Estrelado por Rosanne Mulholland - sim, a 'professora Helena de Carrossel' - e dirigido por Carlos Reichenbach, "Falsa Loura" tenta ser um 'conto de fadas' às avessas, em que o reino feliz e o príncipe encantado são trocados pelo chão de fábrica e a objetificação sexual. O filme tem um ponto e poderia ter funcionado, se não fosse o fato do roteiro não saber para onde ir, suas situações serem pouco envolventes, a maioria das atuações serem ruins e sua protagonista ser extremamente antipática. O longa-metragem não consegue ter carisma suficiente para prender o interesse, e seus 100 minutos soam muito mais longos do que de fato são. Para completar, a direção de Reichenbach - um cineasta brasileiro cheio de 'altos' e 'baixos' - se encontra pessimamente inspirada, lembrando em alguns momentos a direção de um comercial de TV. Mulholland bem que poderia ter seguido o exemplo de Xuxa e ter pedido para o filme ser cancelado do mercado. Talvez fosse um bem para a sociedade em geral.
Clássico da pornochanchada brasileira, "A Dama do Lotação" é baseado em um conto de Nelson Rodrigues. Pouco ambicioso, e com um elenco repleto de personagens unidimensionais e rasos, o filme, ao menos, entrega com eficiência aquilo que se propõe: a lascívia de uma mulher devassa, que procura satisfazer na rua aquilo que não lhe causa desejo dentro de casa. Praticamente um "A Bela da Tarde" brasileiro, "A Dama do Lotação" mantém atual a sua crítica da visão machista da sociedade sobre a sexualidade feminina (se a relação fosse a inversa, certamente não chocaria ninguém). Interessante que a única concessão que o longa parece fazer à censura da época é deixar a sugestão de que pelo menos uma das traições da protagonista (a mais grave) teria ocorrido apenas em seus sonhos. Por sua vez, dá para entender perfeitamente porquê Sonia Braga se tornou um ícone deste gênero cinematográfico, linda, perfeita, talentosa e absurdamente sensual. Nessa época, ela era uma deusa.
Retratando a juventude islandesa rebelde, pobre e com pouquíssimas expectativas sobre o futuro, "Berdreymi" é um filme que se mantém num tom sombrio constante. É como se a sugestão da tragédia pairasse sobre a vida daqueles indivíduos quase como uma certeza iminente e inevitável, a incógnita residindo apenas sobre o 'quando'. O longa é um estudo social pesadíssimo sobre os habitantes que povoam aquele microverso gélido e frio, mas, ao mesmo tempo, inspira uma nota tímida de esperança no pequeno rastro de calor que se forma a partir da amizade improvável de quatro meninos, garotos esses que parecem oscilar entre os dois lados do espectro do bullying constantemente. Encontram em suas pequenas brutalidades ativas do dia-a-dia, uma forma de responder as grandes brutalidades do mundo sofridas. O cineasta Arnar Guðmundsson faz um registro consistente e pesado de seus psicológicos atormentados e da violência jovem que se retroalimenta. É sufocante, denso e difícil. Mas também humano e necessário.
O mais surpreendente em 'Barbie' é notar como a própria Mattel meio que reconhece as críticas ao seu legado, ao ter ajudado a construir um estereótipo feminino completamente desvirtuado da realidade. Ao mesmo tempo que faz um mea-culpa, tenta se explicar a medida que mostra que 'Barbie' não é a representação do ideal, tampouco do modelo a ser seguido, mas sim uma inspiração feminina para que cada mulher - cada pessoa, porque não - possa ser melhor sendo quem ela de fato é, seja médica, astronauta, ou simplesmente mãe dona-de-casa. É aí que reside o brilhantismo do roteiro, que, ainda que recorra a uma estrutura maniqueísta principalmente em sua segunda metade, consegue construir um estudo de personagem palpável em torno de uma boneca que demonstra uma complexidade psicológica paradoxal, mas completamente apropriada as angústias dos tempos modernos. "Barbie", de Greta Gerwig, não é uma comédia - e foi um erro o filme ter sido vendido dessa forma - mas sim uma jornada de autodescoberta leve e reflexiva (o próprio início remetendo a "2001 - Uma Odisseia no Espaço" é uma pista nesse sentido). Ajuda a alcançar seu intento o carisma absurdo de Margot Robbie - que, convenhamos, não poderia ter sido melhor escalada, ela é a Barbie perfeita. Por outro lado, o filme não é de todo infalível, pecando em alguns momentos pelo exagero - o excesso de números musicais, por exemplo, impacientam. Mas no todo é uma obra inesperadamente ambiciosa que espanta e convence.
Cinebiografia do criador da bomba atômica, "Oppenheimer" é, claramente, um filme de nicho. Adoradores de história, política e física, certamente curtirão a reconstrução da trajetória do personagem como principal expoente do projeto Manhattan, intercalado pelas investigações do governo macartista, anos depois, pelos supostos envolvimentos do cientista com os comunistas. Nomes importantíssimos da ciência são citados, como Heisenberg (do Princípio da Incerteza) , Bohr (o do modelo atômico) e, claro, Albert Einstein (de praticamente a porra toda). Enquanto construção tridimensional do personagem, o filme funciona - mesmo que, a meu ver, acentue uma culpa e uma consciência moral do biografado que talvez não condiga tanto assim com o personagem real. O elenco de peso não deixa nada a desejar - e, como curiosidade, talvez traga a escolha de casting mais adequada possível para o ator Casey Affleck - já a direção de Nolan consegue conduzir a tensão em um ritmo crescente até mesmo nas cenas de 'gabinete'. Mas, como disse, é um filme intimista e de nicho, e se você estava esperando algum blockbuster explosivo sobre as bombas de Hiroshima e Nagasaki, quase como uma espetacularização da desgraça, pode tirar o cavalinho da chuva. Esse filme não é entretenimento. Esse filme não é para você.
Nada contra filmes em aberto, mas desde que o longa ofereça algum mínimo de gramática narrativa para sustentar a sua trama. "Ninguém Vai Te Salvar" até começa de forma promissora, com algumas construções interessantes de tensão, mas depois que percebemos que o filme nada mais é do que uma hora e meia da protagonista fugindo de ETs sem nenhum desenvolvimento de personagem ou de roteiro aparente, o longa acaba ressoando o quão vazio ele é. É tão fraco e insípido que nem suporte direito para ser interpretado como uma alegoria ele fornece. A atriz Kaitlyn Dever até se esforça com o pouco que lhe dão, mas é difícil, para mim, se importar com alguém que não é um personagem, e sim um mero esboço de um. Nem os flertes com 'Sinais', 'Guerra dos Mundos' e 'Invasores de Corpos' salvam, porque só o que lembram é um filme sem personalidade própria que apenas copia conceitos que outros filmes fizeram de forma bem melhor que ele. Visualmente ele é bem dirigido, reconheço, mas enquanto 'terror sci-fi', receio que até mesmo 'Paul - O Alien Fugitivo' me deixa mais assustado.
O final merece um aparte. Sério mesmo que depois deles parasitarem inúmeras pessoas sem piedade e ela ter matado três deles, os aliens resolvem poupar a menina só porque... "leram a mente da garota e descobriram que ela se sente mal por ter matado a amiga com uma pedrada, e aí então ficaram com peninha??!" Pqp, parece que acabei de ver uma daquelas reviravoltas mequetrefes do Shyamalan... Se vocês gostam de ter suas inteligências subestimadas, à vontade. Eu não.
Segundo filme da atriz Clea DuVall na função de diretora - ainda não assisti sua estreia na carreira com "A Intervenção" - "Alguém Avisa?" é uma comédia natalina da Netflix com um quê de "A Gaiola das Loucas" às avessas. Ao invés de serem os pais que precisam esconder seu relacionamento, são as próprias filhas - o casal protagonista - que tentam ofuscar a verdade de sua família conservadora, superficial e com contatos políticos. A trama é perigosamente clichê, seguindo a estrutura típica de uma comédia em que alguém precisa dar vida a uma farsa, mas acaba desandando tudo com o desenvolvimento das situações. Porém, nas poucas vezes que o filme tenta ser engraçado, ele fracassa. Mas o grande problema, na verdade, é que apesar das meninas estarem competentes em suas atuações, o roteiro jamais permite que o casal formado por Kristen Stewart e Mackenzie Davis conquiste a torcida do público. De fato, corroborando o que outras pessoas já comentaram aqui, a personagem de Aubrey Plaza surge lá pelas tantas como uma alternativa válida e com muito mais química com a Kristen Stewart, do que a Mackenzie. Se não fosse pela necessidade da Netflix de entregar uma farofada óbvia, com certeza o desfecho desse filme deveria ser outro.
Em um ritmo frenético, "Mambo Italiano" diverte com suas tiradas espirituosas e criativas (gosto particularmente bastante da ideia de um "Teleajuda Gay"), ao mesmo tempo que tece uma crítica funcional em forma de caricatura ao conservadorismo cultural. Tem momentos de humor bem afinados, e uma certa inocência que soa proposital. A escolha da comunidade italiana como alvo de suas alfinetadas compensa por poder proporcionar ao filme a presença sempre bem-vinda de Paul Sorvino, como o pai do protagonista. A direção de Emile Gaudreault, com sua montagem bem executada, demonstra saber usar o orçamento visivelmente limitado com eficiência. É uma comédia bem 'feel good movie' que, ainda que não seja exatamente marcante, entretém.
A princípio "Alex Strangelove" parece ser uma comédia romântica que vai contra as expectativas, muito por conta de seu desfecho soar estranhamente insatisfatório, com um final feliz para um casal até ali muito mal desenvolvido. Mas foi só quando entendi que o filme não era sobre o início de um romance, mas sim sobre o término de um, que percebi que o seu arco de roteiro principal, afinal, se completava, sim, muito bem. O longa é uma complicada e confusa jornada de auto-aceitação adolescente da sexualidade, dolorosa para quem se é, mas ainda tão dolorosa e necessária para aqueles a quem se amam. Nessa ótica, os atores Daniel Doheny e Madeleine Weinstein seguram muito bem a barra de terem que lidar com os sentimentos gradualmente conflituosos de seus personagens - de culpa, mágoa, frustração, mas também, amor incondicional, e querer ver o outro bem. Há alguns desvios desnecessários no meio do caminho - o amigo engraçadinho e a subtrama do sapo alucinógeno eram completamente descartáveis - mas a proposta, como um todo, funciona.
Se fosse só um filme nacional focado numa protagonista adolescente trans, "Alice Júnior" já mereceria a atenção por sua singularidade. Felizmente, para além disso, o filme ainda é muito bom. A galera normativa poderá encarar os conflitos que a protagonista enfrenta em seu novo lar como coisas pequenas, mas são justamente esses os grandes obstáculos sociais que pessoas trans precisam superar todos os dias em um mundo tão marcado pelo preconceito. A direção de Gil Baroni é boa, consegue dar um dinamismo a uma história contada a partir da energia adolescente, e a decisão estilística de marcar as expressividades do personagens na tela com "caneta glitter" dá um charme especial à obra. A protagonista Anne Celestino, é bom que se diga, não é exatamente digna de um Oscar, mas cativa por sua simpatia. O roteiro é simples e funcional, mas peca, talvez, pela ingenuidade - ou, quem sabe, otimismo - na forma brusca como a heroína conquista a simpatia das demais colegas de classe. Seja como for, fico contente em poder constatar que "Alice Júnior" é um filme que dá ORGULHO ao cinema nacional, em todos os sentidos da importância dessa palavra.
Uma boa surpresa. Dirigido por Jean-Marc Vallée - de "Clube de Compras Dallas" - "C.R.A.Z.Y" é mais do que um estudo de personagem, é uma jornada de auto-descoberta. Flertando com o alegórico, mas mantendo o pé no chão, o longa acompanha o quarto de cinco irmãos que, desde tenra idade, precisa lidar com os dilemas internos sobre a sua sexualidade e, ao mesmo tempo, aprender a crescer junto de seus irmãos, de seu pai conservador e de sua mãe religiosa. E o mais satisfatório é perceber que, apesar dos personagens trazerem essas características, o roteiro não permite jamais que elas os definam, trazendo situações complexas da vida de uma família que, acima das diferenças, se ama. Sim, há conflitos, mas há também espaço para o recomeço, a tentativa e o perdão. É uma bela história - individual e familiar - acompanhada por uma ótima trilha sonora que pega o melhor da década de 70, de Rolling Stones a David Bowie.
Vamos abster o fato de que a florista do casamento fica para a festa que ela não foi convidada, se serve do ponche e, ainda por cima, dança com os convidados que ela nunca viu antes. "Imagine Eu & Você" é uma comédia romântica que segue a risca todos os requisitos típicos da checklist do gênero, não inovando em absolutamente nada nesse quesito - a não ser se levarmos em conta o fato do casal protagonista serem duas moças. Até mesmo o velho clichê do personagem que tem que correr para impedir que o amor da sua vida saia da cidade se repete aqui na maior cara-de-pau. Em que pese isso, o motivo de boa parte do filme funcionar se deve ao carisma e a boa química que Lena Headey e Piper Perabo apresentam em cena, convencendo-nos da sua 'paixão-relâmpago', bem como da resignação carinhosa que o personagem de Matthew Goode demonstra ter. Apesar de engessada, essa comédia cativa e provoca um leve quentinho no coração.
"The Christmas Setup" sofre de um mal de breguice açucarada enjoativa incurável. Se a voz anasalada de Fran Drescher se abrisse mais uma vez de excitação pela família estar toda reunida e ela estar juntando pombinhos e "blablabla corações, corações, fofurice, fofurice, fofurice, blablabla", enquanto está 'lambendo' os filhos, eu provavelmente me dava um tiro. É bobinho, é fofinho, é bonitinho, é grudentinho, dá vontade de apertar, e é tão esquecível quanto um comercial de biscoitos natalinos. A direção televisiva de baixo orçamento de Pat Mills remete a algum especial pra TV a cabo (o que, aparentemente, o filme de fato é). Os diálogos piegas fazem os 84 minutos durarem uma eternidade. Passadores de pano dirão que o filme é bom porque é a primeira 'comédia romântica natalina homossexual'. Mas é justamente por isso - se é que isso é mesmo verdade - que o filme merecia ter uma maior substância que a levasse para além da pura glicose fílmica.
Logo no início de 'Mais Que Amigos' o protagonista faz um monólogo reclamando dos estereótipos homossexuais criados por uma sociedade predominantemente hetero para rotulá-los. É irônico, e contraditório portanto, que lá pelas tantas o próprio filme caia nesses mesmos estereótipos superficiais para construir seus personagens e sua historinha clichê, quase como se admitisse para o mundo essa imagem pré-concebida. A trama de romance batida até conseguiria ser bonitinha, mas o personagem de Billy Eichner é tão insuportavelmente chato e antipático que inviabiliza qualquer torcida por ele. Depois de uma hora de duração entendemos a amargura do personagem, mas já é tarde demais para criarmos qualquer empatia por um ser bitolado, arrogante, egocêntrico, que tenta impor sua visão de mundo aos outros e tenta esconder suas fragilidades e ignorâncias em uma imagem de falsa superioridade, que causa dó. Por mais que o desenlace possa soar fofinho, receio que torci o filme inteiro contra o 'final feliz' do casal principal. Por outro lado, a direção de Nicholas Stoller é, no mínimo, competente, mas os alívios cômicos do filme não funcionam.
Em certo momento de 'Booksmart' - comédia adolescente dirigida por Olivia Wilde - uma determinada personagem fala para outro que o problema dele é 'tentar demais'. Ironicamente, essa mesma sugestão também valeria para o longa-metragem em questão que se esforça em recorrer histericamente a tudo e a qualquer coisa que esteja a seu alcance para tentar fazer humor. É como tentar matar uma mosca usando um canhão. No fim, as piadas realmente boas se diluem na confusão narrativa e as risadas são relativamente poucas. Ainda assim, imagino que a juventude atual consiga assistir o filme e se identificar um pouco com os seus personagens, mesmo que a maioria deles sejam apenas caricaturas. E o longa ainda ganha pontos por retratar com naturalidade o interesse sexual feminino - pouquíssimo explorado em comédias sexuais adolescentes, geralmente contadas a partir do ponto de vista dos meninos.
"The Half of It" é basicamente uma versão de 'Cyrano de Bergerac' LGBT, adolescente e voltada para a geração Z. Constrói seus personagens com relativa consistência, e as referências literárias e cinematográficas garantem algum estofo intelectual. Entretanto, parece meio perdido as vezes, e tenta entrar em discussões pertinentes mas acaba soando apenas superficial - como a questão da orientação sexual vista pela religiosidade, algo aparentemente relevante para as pessoas daquela comunidade, mas que só é 'arranhado' pelo roteiro. O triângulo amoroso formado pela história, por sua vez, funciona em parte, ainda que a mudança nas resoluções de um determinado personagem próximo ao terceiro ato soe meio brusca. Na verdade, a forma como o filme retrata os relacionamentos adolescentes é meio vaga, e talvez essa 'nebulosidade' fosse a proposta original do longa, mostrando como os sentimentos pelo próximo parecem ser meio incertos e confusos nessa idade. É competente naquilo que entrega, e só.
Não costumo apreciar filmes com temáticas adolescente de colegial, mas devo reconhecer que "Com Amor, Simon" faz um excelente trabalho de composição de conflitos e dilemas na construção de seu personagem principal. Tendo que lidar com questões envolvendo sua própria identidade é de se esperar que o filme acabe servindo como peça fundamental de empatia para muitos jovens que se veem na mesma situação delicada de seu protagonista. O filme não trata da questão do preconceito, pelo menos não de forma aprofundada, mas nem precisa. O foco da proposta aqui é a 'aceitação interna', muito mais do que a social - o próprio filme faz um comentário sobre isso ao retratar a mãe do protagonista como uma psicóloga. Os coadjuvantes também são bem explorados e seus relacionamentos acabam sendo funcionais para a trama. E a direção se arrisca em alguns momentos bem inspirados e engraçados - como no 'musical literal' que o filme se torna quando Simon imagina sua vida na faculdade. Consistente, envolvente e relevante.
Trocando a França pela breguice da Flórida, "The Birdcage" é um dos poucos remakes americanos de filmes de outra nacionalidade que podem ser considerados tão bons - ou, ao menos, que fazem jus - ao original. Ainda que mantenha, basicamente, a mesma história, o longa-metragem consegue construir uma identidade própria visual, e tateia alcançar novos níveis de ironia em seu humor (principalmente nas aprovações que o senador republicano vivido por Gene Hackman passa a ter pela 'mãe' de seu futuro genro). A direção de Mike Nichols é mais inspirada do que a de Édouard Molinaro, e o casal de protagonistas interpretados por Robin Williams e Nathan Lane nada deixam a desejar com relação aos originais vividos por Ugo Tognazzi e Michel Serrault. Todavia, o desfecho apressado sem um clímax de humor continua sendo o problema - aqui, agravado pela estranha passividade do personagem de Hackman frente as revelações da trama, seria bem mais engraçado se ele reagisse emocionalmente com as descobertas. Seja como for, é uma boa refilmagem e, considerando o puritanismo conservador ser historicamente muito mais forte nos EUA do que na França, geograficamente justificável.
Comédia francesa da década de 70, "A Gaiola das Loucas" diverte com seu humor marginal e deliciosamente despudorado. Um filme ainda necessário, que traz uma leveza a um assunto tabu sem motivo para ser. O humor é garantido pelas boas performances de Michel Serrault e Ugo Tonazzi, que fazem um casal homossexual que 'tentam' manter as aparências em uma noite em que tudo parece gradualmente dar errado. As alfinetadas aos defensores da 'moralidade e dos bons costumes' que habitam o meio político são bem colocadas, e se encaixam perfeitamente bem ainda hoje num mundo que, de forma assustadora, parece possuir um conservadorismo cada vez mais acentuado. Peca apenas, talvez, por um desfecho excessivamente apressado, poderia ter explorado mais as consequências insanas do terceiro ato. Mas talvez, pela época, o pouco que o filme faz já seja muito.
Ok, vou dar o braço a torcer. É o modo como o roteiro utiliza os conceitos deixados pelo multiverso do Homem-Aranha nos filmes anteriores de uma forma surpreendentemente coesa, criativa e funcional, que "Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa" merece a maioria dos seus pontos. Ver os vilões antigos e a dinâmica bem afinada entre os três Peter Parker garante a sessão-pipoca (e faz até a gente perdoar a existência dos equivocados filmes estrelados pelo Andrew Garfield). A participação do Doutor Estranho também garante alguns bons momentos. Ainda assim, Tom Holland continua com o problema de ser o Homem-Aranha mais dependente da ajuda dos outros para resolver seus desafios (ao menos, aqui, eles arrumam uma boa desculpa para isso acontecer), e o desenvolvimento dos demais personagens é nulo. Visualmente o filme é um espetáculo, e dramaticamente é um pouquinho mais consistente do que os anteriores dentro do MCU. Já as piadinhas, no entanto, quando não estão tirando sarro dos outros filmes, só são apenas bobocas. Mas diverte e entretém, até mais do que eu esperava.
Existe um ditado que diz que é melhor pecar por excesso do que por falta. No caso de "Homem-Aranha 3" essa máxima não é verdadeira. Claramente o roteiro desse terceiro capítulo sofre pela arrogância e ambição dos produtores de quererem meter o maior número de coisas possíveis sobre o personagem em um filme só. O resultado é um filme bagunçado, inchado, longo, obeso. É tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, e nenhuma delas tem o peso dramático narrativo que se esperaria, que a tudo acompanhamos inertes. O desespero dos roteiristas é tamanho que eles arranjam uma desculpa completamente esfarrapada para 'anular' temporariamente um dos melhores ganchos do filme anterior, e assim poder dar espaço para as outras sub-tramas insípidas. Os efeitos especiais são os melhores da franquia, isso é inegável, mas de que adianta se a história não se sustenta. Quanto a isso há até um gostinho de 'vingancinha' do Sam Raimi: era intenção original dele usar o Homem-Areia como capanga e o Abutre como vilão principal, mas o Venom foi imposição do estúdio. Raimi fez um Homem-Areia graficamente competente, mas um Venom ridículo, forçado, nada ameaçador. Os conflitos de identidade de Parker soariam convincentes se o filme pudesse respirar direito, e pra quê trazer de volta totalmente de graça a questão do tio Ben?. "Homem-Aranha 3" é uma sequência de escolhas equivocadas, um filme que tenta abocanhar mais coisas do que consegue e o único resultado disso foi afastar Tobey Maguire do uniforme do personagem mais cedo do que ele merecia.
Certamente, o melhor filme da trilogia. Livre das amarras de ter que fazer uma história de origem e ainda sem a pressão dos produtores que estragariam o terceiro filme, Sam Raimi teve a liberdade quase plena de contar a história da forma como queria. E o resultado é uma continuação cativante, original, consistente e equilibrada tanto na aventura quanto no desenvolvimento dos dilemas particulares dos personagens. A crise de identidade de Peter Parker é palpável e bem construída, faz sentido dentro da trajetória do herói e leva para algum lugar. O desenvolvimento dos coadjuvantes - Mary Jane, Harry Osborn, Tia May (cada um com seu conflito particular) - também são bem trabalhados. E o Doutor Octopus segue sendo o vilão mais bem aproveitado da franquia. As cenas de ação também são muito bem feitas, em especial a fantástica cena de luta em cima do metrô, perto do clímax. Em tudo "Homem-Aranha 2" dá uma aula de como se fazer um bom filme de super-herói, um entretenimento com consistência, substância. O que é mais do que se pode falar de 80% dos filmes meramente 'plásticos' do MCU, habitado por figuras que são nada mais do que manequins artificiais de vitrine.
Não importa o quanto tentem, o 'Homem-Aranha' de Tobey Maguire continuará sendo o definitivo nos cinemas pra mim. Enquanto os filmes estrelados por Andrew Garfield são extremamente aborrecidos, e a versão de Tom Holland é demasiadamente dependente dos outros personagens do MCU para resolver seus problemas, a trilogia dirigida por Sam Raimi conquista um equilíbrio muito bom entre personagens carismáticos e roteiros que funcionam sozinhos (mesmo que o terceiro capítulo seja bem problemático). "Homem-Aranha", de 2002, é um marco do cinema de super-herói, trazendo e adaptando para uma linguagem mais moderna elementos que já haviam sido feitos em 'Superman', do Richard Donner e 'Batman' do Tim Burton. As cenas de ação ainda funcionam relativamente bem para a época, mesmo o CGI ficando mais evidente hoje. Entretanto, devo apontar que o traje caricato do Duende Verde - que mais parece algum vilão exagerado dos Power Rangers - envelheceu muito, muito mal. Felizmente, por trás da máscara temos Willem Defoe que, ao menos, convence no tom de ameaça insana que o filme necessitava para funcionar.
É inegável a qualidade cinematográfica das cenas de ação da franquia "John Wick". Afinal, é exclusivamente por conta delas que a série teve fôlego para chegar ao quarto capítulo. Já a história, por sua vez, tende a ser um perigoso 'mais do mesmo', o que faz com que os filmes isoladamente considerados se confundam na nossa memória e já não sabemos mais qual é qual. Felizmente, o diretor Chad Stahelski e o astro (e também produtor do filme) Keanu Reeves) parecem finalmente ter entendido isso, e após um terceiro capítulo que enchia os olhos tanto quanto enchia linguiça, deram um ponto final a trajetória do assassino vingativo. O ato final é satisfatório e competente naquilo que a série sempre soube fazer de melhor, e ainda servirá como referência - assim como os episódios anteriores - para os cineastas estreantes que queiram aprender sobre como fazer sequências de pancadaria de cair o queixo. Funciona na sua proposta e entrega aquilo que se espera dele, e só.
Falsa Loura
2.9 140Estrelado por Rosanne Mulholland - sim, a 'professora Helena de Carrossel' - e dirigido por Carlos Reichenbach, "Falsa Loura" tenta ser um 'conto de fadas' às avessas, em que o reino feliz e o príncipe encantado são trocados pelo chão de fábrica e a objetificação sexual. O filme tem um ponto e poderia ter funcionado, se não fosse o fato do roteiro não saber para onde ir, suas situações serem pouco envolventes, a maioria das atuações serem ruins e sua protagonista ser extremamente antipática. O longa-metragem não consegue ter carisma suficiente para prender o interesse, e seus 100 minutos soam muito mais longos do que de fato são. Para completar, a direção de Reichenbach - um cineasta brasileiro cheio de 'altos' e 'baixos' - se encontra pessimamente inspirada, lembrando em alguns momentos a direção de um comercial de TV. Mulholland bem que poderia ter seguido o exemplo de Xuxa e ter pedido para o filme ser cancelado do mercado. Talvez fosse um bem para a sociedade em geral.
A Dama do Lotação
3.1 129Clássico da pornochanchada brasileira, "A Dama do Lotação" é baseado em um conto de Nelson Rodrigues. Pouco ambicioso, e com um elenco repleto de personagens unidimensionais e rasos, o filme, ao menos, entrega com eficiência aquilo que se propõe: a lascívia de uma mulher devassa, que procura satisfazer na rua aquilo que não lhe causa desejo dentro de casa. Praticamente um "A Bela da Tarde" brasileiro, "A Dama do Lotação" mantém atual a sua crítica da visão machista da sociedade sobre a sexualidade feminina (se a relação fosse a inversa, certamente não chocaria ninguém). Interessante que a única concessão que o longa parece fazer à censura da época é deixar a sugestão de que pelo menos uma das traições da protagonista (a mais grave) teria ocorrido apenas em seus sonhos. Por sua vez, dá para entender perfeitamente porquê Sonia Braga se tornou um ícone deste gênero cinematográfico, linda, perfeita, talentosa e absurdamente sensual. Nessa época, ela era uma deusa.
Belas Criaturas
3.9 11Retratando a juventude islandesa rebelde, pobre e com pouquíssimas expectativas sobre o futuro, "Berdreymi" é um filme que se mantém num tom sombrio constante. É como se a sugestão da tragédia pairasse sobre a vida daqueles indivíduos quase como uma certeza iminente e inevitável, a incógnita residindo apenas sobre o 'quando'. O longa é um estudo social pesadíssimo sobre os habitantes que povoam aquele microverso gélido e frio, mas, ao mesmo tempo, inspira uma nota tímida de esperança no pequeno rastro de calor que se forma a partir da amizade improvável de quatro meninos, garotos esses que parecem oscilar entre os dois lados do espectro do bullying constantemente. Encontram em suas pequenas brutalidades ativas do dia-a-dia, uma forma de responder as grandes brutalidades do mundo sofridas. O cineasta Arnar Guðmundsson faz um registro consistente e pesado de seus psicológicos atormentados e da violência jovem que se retroalimenta. É sufocante, denso e difícil. Mas também humano e necessário.
Barbie
3.9 1,6K Assista AgoraO mais surpreendente em 'Barbie' é notar como a própria Mattel meio que reconhece as críticas ao seu legado, ao ter ajudado a construir um estereótipo feminino completamente desvirtuado da realidade. Ao mesmo tempo que faz um mea-culpa, tenta se explicar a medida que mostra que 'Barbie' não é a representação do ideal, tampouco do modelo a ser seguido, mas sim uma inspiração feminina para que cada mulher - cada pessoa, porque não - possa ser melhor sendo quem ela de fato é, seja médica, astronauta, ou simplesmente mãe dona-de-casa. É aí que reside o brilhantismo do roteiro, que, ainda que recorra a uma estrutura maniqueísta principalmente em sua segunda metade, consegue construir um estudo de personagem palpável em torno de uma boneca que demonstra uma complexidade psicológica paradoxal, mas completamente apropriada as angústias dos tempos modernos. "Barbie", de Greta Gerwig, não é uma comédia - e foi um erro o filme ter sido vendido dessa forma - mas sim uma jornada de autodescoberta leve e reflexiva (o próprio início remetendo a "2001 - Uma Odisseia no Espaço" é uma pista nesse sentido). Ajuda a alcançar seu intento o carisma absurdo de Margot Robbie - que, convenhamos, não poderia ter sido melhor escalada, ela é a Barbie perfeita. Por outro lado, o filme não é de todo infalível, pecando em alguns momentos pelo exagero - o excesso de números musicais, por exemplo, impacientam. Mas no todo é uma obra inesperadamente ambiciosa que espanta e convence.
Oppenheimer
4.0 1,1KCinebiografia do criador da bomba atômica, "Oppenheimer" é, claramente, um filme de nicho. Adoradores de história, política e física, certamente curtirão a reconstrução da trajetória do personagem como principal expoente do projeto Manhattan, intercalado pelas investigações do governo macartista, anos depois, pelos supostos envolvimentos do cientista com os comunistas. Nomes importantíssimos da ciência são citados, como Heisenberg (do Princípio da Incerteza) , Bohr (o do modelo atômico) e, claro, Albert Einstein (de praticamente a porra toda). Enquanto construção tridimensional do personagem, o filme funciona - mesmo que, a meu ver, acentue uma culpa e uma consciência moral do biografado que talvez não condiga tanto assim com o personagem real. O elenco de peso não deixa nada a desejar - e, como curiosidade, talvez traga a escolha de casting mais adequada possível para o ator Casey Affleck - já a direção de Nolan consegue conduzir a tensão em um ritmo crescente até mesmo nas cenas de 'gabinete'. Mas, como disse, é um filme intimista e de nicho, e se você estava esperando algum blockbuster explosivo sobre as bombas de Hiroshima e Nagasaki, quase como uma espetacularização da desgraça, pode tirar o cavalinho da chuva. Esse filme não é entretenimento. Esse filme não é para você.
Ninguém Vai Te Salvar
3.2 565 Assista AgoraNada contra filmes em aberto, mas desde que o longa ofereça algum mínimo de gramática narrativa para sustentar a sua trama. "Ninguém Vai Te Salvar" até começa de forma promissora, com algumas construções interessantes de tensão, mas depois que percebemos que o filme nada mais é do que uma hora e meia da protagonista fugindo de ETs sem nenhum desenvolvimento de personagem ou de roteiro aparente, o longa acaba ressoando o quão vazio ele é. É tão fraco e insípido que nem suporte direito para ser interpretado como uma alegoria ele fornece. A atriz Kaitlyn Dever até se esforça com o pouco que lhe dão, mas é difícil, para mim, se importar com alguém que não é um personagem, e sim um mero esboço de um. Nem os flertes com 'Sinais', 'Guerra dos Mundos' e 'Invasores de Corpos' salvam, porque só o que lembram é um filme sem personalidade própria que apenas copia conceitos que outros filmes fizeram de forma bem melhor que ele. Visualmente ele é bem dirigido, reconheço, mas enquanto 'terror sci-fi', receio que até mesmo 'Paul - O Alien Fugitivo' me deixa mais assustado.
O final merece um aparte. Sério mesmo que depois deles parasitarem inúmeras pessoas sem piedade e ela ter matado três deles, os aliens resolvem poupar a menina só porque... "leram a mente da garota e descobriram que ela se sente mal por ter matado a amiga com uma pedrada, e aí então ficaram com peninha??!" Pqp, parece que acabei de ver uma daquelas reviravoltas mequetrefes do Shyamalan... Se vocês gostam de ter suas inteligências subestimadas, à vontade. Eu não.
Alguém Avisa?
3.5 342 Assista AgoraSegundo filme da atriz Clea DuVall na função de diretora - ainda não assisti sua estreia na carreira com "A Intervenção" - "Alguém Avisa?" é uma comédia natalina da Netflix com um quê de "A Gaiola das Loucas" às avessas. Ao invés de serem os pais que precisam esconder seu relacionamento, são as próprias filhas - o casal protagonista - que tentam ofuscar a verdade de sua família conservadora, superficial e com contatos políticos. A trama é perigosamente clichê, seguindo a estrutura típica de uma comédia em que alguém precisa dar vida a uma farsa, mas acaba desandando tudo com o desenvolvimento das situações. Porém, nas poucas vezes que o filme tenta ser engraçado, ele fracassa. Mas o grande problema, na verdade, é que apesar das meninas estarem competentes em suas atuações, o roteiro jamais permite que o casal formado por Kristen Stewart e Mackenzie Davis conquiste a torcida do público. De fato, corroborando o que outras pessoas já comentaram aqui, a personagem de Aubrey Plaza surge lá pelas tantas como uma alternativa válida e com muito mais química com a Kristen Stewart, do que a Mackenzie. Se não fosse pela necessidade da Netflix de entregar uma farofada óbvia, com certeza o desfecho desse filme deveria ser outro.
Mambo Italiano
3.8 39Em um ritmo frenético, "Mambo Italiano" diverte com suas tiradas espirituosas e criativas (gosto particularmente bastante da ideia de um "Teleajuda Gay"), ao mesmo tempo que tece uma crítica funcional em forma de caricatura ao conservadorismo cultural. Tem momentos de humor bem afinados, e uma certa inocência que soa proposital. A escolha da comunidade italiana como alvo de suas alfinetadas compensa por poder proporcionar ao filme a presença sempre bem-vinda de Paul Sorvino, como o pai do protagonista. A direção de Emile Gaudreault, com sua montagem bem executada, demonstra saber usar o orçamento visivelmente limitado com eficiência. É uma comédia bem 'feel good movie' que, ainda que não seja exatamente marcante, entretém.
Alex Strangelove - O Amor Pode Ser Confuso
3.2 365 Assista AgoraA princípio "Alex Strangelove" parece ser uma comédia romântica que vai contra as expectativas, muito por conta de seu desfecho soar estranhamente insatisfatório, com um final feliz para um casal até ali muito mal desenvolvido. Mas foi só quando entendi que o filme não era sobre o início de um romance, mas sim sobre o término de um, que percebi que o seu arco de roteiro principal, afinal, se completava, sim, muito bem. O longa é uma complicada e confusa jornada de auto-aceitação adolescente da sexualidade, dolorosa para quem se é, mas ainda tão dolorosa e necessária para aqueles a quem se amam. Nessa ótica, os atores Daniel Doheny e Madeleine Weinstein seguram muito bem a barra de terem que lidar com os sentimentos gradualmente conflituosos de seus personagens - de culpa, mágoa, frustração, mas também, amor incondicional, e querer ver o outro bem. Há alguns desvios desnecessários no meio do caminho - o amigo engraçadinho e a subtrama do sapo alucinógeno eram completamente descartáveis - mas a proposta, como um todo, funciona.
Alice Júnior
3.8 144Se fosse só um filme nacional focado numa protagonista adolescente trans, "Alice Júnior" já mereceria a atenção por sua singularidade. Felizmente, para além disso, o filme ainda é muito bom. A galera normativa poderá encarar os conflitos que a protagonista enfrenta em seu novo lar como coisas pequenas, mas são justamente esses os grandes obstáculos sociais que pessoas trans precisam superar todos os dias em um mundo tão marcado pelo preconceito. A direção de Gil Baroni é boa, consegue dar um dinamismo a uma história contada a partir da energia adolescente, e a decisão estilística de marcar as expressividades do personagens na tela com "caneta glitter" dá um charme especial à obra. A protagonista Anne Celestino, é bom que se diga, não é exatamente digna de um Oscar, mas cativa por sua simpatia. O roteiro é simples e funcional, mas peca, talvez, pela ingenuidade - ou, quem sabe, otimismo - na forma brusca como a heroína conquista a simpatia das demais colegas de classe. Seja como for, fico contente em poder constatar que "Alice Júnior" é um filme que dá ORGULHO ao cinema nacional, em todos os sentidos da importância dessa palavra.
C.R.A.Z.Y. - Loucos de Amor
4.2 712Uma boa surpresa. Dirigido por Jean-Marc Vallée - de "Clube de Compras Dallas" - "C.R.A.Z.Y" é mais do que um estudo de personagem, é uma jornada de auto-descoberta. Flertando com o alegórico, mas mantendo o pé no chão, o longa acompanha o quarto de cinco irmãos que, desde tenra idade, precisa lidar com os dilemas internos sobre a sua sexualidade e, ao mesmo tempo, aprender a crescer junto de seus irmãos, de seu pai conservador e de sua mãe religiosa. E o mais satisfatório é perceber que, apesar dos personagens trazerem essas características, o roteiro não permite jamais que elas os definam, trazendo situações complexas da vida de uma família que, acima das diferenças, se ama. Sim, há conflitos, mas há também espaço para o recomeço, a tentativa e o perdão. É uma bela história - individual e familiar - acompanhada por uma ótima trilha sonora que pega o melhor da década de 70, de Rolling Stones a David Bowie.
Imagine Eu e Você
3.7 743Vamos abster o fato de que a florista do casamento fica para a festa que ela não foi convidada, se serve do ponche e, ainda por cima, dança com os convidados que ela nunca viu antes. "Imagine Eu & Você" é uma comédia romântica que segue a risca todos os requisitos típicos da checklist do gênero, não inovando em absolutamente nada nesse quesito - a não ser se levarmos em conta o fato do casal protagonista serem duas moças. Até mesmo o velho clichê do personagem que tem que correr para impedir que o amor da sua vida saia da cidade se repete aqui na maior cara-de-pau. Em que pese isso, o motivo de boa parte do filme funcionar se deve ao carisma e a boa química que Lena Headey e Piper Perabo apresentam em cena, convencendo-nos da sua 'paixão-relâmpago', bem como da resignação carinhosa que o personagem de Matthew Goode demonstra ter. Apesar de engessada, essa comédia cativa e provoca um leve quentinho no coração.
Encontro de Natal
3.4 39 Assista Agora"The Christmas Setup" sofre de um mal de breguice açucarada enjoativa incurável. Se a voz anasalada de Fran Drescher se abrisse mais uma vez de excitação pela família estar toda reunida e ela estar juntando pombinhos e "blablabla corações, corações, fofurice, fofurice, fofurice, blablabla", enquanto está 'lambendo' os filhos, eu provavelmente me dava um tiro. É bobinho, é fofinho, é bonitinho, é grudentinho, dá vontade de apertar, e é tão esquecível quanto um comercial de biscoitos natalinos. A direção televisiva de baixo orçamento de Pat Mills remete a algum especial pra TV a cabo (o que, aparentemente, o filme de fato é). Os diálogos piegas fazem os 84 minutos durarem uma eternidade. Passadores de pano dirão que o filme é bom porque é a primeira 'comédia romântica natalina homossexual'. Mas é justamente por isso - se é que isso é mesmo verdade - que o filme merecia ter uma maior substância que a levasse para além da pura glicose fílmica.
Mais Que Amigos
3.3 139 Assista AgoraLogo no início de 'Mais Que Amigos' o protagonista faz um monólogo reclamando dos estereótipos homossexuais criados por uma sociedade predominantemente hetero para rotulá-los. É irônico, e contraditório portanto, que lá pelas tantas o próprio filme caia nesses mesmos estereótipos superficiais para construir seus personagens e sua historinha clichê, quase como se admitisse para o mundo essa imagem pré-concebida. A trama de romance batida até conseguiria ser bonitinha, mas o personagem de Billy Eichner é tão insuportavelmente chato e antipático que inviabiliza qualquer torcida por ele. Depois de uma hora de duração entendemos a amargura do personagem, mas já é tarde demais para criarmos qualquer empatia por um ser bitolado, arrogante, egocêntrico, que tenta impor sua visão de mundo aos outros e tenta esconder suas fragilidades e ignorâncias em uma imagem de falsa superioridade, que causa dó. Por mais que o desenlace possa soar fofinho, receio que torci o filme inteiro contra o 'final feliz' do casal principal. Por outro lado, a direção de Nicholas Stoller é, no mínimo, competente, mas os alívios cômicos do filme não funcionam.
Fora de Série
3.9 493 Assista AgoraEm certo momento de 'Booksmart' - comédia adolescente dirigida por Olivia Wilde - uma determinada personagem fala para outro que o problema dele é 'tentar demais'. Ironicamente, essa mesma sugestão também valeria para o longa-metragem em questão que se esforça em recorrer histericamente a tudo e a qualquer coisa que esteja a seu alcance para tentar fazer humor. É como tentar matar uma mosca usando um canhão. No fim, as piadas realmente boas se diluem na confusão narrativa e as risadas são relativamente poucas. Ainda assim, imagino que a juventude atual consiga assistir o filme e se identificar um pouco com os seus personagens, mesmo que a maioria deles sejam apenas caricaturas. E o longa ainda ganha pontos por retratar com naturalidade o interesse sexual feminino - pouquíssimo explorado em comédias sexuais adolescentes, geralmente contadas a partir do ponto de vista dos meninos.
Você Nem Imagina
3.4 518 Assista Agora"The Half of It" é basicamente uma versão de 'Cyrano de Bergerac' LGBT, adolescente e voltada para a geração Z. Constrói seus personagens com relativa consistência, e as referências literárias e cinematográficas garantem algum estofo intelectual. Entretanto, parece meio perdido as vezes, e tenta entrar em discussões pertinentes mas acaba soando apenas superficial - como a questão da orientação sexual vista pela religiosidade, algo aparentemente relevante para as pessoas daquela comunidade, mas que só é 'arranhado' pelo roteiro. O triângulo amoroso formado pela história, por sua vez, funciona em parte, ainda que a mudança nas resoluções de um determinado personagem próximo ao terceiro ato soe meio brusca. Na verdade, a forma como o filme retrata os relacionamentos adolescentes é meio vaga, e talvez essa 'nebulosidade' fosse a proposta original do longa, mostrando como os sentimentos pelo próximo parecem ser meio incertos e confusos nessa idade. É competente naquilo que entrega, e só.
Com Amor, Simon
4.0 1,2K Assista AgoraNão costumo apreciar filmes com temáticas adolescente de colegial, mas devo reconhecer que "Com Amor, Simon" faz um excelente trabalho de composição de conflitos e dilemas na construção de seu personagem principal. Tendo que lidar com questões envolvendo sua própria identidade é de se esperar que o filme acabe servindo como peça fundamental de empatia para muitos jovens que se veem na mesma situação delicada de seu protagonista. O filme não trata da questão do preconceito, pelo menos não de forma aprofundada, mas nem precisa. O foco da proposta aqui é a 'aceitação interna', muito mais do que a social - o próprio filme faz um comentário sobre isso ao retratar a mãe do protagonista como uma psicóloga. Os coadjuvantes também são bem explorados e seus relacionamentos acabam sendo funcionais para a trama. E a direção se arrisca em alguns momentos bem inspirados e engraçados - como no 'musical literal' que o filme se torna quando Simon imagina sua vida na faculdade. Consistente, envolvente e relevante.
A Gaiola das Loucas
3.6 224 Assista AgoraTrocando a França pela breguice da Flórida, "The Birdcage" é um dos poucos remakes americanos de filmes de outra nacionalidade que podem ser considerados tão bons - ou, ao menos, que fazem jus - ao original. Ainda que mantenha, basicamente, a mesma história, o longa-metragem consegue construir uma identidade própria visual, e tateia alcançar novos níveis de ironia em seu humor (principalmente nas aprovações que o senador republicano vivido por Gene Hackman passa a ter pela 'mãe' de seu futuro genro). A direção de Mike Nichols é mais inspirada do que a de Édouard Molinaro, e o casal de protagonistas interpretados por Robin Williams e Nathan Lane nada deixam a desejar com relação aos originais vividos por Ugo Tognazzi e Michel Serrault. Todavia, o desfecho apressado sem um clímax de humor continua sendo o problema - aqui, agravado pela estranha passividade do personagem de Hackman frente as revelações da trama, seria bem mais engraçado se ele reagisse emocionalmente com as descobertas. Seja como for, é uma boa refilmagem e, considerando o puritanismo conservador ser historicamente muito mais forte nos EUA do que na França, geograficamente justificável.
A Gaiola das Loucas
3.7 94 Assista AgoraComédia francesa da década de 70, "A Gaiola das Loucas" diverte com seu humor marginal e deliciosamente despudorado. Um filme ainda necessário, que traz uma leveza a um assunto tabu sem motivo para ser. O humor é garantido pelas boas performances de Michel Serrault e Ugo Tonazzi, que fazem um casal homossexual que 'tentam' manter as aparências em uma noite em que tudo parece gradualmente dar errado. As alfinetadas aos defensores da 'moralidade e dos bons costumes' que habitam o meio político são bem colocadas, e se encaixam perfeitamente bem ainda hoje num mundo que, de forma assustadora, parece possuir um conservadorismo cada vez mais acentuado. Peca apenas, talvez, por um desfecho excessivamente apressado, poderia ter explorado mais as consequências insanas do terceiro ato. Mas talvez, pela época, o pouco que o filme faz já seja muito.
Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa
4.2 1,8K Assista AgoraOk, vou dar o braço a torcer. É o modo como o roteiro utiliza os conceitos deixados pelo multiverso do Homem-Aranha nos filmes anteriores de uma forma surpreendentemente coesa, criativa e funcional, que "Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa" merece a maioria dos seus pontos. Ver os vilões antigos e a dinâmica bem afinada entre os três Peter Parker garante a sessão-pipoca (e faz até a gente perdoar a existência dos equivocados filmes estrelados pelo Andrew Garfield). A participação do Doutor Estranho também garante alguns bons momentos. Ainda assim, Tom Holland continua com o problema de ser o Homem-Aranha mais dependente da ajuda dos outros para resolver seus desafios (ao menos, aqui, eles arrumam uma boa desculpa para isso acontecer), e o desenvolvimento dos demais personagens é nulo. Visualmente o filme é um espetáculo, e dramaticamente é um pouquinho mais consistente do que os anteriores dentro do MCU. Já as piadinhas, no entanto, quando não estão tirando sarro dos outros filmes, só são apenas bobocas. Mas diverte e entretém, até mais do que eu esperava.
Homem-Aranha 3
3.1 1,5K Assista AgoraExiste um ditado que diz que é melhor pecar por excesso do que por falta. No caso de "Homem-Aranha 3" essa máxima não é verdadeira. Claramente o roteiro desse terceiro capítulo sofre pela arrogância e ambição dos produtores de quererem meter o maior número de coisas possíveis sobre o personagem em um filme só. O resultado é um filme bagunçado, inchado, longo, obeso. É tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo, e nenhuma delas tem o peso dramático narrativo que se esperaria, que a tudo acompanhamos inertes. O desespero dos roteiristas é tamanho que eles arranjam uma desculpa completamente esfarrapada para 'anular' temporariamente um dos melhores ganchos do filme anterior, e assim poder dar espaço para as outras sub-tramas insípidas. Os efeitos especiais são os melhores da franquia, isso é inegável, mas de que adianta se a história não se sustenta. Quanto a isso há até um gostinho de 'vingancinha' do Sam Raimi: era intenção original dele usar o Homem-Areia como capanga e o Abutre como vilão principal, mas o Venom foi imposição do estúdio. Raimi fez um Homem-Areia graficamente competente, mas um Venom ridículo, forçado, nada ameaçador. Os conflitos de identidade de Parker soariam convincentes se o filme pudesse respirar direito, e pra quê trazer de volta totalmente de graça a questão do tio Ben?. "Homem-Aranha 3" é uma sequência de escolhas equivocadas, um filme que tenta abocanhar mais coisas do que consegue e o único resultado disso foi afastar Tobey Maguire do uniforme do personagem mais cedo do que ele merecia.
Homem-Aranha 2
3.6 1,1K Assista AgoraCertamente, o melhor filme da trilogia. Livre das amarras de ter que fazer uma história de origem e ainda sem a pressão dos produtores que estragariam o terceiro filme, Sam Raimi teve a liberdade quase plena de contar a história da forma como queria. E o resultado é uma continuação cativante, original, consistente e equilibrada tanto na aventura quanto no desenvolvimento dos dilemas particulares dos personagens. A crise de identidade de Peter Parker é palpável e bem construída, faz sentido dentro da trajetória do herói e leva para algum lugar. O desenvolvimento dos coadjuvantes - Mary Jane, Harry Osborn, Tia May (cada um com seu conflito particular) - também são bem trabalhados. E o Doutor Octopus segue sendo o vilão mais bem aproveitado da franquia. As cenas de ação também são muito bem feitas, em especial a fantástica cena de luta em cima do metrô, perto do clímax. Em tudo "Homem-Aranha 2" dá uma aula de como se fazer um bom filme de super-herói, um entretenimento com consistência, substância. O que é mais do que se pode falar de 80% dos filmes meramente 'plásticos' do MCU, habitado por figuras que são nada mais do que manequins artificiais de vitrine.
Homem-Aranha
3.7 1,3K Assista AgoraNão importa o quanto tentem, o 'Homem-Aranha' de Tobey Maguire continuará sendo o definitivo nos cinemas pra mim. Enquanto os filmes estrelados por Andrew Garfield são extremamente aborrecidos, e a versão de Tom Holland é demasiadamente dependente dos outros personagens do MCU para resolver seus problemas, a trilogia dirigida por Sam Raimi conquista um equilíbrio muito bom entre personagens carismáticos e roteiros que funcionam sozinhos (mesmo que o terceiro capítulo seja bem problemático). "Homem-Aranha", de 2002, é um marco do cinema de super-herói, trazendo e adaptando para uma linguagem mais moderna elementos que já haviam sido feitos em 'Superman', do Richard Donner e 'Batman' do Tim Burton. As cenas de ação ainda funcionam relativamente bem para a época, mesmo o CGI ficando mais evidente hoje. Entretanto, devo apontar que o traje caricato do Duende Verde - que mais parece algum vilão exagerado dos Power Rangers - envelheceu muito, muito mal. Felizmente, por trás da máscara temos Willem Defoe que, ao menos, convence no tom de ameaça insana que o filme necessitava para funcionar.
John Wick 4: Baba Yaga
3.9 694 Assista AgoraÉ inegável a qualidade cinematográfica das cenas de ação da franquia "John Wick". Afinal, é exclusivamente por conta delas que a série teve fôlego para chegar ao quarto capítulo. Já a história, por sua vez, tende a ser um perigoso 'mais do mesmo', o que faz com que os filmes isoladamente considerados se confundam na nossa memória e já não sabemos mais qual é qual. Felizmente, o diretor Chad Stahelski e o astro (e também produtor do filme) Keanu Reeves) parecem finalmente ter entendido isso, e após um terceiro capítulo que enchia os olhos tanto quanto enchia linguiça, deram um ponto final a trajetória do assassino vingativo. O ato final é satisfatório e competente naquilo que a série sempre soube fazer de melhor, e ainda servirá como referência - assim como os episódios anteriores - para os cineastas estreantes que queiram aprender sobre como fazer sequências de pancadaria de cair o queixo. Funciona na sua proposta e entrega aquilo que se espera dele, e só.