O conceito por trás dos 'Eternos' - personagens criados por Jack Kirby - é até interessante: seres superpoderosos que aparecem nas mitologias de diversas culturas e que na verdade nada mais são do que o mesmo grupo de heróis em diversos períodos da história da humanidade. Entretanto, dentro do Universo Marvel dos quadrinhos eles sempre soaram meio deslocados, e isso não é diferente na sua adaptação cinematográfica. Afinal, sendo tão poderosos, por quê não se manifestaram antes em literalmente dezenas de eventos que poderiam ter agido (Loki, Thanos, Ultron, apenas para citar os exemplos maiores)? Claro que o filme dá uma desculpa, mas ela soa meio inverossímil já que obviamente eles interferiram na evolução da raça humana em momentos anteriores pontuais quando julgaram oportuno. Soa mais como um grupo de heróis arrogantes que vivem dentro de sua bolha elitista, mas divago...
Apesar de ser vendido como o 'filme mais ambicioso da Marvel', "Eternos" acaba se revelando ser apenas mais um enlatado do estúdio. A ideia de contar uma 'Gênesis do Universo Marvel' é ousada, mas se perde em um roteiro inconsistente e com vários furos. Os personagens são sem carisma e, apesar de terem quase sete mil anos, são meio rasos. E a diretora Chloé Zhao visivelmente está de mãos atadas, sendo as composições visuais bonitas ao pôr do sol o máximo de liberdade criativa que deram a ela. Como filme de herói mesmo, soa aborrecido, mas as cenas de pancadaria até funcionam. Tenta fazer uma crítica vaga à cegueira fanática religiosa, mas se perde. Enfim, é um 'mais do mesmo' do estúdio que tenta se passar por algo diferente e novo, mas a mim não convence. Como entretenimento, todavia, funciona razoavelmente.
Foi o filme que logrou Anne Baxter e Bette Davis de ganharem o Oscar de Melhor Atriz principal por "A Malvada". O prêmio foi para Judy Holliday nessa comédia romântica bem intencionada, porém hoje esquecível. A lenda nos conta que a campanha conjunta da Fox para suas duas atrizes acabou dividindo os votos e favorecendo a terceira opção (ainda assim, particularmente, eu preferiria que o prêmio tivesse ido para Gloria Swamson por 'Crepúsculo dos Deuses'). Judy Holliday está bem aqui para o que o papel exige dela, mas nada carismática, e se sua personagem gera alguma empatia é apenas porque Broderick Crawford está um ogro. No mais, um filme que denuncia sua origem teatral com um roteiro excessivamente expositivo e clichê. Ao menos, as locações em Washington fazem o filme valer à pena esteticamente.
Faz valer pela presença estereotipada de Chris Evans e pelo carinho demonstrado ao zoar de forma despretensiosa com os filmes dirigidos e roteirizados pelo eterno John Hughes (contando, inclusive, com a participação especial da 'musa teen' do cineasta Molly Ringwald, em um papel que se torna literalmente a consciência dos personagens). Mas como filme sozinho, "Não é Mais um Besteirol Americano" funciona de forma um pouco irregular. Algumas piadas sexuais funcionam - como a de abertura do longa - outras nem tanto, e talvez um dos erros do filme seja apelar em excesso para gags escatológicas - um péssimo sinal para qualquer comédia. Mas, no geral, não desagrada.
Mais corajoso que o original ao ousar fazer piada com o ditador Saddam Hussein poucos meses após o final da Guerra do Golfo. "Top Gang 2 - A Missão" apresenta em alguns momentos a mesma criatividade do original, principalmente nas suas gags de plano de fundo e ao fazer referências de metalinguagem a filmes como "Apocalypse Now", "Rambo", "Instinto Selvagem", e, surpreendentemente, "Casablanca". Em outras cenas, por outro lado, apenas recicla piadas que já foram gastas no anterior, e apresenta uma dose maior de escatologia. No geral, se mantem ao lado do primeiro como um entretenimento que funciona pela estupidez proposital de seu roteiro.
Paródia de 'Top Gun' com Charlie Sheen no lugar de Tom Cruise, e com as piadas estapafúrdias de Jim Abrahams no lugar do romance açucarado. O filme cumpre o que promete com sua tiração de sarro do gênero, subvertendo os clichês típicos como as cenas de sexo cafona e os coadjuvantes previsíveis que estão na trama apenas para morrer. Tem seus méritos por achincalhar com o estereótipo de (pseudo-)virilidade das forças armadas americanas. Divertidamente imbecil e, muito por isso, genuinamente engraçado.
Remake do filme alemão parcialmente homônimo que reimaginava o retorno de Adolf Hitler para os tempos modernos. "Sono Tornato" repete a mesma ideia e a mesma estrutura, mas focando no estadista italiano Benito Mussolini. No todo não é um filme ruim, mas é aquilo: a ideia não é original. A trama segue exatamente os mesmos plots, com o personagem sendo confundido com um ator a princípio, recebendo um certo espaço midiático apenas por ser visto como uma sátira inusitada e inofensiva, mas logo passando a despertar os monstros latentes mais internos escondidos dentro da comunidade italiana. A crítica é válida, e qualquer comparação com a vida real não é coincidência. Porém, por ter vindo depois, é inegável que o filme esteja condenado a viver à sombra de seu original, mais ácido, mais divertido e ainda mais preocupante.
"S.O.S.: Tem um Louco Solto no Espaço" vale pelo seu humor estapafúrdio. É uma típica comédia do Mel Brooks que praticamente construiu a carreira satirizando outros gêneros cinematográficos. Aqui, no caso, se trata dos filmes de ficção científica capitaneados por 'Star Wars', mas com piadas envolvendo 'Star Trek', 'Alien - O Oitavo Passageiro' e 'Planeta dos Macacos'. As piadas não são tão inspiradas quanto outros filmes do cineasta - como "O Jovem Frankenstein" e "Banzé no Oeste" - e Bill Pullman parece deslocado em um filme de comédia escrachada. Mas é capaz de agradar os fãs do gênero com seus trocadilhos e deboches espirituosos como o cabeção de Rick Moranis e o Mestre Yogurt.
Em um primeiro momento, a premissa de se fazer um filme dos 'emojis' parece estúpida. Em um segundo momento, a execução da proposta parece confirmar completamente a estupidez da primeira impressão. Uma trama clichê com personagens bobinhos e um arco de protagonista buscando a sua identidade dentro de um universo informático reconstruído visualmente para fazer sentido dentro de uma animação. Não vou mentir, a ideia até é um pouquinho interessante, se o filme não soasse a todo momento como sendo uma cópia barata (e ruim) de 'Detona Ralph'. Soma-se a isso as piadocas infames constrangedoras de tão ruim que são e "Emoji - O Filme" preenche os requisitos de uma obra digna de um Framboesa de Ouro. Em tempo, Christina Aguilera deveria estar precisando pagar uma prestação do carro, porque só isso justifica sua presença nesse projeto.
Curiosamente, um dos primeiros filmes clássicos que assisti, ainda na saudosa TVE/RS. "Nem Sansão Nem Dalila" é uma paródia do estúdio Atlântida que satiriza os filmes épicos históricos hollywoodianos ao estilo 'Cecil B. DeMille'. Vale pela ousadia do cinema brasileiro em fazer uma comédia escrachada envolvendo viagem no tempo e piadas políticas em uma lenda originalmente bíblica ainda em plena década de 50. A figura de Oscarito é o que segura o longa, e o roteiro praticamente todo construído com piadas inocentes e ingênuas entretém sem ter maiores ambições além de conseguir ser uma comédia escapista de momento, com um humor que lembra algum episódio especial estendido de Chapolin Colorado. Uma pequena pérola do cinema nacional que ficou esquecida e enterrada pelo tempo.
Quem diria que a Marvel teria o seu próprio filme de artes marciais, ainda mais apostando em um personagem classe 'C' dentro do seu panteão e após a sofrível e equivocada série do 'Punho de Ferro'. "Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis" surpreende de forma positiva, ainda que traga os clichês típicos óbvios. Mas faz um trabalho de composição de personagens um pouco mais consistente do que outros filmes do estúdio, e as cenas de ação são dirigidas com competência, bem como as de lutas - o que, afinal, era o quesito principal da proposta - ainda que o longa deixe um pouco a desejar nos efeitos de CGI. A impressão que dá durante boa parte da projeção é que o diretor Destin Daniel Cretton estava economizando na qualidade dos efeitos especiais para poder gastar tudo com competência na sequência final - essa sim, irrepreensível. No mais, o filme tenta consertar a cagada que o estúdio fez em 'Homem de Ferro 3' e relativamente até consegue, ainda que o retorno de um determinado personagem que não inspirou nenhuma saudade fosse completamente desnecessário. Na mesma linha, o humor medíocre do estúdio permanece, mantendo a sua tradição já consolidada de coadjuvantes bobalhões (sim, Awkwafina, não há muita diferença entre você e um Jar Jar Binks).
A sensibilidade e a qualidade da animação é o que compensa a traminha de folhetim de novela das seis. Com uma certa timidez, Goro Miyazaki vai ensaiando os passos do pai sozinho, ainda que dê para sentir uma certa mão firme de seu tutor o conduzindo. É como acompanhar uma criança aprendendo a andar na bicicleta de rodinha. Competente, sim, relativamente envolvente também, mas não exatamente marcante. Suficientemente bom para merecer uma conferida, no entanto. Para além do romancezinho pueril, o que cativa mesmo é a subtrama envolvendo os esforços dos alunos para salvar um antigo clube estudantil, e a união que passa haver entre eles por conta disso. Uma reflexão bacana, ainda que não necessariamente original, sobre o equilíbrio entre promover o novo da juventude e valorizar a memória do passado.
Os primeiros episódios da franquia não são grandes filmes, mas pelo menos possuem um certo estilo. Inclusive, não é exagero algum falar que o primeiro Blade inspirou, de certa forma, o visual do primeiro Matrix. "Blade Trinity", por outro lado, não possui estilo nenhum, não possui charme, não possui estética, não possui história, não possui nada. É a raspa do tacho de um roteiro agonizando por criatividade. O longa confirma a "maldição do terceiro filme de herói" ao reunir uma trama desinteressante e esburacada, um Blade mais engraçadinho, Ryan Reynolds como um coadjuvante dispensável e, como se já não bastasse ele, um vilão assustadoramente patético. "Blade Trinity" consegue a façanha de criar um dos piores Drácula do cinema. Um personagem fraco, sem presença, sem carisma, sem motivação alguma, com diálogos mal escritos, com uma inteligência questionável, poderes medíocres e que em nenhum momento aparenta justificar a lenda por trás dele ou mesmo fazer jus ao filme ao qual antagoniza. "Blade Trinity" é um escarro não só ao cinema, mas também ao legado do personagem-título e à toda mitologia dos vampiros.
Dirigido por Guillermo Del Toro, "Blade II" dá um pouco mais de ênfase ao caráter biológico da coisa, algo que já existia no primeiro filme mas não tão aprofundado quanto aqui. O diferencial se encontra principalmente na estilização neon que Del Toro traz a esse universo, fazendo uma continuação esteticamente mais interessante. A maquiagem dos vampiros ganha destaque, fazendo referência à caracterização do 'Nosferatu' de 1922, na sua concepção mais avançada de 'vampirismo'. As cenas de ação são um pouquinho melhores (com algumas remissões a "Aliens - O Resgate"), e mesmo a limitação dos efeitos especiais se deve mais ao passar do tempo do que a precariedade dos mesmos. O roteiro é um pouquinho mais ambicioso, ao trazer a proposta de Blade ter que se aliar com seus inimigos naturais, ainda que seja repleto de furos, principalmente ao não explicar direito - antes, apenas dar uma 'enrolada' - a 'ressurreição' do personagem de Kris Kristofferson. No mais, Wesley Snipes novamente competente no papel protagonista, Ron Perlman em sua parceria habitual com Del Toro, e Norman Reedus fazendo o Daryl antes do Daryl existir - ele já fez algum personagem diferente disso? Levemente mais bem acabado do que o primeiro longa, mas não por muito.
É curioso pensar que a primeira adaptação séria de quadrinhos da Marvel que semeou a atual geração de adaptações começou com Blade. Afinal de contas, nunca tendo sido um personagem do 'esquadrão classe A' da editora, o filme do Blade acabou sendo vendido muito mais como um longa genérico de vampiros do que de super-herói. E o roteiro meio que denuncia isso na sua falta de ambição, e na suas escolhas narrativas convencionais que acabam beirando o clichê trash. O filme não é de todo ruim, mas não envelheceu muito bem. Os efeitos especiais são precários para a época e toda a sequência de ação do terceiro ato é um compilado de tudo que havia de pior em filmes de ação dos anos 90. Wesley Snipes ao menos funciona na inexpressividade funcional do personagem, enquanto sua companheira de elenco, N'Bushe Wright, passa trabalho ao não conseguir manifestar surpresa nem quando um cadáver carbonizado volta a vida na sua frente. Teve seu impacto passageiro na época - principalmente, na indumentária - mas é medíocre e, hoje, esquecível.
É fácil entender o choque e o dilema moral causado por essa desconstrução de "A Bela Adormecida". "Fale Com Ela", décimo-quarto filme do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, parece beirar a todo momento a romantização de uma paixão unilateral, platônica e, de certa forma, necrófila, e só não o faz por deixar bem claro a todo momento que o personagem de Benigno é, afinal de contas, um doente mental. Por outro lado, o desfecho pode dar margem a interpretações complicadas de que o roteiro tenta abonar algo abominável pela consequência boa que veio deste. Não tenho dúvidas, porém, de que o incômodo é proposital, pois Almodóvar parece querer provocar o espectador sobre o limite tênue que divide uma tragédia grotesca de um conto de fadas. Sadicamente, brinca com os nossos preconceitos e julgamentos mais íntimos, e nos deixa sem resposta tentando lidar com eles. É mais um exemplo de sua cinebiografia em que eu reconheço a ousadia do cineasta, e a sua qualidade como contador de histórias, ainda que não aprecie, exatamente, o gosto amargo daquilo que ele me oferece.
Terceiro filme do promissor diretor de "Hereditário", o cineasta com nome que parece marca de produto de limpeza, Ari Aster. "Beau Tem Medo" possui uma atmosfera de pesadelo, e é basicamente um mergulho na mente conturbada de um homem psicologicamente afetado por anos de uma relação materna problemática, manipuladora, possessiva e, talvez em certo nível, incesto-edipiana. Uma proposta que poderia ter resultado em uma abstração interessante da exploração de uma mente inquieta, se não fosse por um problema do diretor já verificado como um alerta em "Midsommar", mas que aqui ganha contornos realmente preocupantes: a completa falta de filtro do cara em achar que tudo que ele concebe é 'genial'. "Beau Tem Medo" agoniza em suas três horas labirínticas, redundantes, nada envolventes e estressantes. O filme parece que sai do nada e chega no lugar nenhum, propositalmente trilhando vários desvios desnecessários em sua jornada. As conclusões psicologicamente rasas em que o roteiro chega poderiam ter sido alcançadas em uma trama de 90 minutos e igualmente maluca quanto. O longa-metragem se junta a "Bardo", do Iñárritu, como mais um delírio megalomaníaco, arrogante e pretensioso de um cineasta talentoso desse ano. Uma pena, Aster é jovem demais na carreira para se deixar se levar por vaidades artísticas estúpidas e vazias.
A alguns anos que Scarlett Johansson lutava por um filme solo da Viúva Negra, e em 2021 esse sonho se tornou realidade, ainda que não tenha sido lançado exatamente nos moldes como ela gostaria. Sobre "Viúva Negra", a boa notícia é que ele consegue ser um entretenimento rápido e rasteiro de 'ação/espionagem' competente, ou, ao menos, não está tão atrás de outros filmes do mesmo estúdio. O chato é que, tendo vindo após "Vingadores - Ultimato", este longa é esvaziado de qualquer peso dramático envolvendo o destino de sua protagonista (afinal de contas, todo mundo sabe o que vai acontecer). Para contrapôr isso, o roteiro ganha pontos ao apostar na dinâmica entre Natasha e sua 'irmã' Yelena, e funciona por conta da boa química em cena entre Johansson e Florence Pugh. Sendo um filme que funciona mais como uma passagem de bastão, "Viúva Negra" não chega a decepcionar, mas é inegável que ele é apenas um 'mais do mesmo' dentro do universo Marvel.
Baseado abertamente em "A Letra Escarlate", nota-se que "A Mentira" tenta tecer uma crítica ao puritanismo bitolado e exagerado com que a sociedade norte-americana lida com a sexualidade jovem. E de certa forma até consegue, ao mostrar como um fato da vida que deveria ser encarado com naturalidade de repente vira um monstro dentro das paredes daquela escola. Por outro lado, por mais linda e talentosa - e sim, sensual - que Emma Stone seja, aos vinte e poucos anos ela já não convencia mais como uma estudante de Ensino Médio. "A Mentira" é mais um desses filmes adolescentes norte-americanos que escalam adultos para viver o público jovem, e ganha uma certa artificialidade justamente por conta disso. Por outro lado, é sempre gratificante ver a eterna Phoebe de Friends, Lisa Kudrow, em cena. No mais, é uma comédia que tem alguns momentos inspirados, porém inofensiva (a não ser que você seja do tipo que ache que a pessoa tem que perder a virgindade aos 34 anos, transar de luz apagada e tão somente para procriar).
Comédia romântica adolescente inofensiva. Basicamente uma atualização de "Namorada de Aluguel" dos anos 80 com Patrick Dempsey para os dias atuais. Divertidinho e bem dirigido, conquista seus momentos principalmente ao explorar o hilário desespero da personagem principal enquanto morre de vergonha pelos acontecimentos. Pode conquistar fãs dentro da faixa etária de seu público alvo, mas fora desse nicho ele é meio esquecível.
A ideia até que é bacana. Fazer um filme paródia, satirizando os costumes sociais, mas se passando na Idade da Pedra. A execução, no entanto, é péssima. O filme simplesmente não tem a menor graça, e o fato do longa insistir exaustivamente na mesma piada durante o filme inteiro (todos os personagens se chamarem 'Pedro') é algo que testa a paciência do espectador. Se você for do tipo que se diverte com trasheira, portanto, pode até vir a encará-lo como um 'guilty pleasure', mas pra mim o filme é só 'guilty' mesmo. Vergonha alheia.
Consigo reconhecer a relevância de "As Sufragistas" pelo retrato histórico que faz de uma luta social indubitavelmente importante e ainda necessária mesmo nos dias de hoje em vários lugares do mundo. E é mesmo assustador, irracional e contraditório que no início do Século XX, a Inglaterra - que já havia tido duas das maiores estadistas mulheres reconhecidas da História, as Rainhas Elizabeth I e Vitória - ainda negavam de forma tão veemente o direito fundamental do voto às mulheres. Entretanto, enquanto filme, receio que "As Sufragistas" se mostra uma experiência decepcionantemente fria e distante. Novelesco e excessivamente apelativo em alguns pontos, o longa-metragem falha em criar algum elo de empatia entre o espectador e suas personagens, que surgem e somem na película sem deixar saudade. O esforço artificial em querer arrancar lágrimas e indignação a qualquer custo se mostra evidente. A fotografia é excessivamente escura e a estética é desinteressante. Em uma obra que deveria ressaltar justamente o aspecto de humanidade de suas defendidas, ele peca justamente pela forma mecânica e sem alma com que conta sua história.
Em uma Berlim dividida do final da década de 80 repleta de neon, Charlize Theron é uma espiã encarregada de recuperar uma lista de nomes que, caso caia nas mãos erradas, pode evitar o final da Guerra Fria prestes a acontecer com a queda do Muro. Com um roteiro que referencia os clássicos filmes de espionagem e que não é exatamente original, "Atômica" conquista sua identidade pela atuação intensa de sua protagonista na pele de uma anti-heroína com sangue nos olhos, e na direção de David Leitch que dota o filme de um ritmo frenético e uma estética híbrida entre o período da época e o pós-moderno. A grande cena do filme, o plano-sequência em que a personagem principal precisa proteger um desertor dos agentes da KGB, é de tirar o fôlego por sua competência técnica irrepreensível. Ainda que o filme possa ser meio previsível - certa natureza dúbia de determinado personagem fica bastante clara desde o início - creio que a intenção do filme era muito mais ilustrar a ferocidade de sua protagonista, do que criar alguma trama de mistério. Seja como for, é um filme de ação que envolve e conquista, seja pelas suas ótimas cenas de ação, seja pela beleza fatal de Charlize Theron.
Parece um vulcão prestes a explodir. "Shiva Baby" é o sufoco antes da catarse, um bola na garganta querendo ser gritada mas constantemente abafada pelas convenções sociais e familiares. Além da direção funcional e eficiente de Emma Selligman, o filme não seria o mesmo sem a atuação estupenda de Rachel Sennott, que carrega o longa inteiro nas costas. Vivendo uma jovem no final da adolescência e prestes a entrar na vida adulta, com todas as pressões típicas da idade, somado ao fato de sofrer de uma notória baixa auto-estima e da necessidade de sentir a afeição e o apreço dos outros, Danielle tem o desafio de encarar todas as suas angústias em um único dia, quando os resultados de todas as suas decisões de vida parecem se voltar contra ela em único momento para julgá-la. É um estudo de personagem intenso, sufocante e, em alguns momentos, desesperador. Tem os seus momentos de humor negro em que encontra um certo alívio, e um desfecho, talvez, esperançoso. Mas no geral, uma obra propositadamente desconfortável, que nos coloca na pele da protagonista, a ponto de querer berrar, extravasar aquilo que está entalado, soltar um grande "FUCK YOU!" ao mundo, e a todos que o rodeiam. A vida, suas expectativas e suas consequências, nunca foram tão torturantes e desgastantes quanto nesse exaustivo velório judeu.
Eternos
3.4 1,1K Assista AgoraO conceito por trás dos 'Eternos' - personagens criados por Jack Kirby - é até interessante: seres superpoderosos que aparecem nas mitologias de diversas culturas e que na verdade nada mais são do que o mesmo grupo de heróis em diversos períodos da história da humanidade. Entretanto, dentro do Universo Marvel dos quadrinhos eles sempre soaram meio deslocados, e isso não é diferente na sua adaptação cinematográfica. Afinal, sendo tão poderosos, por quê não se manifestaram antes em literalmente dezenas de eventos que poderiam ter agido (Loki, Thanos, Ultron, apenas para citar os exemplos maiores)? Claro que o filme dá uma desculpa, mas ela soa meio inverossímil já que obviamente eles interferiram na evolução da raça humana em momentos anteriores pontuais quando julgaram oportuno. Soa mais como um grupo de heróis arrogantes que vivem dentro de sua bolha elitista, mas divago...
Apesar de ser vendido como o 'filme mais ambicioso da Marvel', "Eternos" acaba se revelando ser apenas mais um enlatado do estúdio. A ideia de contar uma 'Gênesis do Universo Marvel' é ousada, mas se perde em um roteiro inconsistente e com vários furos. Os personagens são sem carisma e, apesar de terem quase sete mil anos, são meio rasos. E a diretora Chloé Zhao visivelmente está de mãos atadas, sendo as composições visuais bonitas ao pôr do sol o máximo de liberdade criativa que deram a ela. Como filme de herói mesmo, soa aborrecido, mas as cenas de pancadaria até funcionam. Tenta fazer uma crítica vaga à cegueira fanática religiosa, mas se perde. Enfim, é um 'mais do mesmo' do estúdio que tenta se passar por algo diferente e novo, mas a mim não convence. Como entretenimento, todavia, funciona razoavelmente.
Inatividade Paranormal
2.3 837 Assista AgoraPor que os irmãos Wayans fazem sucesso mesmo?
Nascida Ontem
3.7 39 Assista AgoraFoi o filme que logrou Anne Baxter e Bette Davis de ganharem o Oscar de Melhor Atriz principal por "A Malvada". O prêmio foi para Judy Holliday nessa comédia romântica bem intencionada, porém hoje esquecível. A lenda nos conta que a campanha conjunta da Fox para suas duas atrizes acabou dividindo os votos e favorecendo a terceira opção (ainda assim, particularmente, eu preferiria que o prêmio tivesse ido para Gloria Swamson por 'Crepúsculo dos Deuses'). Judy Holliday está bem aqui para o que o papel exige dela, mas nada carismática, e se sua personagem gera alguma empatia é apenas porque Broderick Crawford está um ogro. No mais, um filme que denuncia sua origem teatral com um roteiro excessivamente expositivo e clichê. Ao menos, as locações em Washington fazem o filme valer à pena esteticamente.
Não é Mais um Besteirol Americano
2.6 641 Assista AgoraFaz valer pela presença estereotipada de Chris Evans e pelo carinho demonstrado ao zoar de forma despretensiosa com os filmes dirigidos e roteirizados pelo eterno John Hughes (contando, inclusive, com a participação especial da 'musa teen' do cineasta Molly Ringwald, em um papel que se torna literalmente a consciência dos personagens). Mas como filme sozinho, "Não é Mais um Besteirol Americano" funciona de forma um pouco irregular. Algumas piadas sexuais funcionam - como a de abertura do longa - outras nem tanto, e talvez um dos erros do filme seja apelar em excesso para gags escatológicas - um péssimo sinal para qualquer comédia. Mas, no geral, não desagrada.
Top Gang 2!: A Missão
3.5 314 Assista AgoraMais corajoso que o original ao ousar fazer piada com o ditador Saddam Hussein poucos meses após o final da Guerra do Golfo. "Top Gang 2 - A Missão" apresenta em alguns momentos a mesma criatividade do original, principalmente nas suas gags de plano de fundo e ao fazer referências de metalinguagem a filmes como "Apocalypse Now", "Rambo", "Instinto Selvagem", e, surpreendentemente, "Casablanca". Em outras cenas, por outro lado, apenas recicla piadas que já foram gastas no anterior, e apresenta uma dose maior de escatologia. No geral, se mantem ao lado do primeiro como um entretenimento que funciona pela estupidez proposital de seu roteiro.
Top Gang!: Ases Muito Loucos
3.4 262 Assista AgoraParódia de 'Top Gun' com Charlie Sheen no lugar de Tom Cruise, e com as piadas estapafúrdias de Jim Abrahams no lugar do romance açucarado. O filme cumpre o que promete com sua tiração de sarro do gênero, subvertendo os clichês típicos como as cenas de sexo cafona e os coadjuvantes previsíveis que estão na trama apenas para morrer. Tem seus méritos por achincalhar com o estereótipo de (pseudo-)virilidade das forças armadas americanas. Divertidamente imbecil e, muito por isso, genuinamente engraçado.
Estou de Volta
3.3 12Remake do filme alemão parcialmente homônimo que reimaginava o retorno de Adolf Hitler para os tempos modernos. "Sono Tornato" repete a mesma ideia e a mesma estrutura, mas focando no estadista italiano Benito Mussolini. No todo não é um filme ruim, mas é aquilo: a ideia não é original. A trama segue exatamente os mesmos plots, com o personagem sendo confundido com um ator a princípio, recebendo um certo espaço midiático apenas por ser visto como uma sátira inusitada e inofensiva, mas logo passando a despertar os monstros latentes mais internos escondidos dentro da comunidade italiana. A crítica é válida, e qualquer comparação com a vida real não é coincidência. Porém, por ter vindo depois, é inegável que o filme esteja condenado a viver à sombra de seu original, mais ácido, mais divertido e ainda mais preocupante.
S.O.S.: Tem um Louco Solto no Espaço
3.5 173 Assista Agora"S.O.S.: Tem um Louco Solto no Espaço" vale pelo seu humor estapafúrdio. É uma típica comédia do Mel Brooks que praticamente construiu a carreira satirizando outros gêneros cinematográficos. Aqui, no caso, se trata dos filmes de ficção científica capitaneados por 'Star Wars', mas com piadas envolvendo 'Star Trek', 'Alien - O Oitavo Passageiro' e 'Planeta dos Macacos'. As piadas não são tão inspiradas quanto outros filmes do cineasta - como "O Jovem Frankenstein" e "Banzé no Oeste" - e Bill Pullman parece deslocado em um filme de comédia escrachada. Mas é capaz de agradar os fãs do gênero com seus trocadilhos e deboches espirituosos como o cabeção de Rick Moranis e o Mestre Yogurt.
Emoji: O Filme
2.7 263 Assista AgoraEm um primeiro momento, a premissa de se fazer um filme dos 'emojis' parece estúpida. Em um segundo momento, a execução da proposta parece confirmar completamente a estupidez da primeira impressão. Uma trama clichê com personagens bobinhos e um arco de protagonista buscando a sua identidade dentro de um universo informático reconstruído visualmente para fazer sentido dentro de uma animação. Não vou mentir, a ideia até é um pouquinho interessante, se o filme não soasse a todo momento como sendo uma cópia barata (e ruim) de 'Detona Ralph'. Soma-se a isso as piadocas infames constrangedoras de tão ruim que são e "Emoji - O Filme" preenche os requisitos de uma obra digna de um Framboesa de Ouro. Em tempo, Christina Aguilera deveria estar precisando pagar uma prestação do carro, porque só isso justifica sua presença nesse projeto.
Nem Sansão Nem Dalila
3.5 13Curiosamente, um dos primeiros filmes clássicos que assisti, ainda na saudosa TVE/RS. "Nem Sansão Nem Dalila" é uma paródia do estúdio Atlântida que satiriza os filmes épicos históricos hollywoodianos ao estilo 'Cecil B. DeMille'. Vale pela ousadia do cinema brasileiro em fazer uma comédia escrachada envolvendo viagem no tempo e piadas políticas em uma lenda originalmente bíblica ainda em plena década de 50. A figura de Oscarito é o que segura o longa, e o roteiro praticamente todo construído com piadas inocentes e ingênuas entretém sem ter maiores ambições além de conseguir ser uma comédia escapista de momento, com um humor que lembra algum episódio especial estendido de Chapolin Colorado. Uma pequena pérola do cinema nacional que ficou esquecida e enterrada pelo tempo.
Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis
3.8 893 Assista AgoraQuem diria que a Marvel teria o seu próprio filme de artes marciais, ainda mais apostando em um personagem classe 'C' dentro do seu panteão e após a sofrível e equivocada série do 'Punho de Ferro'. "Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis" surpreende de forma positiva, ainda que traga os clichês típicos óbvios. Mas faz um trabalho de composição de personagens um pouco mais consistente do que outros filmes do estúdio, e as cenas de ação são dirigidas com competência, bem como as de lutas - o que, afinal, era o quesito principal da proposta - ainda que o longa deixe um pouco a desejar nos efeitos de CGI. A impressão que dá durante boa parte da projeção é que o diretor Destin Daniel Cretton estava economizando na qualidade dos efeitos especiais para poder gastar tudo com competência na sequência final - essa sim, irrepreensível. No mais, o filme tenta consertar a cagada que o estúdio fez em 'Homem de Ferro 3' e relativamente até consegue, ainda que o retorno de um determinado personagem que não inspirou nenhuma saudade fosse completamente desnecessário. Na mesma linha, o humor medíocre do estúdio permanece, mantendo a sua tradição já consolidada de coadjuvantes bobalhões (sim, Awkwafina, não há muita diferença entre você e um Jar Jar Binks).
Da Colina Kokuriko
4.0 243 Assista AgoraA sensibilidade e a qualidade da animação é o que compensa a traminha de folhetim de novela das seis. Com uma certa timidez, Goro Miyazaki vai ensaiando os passos do pai sozinho, ainda que dê para sentir uma certa mão firme de seu tutor o conduzindo. É como acompanhar uma criança aprendendo a andar na bicicleta de rodinha. Competente, sim, relativamente envolvente também, mas não exatamente marcante. Suficientemente bom para merecer uma conferida, no entanto. Para além do romancezinho pueril, o que cativa mesmo é a subtrama envolvendo os esforços dos alunos para salvar um antigo clube estudantil, e a união que passa haver entre eles por conta disso. Uma reflexão bacana, ainda que não necessariamente original, sobre o equilíbrio entre promover o novo da juventude e valorizar a memória do passado.
Blade: Trinity
2.8 340 Assista AgoraOs primeiros episódios da franquia não são grandes filmes, mas pelo menos possuem um certo estilo. Inclusive, não é exagero algum falar que o primeiro Blade inspirou, de certa forma, o visual do primeiro Matrix. "Blade Trinity", por outro lado, não possui estilo nenhum, não possui charme, não possui estética, não possui história, não possui nada. É a raspa do tacho de um roteiro agonizando por criatividade. O longa confirma a "maldição do terceiro filme de herói" ao reunir uma trama desinteressante e esburacada, um Blade mais engraçadinho, Ryan Reynolds como um coadjuvante dispensável e, como se já não bastasse ele, um vilão assustadoramente patético. "Blade Trinity" consegue a façanha de criar um dos piores Drácula do cinema. Um personagem fraco, sem presença, sem carisma, sem motivação alguma, com diálogos mal escritos, com uma inteligência questionável, poderes medíocres e que em nenhum momento aparenta justificar a lenda por trás dele ou mesmo fazer jus ao filme ao qual antagoniza. "Blade Trinity" é um escarro não só ao cinema, mas também ao legado do personagem-título e à toda mitologia dos vampiros.
Blade II: O Caçador de Vampiros
3.1 295 Assista AgoraDirigido por Guillermo Del Toro, "Blade II" dá um pouco mais de ênfase ao caráter biológico da coisa, algo que já existia no primeiro filme mas não tão aprofundado quanto aqui. O diferencial se encontra principalmente na estilização neon que Del Toro traz a esse universo, fazendo uma continuação esteticamente mais interessante. A maquiagem dos vampiros ganha destaque, fazendo referência à caracterização do 'Nosferatu' de 1922, na sua concepção mais avançada de 'vampirismo'. As cenas de ação são um pouquinho melhores (com algumas remissões a "Aliens - O Resgate"), e mesmo a limitação dos efeitos especiais se deve mais ao passar do tempo do que a precariedade dos mesmos. O roteiro é um pouquinho mais ambicioso, ao trazer a proposta de Blade ter que se aliar com seus inimigos naturais, ainda que seja repleto de furos, principalmente ao não explicar direito - antes, apenas dar uma 'enrolada' - a 'ressurreição' do personagem de Kris Kristofferson. No mais, Wesley Snipes novamente competente no papel protagonista, Ron Perlman em sua parceria habitual com Del Toro, e Norman Reedus fazendo o Daryl antes do Daryl existir - ele já fez algum personagem diferente disso? Levemente mais bem acabado do que o primeiro longa, mas não por muito.
Blade: O Caçador de Vampiros
3.2 356 Assista AgoraÉ curioso pensar que a primeira adaptação séria de quadrinhos da Marvel que semeou a atual geração de adaptações começou com Blade. Afinal de contas, nunca tendo sido um personagem do 'esquadrão classe A' da editora, o filme do Blade acabou sendo vendido muito mais como um longa genérico de vampiros do que de super-herói. E o roteiro meio que denuncia isso na sua falta de ambição, e na suas escolhas narrativas convencionais que acabam beirando o clichê trash. O filme não é de todo ruim, mas não envelheceu muito bem. Os efeitos especiais são precários para a época e toda a sequência de ação do terceiro ato é um compilado de tudo que havia de pior em filmes de ação dos anos 90. Wesley Snipes ao menos funciona na inexpressividade funcional do personagem, enquanto sua companheira de elenco, N'Bushe Wright, passa trabalho ao não conseguir manifestar surpresa nem quando um cadáver carbonizado volta a vida na sua frente. Teve seu impacto passageiro na época - principalmente, na indumentária - mas é medíocre e, hoje, esquecível.
Fale com Ela
4.2 1,0K Assista AgoraÉ fácil entender o choque e o dilema moral causado por essa desconstrução de "A Bela Adormecida". "Fale Com Ela", décimo-quarto filme do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, parece beirar a todo momento a romantização de uma paixão unilateral, platônica e, de certa forma, necrófila, e só não o faz por deixar bem claro a todo momento que o personagem de Benigno é, afinal de contas, um doente mental. Por outro lado, o desfecho pode dar margem a interpretações complicadas de que o roteiro tenta abonar algo abominável pela consequência boa que veio deste. Não tenho dúvidas, porém, de que o incômodo é proposital, pois Almodóvar parece querer provocar o espectador sobre o limite tênue que divide uma tragédia grotesca de um conto de fadas. Sadicamente, brinca com os nossos preconceitos e julgamentos mais íntimos, e nos deixa sem resposta tentando lidar com eles. É mais um exemplo de sua cinebiografia em que eu reconheço a ousadia do cineasta, e a sua qualidade como contador de histórias, ainda que não aprecie, exatamente, o gosto amargo daquilo que ele me oferece.
Beau Tem Medo
3.2 415 Assista AgoraTerceiro filme do promissor diretor de "Hereditário", o cineasta com nome que parece marca de produto de limpeza, Ari Aster. "Beau Tem Medo" possui uma atmosfera de pesadelo, e é basicamente um mergulho na mente conturbada de um homem psicologicamente afetado por anos de uma relação materna problemática, manipuladora, possessiva e, talvez em certo nível, incesto-edipiana. Uma proposta que poderia ter resultado em uma abstração interessante da exploração de uma mente inquieta, se não fosse por um problema do diretor já verificado como um alerta em "Midsommar", mas que aqui ganha contornos realmente preocupantes: a completa falta de filtro do cara em achar que tudo que ele concebe é 'genial'. "Beau Tem Medo" agoniza em suas três horas labirínticas, redundantes, nada envolventes e estressantes. O filme parece que sai do nada e chega no lugar nenhum, propositalmente trilhando vários desvios desnecessários em sua jornada. As conclusões psicologicamente rasas em que o roteiro chega poderiam ter sido alcançadas em uma trama de 90 minutos e igualmente maluca quanto. O longa-metragem se junta a "Bardo", do Iñárritu, como mais um delírio megalomaníaco, arrogante e pretensioso de um cineasta talentoso desse ano. Uma pena, Aster é jovem demais na carreira para se deixar se levar por vaidades artísticas estúpidas e vazias.
Viúva Negra
3.5 1,0K Assista AgoraA alguns anos que Scarlett Johansson lutava por um filme solo da Viúva Negra, e em 2021 esse sonho se tornou realidade, ainda que não tenha sido lançado exatamente nos moldes como ela gostaria. Sobre "Viúva Negra", a boa notícia é que ele consegue ser um entretenimento rápido e rasteiro de 'ação/espionagem' competente, ou, ao menos, não está tão atrás de outros filmes do mesmo estúdio. O chato é que, tendo vindo após "Vingadores - Ultimato", este longa é esvaziado de qualquer peso dramático envolvendo o destino de sua protagonista (afinal de contas, todo mundo sabe o que vai acontecer). Para contrapôr isso, o roteiro ganha pontos ao apostar na dinâmica entre Natasha e sua 'irmã' Yelena, e funciona por conta da boa química em cena entre Johansson e Florence Pugh. Sendo um filme que funciona mais como uma passagem de bastão, "Viúva Negra" não chega a decepcionar, mas é inegável que ele é apenas um 'mais do mesmo' dentro do universo Marvel.
A Mentira
3.6 2,2K Assista AgoraBaseado abertamente em "A Letra Escarlate", nota-se que "A Mentira" tenta tecer uma crítica ao puritanismo bitolado e exagerado com que a sociedade norte-americana lida com a sexualidade jovem. E de certa forma até consegue, ao mostrar como um fato da vida que deveria ser encarado com naturalidade de repente vira um monstro dentro das paredes daquela escola. Por outro lado, por mais linda e talentosa - e sim, sensual - que Emma Stone seja, aos vinte e poucos anos ela já não convencia mais como uma estudante de Ensino Médio. "A Mentira" é mais um desses filmes adolescentes norte-americanos que escalam adultos para viver o público jovem, e ganha uma certa artificialidade justamente por conta disso. Por outro lado, é sempre gratificante ver a eterna Phoebe de Friends, Lisa Kudrow, em cena. No mais, é uma comédia que tem alguns momentos inspirados, porém inofensiva (a não ser que você seja do tipo que ache que a pessoa tem que perder a virgindade aos 34 anos, transar de luz apagada e tão somente para procriar).
Para Todos os Garotos que Já Amei
3.7 1,2KComédia romântica adolescente inofensiva. Basicamente uma atualização de "Namorada de Aluguel" dos anos 80 com Patrick Dempsey para os dias atuais. Divertidinho e bem dirigido, conquista seus momentos principalmente ao explorar o hilário desespero da personagem principal enquanto morre de vergonha pelos acontecimentos. Pode conquistar fãs dentro da faixa etária de seu público alvo, mas fora desse nicho ele é meio esquecível.
RRRrrrr!!! Na Idade da Pedra
3.5 316A ideia até que é bacana. Fazer um filme paródia, satirizando os costumes sociais, mas se passando na Idade da Pedra. A execução, no entanto, é péssima. O filme simplesmente não tem a menor graça, e o fato do longa insistir exaustivamente na mesma piada durante o filme inteiro (todos os personagens se chamarem 'Pedro') é algo que testa a paciência do espectador. Se você for do tipo que se diverte com trasheira, portanto, pode até vir a encará-lo como um 'guilty pleasure', mas pra mim o filme é só 'guilty' mesmo. Vergonha alheia.
As Sufragistas
4.1 778 Assista AgoraConsigo reconhecer a relevância de "As Sufragistas" pelo retrato histórico que faz de uma luta social indubitavelmente importante e ainda necessária mesmo nos dias de hoje em vários lugares do mundo. E é mesmo assustador, irracional e contraditório que no início do Século XX, a Inglaterra - que já havia tido duas das maiores estadistas mulheres reconhecidas da História, as Rainhas Elizabeth I e Vitória - ainda negavam de forma tão veemente o direito fundamental do voto às mulheres. Entretanto, enquanto filme, receio que "As Sufragistas" se mostra uma experiência decepcionantemente fria e distante. Novelesco e excessivamente apelativo em alguns pontos, o longa-metragem falha em criar algum elo de empatia entre o espectador e suas personagens, que surgem e somem na película sem deixar saudade. O esforço artificial em querer arrancar lágrimas e indignação a qualquer custo se mostra evidente. A fotografia é excessivamente escura e a estética é desinteressante. Em uma obra que deveria ressaltar justamente o aspecto de humanidade de suas defendidas, ele peca justamente pela forma mecânica e sem alma com que conta sua história.
Atômica
3.6 1,1K Assista AgoraEm uma Berlim dividida do final da década de 80 repleta de neon, Charlize Theron é uma espiã encarregada de recuperar uma lista de nomes que, caso caia nas mãos erradas, pode evitar o final da Guerra Fria prestes a acontecer com a queda do Muro. Com um roteiro que referencia os clássicos filmes de espionagem e que não é exatamente original, "Atômica" conquista sua identidade pela atuação intensa de sua protagonista na pele de uma anti-heroína com sangue nos olhos, e na direção de David Leitch que dota o filme de um ritmo frenético e uma estética híbrida entre o período da época e o pós-moderno. A grande cena do filme, o plano-sequência em que a personagem principal precisa proteger um desertor dos agentes da KGB, é de tirar o fôlego por sua competência técnica irrepreensível. Ainda que o filme possa ser meio previsível - certa natureza dúbia de determinado personagem fica bastante clara desde o início - creio que a intenção do filme era muito mais ilustrar a ferocidade de sua protagonista, do que criar alguma trama de mistério. Seja como for, é um filme de ação que envolve e conquista, seja pelas suas ótimas cenas de ação, seja pela beleza fatal de Charlize Theron.
Shiva Baby
3.8 261 Assista AgoraParece um vulcão prestes a explodir. "Shiva Baby" é o sufoco antes da catarse, um bola na garganta querendo ser gritada mas constantemente abafada pelas convenções sociais e familiares. Além da direção funcional e eficiente de Emma Selligman, o filme não seria o mesmo sem a atuação estupenda de Rachel Sennott, que carrega o longa inteiro nas costas. Vivendo uma jovem no final da adolescência e prestes a entrar na vida adulta, com todas as pressões típicas da idade, somado ao fato de sofrer de uma notória baixa auto-estima e da necessidade de sentir a afeição e o apreço dos outros, Danielle tem o desafio de encarar todas as suas angústias em um único dia, quando os resultados de todas as suas decisões de vida parecem se voltar contra ela em único momento para julgá-la. É um estudo de personagem intenso, sufocante e, em alguns momentos, desesperador. Tem os seus momentos de humor negro em que encontra um certo alívio, e um desfecho, talvez, esperançoso. Mas no geral, uma obra propositadamente desconfortável, que nos coloca na pele da protagonista, a ponto de querer berrar, extravasar aquilo que está entalado, soltar um grande "FUCK YOU!" ao mundo, e a todos que o rodeiam. A vida, suas expectativas e suas consequências, nunca foram tão torturantes e desgastantes quanto nesse exaustivo velório judeu.