Urso", mas é indiscutível que a técnica de animação desenvolvida exibe recursos estonteantes de movimento, textura e composição dos personagens, incluindo, claro, paisagens exuberantes. O cabelo - aspecto técnico mais comentado geralmente - tem explicitamente uma preocupação a parte. "Cabelo vermelho, como o fogo", quente e solto, refletindo seu espírito revoltoso que anseia por liberdade.
É interessante observar, com calma, os valores que o mito transmite entre as lacunas mais bem humoradas. O pedido de transformação da mãe é atendido (cuidado com o que deseja) e ela se transforma, mas por fora. Mas logo percebemos que as mudanças permanentes se darão por dentro. Na cena do café da manhã desajeitadamente preparado pela "mãe ursa", percebemos que a rainha não tinha qualquer conhecimento do mundo selvagem e precisaria se despregar de suas etiquetas reais para sobreviver. Do outro lado, a protagonista se arrepende pela audácia e tem que, entre outras coisas, costurar (literalmente) para trazer sua mãe de volta. O encontro dessas atividades que antes repugnavam transforma e aproxima o pensamento das personagens, reconciliando-as.
Dessa vez a aposta foi em mais drama intenso e menos ação em comparação com produções anteriores do estúdio (o que despertou certo grau de rejeição por alguns). Isso nos faz pensar no título, que sugere que o ato de valentia não está necessariamente vinculado à violência. Visto que até por falta de uma definição clara de vilão, a ignorância e intolerância dos guerreiros bárbaros se revelam o maior e mais presente conflito e obstáculo para a princesa, claramente trazendo à tona problemas que encontramos ainda na modernidade.
Um dos dois problemas discutíveis que encontro atualmente gira em torno dos personagens secundários que têm desenvolvimentos mínimos e não fazem mais que apenas preencher, contribuir com uma remada. É possível se cativar, se identificar com Merida ou no máximo achar engraçadinho os trigêmeos, mas não vamos muito além disso. O outro está na ordem da originalidade, que se pretende mascarar pela protagonista feminina e ruiva, mas resgata inúmeras referências e situações já saturadas no cinema (sem precisar ir muito longe), como mais imediato exemplo a questão da garota-quase-mulher sendo obrigada a se casar por sua responsável opressora. Mas ao menos, convenhamos, é uma princesa que não está atrás de um príncipe encantado.
É possível que "Coração Valente" (Mel Gibson) tenha sido tomado como inspiração durante a produção.
A protagonista carrega mais potencial narrativo que o próprio filme em si, os gráficos são admiráveis, ainda que os personagens carecem de desenvolvimento no roteiro. É um filme leve, divertido, mas não sei se é daqueles que se assiste outra vez.
Ágil, formalista e excêntrico, como costumam ser os filmes de Wright. Em contraponto a todo exagero,a abordagem minimalista de um apocalipse zumbi mais caseiro dá o contrapeso que aproxima os personagens um pouco mais do que podemos chamar de nossa realidade. Um cara qualquer que tem seus problemas financeiros, amorosos, sociais e familiares. Divertido, criativo, tenso, com uma pitada de crítica e às vezes besteirolesco, deixa a desejar para os que o superestimam e surpreende os que o subestimam.
Após praticamente dois anos desde o início das filmagens, chega aos cinemas de todo o mundo “Guerra Mundial Z”, dirigido por Marc Foster (“Mais Estranho que a Ficção”, “007 – Quantum of Solace”) e estrelado por Brad Pitt, com quase duas horas de duração. O filme tem suas particularidades, não só por inusitadamente lançar Pitt ao gênero, mas também por ser palco de vários problemas de produção. O orçamento inicial teve um aumento de aproximadamente 50% (de 125 milhões para algo em torno de 190 milhões) e até agora arrecadou US$ 128 milhões mundialmente (US$ 66 milhões só nos EUA) em seu primeiro fim de semana. Com o marketing, as contas finais chegam a quase 400 milhões. O alto investimento faz de “GMZ” o filme de zumbis mais caro da história, deixando os produtores receosos por um grande prejuízo porque, para haver lucro, o filme precisaria faturar (a grosso modo) pelo menos 1 bilhão.
Normalmente vemos no cinema o apocalipse zumbi evocar uma metáfora crítica sobre as variáveis da condição humana. Dessa vez, entretanto, não parece ser o caso, visto que o maior investimento dramático tem foco simples e exclusivamente na sobrevivência. Este fator também define os demais personagens, que não possuem qualquer profundidade e constituem nada mais que uma “ponte” passageira para o protagonista. A própria situação delicada e repentina em que se encontra o pai de família Gerry Lane, tendo que proteger sua esposa e suas duas frágeis filhas, por si só já proporciona uma identificação com o espectador. Mas isso não quer dizer que o filme para por aí e seja só mais um enlatado desmiolado ou superficial. Uma das características que mais atribuem valor a obra é a criatividade – e até um certo grau de originalidade.
Adaptação do livro “World War Z: An Oral History of the Zombie War” de Max Brooks (que também escreveu “Guia de Sobrevivência contra zumbis”), o filme se desvincula quase totalmente da obra literária, onde Gerry Lane deixa de ser um coletor de relatos sobre os ataques para o livro que escreve, para atuar como um agente da ONU envolvido na missão de buscar informações sobre a origem do vírus. Foi criada uma trama alternativa que capturasse a essência do livro, mas contada de uma forma bem mais “tradicional” (aos moldes hollywoodianos). Ainda que o longa abandone a abordagem social, política e econômica, mantém o abrangente aspecto geográfico, onde passamos pela Pensilvânia (Filadélfia), Coréia do Sul, Israel e País de Gales e também em variados cenários e situações, como dentro de um avião, nas escadas e na sacada de um prédio, multidões desesperadas, uma base militar marítima, bicicletas à noite debaixo da chuva, um supermercado e um laboratório infestado de mortos-vivos.
As características desses zumbis foram definidas por Foster de modo a parecerem mais verossímeis, perigosos e orgânicos. Eles ficam em um estado de dormência, vagando lentamente, até que encontrem um estímulo que os transformem em criaturas frenéticas. São realmente velozes e se lançam como pregos, usando a cabeça para atravessar qualquer coisa que esteja entre ele e o alvo. Se uma dessas criaturas é “desligada” diante das outras, elas são capazes de se enfurecer. Não são comedores de cérebro ou famintos pela carne humana, mas fundamentalmente mordedores cujas mandíbulas batem como castanholas. Em grupo, eles se amontoam como insetos, onde a comparação mais justa equivale a um formigueiro, fazendo o vírus engolir cidades como um tsunami. Um conceito trazido por um dos personagens os relaciona com a natureza e sua essência assassina que não resiste em deixar rastros de sua fraqueza para que no final possa ganhar os créditos pelo feito. E é através da fraqueza humana, em seu viés biológico, que o filme consegue sua resposta paliativa, conquistando espaço para um desfecho curioso e inovador (em devidas proporções).
O filme pouco amedronta e menos ainda causa repugnância, não há sangue ou corpos despedaçados. Isso porque a censura é PG-13, ou seja, proibido apenas para menores de 13 anos, se estendendo a um número maior de espectadores. Há, entretanto, uma recompensa de um ritmo quase tão frenético quanto os próprios zumbis, com muita ação e o dobro de tensão, como se assistíssemos com uma boa quantia de adrenalina contida. Já o 3D é plenamente descartável, não acrescentando em absolutamente nada, exceto pela otimização de alguns sustos.
Plan B é a produtora de Brad Pitt que comprou os direitos do livro. Então, oficialmente, ele também é um dos produtores do filme, junto com a também distribuidora Paramount. Isso ajudou Marc Forster a abrir várias portas, mas nem tudo foram flores ao longo do processo. Pelo contrário, foi quase uma verdadeira guerra. Faltaram investidores no projeto. A polícia húngara (Budapeste) chegou a confiscar 85 pistolas e fuzis do set por serem identificadas como armas reais, não réplicas. Acidentes com alguns dos 900 figurantes que compunham a multidão, fora os problemas para alimentá-los também. A saída inesperada do diretor de efeitos especiais John Nelson. O possível desentendimento entre Marc e Brad durante as filmagens ao ponto de se comunicarem por meio de um intermediário. Pelo menos dois roteiristas tiveram de abandonar o projeto por conta de outras ocupações e o terceiro ato teve que ser reescrito e refilmado (aproximadamente 40 minutos). Talvez você consiga imaginar o clima. O lançamento do filme foi adiado 6 meses, o que pelo menos garantiu mais tempo aos técnicos para trabalharem nos efeitos visuais.
A versão descartada fazia de Gerry um combatente experiente em matar zumbis, Karin se tornava uma mãe que oferecia seu corpo a um militar em troca de abrigo para ela e as filhas e a partir daí, a missão de Lane era voltar para resgatar sua família, o que garantiria uma sequência. Aliás, o projeto todo foi idealizado como uma trilogia, mas os estúdios estão esperando para ver qual o resultado desse primeiro investimento. A alteração ficou por conta de Damon Lindof (Prometheus), contratado pessoalmente por Brad Pitt. E, sem querer desmerecer outra alternativa, o final definitivo parece realmente melhor, mas é um desfecho que sofre de ritmo, esfriando um pouco uma história que costuma foi intensa desde seus primeiros minutos.
O elenco principal conta também com Mireille Enos (Caça aos Gângsteres) interpretando Karin, esposa de Gerry e a israelense Daniella Kertesz (AfterDeath) como a oficial Segen. Com a sequência garantida pelos produtores, o filme já se torna um jogo para tablets e celulares. É um filme simples em critérios intelectuais, complexo em seu backstage, mas um ótimo entretenimento que dá vontade de assistir outra vez, com potencial para agradar e divertir os fãs do gênero.
Fede (Federico) Alvarez é um diretor uruguaio que chamou a atenção após a divulgação de seu curta-metragem “Panic Attack” no YouTube. Sua notoriedade chegou a Hollywood e logo foi “apadrinhado” por um dos seus maiores ídolos, Sam Raimi, para a produção da versão longa de sua ficção científica. Mas o que na verdade aconteceu foi que ele e seu co-roteirista Rodo (Rodolfo) Sayagues Mendez acabaram sendo direcionados a trabalhar no projeto de refilmagem de “Evil Dead”. O orçamento foi de aproximadamente 14 milhões, contando também com Bruce Campbell (antigo protagonista da franquia) como produtor. Diablo Cody (“Juno”, “Garota Infernal”) também teve uma pequena participação no roteiro.
Um dos maiores desafios de um remake é superar (ou estar à altura) o original. Uma ideia que provocou receio nos grandes fãs do “Evil Dead” (Uma Noite Alucinante) de 1981, dirigido pelo próprio Sam. Mas Fede estava confiante porque ele também é um desses fãs. E para preservar a essência do original, recriou a história com novos personagens apropriados para um contexto pertinente. Fede investiu em motivações e conflitos afetivos, trazendo os irmãos Mia (Jane Levy) e David (Shiloh Fernandez) a um chalé na floresta, afastado do resto do mundo, para que Mia tentasse ali se livrar do vício das drogas. David, em processo de redenção, está disposto a fazer o que for preciso apaziguar sua relação com a irmã. Em complemento, temos Olivia (Jessica Lucas), uma enfermeira que está disposta a se responsabilizar pelos métodos de tratamento da amiga em abstinência, que tem como princípio não permitir que ela fuja da casa quando houver uma recaída. A partir desta trama é que Fede marca seu primeiro ponto positivo, ao trabalhar com carisma e envolvimento na relação público x personagens.
Enquanto Jane Levy fica à frente na interpretação, Nat (Elizabeth Blackmore) é a namorada de David e, no quesito desenvolvimento de personagens (que o original praticamente não tem), ela é a mais fraca, tendo mais relevância quando está possuída do que viva. Já Eric (Lou Taylor Pucci) é o responsável pela evocação da entidade maligna, mas, em resposta ao grande equivoco, torna-se um personagem resistente e útil, ganhando algum prestígio em pelo menos três cenas. Não coincidentemente, as iniciais dos cinco amigos formam a palavra “DEMON”. Para completar o time, resta Grandpa, um cachorro que vem com David cuja única finalidade é guiar os personagens com seu faro.
Findo o prólogo, começamos com uma câmera de ponta-cabeça (referência a uma sequência do original), indicando o sentido da única crença pela qual o filme responde. O enquadramento faz com que vejamos o carro cercado pela floresta descendo e descendo cada vez mais pela tela, como uma possível alusão ao inferno. A ausência de qualquer religião é um elemento esperto porque não evoca opositores e, ao invés disso, o filme procura canalizar a contrapartida para a ciência – usando termos como delírios, vírus e tranquilizante. Mais tarde, os personagens descobrem que o conflito só pode ser encarado no campo do misticismo, instruídos pelo invulnerável Livro dos Mortos. Nesta versão são apresentadas três formas de derrotar o demônio e, felizmente, temos a oportunidade de assistir às três.
O segundo maior desafio que o longa assume é o – arriscado – compromisso de ser “o filme mais apavorante que você já viu. Pode parecer pretensioso para muitos, sendo este um dos princípios de Alvarez na produção. O uruguaio afirma já ter participado de diversas produções de terror e tem experiência com efeitos especiais práticos em set, o que lhe permitiu gravar, por exemplo, a já famosa cena da língua cortada, usando cordas (como uma marionete) em uma língua falsa. Talvez o horror aqui não esteja em sua forma mais aterrorizante, mas com certeza é digna de asco, repulsa e aflição. E não só é mais realista no sangue (foram usados cerca de 5 mil litros) e na maquiagem mas também é mais sensato que o original, um conjunto que permite maior verossimilhança para a experiência.
Uma escolha que pode não ter caído muito bem (e eu adiei o assunto propositalmente) foi o prólogo. Uma menina ensanguentada vaga pela floresta até ser capturada por dois homens. Ela acorda amarrada a um tronco diante de seu próprio pai. A situação em que o próprio pai ateia fogo na filha pode parecer desumana, até que ela se revela possuída pelo demônio. Talvez as pessoas sintam mais medo quando estão chocadas, mas nesse caso, o efeito foi desfavorável porque a pancada acabou anestesiando o público. Em todos os minutos que se seguem o terror é gradual e crescente, mas sensorialmente enfraquecido pela prévia daquilo que ainda estava por vir. Nem tudo foi perdido: há investimento em cenas chocantes, reviravoltas e procura surpreender o espectador, fugindo muito da narrativa do filme original, com detalhes e alterações que fazem valer o ingresso (o uso da serra elétrica é espetacular).
A melhor característica do filme – e é aquela que lhe atribui o tom de pânico – é que ele nunca blefa. Os acentos sonoros correspondem a verdadeiras imagens de terror. A atmosfera, quando crescente, garantidamente nos leva a um momento crítico. Não há enganos, não tem essa de personagem assustado se vira e vê que era só o amigo ou um animalzinho passando. O som rege o horror de cada cena, partindo do suspense sem qualquer trilha à desesperadora e apocalíptica orquestra. O brusco silêncio e gritos ensurdecedores também participam da narrativa e da montagem, concluindo ou mudando a trajetória de alguns episódios. Para o grand finale minuciosamente arquitetado, a trilha épica toma o palco para ampliar a magnitude da situação.
Outros elementos do filme também merecem uma análise, como por exemplo o fato da figura da mãe estar sempre morta (das duas famílias). Nessa versão não há menção de uma floresta viva, ainda que exista a cena dos cipós. Mas é diante da “mãe natureza” que Mia é possuída em um ato que mais se parece com dar a luz ao contrário – a negação da vida. Só é estranho que ela seja a única a ser possuída de tal forma, já que todos os outros são meramente “contaminados”, o que nos leva a pensar na hipótese de que tudo pode se tratar de uma metáfora para a condição de Mia. A garota “que já havia morrido uma vez” ingeria novamente e passaria a destruir suas amizades, uma a uma, em decorrência de seus demônios internos. Isso provavelmente daria um sentido alternativo para a cena da ressuscitação.
A batalha conclusiva é essencialmente vermelha, desde a roupa e arma ao carro da personagem, num cenário banhado em sangue e chamas. No campo da arte, percebemos também que David usa uma camisa muito parecida com aquela que Ash usa no filme de 81 (ele também é lançado contra estantes como Ash). A fotografia é competente e traz vários enquadramentos louváveis. Pode-se dizer que todo o humor do filme original foi deixado de lado para dar espaço integral ao horror, gerando um remake digno de reconhecimento. Com $25,7 milhões arrecadados no fim de semana de estreia nos EUA e mais de $50 milhões ao redor do mundo até o momento, “Evil Dead” traz tudo aquilo que o espectador do gênero quer ver. A sequência já foi garantida e Fede já está trabalhando no roteiro de “Evil Dead 2”
Felizmente cheguei a este Total Recall após o remake vir à tona. Um filme que tem realmente aquele ar de anos 80/90, com um dos maiores astros da ficção científica da época: Arnold Schwarzenegger. E é traçando um paralelo entre esta versão e sua regravação que percebo os traços mais curiosos.
Tratando-se de uma adaptação de Philip K. Dick, podemos pressupor que uma das mais notáveis características da história é a perspectiva de um futurismo conturbado. Acontece que a maioria dos elementos que compõem a ideia do avanço tecnológico no filme não convence o espectador do século XXI. No final do século anterior, existiu uma liberdade consensual em fantasiar em torno da evolução científica e tecnológica, tanto dos autores quanto dos espectadores, o que de certa forma inocenta uma abordagem à utopia marciana levada a sério (na regravação a briga é por espaço habitável ameaçado por um exército robô). Conceitos acerca da preservação do planeta Terra ganharam mais espaço nos últimos 50 anos, assim como o considerável desenvolvimento da ciência. Naturalmente, alguns conceitos foram se tornando temas para a ficção científica, como a mutação genética. Isso fica interessante quando comparamos os dois filmes e percebemos que o remake tem uma noção muito mais sensata do futuro.
Outra destoante entre os dois filmes está nos efeitos visuais e especiais, elemento fundamental e memorável em ambos. Enquanto o remake dá um show de computação gráfica com toda sua complexidade, este tem sua própria ambição, buscando maquiagens e artifícios um pouco mais “oldschool”, o que, por outro lado, tem um resultado mais audacioso, criativo e, talvez, à frente do seu tempo. E ao lembrarmos da imagem dos olhos esbugalhados em marte ou da gorda em pane, temos uma conexão forte com o humor, que aqui acompanha o protagonista em quase todas as cenas, amaciando o espectador. Humor que desaparece completamente na regravação.
Com uma breve, porém marcante presença de Sharon Stone, a história consegue facilmente intrigar o espectador quando sua maior qualidade são as reviravoltas. Investindo em uma trama que traz várias surpresas, Quaid se vê numa batalha interior e exterior por sua própria identidade, onde se revela o conceito mais interessante da obra. Em um planeta que caminhava para o artificialismo em suas diversas formas e possibilidades, surge a contrapartida pela preservação da vida em seu estado natural. Uma mensagem pela nossa adaptação em um futuro em que não nos deixemos esquecer quem realmente somos.
Com a chegada de “Antes da Meia-Noite”, Richard Linklater (“Waking Life”) concretiza a “trilogia de menor bilheteria do cinema” – o que não necessariamente, asseguro, diz respeito à qualidade dos filmes. A fórmula é simplista, o tom é europeu e a pegada é existencial. O que torna a franquia especial vai de fora para dentro. Aparentemente, o trio, Ethan Hawke Julie Delpy e o diretor texano se reúnem a cada nove anos para levar às telas a esperada sequência de uma narrativa suspensa com cruéis reticências. Quase uma provocação ao espectador quando vem dizer que os homens estão condenados à eterna insatisfação.
“Antes do Amanhecer” (1995) é um descontraído romance que mostra um dia de dois jovens que se conhecem num trem. “Antes do Anoitecer” (2004) conta o dia em que estes mesmos jovens se reencontram nove anos após terem se separado. E “Antes da Meia-Noite”, com uma trilha igualmente apaixonante, mostra um dia das férias do casal. A base e a riqueza dos três filmes é o diálogo entre Jesse e Celine, que conversam desde pequenos e curiosos casos cotidianos a complexas reflexões sobre o homem, a mulher, a vida, a morte, futuro, religião, e amor. A dupla conversa como grandes amigos se descobrindo, sincronizados por uma intimidade admirável que proporciona uma sensação de naturalidade e improviso. Mas, apesar de Hawke e Delpy participarem da criação de ambos personagens, cada gesto, cada palavra pronunciada diante da câmera está rigorosamente descrita no roteiro, garante Linklater.
Mesmo ainda com a forte presença do humor, o que mais chama atenção é que, nos dois primeiros filmes, a história caminha num sentido em que percebemos a intenção de juntar duas pessoas separadas. Mas neste último, surpreendentemente a correnteza é contrária, o que naturalmente gera certa tensão. Jesse e Celine voltam nove anos mais velhos, aproximadamente com 41 anos, casados, com filhos e várias divergências. Jesse divaga sobre irem morar nos EUA para poder ficar mais próximo de seu filho, enquanto Celine considera aceitar um emprego no governo na França. Entretanto, o maior conflito entre eles não é geográfico, mas temporal. Em “Antes do Amanhecer”, Celine precisa ir embora pela manhã e em “Antes do Anoitecer”, Jesse precisa pegar o vôo no final da tarde. Em “Antes da Meia-Noite”, o tempo é um pouco mais abstrato: acompanhamos o estopim de uma conturbada bagagem de nove anos juntos. O espectador vai descobrindo o que aconteceu durante esse período gradualmente, de acordo com a evolução dos diálogos que trazem uma ambientação totalmente diferente dos dois filmes anteriores.
Não em Viena, nem em Paris. Dessa vez estamos em Messínia, sul Peloponeso, na inspiradora Grécia, o berço das tragédias, repleto de mitos e ruínas. Existe um embate persistente entre o passado (memórias) e o futuro (incertezas), que justifica a intensidade com que o presente é valorizado em cada cena, o que leva Linklater a realizar longas tomadas e longas conversas, dando consistência para a espera real do agora. Ainda que os personagens estejam mais maduros e os diálogos carreguem mesmo essa carga da meia-idade, de alguma forma, eles parecem ainda serem devotos à magia do dia em que se conheceram. Quando quase tudo está perdido depois de tantos conflitos sentimentais, o casal se permite restaurar suas percepções voltando no tempo em que tinham 23 anos e andavam descompromissados pelas vielas conversando sobre ciganas e macacos. Longe de ser encarado como uma relação sustentada por uma ilusão, o sonho foi real e é evocado unicamente para purificá-los dos pensamentos atrofiados pela vida adulta. Como diz a senhora mais velha na mesa, para que nunca se permitam “esquecer das pequenas coisas” ou deixarem de ser quem realmente são.
O primeiro filme carrega todos os traços de um filme genuinamente romântico, mas o segundo não tem sequer um beijo e conseguiu o mesmo efeito. Diante de um roteiro temperamental como este, o desafio de manter tudo isso romântico aumenta para Linklater. Em “Before Midnight”, pode-se presumir que os dois conseguem agora sentar num banco qualquer e contemplar o pôr-do-sol, desafiando o tempo, provando para si mesmos que puderam sobreviver mais um dia juntos, nem que tenham que para isso seja preciso viajar pelo “espaço-tempo continuum”. Linklater mostra que problemas aparecerão em qualquer conexão, por mais bela que tenha nascido a relação, e lutar por ela também é romântico.
“Antes da Meia-Noite” é o terceiro capítulo de uma das mais “humanizadas” experiências do cinema, tanto pelas circunstâncias “não fictícias” em que é produzido, quanto pela narrativa inspiradora e verossímil. Por exemplo, Ethan Hawke não precisa fingir que lembra do dia em que se conheceram quando está em cena porque, oras, Hawke estava lá realmente. Quando estamos diante de Jesse e Celine, a vontade de também encontrar algo tão extraordinário em outra pessoa é inevitável, o que alimenta a esperança de que existem pessoas extraordinárias para serem descobertas por aí. Um filme verdadeiramente “de pessoas sobre pessoas”.
Linklater sempre achou improvável qualquer sequência para “Before Sunrise”, duas surgiram e agora ele não parece descartar a hipótese de um novo encontro com esse casal daqui nove anos para darem notícias.
É a versão "Meu Malvado Favorito" da Disney, em que a fórmula é basicamente a mesma, mas com um resultado ainda superior. Também é possível compará-lo a uma versão digital de "Toy Story" já que são "brinquedos old school" que têm vida quando ninguém está olhando e têm receio de ser abandonados pelas crianças. E apesar da fórmula e do tema manjado, a trama ainda detém um curioso status de originalidade quando o assunto busca precisa e inteligentemente vilões de fliperama.
O que mais me impressionou aqui foram a profundidade dramática dos personagens e as motivações que os levam adiante. Ainda com muita aventura e humor, sem dúvida é um filme memorável e altamente recomendável.
“Seven Psichopaths” é um exercício metalinguístico que carrega críticas aos próprios espectadores do gênero que ele contempla. Um descendente guyritchiano que investe em humor negro, criatividade nos diálogos e uma narrativa que questione os clichês. Pode ser visto como um amontoado de ideias completamente despropositado ou como um trabalho irônico, insano e ousado.
McDonagh, depois do sucesso de “In Bruges” (Na Mira do Chefe – 2008) apostou alto em um filme que sabota a si mesmo. O primeiro deslize e o mais imperdoável (talvez não seja culpa dele, afinal), é o marketing enganoso do pôster em que vemos sete personagens numerados. A informação é falsa, porque nem todos aqueles são psicopatas e o filme sequer tem sete psicopatas. ”Sete Psicopatas” é apenas um bom título para atrair espectadores que procuram um bom thriller e os personagens sabem disso. Além disso, o título se transforma numa expressão para representar o fetichismo desses mesmos espectadores quanto ao desejo utópico de relacionar a violência, humor e morte como uma coisa divertida e aceitável.
A brincadeira começa quando conhecemos Martin, não o diretor, mas o protagonista (Colin Farrell), que é um roteirista que está tentando escrever um filme e não consegue passar do título que já bem conhecemos. Billy (Sam Rockwell) e Hans (Christopher Walken) são seus dois amigos – cada um com suas bizarrices – que acabam ajudando Martin a escrever este roteiro por uma série de situações, construindo, ao mesmo tempo, a narrativa a qual assistimos. Nem cinema imitando a vida ou a vida imitando o cinema, mas ambos caminhando juntos naquela diegese.
Woody Harrelson completa o elenco principal interpretando o vilão Charlie, que tem uma constrangedora relação afetiva com seu cão (um Shih Tzu). E é com personagens problemáticos, incluindo participações de Tom Waits e Michael Pitt no elenco, que o filme segue a até sua metade de maneira extraordinária. Mas em certo ponto, a trama assumidamente se torna uma viagem recatada no deserto, onde nada mais pode acontecer - é onde ele sensorialmente perde força. O filme termina e diante do sentimento de banalização, tudo o que resta a fazer é perguntar qual foi o propósito de tudo aquilo.
Numa segunda camada de interpretação e pensando o filme como um todo, entendemos que grande parte das decisões de McDonagh se tratavam de desafios ao convencional e provocações ao gênero. Ou seja, apesar de todo o teor enganoso, a verdadeira proposta era contradizer, trocar os pés pela cabeça, e nos guiar a um desfecho que já se poderia classificar-se como imprevisível. As cenas de tiroteios romantizados são explicitamente evocadas pelas próprias fantasias dos personagens, defendendo a bandeira de uma violência mais lúcida e repentina, confrontando a própria ideia do filme ser um thriller. E apesar desse discurso ser interessante, McDonagh parece ter receio de mexer no assunto e apenas pisa de leve, deixa um pé atrás e escora seu filme em um desfecho nada extraordinário, bastante comum.
Um amontoado de boas ideias estranhamente costuradas que formam um entretenimento curioso a princípio, mas que infelizmente tropeça em contradições e não detém maturidade para sustentar seus próprios argumentos.
Pegue “Identidade Bourne”, acrescente “Minority Report”, umas chuvas de “Blade Runner”, uma pitadinha de “Matrix” e “Equilíbrium”, alguns robôs de “Eu, Robô” com um visual à la stormtroopers de “Star Wars” e tenha “O Vingador do Futuro” com muitos flashes e – muitos - flares (muitos mesmo). Um título que eu gostaria muito de compreender o porquê da escolha. Sarcasmos à parte, o longa é uma refilmagem de um dos – quase – clássicos da ficção científica “O Vingador do Futuro” (1990), estrelado por Arnold Schwarzenegger, mais uma das inúmeras adaptações do grande Philip K. Dick para o cinema.
Souberam reciclar a grande maioria dos principais elementos do filme dirigido por Verhoeven, do trem aos traíras, inserindo-os em fases diferentes do filme. O fato mais interessante na produção é que o roteirista Kurt Wimmer, junto ao diretor Len Wiseman, recriou a história em muitos aspectos, o que garante alguma originalidade autoral para o trabalho, procurando afastar-se do primeiro filme. Uma das mais impactantes (e mais interessantes) mudanças na história, está a opção por um universo mais sensato, sem as fantasias biológicas do original, o que revela uma perspectiva moderna de como se enxerga o futurismo hoje, diferentemente da visão sonhadora que os autores tinham no final do século anterior.
Wiseman arrisca trabalhar outros conflitos, objetivos e contextos, e dá uma ênfase na tecnologia digital e no artificialismo, o que configura a segunda maior mudança entre os filmes. Os ambientes têm uma enorme e impecável complexidade gráfica e revelam grande investimento em efeitos visuais, dando mais credibilidade para o universo que nos apresenta. Na colônia, em meio ao cenário cyberpunk, muitos criticam a “inapropriada” presença iconográfica da mulher de três seios, que faz referência ao filme de 90. Mas receio que talvez não tenham assimilado que ali havia uma crítica a uma sociedade que abraçou a ideia da artificialidade sobre a própria identidade e integridade.
A principal característica que constitui ambos países é a vasta verticalização dos edifícios, o que sugere e se adequa à necessidade de uma grande concentração de pessoas em uma mesma área: a briga agora é por espaço. Sendo a terceira grande mudança no roteiro, a grande ameaça não diz respeito a uma guerra por oxigênio, mas uma fabricação de um exército de robôs para dominação do território que corresponde à colônia. Também foi acrescentado “A Queda”, ou “The Fall”, uma espécie de elevador que conecta as duas únicas áreas habitáveis do planeta, o que, metaforicamente, se relaciona com a viagem do protagonista que transita entre sonho e lucidez, ficção e realidade.
A quarta e última mudança que precisa ser citada é a retirada absoluta do humor para dedicar e ampliar o gênero pelo qual “Total Recall” reverencia.
Mas esses riscos trouxeram vários efeitos colaterais ao roteiro, que acabou adotando várias “forçadinhas” pra narrativa acontecer. No filme de 90, é fácil – quase didático - localizar e acompanhar os passos de Quaid. Mas aqui, as relações são mal costuradas, dificultando o entendimento e dando a sensação de que o filme é mais complicado do que realmente é. O filme também condiciona o espectador à prática de deduções. A exemplo disso, Quaid sabe pilotar veículos terrestres e aéreos, armas de qualquer natureza e sabe até onde exatamente encontrar dispositivos explosivos em um helicóptero porque devemos aceitar que ele “é um dos melhores agentes secretos do mundo”.
O mesmo Cohaagen está lá, mas Hauser deixa de ser o verdadeiro rival de Quaid, o que enfraquece a essência da obra no que diz respeito a busca do protagonista pela identidade, elemento tão bem trabalhada com Schwarzenegger. E Matthias acaba sendo minimizado a um personagem de apenas dois breves diálogos, sem nem mesmo o impacto visual que o do filme anterior teve. Em contrapartida, Kate Beckinsale vive o inverso, tendo sua personagem, Lori, intensa até a última cena. Colin Farrel, apesar da comparação com Arnold ser quase injusta, se sai bem no papel.
Um fato interessante também vale a pena a comparação. Sharon Stone interpreta Lori no filme original e mantém um caso com o vilão médio do longa, apesar de não durar muito na história. A Lori daqui é Beckinsale (Anjos da Noite), que é esposa de Len Wiseman, o diretor e esse fato já explica o porquê da drástica mudança das características da personagem.
Merecem destaques a inesperada cena do piano e a longa “negociação” entre Quaid e Harry pela paranoia de ainda estar sentado em uma cadeira na Recall. É um filme que agrada principalmente aqueles que não assistiram o filme original e buscam por um entretenimento curioso, mas que pode se tornar frágil para o espectador mais exigente.
Uma efusiva história de um hotel que reúne os maiores monstros da cultura ocidental para o aniversário de 118 anos da filha do Drácula. O humor vem das inversões e contradições dos habitos e personalidades dessas figuras que ironicamente temem os humanos. É daqueles que empolgam a criançada com direito a música e dança.
Seth Mcfarlane, criador de "Family Guy" dirige e dubla o sarcástico ursinho Ted. A princípio a ideia na tela é a de que é divertido ter uma vida desleixada e de hábitos imorais, mas não demora até esses valores se reverterem e percebermos que estamos diante de uma fábula sobre amizade. Um dia nós precisamos amadurecer e não é porque deixamos de fazer coisas estúpidas com os amigos que ela acabou.
Os melhores momentos de humor baseiam-se em situações nonsenses/absurdos e piadas que fazem referências a celebridades americanas. Apesar de muito divertido, não é ingênuo. Muito pelo contrário, é um filme que pode ser perigoso para aqueles que acreditam que a trama é direcionada ao público infantil, o que inclusive já rendeu algumas polêmicas ao trabalho. Remeteu-me a série "Wilfred", estrelada por Elijah Wood, e até mesmo o clássico do terror, "Chuck".
Apesar de ser outro entretenimento embalado especialmente para o público pipoca, esse filme é estruturado a partir de referências muito interessantes. É daqueles que são executados com desenvolvimentos prematuros para promover ação, mas nasceram de ideias curiosas.
“A história prefere lendas a homens.”
Abraham ou Ibrahim é como era chamado Abraão, um personagem bíblico cujo nome significa pai (ou líder) de muitos. Assim, buscamos no tempo Abraham Lincoln, um dos três maiores presidentes dos EUA que é conhecido por um ícone inspirador de feitos extraordinários. Na ficção, temos Abe, o próprio Lincoln, antes da vida política, que involuntariamente se envolveu num universo de vampiros e seus caçadores. O presidente, marcado pelo Ato de Emancipação de 1863, sempre esteve engajado pela libertação dos negros da condição de escravos. A fantasia vampiresca estabelece a analogia com a condenação eterna pela sede de sangue e a ambição de dominação sobre os humanos.
“Os homens escravizavam-se desde que inventaram Deus para perdoá-los. Eu vi os judeus construírem a glória Egípcia. Vi Cristãos sendo jogados aos leões com meus próprios olhos. E vi africanos venderem sua própria gente para os europeus. Posso partilhar uma das minhas revelações dos meus 5.000 anos? Todos somos escravos de alguma coisa. Eu da eternidade, você de suas convicções.”
E a jogada está aí. Quando Lincoln discursa a favor da liberdade dos escravos, temos a sensação de que está se munindo de forças para enfrentar a investida dos vampiros. E seus combates mortais contra essas criaturas parecem ser metáforas para os obstáculos de um período sangrento de guerra civil nos EUA.
“Se esta guerra é realmente uma resistência contra o mal, então que represente algo. Se é uma guerra pela liberdade dos homens, por que não dar a cada homem uma razão para lutar?”
Mais tarde, a luta contra o sul e contra os vampiros se torna exatamente a mesma. A guerra pelos ideais de igualdade e liberdade.
Mesmo com uma arte e fotografia tão sofisticadas e empenhadas com seu tom barroco sépia, o filme perde sua sensatez em alguns momentos movido pelo deslumbramento do espírito fictício. Cortar o tronco de uma árvore daquela forma, tomar um cavalo sobre si e ainda sair montado nele e outros detalhes (absurdos para quase qualquer um) destoantes demais da figura séria de Lincoln - que impõe certos limites para “licença poética”. Uma característica habitual da direção de Bekmambetov (O Procurado). Ainda movido pelo viés do heroísmo, vários momentos críticos são marcados pelo slow motion para acentuar a experiência visual sensorial, que muitos poderiam apontar como um recurso usado exageradamente.
Não sei se coincidentemente, 2012 também foi o ano do premiado “Lincoln”, de Spielberg. Se houvesse algo na história do caçador de vampiros a acrescentar na biografia, seria a amizade com Will Jhonson, que no filme representa o ex-escravo Frederick Douglass que foi um grande amigo pessoal de Lincoln.
“Vampiros não são os únicos que vivem para sempre”.
Renoir interpreta Octave (“oct”, oito). Ele não é apenas o oitavo membro, mas também o mediador do jogo, aquele que despretensiosamente compactua para o encontro de todas as peças. “É interessante o que você está vendo?” diz para Christine no monóculo vendo seu marido a traindo. É um parasita social reconhecido como um bom amigo por patrões e empregados, mas no fundo se entende como um grande fracassado. Octave ambiciona, no final, ser coroado como grande maestro do tabuleiro e vencer o jogo da mentira.
Renoir também conduz a narrativa como diretor, costurando um personagem a outro, as ações do primeiro levando a história a um segundo e assim por diante, como se estivesse recrutando seus jogadores. Os movimentos de câmera e a sintonia com os personagens resultam numa misè en scene fascinante que se apuram com a impecável composição e profundidade de campo.
Todos estão reunidos em uma grande casa de campo para uma festa, isolados do resto do mundo, com várias apresentações teatrais, como uma celebração às máscaras que sustentam. Mesmo as músicas são reproduzidas maquinalmente, substituindo o músico do piano. Robert, o confiante marquês anfitrião, exibe seus inúmeros instrumentos mecânicos de música que refletem no imenso carrossel que movimenta o castelo, apresentando na festa, o maior deles. A música circense dá o tom à comédia cruel que estão submetidos. O evento se transforma, se não em uma chanchada, em um ritual chapliniano, com a presença do vilanizado veterano de guerra Edouard Shumacher, um subordinado oficial raivoso, e o engraçadíssimo Marceau, um caçador clandestino dos mais cafajestes.
Enquanto toda a confusão acontece e os jogadores estão se atacando, Octave está tentando se livrar da fantasia de urso. Urso que vemos reverberar em “O Anjo Exterminador”, de Buñel, quase 30 anos depois, que assumidamente buscou inspirações em “A Regra do Jogo” para construir a fantástica crítica à burguesia. Octave, livre do urso, consegue um tempo sozinho para investir em seu tão almejado prêmio sem que ninguém desconfie: Christine. Ao abandonar as mentiras e dizer a verdade sobre si mesmo, Octave evoca a jogada final, mas coloca Andre Jurieu, o herói aviador, na reta do tiro. Jurieu, sempre sincero, que teve a chance de fugir escondido com sua amada, preferiu ser honesto e acabou perdendo o jogo.
Shumacher se deixava enganar por Lisette, que se engraçava com Marceau, que se escondia atrás de Robert, que era amante de Geneviéve, que teve a cumplicidade de Christine, que eventualmente se lança nos braços de Jurieu, que é morto por Shumacher. Octave traiu a confiança de todos e saiu do ciclo (por um momento) no instante crucial.
Outra referência bastante interessante está na cena da caça aos coelhos e faisões em que claramente podemos enxergar nos personagens um posicionamento muito parecido com os soldados responsáveis pelo massacre na famosa Escadaria de Odessa, episódio marcante do clássico “O Encourançado Potemkin”. Os soldados marchando enfileirados em paralelo com os empregados acuando os coelhos para a morte. A matança é impiedosa, cruel, mas nada mais que um esporte para seus patrões.
É possível também que o filme tenha influenciado Akira Kurosawa em “Um Domingo maravilhoso” (“Subarashiki Nichiyôbi”), de 1947, na cena em que Octave imagina ser um grande maestro.
Renoir faz uma ácida crítica à hipocrisia que ostenta a moral da sociedade. Não só da alta burguesia e seus convidados, mas também dos empregados que acabam por cultivar os mesmos costumes de fofocas, trapaças e interesses, num destrutivo universo de farsas que ninguém arrisca mais ter sua moral à prova. Independentemente da classe social, todos estão no mesmo jogo de mentiras, todos estão sujeitos à traição e ao amor - Octave, como se pode constatar, transita entre as duas definições.
Excomungado em sua época, quase perdido, o filme sobreviveu e a ideia tem força até hoje, na contemporaneidade. Resguarda também críticas políticas no contexto da França do final da década de 40 mas não entro nesse aspecto. É considerado uma das obras máximas do cineasta ou até mesmo do cinema francês.
“A mentira é uma coisa pesada para se carregar”.
Jurieu, que veio do céu, voltou. Uma nação sem heróis.
“Um náufrago e um tigre”, era tudo que eu sabia sobre o filme e eu pensei, o que poderia sair disso? Os 35 minutos iniciais contam a história do menino Piscine Molitor Patel antes do acidente, um prólogo monótono, e até cheguei a pensar em desistir de qualquer boa expectativa pelo receio de um tema religioso. Até que a tempestade me acordou, assim como o próprio Pi no meio da madrugada para evocar a força da natureza. Dali pra frente, o filme me mostrou o quanto eu o subestimei.
O diretor taiwanês, Ang Lee, hoje com 58 anos, pegou o projeto que muitos outros diretores haviam considerado impossível de ser filmado, confiando no recurso 3D (James Cameron esteve envolvido). Não há dúvidas de que ele acertou em todos os aspectos visuais e que a tecnologia implantada tem um vínculo muito coerente com a história. Lee, ao que me parece, ainda fez uma pequena brincadeira colocando Bo-Chieh Wang, que também nasceu em Taiwan, para lhe representar sua própria extensão na história. Wang interpreta um tripulante budista que os consola na mesa quando não encontram comida vegetariana e aponta a zebra para Pi no momento mais crítico, como uma espécie de direcionador do olhar (“você precisa ir, nós vamos ajudar”). Os outros dois homens que empurram Pi para o bote parecem também ter a mesma nacionalidade (ainda que fosse um cargueiro japonês).
Pi é um garoto que foi, desde pequeno, contracorrente. Curioso pelas mais diversas religiões que poderia ter acesso, prevalecendo o hinduísmo, Piscine foi em busca dos porquês da vida. Na escola, diante dos colegas que zombavam de seu nome (“piss in”/ “pissing”) se viu obrigado a se apresentar como “Pi”, um número irracional e infinito, o que também caracterizam seus deuses. O garoto que sabia um extraordinário número de algarismos após os 3,14 acabou se tornando uma lenda entre os demais alunos. Uma dica para todo o misticismo de uma aventura que estava por vir.
Destinado a ter essa viagem, Pi e sua família embarcam num navio que não coincidentemente tem o nome de “Tsimtsum”. Este é um termo que em hebraico é o equivalente a “retração” e é usado para designar o primeiro passo de Deus no processo de criação do universo, em que Ele (onipresente) teria retirado sua luz ou essência de uma área para que naquele espaço fosse gerado algo diferente de si mesmo. Este momento pode corresponder ao naufrágio do navio, o que dá espaço a um incidente fora do comum. Segundo essa mesma teoria, Deus teria contraído sua essência para uma busca interna, o que também se relaciona com o campo imaginativo e psicológico de Pi. O fato de ter pedido tudo, tanto afetivas quanto materiais, também tem relação com ensinamentos budistas que dizem, em outras palavras, que às vezes a destruição vem para que haja reconstrução.
Yann Martel é um escritor canadense, responsável pelo livro “Life of Pi”, em que muitos desses simbolismos são melhor explorados, inclusive o da escolha do nome Richard Parker. Dentre as várias hipóteses, existe uma a respeito de um romance inacabado de Edgar Allan Poe “ The Narrative of Arthur Gordon Pym” (1837) em que quatro náufragos têm de enfrentar a fome em um bote salva-vidas. Eles fazem um sorteio para ver quem seria sacrificado e canibalizado pelos outros três. Um homem chamado Richard Parker tira o menor palito e é prontamente esfaqueado e comido pelos outros três. Outra hipótese mora em 1884, quarenta e sete anos após o conto de Poe, onde quatro sobreviventes de um naufrágio verídico foram julgados pelo assassinato de um garoto a bordo chamado Richard Parker, que foi morto e comido.
Muitos acusam Yann de plágio ao se depararem com uma obra de Moacyr Scliar, um brasileiro, membro da academia de letras, que escreveu no começo da década de 80 “Max e os Felinos”. Para pôr fim às minhas dúvidas, resolvi ler este e realmente, as semelhanças não são coincidências. Entretanto, a história de Pi parece ser uma versão mais branda e mística do que a de Max, cuja aventura tem uma Alemanha nazista como ponto de partida. O naufrágio do garoto que estava indo para o Brasil é apenas uma pequena passagem do livro que não ocupa sequer meio capítulo, enquanto o filme em questão trate quase que totalmente da convivência entre ele e a tigre de bengala (Max convive com um jaguar, ainda que seu maior medo fosse do tigre de bengala empalhado na loja de peles do pai). Talvez, por essa relação entre os livros, exista o instrutivo diálogo entre o narrador, o próprio Pi Patel mais velho, e um escritor que quer publicar sua história.
Existem muitos detalhes que podem ser associados, comparados, interpretados ou analisados, mas a ideia de dar dentes e garras ao medo é a de maior peso. A presença do animal (natureza selvagem) proporciona a Pi a luta pela sobrevivência, transformando-o, ao longo do percurso, em um guerreiro com determinação suficiente para enfrentar, conviver e domar seus monstros. A ilha carnívora também tinha piscinas e, se de dia eram inofensivas, pela noite eram letais. Transformavam-se, assim como Pi. Mas um dia aquilo iria mata-lo (ou o tigre) e com isso decidiu seguir viagem em guerra contra a solidão. Um protegeria o outro até o dia da salvação.
Impressionantes e belíssimas paisagens ou enquadramentos e incrível tecnologia que proporcionou a veracidade de Richard Parker e os outros animais. Uma riquíssima e fantástica história com uma mensagem fascinante. Certamente merecedor de todos os prêmios que vem conquistando.
Ernest e Célestine
4.4 319Francesamente doce.
A dublagem é simplesmente apaixonante. E é de se fascinar como o universo dividido entre ratos e ursos é caracterizado em torno da ideia dos dentes.
Graças ao talento de Célestine, os traços aquarelados são metalinguísticos, o que eleva a animação a uma união onírica entre o diegético e o imaginário. O abraço no meio da rua engole a cidade e tudo em volta dos dois fica branco porque nada mais importa.
O Hobbit: A Desolação de Smaug
4.0 2,5K Assista AgoraEspetacular.
Gravidade
3.9 5,1K Assista AgoraSandra Bullock tem uma atuação satisfatória, enquanto George Clooney me remete ao seu personagem de "Amor Sem Escalas" (Up In The Air) com sua temperança e seu sorriso confiante. Apesar disso, acredito que "atores menores" não fariam muita diferença, e que o elenco só funciona como atrativo para dar peso ao longa.
Tenso, agoniante, uma enorme sensação de desamparo. Mediante às incríveis imagens construídas e uma experiência 3D que vale muito a pena, existe uma reflexão muito interessante que me deixou bastante melancólico. Essa ideia dá nome ao filme.
Fazendo uma crítica ao nosso próprio mundo, as pessoas estão todas sujeitas a uma inércia que nos distancia cada vez mais da vida. Trata-se do automatismo e, em uma instância mais básica, tudo aquilo que passamos a dar valor, que nos torna humanos. O latido de um cachorro, o choro de um bebê, qualquer coisa que nos faça colocar os pés no chão e seguir em frente: gravidade. Onde está a sua gravidade?
A da Dra. Ryan está em um lugar distante, mas que não pode ser mais alcançada, não importa o quanto suba. E da cabine embrionária emerge da água, disposta a uma nova vida.
Devo concordar com a personagem, por fim, que todos também odiamos esse "espaço" entre nós e eles.
Thor: O Mundo Sombrio
3.4 2,3K Assista AgoraCoisas que eu estava doido pra ver: Heimdall em ação (mesmo que só um pouquinho); Thor lutando usando raios; e, claro, ver Loki sendo Loki outra vez.
Gostei muito de poder vê-los mais, entender mais detalhes desse universo e acabei adorando Thor 2. Pra mim, dessa nova onda Marvel, o melhor dos filmes depois de "Avengers".
Das coisas que eu acho que podiam ser melhor aproveitadas, de longe, o vilão, Malekith. Os vilões parecem ser o grande ponto fraco da Marvel, enfim (ainda bem que eles têm o Loki). Gostaria de ver aquela turma de guerreiros asgardianos em situações mais concretas e não só meramente "usados" - em destaque Sif, que já deveria ter ganhado mais relevância na história há muito tempo. Aquela criatura monstruosa que cai em Londres, pra onde foi? "Ah, mas aí o filme teria 3 horas", sim, e o "O Senhor dos Anéis" tá aí pra contestar esse argumento né. Aliás, há quem diga que existem em Thor 2 algumas semelhanças à trilogia.
Eu gosto muito do primeiro filme (na página dele eu explico o porquê) e AINDA BEM que esse segundo não me decepcionou, muito pelo contrário, superou e MUITO. Muitas quebras de expectativa, muita ação, muito humor e muito disso tudo misturado. Engraçado como o roteiro é sempre posto em análise primeiro quando o assunto é Marvel (óbvio), mas é impossível não mencionar as incríveis paisagens ou a trilha épica. Não só fascina mas também surpreende. Valeu muito a pena ter assistido no cinema e já tenho vontade de assistir de novo.
Homem de Ferro 3
3.5 3,4K Assista AgoraUma resposta às palavras de Capitão América: "Fica grandão com sua armadura, mas tirando isso, o que sobra de você? Você luta apenas por si mesmo. Você não é o tipo de homem que se sacrifica."
Então, mantém Tony Stark sem armadura praticamente o tempo todo, mas de um jeito que também a faça presente. Além disso, consegue ainda demonstrar a evolução de sua tecnologia em que agora ele consegue guiá-la à distância. Três em um.
A crise de identidade heroica vai refletir na escolha do vilão, Mandarim (Kingsley). Apenas a fachada, uma casca, uma "armadura".
Considerando ainda a dispensa de Robert Downey Jr. como Homem de Ferro na franquia, o filme termina com a decisão de um recomeço de vida (sem armaduras, sem mansão, sem nada), onde deixa em aberto se aquele continuará sendo o herói nos próximos filmes ou não. Então, nesse sentido, o roteiro é muito bem elaborado.
Mantendo o bom humor, carrega algumas aproximações com o primeiro Thor (sacrifício perante a perda dos poderes), o que também foi outro risco pra quem gosta do Iron Man. Não me entenda mal, acho o Downey Jr. insubstituível como Iron Man, um grande ator mesmo. Mas, pessoalmente, como espectador que acha o Homem de Ferro superestimado demais dentre os Vingadores, gostei muito de ver ele se ferrando.
PENA, que o vilão é tão genérico. Acho que se fosse o personagem do Ben Kingsley mesmo seria bem mais interessante. Outra decepção foi ter visto as armaduras diferentes tão pouco, se comparado a toda o alarde feito no trailer. Portanto, achei um filme bem fraco.
A pergunta que me resta é: será que o erro está em mim, que estou tomando "Os Vingadores" como parâmetro de bom filme ou o erro está neles de confiarem cegamente no sucesso de personagens já tão consagrados?
A Vida é Bela
4.5 2,7K Assista AgoraFantástico, doloroso e encantador. Cenas como a de Guido traduzindo o oficial alemão ou a frase "buongiorno principessa" nunca mais vão sair da minha memória.
Headhunters
3.9 355Em tom mitológico, a trama adaptada da obra de Jo Nesbø pode ser analisada, a princípio, em torno da ideia de caça. Roger Brown, nosso anti-herói, é um “caça cabeças”, algo como “caça talentos” para altos postos empresariais. E essa função não passa de uma fachada para o que realmente faz: seleciona vítimas para seus golpes. Então, em um sentido primitivo, ele está mesmo caçando, avaliando seus alvos mascaradamente.
Sua verdadeira intenção, portanto, nos leva à esfera da arte, mais precisamente dos quadros, quando surge a oportunidade de roubar um quadro da coleção do pintor Peter Paul Rubens (1577-1640). O quadro, cujo nome contém a palavra “caça”, é baseado na obra “Metamorfoses” do poeta latino Ovídio (daí a introdução do personagem Ove, que representa o acesso à pintura). Para reforçar a hipótese, descobri que em uma das histórias em “Metamorfoses” encontramos a deusa da caça, Diana, que no filme não é ninguém menos que a esposa de Brown, ou seja, aquela a quem ele “cultua”, atribui “oferendas”. E é essa devoção que justifica o estilo de vida do protagonista.
Roger é baixinho, mas luta para jogar com os maiores utilizando de uma importante ferramenta que usa com bastante astúcia e habilidade: a farsa. Brown prefere chamar de “reputação”. Se “caça” é o verbo, “farsa” é o adjetivo que traduz e pode ser estendido por todo o longa.
Quando Claus Greve é inserido na trama, o jogo fica interessante porque acompanhamos o caçador se tornando a caça e vice-versa. A farsa, que antes era uma forte aliada, se torna sua pior inimiga, invade sua casa, corrompe sua esposa e nada mais ao seu redor é confiável. O casal não aparece mais juntos na cama, forte símbolo matrimonial, mas parecem agora revezar, fingindo não existir graves tensões entre eles. No decorrer de sua falência moral, Roger abdica de tudo que lhe é material buscando uma espécie de purificação (presença do rio), incluindo sua aliança de casamento, representando seu divórcio com o ofício da caça. Mais tarde, ele também é levado a deixar o quadro pra trás, sendo justamente forçado a executar Ove, uma ruptura definitiva com a vida de farsas. Roger desce ao fundo do poço, fica na merda, literalmente, se transforma em uma verdadeira besta acuada, um javali fugindo em desespero. Seu cabelo dourado, objeto de vaidade, equipara-se a uma coroa, que também é obrigado a se desfazer. É possível dizer, em termos “Ovidinianos”, que Roger Brown se salva pelo amor verdadeiro.
A narrativa é surpreendente, belissimamente estruturada, tem um ritmo envolvente, um roteiro inteligente, atuações sensacionais (em destaque a entrega de Aksel), uma trilha espetacular, momentos cômicos e inúmeros outros aspectos dignos de elogios. Já o tão criticado desfecho, que muito se pode comparar ao estilo guyritchiano, poderia ser menos topetudo e optar por algo mais sutil, mas não ofusca a brilhante produção norueguesa e alemã. Que, inclusive, o cinema americano já tá de olho, sedento por um remake.
Valente
3.8 2,8K Assista AgoraA Disney Pixar mantém a trajetória de filmes para família e sobre família, na linha de "Os Incríveis". Com o sucesso de "Como Treinar seu Dragão", "Valente" também retoma alguns séculos passados de uma Escócia que não se consegue muito bem identificar seu período devido à confusão de referências (ao invés disso constrói o imaginário popular). E, diferente de "Procurando Nemo", podemos dizer que uma das exclusividades do longa é sua perspectiva feminina (alguns até diriam feminista).
Alguns podem até priorizar a associação com "Irmão Urso", mas é indiscutível que a técnica de animação desenvolvida exibe recursos estonteantes de movimento, textura e composição dos personagens, incluindo, claro, paisagens exuberantes. O cabelo - aspecto técnico mais comentado geralmente - tem explicitamente uma preocupação a parte. "Cabelo vermelho, como o fogo", quente e solto, refletindo seu espírito revoltoso que anseia por liberdade.
É interessante observar, com calma, os valores que o mito transmite entre as lacunas mais bem humoradas. O pedido de transformação da mãe é atendido (cuidado com o que deseja) e ela se transforma, mas por fora. Mas logo percebemos que as mudanças permanentes se darão por dentro. Na cena do café da manhã desajeitadamente preparado pela "mãe ursa", percebemos que a rainha não tinha qualquer conhecimento do mundo selvagem e precisaria se despregar de suas etiquetas reais para sobreviver. Do outro lado, a protagonista se arrepende pela audácia e tem que, entre outras coisas, costurar (literalmente) para trazer sua mãe de volta. O encontro dessas atividades que antes repugnavam transforma e aproxima o pensamento das personagens, reconciliando-as.
Dessa vez a aposta foi em mais drama intenso e menos ação em comparação com produções anteriores do estúdio (o que despertou certo grau de rejeição por alguns). Isso nos faz pensar no título, que sugere que o ato de valentia não está necessariamente vinculado à violência. Visto que até por falta de uma definição clara de vilão, a ignorância e intolerância dos guerreiros bárbaros se revelam o maior e mais presente conflito e obstáculo para a princesa, claramente trazendo à tona problemas que encontramos ainda na modernidade.
Um dos dois problemas discutíveis que encontro atualmente gira em torno dos personagens secundários que têm desenvolvimentos mínimos e não fazem mais que apenas preencher, contribuir com uma remada. É possível se cativar, se identificar com Merida ou no máximo achar engraçadinho os trigêmeos, mas não vamos muito além disso. O outro está na ordem da originalidade, que se pretende mascarar pela protagonista feminina e ruiva, mas resgata inúmeras referências e situações já saturadas no cinema (sem precisar ir muito longe), como mais imediato exemplo a questão da garota-quase-mulher sendo obrigada a se casar por sua responsável opressora. Mas ao menos, convenhamos, é uma princesa que não está atrás de um príncipe encantado.
É possível que "Coração Valente" (Mel Gibson) tenha sido tomado como inspiração durante a produção.
A protagonista carrega mais potencial narrativo que o próprio filme em si, os gráficos são admiráveis, ainda que os personagens carecem de desenvolvimento no roteiro. É um filme leve, divertido, mas não sei se é daqueles que se assiste outra vez.
Todo Mundo Quase Morto
3.7 979 Assista AgoraÁgil, formalista e excêntrico, como costumam ser os filmes de Wright. Em contraponto a todo exagero,a abordagem minimalista de um apocalipse zumbi mais caseiro dá o contrapeso que aproxima os personagens um pouco mais do que podemos chamar de nossa realidade. Um cara qualquer que tem seus problemas financeiros, amorosos, sociais e familiares.
Divertido, criativo, tenso, com uma pitada de crítica e às vezes besteirolesco, deixa a desejar para os que o superestimam e surpreende os que o subestimam.
Armadilha
2.2 589Uma mistura de "Por um Fio" com "Jogos Mortais". Alguns aspectos deixam a desejar mas é um passatempo interessante.
Guerra Mundial Z
3.5 3,2K Assista AgoraTexto que escrevi para o blog de um amigo. Coloquei como spoiler pra não ocupar muito espaço.
Após praticamente dois anos desde o início das filmagens, chega aos cinemas de todo o mundo “Guerra Mundial Z”, dirigido por Marc Foster (“Mais Estranho que a Ficção”, “007 – Quantum of Solace”) e estrelado por Brad Pitt, com quase duas horas de duração. O filme tem suas particularidades, não só por inusitadamente lançar Pitt ao gênero, mas também por ser palco de vários problemas de produção. O orçamento inicial teve um aumento de aproximadamente 50% (de 125 milhões para algo em torno de 190 milhões) e até agora arrecadou US$ 128 milhões mundialmente (US$ 66 milhões só nos EUA) em seu primeiro fim de semana. Com o marketing, as contas finais chegam a quase 400 milhões. O alto investimento faz de “GMZ” o filme de zumbis mais caro da história, deixando os produtores receosos por um grande prejuízo porque, para haver lucro, o filme precisaria faturar (a grosso modo) pelo menos 1 bilhão.
Normalmente vemos no cinema o apocalipse zumbi evocar uma metáfora crítica sobre as variáveis da condição humana. Dessa vez, entretanto, não parece ser o caso, visto que o maior investimento dramático tem foco simples e exclusivamente na sobrevivência. Este fator também define os demais personagens, que não possuem qualquer profundidade e constituem nada mais que uma “ponte” passageira para o protagonista. A própria situação delicada e repentina em que se encontra o pai de família Gerry Lane, tendo que proteger sua esposa e suas duas frágeis filhas, por si só já proporciona uma identificação com o espectador. Mas isso não quer dizer que o filme para por aí e seja só mais um enlatado desmiolado ou superficial. Uma das características que mais atribuem valor a obra é a criatividade – e até um certo grau de originalidade.
Adaptação do livro “World War Z: An Oral History of the Zombie War” de Max Brooks (que também escreveu “Guia de Sobrevivência contra zumbis”), o filme se desvincula quase totalmente da obra literária, onde Gerry Lane deixa de ser um coletor de relatos sobre os ataques para o livro que escreve, para atuar como um agente da ONU envolvido na missão de buscar informações sobre a origem do vírus. Foi criada uma trama alternativa que capturasse a essência do livro, mas contada de uma forma bem mais “tradicional” (aos moldes hollywoodianos). Ainda que o longa abandone a abordagem social, política e econômica, mantém o abrangente aspecto geográfico, onde passamos pela Pensilvânia (Filadélfia), Coréia do Sul, Israel e País de Gales e também em variados cenários e situações, como dentro de um avião, nas escadas e na sacada de um prédio, multidões desesperadas, uma base militar marítima, bicicletas à noite debaixo da chuva, um supermercado e um laboratório infestado de mortos-vivos.
As características desses zumbis foram definidas por Foster de modo a parecerem mais verossímeis, perigosos e orgânicos. Eles ficam em um estado de dormência, vagando lentamente, até que encontrem um estímulo que os transformem em criaturas frenéticas. São realmente velozes e se lançam como pregos, usando a cabeça para atravessar qualquer coisa que esteja entre ele e o alvo. Se uma dessas criaturas é “desligada” diante das outras, elas são capazes de se enfurecer. Não são comedores de cérebro ou famintos pela carne humana, mas fundamentalmente mordedores cujas mandíbulas batem como castanholas. Em grupo, eles se amontoam como insetos, onde a comparação mais justa equivale a um formigueiro, fazendo o vírus engolir cidades como um tsunami. Um conceito trazido por um dos personagens os relaciona com a natureza e sua essência assassina que não resiste em deixar rastros de sua fraqueza para que no final possa ganhar os créditos pelo feito. E é através da fraqueza humana, em seu viés biológico, que o filme consegue sua resposta paliativa, conquistando espaço para um desfecho curioso e inovador (em devidas proporções).
O filme pouco amedronta e menos ainda causa repugnância, não há sangue ou corpos despedaçados. Isso porque a censura é PG-13, ou seja, proibido apenas para menores de 13 anos, se estendendo a um número maior de espectadores. Há, entretanto, uma recompensa de um ritmo quase tão frenético quanto os próprios zumbis, com muita ação e o dobro de tensão, como se assistíssemos com uma boa quantia de adrenalina contida. Já o 3D é plenamente descartável, não acrescentando em absolutamente nada, exceto pela otimização de alguns sustos.
Plan B é a produtora de Brad Pitt que comprou os direitos do livro. Então, oficialmente, ele também é um dos produtores do filme, junto com a também distribuidora Paramount. Isso ajudou Marc Forster a abrir várias portas, mas nem tudo foram flores ao longo do processo. Pelo contrário, foi quase uma verdadeira guerra. Faltaram investidores no projeto. A polícia húngara (Budapeste) chegou a confiscar 85 pistolas e fuzis do set por serem identificadas como armas reais, não réplicas. Acidentes com alguns dos 900 figurantes que compunham a multidão, fora os problemas para alimentá-los também. A saída inesperada do diretor de efeitos especiais John Nelson. O possível desentendimento entre Marc e Brad durante as filmagens ao ponto de se comunicarem por meio de um intermediário. Pelo menos dois roteiristas tiveram de abandonar o projeto por conta de outras ocupações e o terceiro ato teve que ser reescrito e refilmado (aproximadamente 40 minutos). Talvez você consiga imaginar o clima. O lançamento do filme foi adiado 6 meses, o que pelo menos garantiu mais tempo aos técnicos para trabalharem nos efeitos visuais.
A versão descartada fazia de Gerry um combatente experiente em matar zumbis, Karin se tornava uma mãe que oferecia seu corpo a um militar em troca de abrigo para ela e as filhas e a partir daí, a missão de Lane era voltar para resgatar sua família, o que garantiria uma sequência.
Aliás, o projeto todo foi idealizado como uma trilogia, mas os estúdios estão esperando para ver qual o resultado desse primeiro investimento. A alteração ficou por conta de Damon Lindof (Prometheus), contratado pessoalmente por Brad Pitt.
E, sem querer desmerecer outra alternativa, o final definitivo parece realmente melhor, mas é um desfecho que sofre de ritmo, esfriando um pouco uma história que costuma foi intensa desde seus primeiros minutos.
O elenco principal conta também com Mireille Enos (Caça aos Gângsteres) interpretando Karin, esposa de Gerry e a israelense Daniella Kertesz (AfterDeath) como a oficial Segen. Com a sequência garantida pelos produtores, o filme já se torna um jogo para tablets e celulares. É um filme simples em critérios intelectuais, complexo em seu backstage, mas um ótimo entretenimento que dá vontade de assistir outra vez, com potencial para agradar e divertir os fãs do gênero.
A Rosa Púrpura do Cairo
4.1 590 Assista AgoraMuito divertido, leve e interessante, evoca a metalinguagem do cinema para dar vida a um romance extraordinário e imprevisível.
O maridão me lembra Robert De Niro em "Touro Indomável".
A Morte do Demônio
3.2 3,9K Assista AgoraTexto que escrevi para o blog de um amigo meu. Coloquei como spoilers para não ocupar muito espaço na página.
Fede (Federico) Alvarez é um diretor uruguaio que chamou a atenção após a divulgação de seu curta-metragem “Panic Attack” no YouTube. Sua notoriedade chegou a Hollywood e logo foi “apadrinhado” por um dos seus maiores ídolos, Sam Raimi, para a produção da versão longa de sua ficção científica. Mas o que na verdade aconteceu foi que ele e seu co-roteirista Rodo (Rodolfo) Sayagues Mendez acabaram sendo direcionados a trabalhar no projeto de refilmagem de “Evil Dead”.
O orçamento foi de aproximadamente 14 milhões, contando também com Bruce Campbell (antigo protagonista da franquia) como produtor. Diablo Cody (“Juno”, “Garota Infernal”) também teve uma pequena participação no roteiro.
Um dos maiores desafios de um remake é superar (ou estar à altura) o original. Uma ideia que provocou receio nos grandes fãs do “Evil Dead” (Uma Noite Alucinante) de 1981, dirigido pelo próprio Sam. Mas Fede estava confiante porque ele também é um desses fãs. E para preservar a essência do original, recriou a história com novos personagens apropriados para um contexto pertinente. Fede investiu em motivações e conflitos afetivos, trazendo os irmãos Mia (Jane Levy) e David (Shiloh Fernandez) a um chalé na floresta, afastado do resto do mundo, para que Mia tentasse ali se livrar do vício das drogas. David, em processo de redenção, está disposto a fazer o que for preciso apaziguar sua relação com a irmã. Em complemento, temos Olivia (Jessica Lucas), uma enfermeira que está disposta a se responsabilizar pelos métodos de tratamento da amiga em abstinência, que tem como princípio não permitir que ela fuja da casa quando houver uma recaída. A partir desta trama é que Fede marca seu primeiro ponto positivo, ao trabalhar com carisma e envolvimento na relação público x personagens.
Enquanto Jane Levy fica à frente na interpretação, Nat (Elizabeth Blackmore) é a namorada de David e, no quesito desenvolvimento de personagens (que o original praticamente não tem), ela é a mais fraca, tendo mais relevância quando está possuída do que viva. Já Eric (Lou Taylor Pucci) é o responsável pela evocação da entidade maligna, mas, em resposta ao grande equivoco, torna-se um personagem resistente e útil, ganhando algum prestígio em pelo menos três cenas. Não coincidentemente, as iniciais dos cinco amigos formam a palavra “DEMON”. Para completar o time, resta Grandpa, um cachorro que vem com David cuja única finalidade é guiar os personagens com seu faro.
Findo o prólogo, começamos com uma câmera de ponta-cabeça (referência a uma sequência do original), indicando o sentido da única crença pela qual o filme responde. O enquadramento faz com que vejamos o carro cercado pela floresta descendo e descendo cada vez mais pela tela, como uma possível alusão ao inferno. A ausência de qualquer religião é um elemento esperto porque não evoca opositores e, ao invés disso, o filme procura canalizar a contrapartida para a ciência – usando termos como delírios, vírus e tranquilizante. Mais tarde, os personagens descobrem que o conflito só pode ser encarado no campo do misticismo, instruídos pelo invulnerável Livro dos Mortos. Nesta versão são apresentadas três formas de derrotar o demônio e, felizmente, temos a oportunidade de assistir às três.
O segundo maior desafio que o longa assume é o – arriscado – compromisso de ser “o filme mais apavorante que você já viu. Pode parecer pretensioso para muitos, sendo este um dos princípios de Alvarez na produção. O uruguaio afirma já ter participado de diversas produções de terror e tem experiência com efeitos especiais práticos em set, o que lhe permitiu gravar, por exemplo, a já famosa cena da língua cortada, usando cordas (como uma marionete) em uma língua falsa. Talvez o horror aqui não esteja em sua forma mais aterrorizante, mas com certeza é digna de asco, repulsa e aflição. E não só é mais realista no sangue (foram usados cerca de 5 mil litros) e na maquiagem mas também é mais sensato que o original, um conjunto que permite maior verossimilhança para a experiência.
Uma escolha que pode não ter caído muito bem (e eu adiei o assunto propositalmente) foi o prólogo. Uma menina ensanguentada vaga pela floresta até ser capturada por dois homens. Ela acorda amarrada a um tronco diante de seu próprio pai. A situação em que o próprio pai ateia fogo na filha pode parecer desumana, até que ela se revela possuída pelo demônio. Talvez as pessoas sintam mais medo quando estão chocadas, mas nesse caso, o efeito foi desfavorável porque a pancada acabou anestesiando o público. Em todos os minutos que se seguem o terror é gradual e crescente, mas sensorialmente enfraquecido pela prévia daquilo que ainda estava por vir. Nem tudo foi perdido: há investimento em cenas chocantes, reviravoltas e procura surpreender o espectador, fugindo muito da narrativa do filme original, com detalhes e alterações que fazem valer o ingresso (o uso da serra elétrica é espetacular).
A melhor característica do filme – e é aquela que lhe atribui o tom de pânico – é que ele nunca blefa. Os acentos sonoros correspondem a verdadeiras imagens de terror. A atmosfera, quando crescente, garantidamente nos leva a um momento crítico. Não há enganos, não tem essa de personagem assustado se vira e vê que era só o amigo ou um animalzinho passando. O som rege o horror de cada cena, partindo do suspense sem qualquer trilha à desesperadora e apocalíptica orquestra. O brusco silêncio e gritos ensurdecedores também participam da narrativa e da montagem, concluindo ou mudando a trajetória de alguns episódios. Para o grand finale minuciosamente arquitetado, a trilha épica toma o palco para ampliar a magnitude da situação.
Outros elementos do filme também merecem uma análise, como por exemplo o fato da figura da mãe estar sempre morta (das duas famílias). Nessa versão não há menção de uma floresta viva, ainda que exista a cena dos cipós. Mas é diante da “mãe natureza” que Mia é possuída em um ato que mais se parece com dar a luz ao contrário – a negação da vida. Só é estranho que ela seja a única a ser possuída de tal forma, já que todos os outros são meramente “contaminados”, o que nos leva a pensar na hipótese de que tudo pode se tratar de uma metáfora para a condição de Mia. A garota “que já havia morrido uma vez” ingeria novamente e passaria a destruir suas amizades, uma a uma, em decorrência de seus demônios internos. Isso provavelmente daria um sentido alternativo para a cena da ressuscitação.
A batalha conclusiva é essencialmente vermelha, desde a roupa e arma ao carro da personagem, num cenário banhado em sangue e chamas. No campo da arte, percebemos também que David usa uma camisa muito parecida com aquela que Ash usa no filme de 81 (ele também é lançado contra estantes como Ash). A fotografia é competente e traz vários enquadramentos louváveis. Pode-se dizer que todo o humor do filme original foi deixado de lado para dar espaço integral ao horror, gerando um remake digno de reconhecimento. Com $25,7 milhões arrecadados no fim de semana de estreia nos EUA e mais de $50 milhões ao redor do mundo até o momento, “Evil Dead” traz tudo aquilo que o espectador do gênero quer ver.
A sequência já foi garantida e Fede já está trabalhando no roteiro de “Evil Dead 2”
O Vingador do Futuro
3.6 495 Assista AgoraFelizmente cheguei a este Total Recall após o remake vir à tona. Um filme que tem realmente aquele ar de anos 80/90, com um dos maiores astros da ficção científica da época: Arnold Schwarzenegger. E é traçando um paralelo entre esta versão e sua regravação que percebo os traços mais curiosos.
Tratando-se de uma adaptação de Philip K. Dick, podemos pressupor que uma das mais notáveis características da história é a perspectiva de um futurismo conturbado. Acontece que a maioria dos elementos que compõem a ideia do avanço tecnológico no filme não convence o espectador do século XXI. No final do século anterior, existiu uma liberdade consensual em fantasiar em torno da evolução científica e tecnológica, tanto dos autores quanto dos espectadores, o que de certa forma inocenta uma abordagem à utopia marciana levada a sério (na regravação a briga é por espaço habitável ameaçado por um exército robô). Conceitos acerca da preservação do planeta Terra ganharam mais espaço nos últimos 50 anos, assim como o considerável desenvolvimento da ciência. Naturalmente, alguns conceitos foram se tornando temas para a ficção científica, como a mutação genética. Isso fica interessante quando comparamos os dois filmes e percebemos que o remake tem uma noção muito mais sensata do futuro.
Outra destoante entre os dois filmes está nos efeitos visuais e especiais, elemento fundamental e memorável em ambos. Enquanto o remake dá um show de computação gráfica com toda sua complexidade, este tem sua própria ambição, buscando maquiagens e artifícios um pouco mais “oldschool”, o que, por outro lado, tem um resultado mais audacioso, criativo e, talvez, à frente do seu tempo. E ao lembrarmos da imagem dos olhos esbugalhados em marte ou da gorda em pane, temos uma conexão forte com o humor, que aqui acompanha o protagonista em quase todas as cenas, amaciando o espectador. Humor que desaparece completamente na regravação.
Com uma breve, porém marcante presença de Sharon Stone, a história consegue facilmente intrigar o espectador quando sua maior qualidade são as reviravoltas. Investindo em uma trama que traz várias surpresas, Quaid se vê numa batalha interior e exterior por sua própria identidade, onde se revela o conceito mais interessante da obra. Em um planeta que caminhava para o artificialismo em suas diversas formas e possibilidades, surge a contrapartida pela preservação da vida em seu estado natural. Uma mensagem pela nossa adaptação em um futuro em que não nos deixemos esquecer quem realmente somos.
Antes da Meia-Noite
4.2 1,5K Assista AgoraTexto que escrevi para o blog de um amigo.
Com a chegada de “Antes da Meia-Noite”, Richard Linklater (“Waking Life”) concretiza a “trilogia de menor bilheteria do cinema” – o que não necessariamente, asseguro, diz respeito à qualidade dos filmes. A fórmula é simplista, o tom é europeu e a pegada é existencial. O que torna a franquia especial vai de fora para dentro. Aparentemente, o trio, Ethan Hawke Julie Delpy e o diretor texano se reúnem a cada nove anos para levar às telas a esperada sequência de uma narrativa suspensa com cruéis reticências. Quase uma provocação ao espectador quando vem dizer que os homens estão condenados à eterna insatisfação.
“Antes do Amanhecer” (1995) é um descontraído romance que mostra um dia de dois jovens que se conhecem num trem. “Antes do Anoitecer” (2004) conta o dia em que estes mesmos jovens se reencontram nove anos após terem se separado. E “Antes da Meia-Noite”, com uma trilha igualmente apaixonante, mostra um dia das férias do casal. A base e a riqueza dos três filmes é o diálogo entre Jesse e Celine, que conversam desde pequenos e curiosos casos cotidianos a complexas reflexões sobre o homem, a mulher, a vida, a morte, futuro, religião, e amor. A dupla conversa como grandes amigos se descobrindo, sincronizados por uma intimidade admirável que proporciona uma sensação de naturalidade e improviso. Mas, apesar de Hawke e Delpy participarem da criação de ambos personagens, cada gesto, cada palavra pronunciada diante da câmera está rigorosamente descrita no roteiro, garante Linklater.
Mesmo ainda com a forte presença do humor, o que mais chama atenção é que, nos dois primeiros filmes, a história caminha num sentido em que percebemos a intenção de juntar duas pessoas separadas. Mas neste último, surpreendentemente a correnteza é contrária, o que naturalmente gera certa tensão. Jesse e Celine voltam nove anos mais velhos, aproximadamente com 41 anos, casados, com filhos e várias divergências. Jesse divaga sobre irem morar nos EUA para poder ficar mais próximo de seu filho, enquanto Celine considera aceitar um emprego no governo na França. Entretanto, o maior conflito entre eles não é geográfico, mas temporal. Em “Antes do Amanhecer”, Celine precisa ir embora pela manhã e em “Antes do Anoitecer”, Jesse precisa pegar o vôo no final da tarde. Em “Antes da Meia-Noite”, o tempo é um pouco mais abstrato: acompanhamos o estopim de uma conturbada bagagem de nove anos juntos. O espectador vai descobrindo o que aconteceu durante esse período gradualmente, de acordo com a evolução dos diálogos que trazem uma ambientação totalmente diferente dos dois filmes anteriores.
Não em Viena, nem em Paris. Dessa vez estamos em Messínia, sul Peloponeso, na inspiradora Grécia, o berço das tragédias, repleto de mitos e ruínas. Existe um embate persistente entre o passado (memórias) e o futuro (incertezas), que justifica a intensidade com que o presente é valorizado em cada cena, o que leva Linklater a realizar longas tomadas e longas conversas, dando consistência para a espera real do agora. Ainda que os personagens estejam mais maduros e os diálogos carreguem mesmo essa carga da meia-idade, de alguma forma, eles parecem ainda serem devotos à magia do dia em que se conheceram. Quando quase tudo está perdido depois de tantos conflitos sentimentais, o casal se permite restaurar suas percepções voltando no tempo em que tinham 23 anos e andavam descompromissados pelas vielas conversando sobre ciganas e macacos. Longe de ser encarado como uma relação sustentada por uma ilusão, o sonho foi real e é evocado unicamente para purificá-los dos pensamentos atrofiados pela vida adulta. Como diz a senhora mais velha na mesa, para que nunca se permitam “esquecer das pequenas coisas” ou deixarem de ser quem realmente são.
O primeiro filme carrega todos os traços de um filme genuinamente romântico, mas o segundo não tem sequer um beijo e conseguiu o mesmo efeito. Diante de um roteiro temperamental como este, o desafio de manter tudo isso romântico aumenta para Linklater. Em “Before Midnight”, pode-se presumir que os dois conseguem agora sentar num banco qualquer e contemplar o pôr-do-sol, desafiando o tempo, provando para si mesmos que puderam sobreviver mais um dia juntos, nem que tenham que para isso seja preciso viajar pelo “espaço-tempo continuum”. Linklater mostra que problemas aparecerão em qualquer conexão, por mais bela que tenha nascido a relação, e lutar por ela também é romântico.
“Antes da Meia-Noite” é o terceiro capítulo de uma das mais “humanizadas” experiências do cinema, tanto pelas circunstâncias “não fictícias” em que é produzido, quanto pela narrativa inspiradora e verossímil. Por exemplo, Ethan Hawke não precisa fingir que lembra do dia em que se conheceram quando está em cena porque, oras, Hawke estava lá realmente. Quando estamos diante de Jesse e Celine, a vontade de também encontrar algo tão extraordinário em outra pessoa é inevitável, o que alimenta a esperança de que existem pessoas extraordinárias para serem descobertas por aí. Um filme verdadeiramente “de pessoas sobre pessoas”.
Linklater sempre achou improvável qualquer sequência para “Before Sunrise”, duas surgiram e agora ele não parece descartar a hipótese de um novo encontro com esse casal daqui nove anos para darem notícias.
Detona Ralph
3.9 2,6K Assista AgoraÉ a versão "Meu Malvado Favorito" da Disney, em que a fórmula é basicamente a mesma, mas com um resultado ainda superior. Também é possível compará-lo a uma versão digital de "Toy Story" já que são "brinquedos old school" que têm vida quando ninguém está olhando e têm receio de ser abandonados pelas crianças. E apesar da fórmula e do tema manjado, a trama ainda detém um curioso status de originalidade quando o assunto busca precisa e inteligentemente vilões de fliperama.
O que mais me impressionou aqui foram a profundidade dramática dos personagens e as motivações que os levam adiante. Ainda com muita aventura e humor, sem dúvida é um filme memorável e altamente recomendável.
Sete Psicopatas e um Shih Tzu
3.4 600“Seven Psichopaths” é um exercício metalinguístico que carrega críticas aos próprios espectadores do gênero que ele contempla. Um descendente guyritchiano que investe em humor negro, criatividade nos diálogos e uma narrativa que questione os clichês. Pode ser visto como um amontoado de ideias completamente despropositado ou como um trabalho irônico, insano e ousado.
McDonagh, depois do sucesso de “In Bruges” (Na Mira do Chefe – 2008) apostou alto em um filme que sabota a si mesmo. O primeiro deslize e o mais imperdoável (talvez não seja culpa dele, afinal), é o marketing enganoso do pôster em que vemos sete personagens numerados. A informação é falsa, porque nem todos aqueles são psicopatas e o filme sequer tem sete psicopatas. ”Sete Psicopatas” é apenas um bom título para atrair espectadores que procuram um bom thriller e os personagens sabem disso. Além disso, o título se transforma numa expressão para representar o fetichismo desses mesmos espectadores quanto ao desejo utópico de relacionar a violência, humor e morte como uma coisa divertida e aceitável.
A brincadeira começa quando conhecemos Martin, não o diretor, mas o protagonista (Colin Farrell), que é um roteirista que está tentando escrever um filme e não consegue passar do título que já bem conhecemos. Billy (Sam Rockwell) e Hans (Christopher Walken) são seus dois amigos – cada um com suas bizarrices – que acabam ajudando Martin a escrever este roteiro por uma série de situações, construindo, ao mesmo tempo, a narrativa a qual assistimos. Nem cinema imitando a vida ou a vida imitando o cinema, mas ambos caminhando juntos naquela diegese.
Woody Harrelson completa o elenco principal interpretando o vilão Charlie, que tem uma constrangedora relação afetiva com seu cão (um Shih Tzu). E é com personagens problemáticos, incluindo participações de Tom Waits e Michael Pitt no elenco, que o filme segue a até sua metade de maneira extraordinária. Mas em certo ponto, a trama assumidamente se torna uma viagem recatada no deserto, onde nada mais pode acontecer - é onde ele sensorialmente perde força. O filme termina e diante do sentimento de banalização, tudo o que resta a fazer é perguntar qual foi o propósito de tudo aquilo.
Numa segunda camada de interpretação e pensando o filme como um todo, entendemos que grande parte das decisões de McDonagh se tratavam de desafios ao convencional e provocações ao gênero. Ou seja, apesar de todo o teor enganoso, a verdadeira proposta era contradizer, trocar os pés pela cabeça, e nos guiar a um desfecho que já se poderia classificar-se como imprevisível. As cenas de tiroteios romantizados são explicitamente evocadas pelas próprias fantasias dos personagens, defendendo a bandeira de uma violência mais lúcida e repentina, confrontando a própria ideia do filme ser um thriller. E apesar desse discurso ser interessante, McDonagh parece ter receio de mexer no assunto e apenas pisa de leve, deixa um pé atrás e escora seu filme em um desfecho nada extraordinário, bastante comum.
Um amontoado de boas ideias estranhamente costuradas que formam um entretenimento curioso a princípio, mas que infelizmente tropeça em contradições e não detém maturidade para sustentar seus próprios argumentos.
O Vingador do Futuro
3.0 1,6KPegue “Identidade Bourne”, acrescente “Minority Report”, umas chuvas de “Blade Runner”, uma pitadinha de “Matrix” e “Equilíbrium”, alguns robôs de “Eu, Robô” com um visual à la stormtroopers de “Star Wars” e tenha “O Vingador do Futuro” com muitos flashes e – muitos - flares (muitos mesmo). Um título que eu gostaria muito de compreender o porquê da escolha.
Sarcasmos à parte, o longa é uma refilmagem de um dos – quase – clássicos da ficção científica “O Vingador do Futuro” (1990), estrelado por Arnold Schwarzenegger, mais uma das inúmeras adaptações do grande Philip K. Dick para o cinema.
Souberam reciclar a grande maioria dos principais elementos do filme dirigido por Verhoeven, do trem aos traíras, inserindo-os em fases diferentes do filme. O fato mais interessante na produção é que o roteirista Kurt Wimmer, junto ao diretor Len Wiseman, recriou a história em muitos aspectos, o que garante alguma originalidade autoral para o trabalho, procurando afastar-se do primeiro filme. Uma das mais impactantes (e mais interessantes) mudanças na história, está a opção por um universo mais sensato, sem as fantasias biológicas do original, o que revela uma perspectiva moderna de como se enxerga o futurismo hoje, diferentemente da visão sonhadora que os autores tinham no final do século anterior.
Wiseman arrisca trabalhar outros conflitos, objetivos e contextos, e dá uma ênfase na tecnologia digital e no artificialismo, o que configura a segunda maior mudança entre os filmes. Os ambientes têm uma enorme e impecável complexidade gráfica e revelam grande investimento em efeitos visuais, dando mais credibilidade para o universo que nos apresenta. Na colônia, em meio ao cenário cyberpunk, muitos criticam a “inapropriada” presença iconográfica da mulher de três seios, que faz referência ao filme de 90. Mas receio que talvez não tenham assimilado que ali havia uma crítica a uma sociedade que abraçou a ideia da artificialidade sobre a própria identidade e integridade.
A principal característica que constitui ambos países é a vasta verticalização dos edifícios, o que sugere e se adequa à necessidade de uma grande concentração de pessoas em uma mesma área: a briga agora é por espaço. Sendo a terceira grande mudança no roteiro, a grande ameaça não diz respeito a uma guerra por oxigênio, mas uma fabricação de um exército de robôs para dominação do território que corresponde à colônia. Também foi acrescentado “A Queda”, ou “The Fall”, uma espécie de elevador que conecta as duas únicas áreas habitáveis do planeta, o que, metaforicamente, se relaciona com a viagem do protagonista que transita entre sonho e lucidez, ficção e realidade.
A quarta e última mudança que precisa ser citada é a retirada absoluta do humor para dedicar e ampliar o gênero pelo qual “Total Recall” reverencia.
Mas esses riscos trouxeram vários efeitos colaterais ao roteiro, que acabou adotando várias “forçadinhas” pra narrativa acontecer. No filme de 90, é fácil – quase didático - localizar e acompanhar os passos de Quaid. Mas aqui, as relações são mal costuradas, dificultando o entendimento e dando a sensação de que o filme é mais complicado do que realmente é. O filme também condiciona o espectador à prática de deduções. A exemplo disso, Quaid sabe pilotar veículos terrestres e aéreos, armas de qualquer natureza e sabe até onde exatamente encontrar dispositivos explosivos em um helicóptero porque devemos aceitar que ele “é um dos melhores agentes secretos do mundo”.
O mesmo Cohaagen está lá, mas Hauser deixa de ser o verdadeiro rival de Quaid, o que enfraquece a essência da obra no que diz respeito a busca do protagonista pela identidade, elemento tão bem trabalhada com Schwarzenegger. E Matthias acaba sendo minimizado a um personagem de apenas dois breves diálogos, sem nem mesmo o impacto visual que o do filme anterior teve. Em contrapartida, Kate Beckinsale vive o inverso, tendo sua personagem, Lori, intensa até a última cena. Colin Farrel, apesar da comparação com Arnold ser quase injusta, se sai bem no papel.
Um fato interessante também vale a pena a comparação. Sharon Stone interpreta Lori no filme original e mantém um caso com o vilão médio do longa, apesar de não durar muito na história. A Lori daqui é Beckinsale (Anjos da Noite), que é esposa de Len Wiseman, o diretor e esse fato já explica o porquê da drástica mudança das características da personagem.
Merecem destaques a inesperada cena do piano e a longa “negociação” entre Quaid e Harry pela paranoia de ainda estar sentado em uma cadeira na Recall. É um filme que agrada principalmente aqueles que não assistiram o filme original e buscam por um entretenimento curioso, mas que pode se tornar frágil para o espectador mais exigente.
Hotel Transilvânia
3.6 1,5K Assista AgoraUma efusiva história de um hotel que reúne os maiores monstros da cultura ocidental para o aniversário de 118 anos da filha do Drácula. O humor vem das inversões e contradições dos habitos e personalidades dessas figuras que ironicamente temem os humanos. É daqueles que empolgam a criançada com direito a música e dança.
Ted
3.1 3,4K Assista AgoraSeth Mcfarlane, criador de "Family Guy" dirige e dubla o sarcástico ursinho Ted. A princípio a ideia na tela é a de que é divertido ter uma vida desleixada e de hábitos imorais, mas não demora até esses valores se reverterem e percebermos que estamos diante de uma fábula sobre amizade. Um dia nós precisamos amadurecer e não é porque deixamos de fazer coisas estúpidas com os amigos que ela acabou.
Os melhores momentos de humor baseiam-se em situações nonsenses/absurdos e piadas que fazem referências a celebridades americanas. Apesar de muito divertido, não é ingênuo. Muito pelo contrário, é um filme que pode ser perigoso para aqueles que acreditam que a trama é direcionada ao público infantil, o que inclusive já rendeu algumas polêmicas ao trabalho. Remeteu-me a série "Wilfred", estrelada por Elijah Wood, e até mesmo o clássico do terror, "Chuck".
Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros
3.0 2,2K Assista AgoraApesar de ser outro entretenimento embalado especialmente para o público pipoca, esse filme é estruturado a partir de referências muito interessantes. É daqueles que são executados com desenvolvimentos prematuros para promover ação, mas nasceram de ideias curiosas.
“A história prefere lendas a homens.”
Abraham ou Ibrahim é como era chamado Abraão, um personagem bíblico cujo nome significa pai (ou líder) de muitos. Assim, buscamos no tempo Abraham Lincoln, um dos três maiores presidentes dos EUA que é conhecido por um ícone inspirador de feitos extraordinários. Na ficção, temos Abe, o próprio Lincoln, antes da vida política, que involuntariamente se envolveu num universo de vampiros e seus caçadores. O presidente, marcado pelo Ato de Emancipação de 1863, sempre esteve engajado pela libertação dos negros da condição de escravos. A fantasia vampiresca estabelece a analogia com a condenação eterna pela sede de sangue e a ambição de dominação sobre os humanos.
“Os homens escravizavam-se desde que inventaram Deus para perdoá-los. Eu vi os judeus construírem a glória Egípcia. Vi Cristãos sendo jogados aos leões com meus próprios olhos. E vi africanos venderem sua própria gente para os europeus. Posso partilhar uma das minhas revelações dos meus 5.000 anos? Todos somos escravos de alguma coisa. Eu da eternidade, você de suas convicções.”
E a jogada está aí. Quando Lincoln discursa a favor da liberdade dos escravos, temos a sensação de que está se munindo de forças para enfrentar a investida dos vampiros. E seus combates mortais contra essas criaturas parecem ser metáforas para os obstáculos de um período sangrento de guerra civil nos EUA.
“Se esta guerra é realmente uma resistência contra o mal, então que represente algo. Se é uma guerra pela liberdade dos homens, por que não dar a cada homem uma razão para lutar?”
Mais tarde, a luta contra o sul e contra os vampiros se torna exatamente a mesma. A guerra pelos ideais de igualdade e liberdade.
Mesmo com uma arte e fotografia tão sofisticadas e empenhadas com seu tom barroco sépia, o filme perde sua sensatez em alguns momentos movido pelo deslumbramento do espírito fictício. Cortar o tronco de uma árvore daquela forma, tomar um cavalo sobre si e ainda sair montado nele e outros detalhes (absurdos para quase qualquer um) destoantes demais da figura séria de Lincoln - que impõe certos limites para “licença poética”. Uma característica habitual da direção de Bekmambetov (O Procurado). Ainda movido pelo viés do heroísmo, vários momentos críticos são marcados pelo slow motion para acentuar a experiência visual sensorial, que muitos poderiam apontar como um recurso usado exageradamente.
Não sei se coincidentemente, 2012 também foi o ano do premiado “Lincoln”, de Spielberg. Se houvesse algo na história do caçador de vampiros a acrescentar na biografia, seria a amizade com Will Jhonson, que no filme representa o ex-escravo Frederick Douglass que foi um grande amigo pessoal de Lincoln.
“Vampiros não são os únicos que vivem para sempre”.
A Era do Gelo 4
3.5 1,7K Assista AgoraAcredito que seja o melhor Ice Age até agora.
A Regra do Jogo
4.1 122 Assista AgoraNão fiz controle de spoilers.
Renoir interpreta Octave (“oct”, oito). Ele não é apenas o oitavo membro, mas também o mediador do jogo, aquele que despretensiosamente compactua para o encontro de todas as peças. “É interessante o que você está vendo?” diz para Christine no monóculo vendo seu marido a traindo. É um parasita social reconhecido como um bom amigo por patrões e empregados, mas no fundo se entende como um grande fracassado. Octave ambiciona, no final, ser coroado como grande maestro do tabuleiro e vencer o jogo da mentira.
Renoir também conduz a narrativa como diretor, costurando um personagem a outro, as ações do primeiro levando a história a um segundo e assim por diante, como se estivesse recrutando seus jogadores. Os movimentos de câmera e a sintonia com os personagens resultam numa misè en scene fascinante que se apuram com a impecável composição e profundidade de campo.
Todos estão reunidos em uma grande casa de campo para uma festa, isolados do resto do mundo, com várias apresentações teatrais, como uma celebração às máscaras que sustentam. Mesmo as músicas são reproduzidas maquinalmente, substituindo o músico do piano. Robert, o confiante marquês anfitrião, exibe seus inúmeros instrumentos mecânicos de música que refletem no imenso carrossel que movimenta o castelo, apresentando na festa, o maior deles. A música circense dá o tom à comédia cruel que estão submetidos. O evento se transforma, se não em uma chanchada, em um ritual chapliniano, com a presença do vilanizado veterano de guerra Edouard Shumacher, um subordinado oficial raivoso, e o engraçadíssimo Marceau, um caçador clandestino dos mais cafajestes.
Enquanto toda a confusão acontece e os jogadores estão se atacando, Octave está tentando se livrar da fantasia de urso. Urso que vemos reverberar em “O Anjo Exterminador”, de Buñel, quase 30 anos depois, que assumidamente buscou inspirações em “A Regra do Jogo” para construir a fantástica crítica à burguesia. Octave, livre do urso, consegue um tempo sozinho para investir em seu tão almejado prêmio sem que ninguém desconfie: Christine. Ao abandonar as mentiras e dizer a verdade sobre si mesmo, Octave evoca a jogada final, mas coloca Andre Jurieu, o herói aviador, na reta do tiro. Jurieu, sempre sincero, que teve a chance de fugir escondido com sua amada, preferiu ser honesto e acabou perdendo o jogo.
Shumacher se deixava enganar por Lisette, que se engraçava com Marceau, que se escondia atrás de Robert, que era amante de Geneviéve, que teve a cumplicidade de Christine, que eventualmente se lança nos braços de Jurieu, que é morto por Shumacher. Octave traiu a confiança de todos e saiu do ciclo (por um momento) no instante crucial.
Outra referência bastante interessante está na cena da caça aos coelhos e faisões em que claramente podemos enxergar nos personagens um posicionamento muito parecido com os soldados responsáveis pelo massacre na famosa Escadaria de Odessa, episódio marcante do clássico “O Encourançado Potemkin”. Os soldados marchando enfileirados em paralelo com os empregados acuando os coelhos para a morte. A matança é impiedosa, cruel, mas nada mais que um esporte para seus patrões.
É possível também que o filme tenha influenciado Akira Kurosawa em “Um Domingo maravilhoso” (“Subarashiki Nichiyôbi”), de 1947, na cena em que Octave imagina ser um grande maestro.
Renoir faz uma ácida crítica à hipocrisia que ostenta a moral da sociedade. Não só da alta burguesia e seus convidados, mas também dos empregados que acabam por cultivar os mesmos costumes de fofocas, trapaças e interesses, num destrutivo universo de farsas que ninguém arrisca mais ter sua moral à prova. Independentemente da classe social, todos estão no mesmo jogo de mentiras, todos estão sujeitos à traição e ao amor - Octave, como se pode constatar, transita entre as duas definições.
Excomungado em sua época, quase perdido, o filme sobreviveu e a ideia tem força até hoje, na contemporaneidade. Resguarda também críticas políticas no contexto da França do final da década de 40 mas não entro nesse aspecto. É considerado uma das obras máximas do cineasta ou até mesmo do cinema francês.
“A mentira é uma coisa pesada para se carregar”.
Jurieu, que veio do céu, voltou. Uma nação sem heróis.
As Aventuras de Pi
3.9 4,4K“Um náufrago e um tigre”, era tudo que eu sabia sobre o filme e eu pensei, o que poderia sair disso? Os 35 minutos iniciais contam a história do menino Piscine Molitor Patel antes do acidente, um prólogo monótono, e até cheguei a pensar em desistir de qualquer boa expectativa pelo receio de um tema religioso. Até que a tempestade me acordou, assim como o próprio Pi no meio da madrugada para evocar a força da natureza. Dali pra frente, o filme me mostrou o quanto eu o subestimei.
O diretor taiwanês, Ang Lee, hoje com 58 anos, pegou o projeto que muitos outros diretores haviam considerado impossível de ser filmado, confiando no recurso 3D (James Cameron esteve envolvido). Não há dúvidas de que ele acertou em todos os aspectos visuais e que a tecnologia implantada tem um vínculo muito coerente com a história. Lee, ao que me parece, ainda fez uma pequena brincadeira colocando Bo-Chieh Wang, que também nasceu em Taiwan, para lhe representar sua própria extensão na história. Wang interpreta um tripulante budista que os consola na mesa quando não encontram comida vegetariana e aponta a zebra para Pi no momento mais crítico, como uma espécie de direcionador do olhar (“você precisa ir, nós vamos ajudar”). Os outros dois homens que empurram Pi para o bote parecem também ter a mesma nacionalidade (ainda que fosse um cargueiro japonês).
Pi é um garoto que foi, desde pequeno, contracorrente. Curioso pelas mais diversas religiões que poderia ter acesso, prevalecendo o hinduísmo, Piscine foi em busca dos porquês da vida. Na escola, diante dos colegas que zombavam de seu nome (“piss in”/ “pissing”) se viu obrigado a se apresentar como “Pi”, um número irracional e infinito, o que também caracterizam seus deuses. O garoto que sabia um extraordinário número de algarismos após os 3,14 acabou se tornando uma lenda entre os demais alunos. Uma dica para todo o misticismo de uma aventura que estava por vir.
Destinado a ter essa viagem, Pi e sua família embarcam num navio que não coincidentemente tem o nome de “Tsimtsum”. Este é um termo que em hebraico é o equivalente a “retração” e é usado para designar o primeiro passo de Deus no processo de criação do universo, em que Ele (onipresente) teria retirado sua luz ou essência de uma área para que naquele espaço fosse gerado algo diferente de si mesmo. Este momento pode corresponder ao naufrágio do navio, o que dá espaço a um incidente fora do comum. Segundo essa mesma teoria, Deus teria contraído sua essência para uma busca interna, o que também se relaciona com o campo imaginativo e psicológico de Pi. O fato de ter pedido tudo, tanto afetivas quanto materiais, também tem relação com ensinamentos budistas que dizem, em outras palavras, que às vezes a destruição vem para que haja reconstrução.
Yann Martel é um escritor canadense, responsável pelo livro “Life of Pi”, em que muitos desses simbolismos são melhor explorados, inclusive o da escolha do nome Richard Parker. Dentre as várias hipóteses, existe uma a respeito de um romance inacabado de Edgar Allan Poe “ The Narrative of Arthur Gordon Pym” (1837) em que quatro náufragos têm de enfrentar a fome em um bote salva-vidas. Eles fazem um sorteio para ver quem seria sacrificado e canibalizado pelos outros três. Um homem chamado Richard Parker tira o menor palito e é prontamente esfaqueado e comido pelos outros três. Outra hipótese mora em 1884, quarenta e sete anos após o conto de Poe, onde quatro sobreviventes de um naufrágio verídico foram julgados pelo assassinato de um garoto a bordo chamado Richard Parker, que foi morto e comido.
Muitos acusam Yann de plágio ao se depararem com uma obra de Moacyr Scliar, um brasileiro, membro da academia de letras, que escreveu no começo da década de 80 “Max e os Felinos”. Para pôr fim às minhas dúvidas, resolvi ler este e realmente, as semelhanças não são coincidências. Entretanto, a história de Pi parece ser uma versão mais branda e mística do que a de Max, cuja aventura tem uma Alemanha nazista como ponto de partida. O naufrágio do garoto que estava indo para o Brasil é apenas uma pequena passagem do livro que não ocupa sequer meio capítulo, enquanto o filme em questão trate quase que totalmente da convivência entre ele e a tigre de bengala (Max convive com um jaguar, ainda que seu maior medo fosse do tigre de bengala empalhado na loja de peles do pai). Talvez, por essa relação entre os livros, exista o instrutivo diálogo entre o narrador, o próprio Pi Patel mais velho, e um escritor que quer publicar sua história.
Existem muitos detalhes que podem ser associados, comparados, interpretados ou analisados, mas a ideia de dar dentes e garras ao medo é a de maior peso. A presença do animal (natureza selvagem) proporciona a Pi a luta pela sobrevivência, transformando-o, ao longo do percurso, em um guerreiro com determinação suficiente para enfrentar, conviver e domar seus monstros. A ilha carnívora também tinha piscinas e, se de dia eram inofensivas, pela noite eram letais. Transformavam-se, assim como Pi. Mas um dia aquilo iria mata-lo (ou o tigre) e com isso decidiu seguir viagem em guerra contra a solidão. Um protegeria o outro até o dia da salvação.
Impressionantes e belíssimas paisagens ou enquadramentos e incrível tecnologia que proporcionou a veracidade de Richard Parker e os outros animais. Uma riquíssima e fantástica história com uma mensagem fascinante. Certamente merecedor de todos os prêmios que vem conquistando.