Apesar de não ter funcionado plenamente comigo, nesta revisão, acho compreensível e defensável que muitos críticos considerem este filme uma obra-prima. Afinal, representa, sim, a quintessência do subgênero 'noir', numa trama sobremaneira complicada (a partir de certo ponto) que, a despeito de uma ou outra firula, não suprime a excelência do roteiro: anotei vários diálogos, enquanto revia o filme. O elenco é ótimo, o desfecho é belíssimo e a condução directiva é adulta, madura e tecnicamente elegante, demonstrando que seu realizador transcreveu com rigor e maestria aquilo que aprendera e executara durante seus maravilhosos filmes de terror. Repleto de possibilidades de interpretações e conjecturas. A ser revisto, novamente! (WPC>)
Não vi o filme anterior do diretor (mas tenho certeza de que o apreciarei) e, pela comparação entre os dois enredos, dá para perceber que ele deseja se firmar como uma espécie de Nick Hornby cinematográfico. O ponto de partida para este filme possui muitas similaridades com ALTA FIDELIDADE, ainda que siga um rumo narrativo à la P.S. EU TE AMO. Seja como for, ele consegue nos cativar e demonstrar volição quanto à superação emocional da protagonista, num luto prolongado por alguém que se foi há dois anos. Os atores são simpáticos e, obviamente, as canções são legaizinhas (Nely Furtado até faz uma ponta!), mas a falta de lógica físico-teleológica do roteiro faz com que percamos o interesse na situação central, visto que as "descobertas" da protagonista, quanto ao disco definitivo que pode mudar o seu passado/futuro, não fazem multo sentido. É uma diversão confortável, mas que desperdiça a chance de ser um filme realmente interessante. O terço final apressa o ritmo e torna-se enfadonho, paradoxalmente. Uma pena. Mas insisto que o diretor merece ser conhecido: aguardemos os seus próximos trabalhos! (WPC>)
Apesar de prolífico e tendente ao surrealismo, há algo que me decepciona nos filmes do Quentin Dupieux: em determinado momento de seus trabalhos, em parece capitular ceder às convenções de um divertimento que exige a "facilitação". Não é o caso aqui: naquele que talvez seja o mais realista de seus filmes, ele atinge píncaros de genialidade reivindicativa e de ambigüidade política, criticando desde o fascínio provocado pela extrema-direita entre os trabalhadores fatigados quanto o elitismo dos artistas acostumados ao puxa-saquismo da critica. Raphaël Quenard está belíssimo e mui eloqüente enquanto protagonista, num elenco extraordinário e muitíssimo bem dirigido. A duração curta facilita a adesão imediata dos espectadores à proposta auto-investigativa do realizador, que nos obriga a refletir sobre o que está acontecendo, evitando o maniqueísmo julgamental acerca de quem está certo ou errado. O que temos diante de nós é um dilema: por que escolhemos obedecer a algumas regras? Que interesses ostentamos ao fazê-lo? Um filme inteligentíssimo e engraçado ao lidar com uma situação sumamente dramática. Amei! (WPC>)
Quando esta produção recebeu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, estranhei que ele retirasse o prêmio dos favoritos orientais; quando o vi pela primeira vez, na extinta "Sexta Sexy", da Band, não entendi algumas situações e frustrei-me por ele não ser "erótico o suficiente". Erro meu! Revisto agora, fiquei impressionado perante a excelência do roteiro e a magnificência dos diálogos e interpretações. Amei a seriedade e perfeição da Chus Lampreave, num personagem não-almodovariano. Mas e Fernando Fernán Gómez que brilha do início ao fim: que personagem sublime, um ideal de maturidade e sanidade, para mim. As cenas são repletas de sutileza política e erótica, unindo ambos os conceitos de maneira inteligentíssima. Maravilhoso! A trilha musical de Antonie Duhamel encantar-me-á perpetuamente: lindo, lindo, lindo filme! (WPC>)
Sou fã do diretor e interesso-me bastante pelo modo como ele concede asas livres à sua imaginação, em percursos atravessados pela liberação erótica e auto-reconhecimento identitário. Aqui, fascinei-me de imediato por ao menos dois dos personagens do trio central: Isabella e Jonata são fascinantes, apaixonantes, e foi maravilhoso acompanhar o passeio dominical deles por São Paulo. As menções, entre o ficcional e o documental àquela "pandemia da amnésia" são oportunas e inteligentes, bem como as aparições da diva Gilda Nomacce e os jogos com efeitos sonoros. Há muitos detalhes e referências nas entrelinhas e diálogos, muito humor e muita consciência melancólica (mas não paralisante) da necessidade de seguir e frente. Por vezes, lembrei de CÉLINE E JULIE VÃO DE BARCO, há muitas similaridades com o 'trottoir' surrealista/psicodélico urbano do Jacques Rivette, o que vai se tornando cada vez mais explícito, até a apoteose antes do desfecho. Pessoalmente, preferi muito mais a primeira metade que a segunda, mas gosto de como termina, fiquei com as canções repetindo na mente, algum tempo após a sessão. Minha paixão pelo diretor foi recompensada: um filme fofo e motivacional. Uma belezinha, remédio certeiro para o mal-estar das "pequenas e grandes doenças que todos nós temos"! (WPC>)
Enquanto eu via o filme, por mais que eu estivesse fascinado pela magnifica interpretação da garotinha Sofía Otero e pela delicadeza na abordagem da temática da transexualidade infantil, parecia que eu não estava gostando tanto da obra. Quiçá por seu ritmo lento ou pela recusa em aderir a uma narrativa tradicional, no sentido de que o protagonismo é diluído entre mais de uma personagem: a garotinha que descobre a sua própria identidade serve como espelhamento genético para a mãe artista, em dúvida quanto ao(s) próprio(s) talento(s) e o acolhimento mui afetuoso da tia-avó cuidadora de abelhas. Os fatos ocorrem de maneira plácida, sem dependerem de um clímax anunciado, que, quando ocorre, tem uma função mais metafórica que efetivamente causal: é quando aplica-se, na prática, o que é discutido num diálogo anterior, acerca da inexistência daquilo que não tem nome, que não é chamado por ninguém, por conta disso. Terminada a sessão, não paro de pensar no filme, de maneira encantatória: é uma obra sobre relações familiares naturalizadas a partir da aceitação de ideais possíveis e sobre o amor enquanto artefato artístico. Bonito e atípico. O idioma basco causa muita estranheza entre os ouvintes! (WPC>)
Por mais que se reclame do moralismo gritante do título brasileiro, eu gosto de como ele antecipa um rol de expectativas positivamente frustradas: por se tratar de um filme da fase estadunidense do Lang, esperávamos uma trama de vingança. Tem-se um relato de reconciliação interna; por conter uma participação actancial da jovem Marilyn Monroe, pensamos haver erotização exacerbada de sua presença. Encontramos um retrato de rebeldia empregatícia, em sua ótima interpretação; por se tratar de uma época em que as convenções hollywoodianas rendiam-se ao machismo dominante, pensamos encontrar algo que confirme o tal título. Lidamos com um roteiro maduro, em que há também brechas para a exortação da emancipação feminina, não obstante as escolhas que as personagens tenham à disposição sejam exíguas e/ou insatisfatórias. Os diálogos são maravilhosos e a ascendência teatral do enredo rende momentos de suma pujança dramatúrgica, sobretudo na segunda metade, depois que as ondas quebram novamente com violência na praia, sob a luz do luar, agora justificando o título original. Achei a abordagem moderníssima, quiçá influenciada por STROMBOLI e antecipando tanto MARTY quanto o recente RODA GIGANTE. Barbara Stanwyck está soberba, como a protagonista comedida e cansada, após tantos maus tratos da vida livre que ela desejou para ti. Paul Douglas surge enquanto complemento sobremaneira digno. Keith Andes é o jovem sensual, ponderado e intenso em iguais medidas. Enquanto Robert Ryan aparece como aquele que tem a função de estragar tudo o que toca. Foi a única interpretação que eu não gostei tanto (o que demonstra, talvez a intencionalidade alcançada dos propósitos insuportáveis do personagem?). Direção segura, ainda que atípica. Achei o filme deliciosamente estranho, muito à frente das convenções românticas daquele período, no que tange à abordagem de um dilema essencialmente feminino. Em dado momento, soou-me arrítmico, demorado, estendido, prolongado.... Mas assim também era o dilema da protagonista. Muito bom! (WPC>)
As reviravoltas deste filme são tão impressionantes e o roteiro é tão impressionante na demonstração daquilo que está contido em seu título, que, não tem jeito: não importa quantas vezes o revejamos, o impacto é sempre como se fosse a primeira vez. Dá pena do personagem de Tom Neal, tadinho, mas a espiral de azar só tende a crescer. Ann Savage é a vilã de filme 'noir' que todos nós queremos e tememos. Incrível o que o diretor faz com um orçamento reduzido e condições céleres de filmagem. Magnífico em cada detalhe e traumatizante na maneira como surgem os relatos de agressão de violência dos personagens, caramba! (WPC>)
A direção e o roteiro estragam todas as possibilidades que este filme tinha de ser muito interessante, enquanto análise ambivalente das interferências de 'coaches' nas vidas de pessoas deprimidas e/ou exploradas por outrem. Gosto das interações nos grupos de apoio e de como o personagem de Nicholas Hoult lida com as suas inseguranças subservientes. Porém, quando a personagem de Awkwafina entra em cena, extremamente caricatural, a trama desanda, no sentido de que começa a haver muita competição quanto ao mote tramático principal. Ou seja, além do ótimo ponto de partida contido no título brasileiro, há a briga de gangues e a corrupção policial, de um lado, e a abnegação de duas irmãs para vingar a morte injusta do pai policial. Tudo isso em meio a muito sangue e piadas fora de tom. Minha mãe divertiu-se, ao meu lado, e, volta e meia, eu sentia que o filme poderia render bastante, o que continua a ocorrer entre uma ou outra brecha de banalização psicanalítica. Nicolas Cage ao menos se diverte, ainda que a ovação da "crueldade pela crueldade" não faça sentido na caracterização de seu personagem. Gostei das inserções de sua imagem em versões antigas de produções com o personagem Drácula (risos). (WPC>)
Meus contatos anteriores com a diretora não são dos melhores, no sentido de que suas intenções sempre descambam para as festividades e, por extensão, celebração das benesses classistas dos seus personagens. Aqui, de fato, tem-se isso logo no início, no aniversário da mãe das protagonistas. Mas o roteiro é direcionado para a "correção" do relacionamento entre as duas personagens fraternais, o que descamba para uma interessante tônica feminista, do meio para o final, culminando num desfecho positivamente empoderado(r). A química entre as duas atrizes principais é descontínua, mas acertada (até porque isso é abordado internamente): gosto muito da Tatá Werneck (por mais que, às vezes, seja difícil compreender o que ela está falando), enquanto a Ingrid Guimarães realmente se esforça para compor uma mulher com sentimentos tridimensionais. A aparição do personagem de Leandro Lima, neste sentido, é importante enquanto catalisador orgástico. Minha mãe, que viu o filme ao meu lado, riu bastante, o que confirma o sucesso da obra, em termos de alcance de público. E Arlete Salles cumpre com dignidade a sua participação, conferindo toques de reflexões adultas a uma obra que não é tão rasteira quanto a sua divulgação faz parecer: em meio a todos os seus vícios discursivos, há algo de inovador e bem-vindo, ao questionar a fidelidade excessiva das donas-de-casa abnegadas. Quem diria? (WPC>)
Antes da sessão, comentei com um dos co-diretores (que repassou-me o arquivo com o filme) que não um dos maiores admiradores do cinema estrutural, subgênero ao qual ele relacionara o filme. Para além das características elementares deste tipo de filme, a sinopse ora acostuma (em relação à qual não tive acesso antes da sessão) demonstra uma intenção mais explícita, quanto ao viés analítico da obra. Não há nada escrito na tela, contextualizando o título/cenário. Para quem nunca foi a Indaiatuba, por exemplo, a fazenda apresentada poderia ser uma senzala antiga, abandonada, e imaginamos os gritos de muitas pessoas maltratadas e exploradas naqueles ambientes. O filme, porém, joga com uma relação entre espaço físico criado pelo homem e a natureza circundante: as plantas insistem em brotar em meio aos tijolos e linhas de trem. Gostei muitíssimo de como o som direto aproveitou a importância e a beleza do canto dos pássaros e farfalhar das folhas. O céu alvo impressiona, inclusive pelo modo se movimenta. Somos testemunhas do tempo em ação, em curso. Mas algo incomodava-me, no que tange à impressão de que aqueles lugares foram palco de exploração do trabalho alheio. Até que um enorme trem corta a tela, numa seqüência que funciona como clímax. A despeito de um eventual mal-estar concernente ao meu problema com o subgênero (sinto falta de ver pessoas e, aqui, achei o projeto pouco discernível na prática da montagem), é um filme divertido de ser visto, é agradável assistir às nuvens que passam, enquanto marimbondos e pássaros eventualmente são captados pela tela. Não é um trabalho que me cative, como eu suspeitava, mas agrada em suas entrelinhas (exceto pelo que a minha imaginação histórica fez divagar quanto ao passado do lugar que eu não conhecia), de modo que, sim, não apenas eu parabenizo os diretores como agradeço à confiança depositada em nós, espectadores. E viva o cinema super alternativo produzido no Brasil! (WPC>)
Quando vi o 'trailer', pensei que divertir-me-ia: gosto da Sydney Sweeney e achei o seu parceiro de cena muito bonito. Mas a seqüências de abertura já denunciou onde o filme falharia radicalmente: na sua ode à falta de comunicação como algo divertido (não é). Além de a suposta vontade de urinar da protagonista revelar-se inconvincente, o modo como é alimentando o desentendimento entre os dois futuros amantes é vexatório, o que só piora a cada aparição gaiata do estranhamente assexuado personagem Pete, cujas ações estão todas voltadas para os encontros amorosos de outras pessoas. As piadas envolvendo as desavenças entre os protagonistas não repetitivas e, por mais que se mostre os corpos seminus deles, tudo é feito de maneira frígida, sem tesão. É como se o sexo fosse algo destrutivo, tal qual chega a insinuar Pete acerca da geração 'hippie' de seu padrasto, vivido de maneira caricatural por Bryan Brown. Fiquei triste ao perceber Rachel Griffiths e Dermot Mulroney reduzidos a personagens paspalhos e irritantes. A vendabilidade do conforto associado aos benefícios de classe (verdadeiro tema do filme) assume píncaros cada vez mais nojosos à medida que os ensaios para o casamentos são desenrolados. E o que já era muito ruim torna-se pior: o para que o casal adira à previsível reconciliação, é preciso difamar ainda mais as pessoas (e/ou possíveis concorrentes à sua volta). Não vou mentir que gostei de alguns aspectos, como as frases de efeito espalhadas pelo cenário ou o retorno a seqüências-chave da trama, ressiginificadas na cantoria coletiva do desfecho. Mas é tudo muito, muito ruim, de dar medo, tamanho o seu investimento propagandístico acerca do luxo e das referendações institucionais do envolvimento romântico entre as pessoas. Para mim, hediondo. Nem a suposta atualização de uma comédia shakespeareana serviu: péssimo em nível abissal. O diretor é ostensivamente inábil naquilo que pretende: e tome-lhe câmera girando enquanto os protagonistas se beijam mecanicamente, aff! (WPC>)
Ainda não li a novela do Robert Louis Stevenson, mas está aqui, em lugar privilegiado em minha lista. Sou obcecado pela versão do Robert Mamoulian e fiquei impressionado pelo elenco reunido, mas a direção do Victor Fleming não extrai a expressividade prometida a partir das situações descritas: achei o filme seco, impessoal, desenxabido: o protagonista é bem delineado, nos diálogos iniciais, mas, depois, resume-me a uma caracterização burocrática de uma malvadeza direcionada e exclusivista; Lana Turner pareceu-me francamente subaproveitada; e Ingrid Bergman brilha, extrai pujança dramática correspondente à sua personagem, de modo que os melhores momentos do filme são quando ela está em cena. Mas, mesmo assim, é insuficiente para resgatar a maestria do trabalho como um todo, visto que o Fleming age como um realização em linha de produção, dá para perceber na tela a quantidade de vezes em que ele ensaiou, esvaziando a trama daquilo que ela tem de mais intensa. Achei o filme interminável por vezes, queria que acabasse logo. Talvez numa revisão sem tantas expectativas funcione melhor. Nalgum momento, quiçá após a leitura do livro, hei de revê-lo. Por ora, não funcionou muito! :( - WPC>
Que filme belíssimo! Estava precisando muito de uma trama lenta e intensa (em sua carnalidade) como essa, em que os personagens se encontram, se amam e seguem as suas vidas, como ocorre com muitos de nós (ou todos nós) no frenesi contemporâneo, sob a égide do capitalismo urbano. A fotografia é calorosa, acolhedora, e a trilha musical de Lucas Carvalho direciona a cadência da montagem, perpetrada pelo próprio diretor. É um filme permanentemente musicado, que traduz em imagens e sentimentos os versos da canção de Dona Ivone Lara, que a protagonista entoa num momento-chave. Shrilene Paixão está ótima em cena, mas é Welket Bungué que nos apaixona ainda mais a cada aparição: que homem lindo e talentoso, sutil na delicadeza da expressões e falas, olhares e movimentos. Fiquei encantado ao longo do filme inteiro, amei o seu ritmo compassado, a ausência de teleologia no desenrolar da narrativa. Encontra-se, desencontra-se e os ciclos recomeçam: é assim em nossos empregos, é assim na rotina da vida. Belíssimo! (WPC>)
Fiquei muito surpreso com algo que acontece no meio dos créditos finais, uma imagem que justifica muitas das opções estéticas da narrativa (que o cenário seja Curitiba, por exemplo). Não entendo o porquê de esse filme ter sido tão atacado por alguns críticos: o achei muito eficiente enquanto exercício de gênero, trazendo para o Brasil situações comuns em Hollywood, na década de 1990, no mesmo clima de A MÃO QUE BALANÇA O BERÇO, por exemplo. Fico impressionado com a versatilidade do José Eduardo Belmonte, ainda que, sendo tão prolífico, ele ainda não consiga ostentar um estilo próprio. Mas é um artesão hábil, que equivoca-se, aqui, ao optar por iniciar o filme com situações de seu desfecho (afinal, em aberto). Nem precisava: a mudança de perspectiva sobre a suspeição do cônjuge ocorre de maneira interessante na trama, por mais que, no início, pareça-se julgar excessivamente a personagem de Grazi Massafera, tanto quanto os demais personagens também o faziam. Não achei as interpretações do casal central ruins: pelo contrário, são eficientes no jogo de aparências que trazem à tona, o que ganha mais pontos com a verve ostensivamente antibolsonarista do roteiro. Por vezes, senti-me positivamente perturbado. É um filme que merece encontrar o seu público, portanto: de minha parte, recomendo-o com entusiasmo! (WPC>)
Já tinha ouvido falar muito sobre essa dupla de comediantes, mas nunca tive a oportunidade de conferir nenhum de seus filmes. Acho que comecei por um ideal, repleto de 'gags' e trama geral. É o modelo que deu origem às imitações chanchadescas no Brasil, né? Uma ou outra palhaçada (aliás, palhaçadas o tempo inteiro), perseguições frenéticas, um mote romântico entre coadjuvantes e canções afetadas, aqui e acolá. O Abbott é sério demais, pouco engraçado. Mas papouquei-me de rir com o Costello, desde a primeira aparição, e a situação envolvendo o Rags Ragland. Minha mãe estava ao meu lado, e lembrou de quando via estes filmes, em sua pré-adolescência, na década de 1950. O roteiro é mero pretexto para as 'gags' (e canções), mas o filme diverte. Quando entendemos que ele segue à risca uma fórmula bem sucedida, deixamo-nos levar e caímos na gargalhada. A seqüência final, na montanha-russa, é pura ode às aventuras de quem se atrapalha no dia a dia... kkkkkkkkkkkk (WPC>)
Vi o filme por puro acaso, numa exibição na HBO, e achei uma gracinha. 'Pop' e despretensioso, mas não blasfemo, como talvez tenha sido acusado. Tudo bem, não curti os estereótipos trapalhões do Anjo Gabriel e dos Reis Magos, mas as canções são fofinhas, Milo Manheim é apaixonante e Antonio Banderas está divertindo-se à beça, entregando-se à caricatura sem receio e sem medo de ser feliz (ainda que seja o vilão). Foi realmente uma grata surpresa. Sou obcecado por musicais, não tinha como não funcionar comigo! (risos) - WPC>
Ainda que a temática das drogas não apareça aqui, achei este filme muitíssimo parecido com (e/ou influenciado por) TRAINSPOTTING - SEM LIMITES. Não apenas pela relação entre os personagens e pela narração dramático-satírica, mas até mesmo alguns planos e enquadramentos são bastante semelhantes. Como eu vi o primeiro da trilogia de Oslo depois de ter conferido os demais exemplares, decepcionei-me um tantinho: o que é elogiosamente visto e descrito como crueza 'punk' tem também um quinhão mui desagradável de elogio concessivo à masculinidade tóxica. As interpretações são desenvoltas, mas acho na hipertrofia do repentino reconhecimento literário dos personagens incomodou-me: pareceu tão corriqueiro publicar um livro, ser reconhecido por ele, etc. . Por vezes, o vai e vém da narrativa confundiu-me, o que é intencional, mas, no geral, acho que o filme teve mais boas idéias que acertos de execução. É gracioso, mas promete mais do que oferece, enquanto obra imbuída de muito frescor juvenil. Culpa do gélido clima norueguês, talvez. (WPC>)
P.S.: achei o intérprete do Erik muito parecido com o Evan Peters!
A empolgação era extrema: enquanto minha mãe assistia ao filme, na sala, ouvi trechos da fantástica trilha musical, de caráter sinfônico, do Scott Walker e fiquei obcecado para conferir o filme. Com as expectativas nas alturas, fui de fato, arrebatado pela seqüência de abertura e gostei da maneira um tanto distanciada como são retratados as situações políticas e os personagens, não obstante as interpretações intensas de um ótimo elenco. Foi quando a frustração instaurou-se: por mais que a direção me fascinasse, em seu pendor experimental, achei o roteiro óbvio, em seu adlerismo. Reiterativo e redundante, em sua demonstração de que crianças mimadas convertem-se em fascistas, oh! A revelação do desfecho, quanto à origem genética do garoto crescido, pareceu-me igualmente insossa, como a maior parte do que acontece. Tudo bem, concordo que o garotinho Tom Sweet entrega-nos uma potente demonstração do quão irritante um filho único pode ser, mas o filme passa a redundar em círculos, a partir de determinado momento. A empolgação do início fenece, ao final, tudo chafurda numa metáfora previsível sobre um fascismo que é também hodierno. Uma pena. Mas preciso do CD deste filme, uau! (WPC>)
O titulo brasileiro não é infiel à proposta da narrativa, mas é o original que sintetiza melhor as intenções da diretora, ao fazer com que acompanhemos o cotidiano de produção de uma artista que, a princípio, revela-se tão desagradável enquanto pessoa. Foi importante, para isso, o enfeamento da maravilhosa protagonista, uma de minhas atrizes contemporâneas favoritas: não conseguimos sentir simpatia por ela, mas a empatia surge gradualmente, quando compreendemos o porquê de ela ter ficado tão amargurada, convivendo com aqueles familiares tão problemáticos. Hong Chau transforma-se em cada papel que dignifica: ela está maravilhosa aqui, a personificação de diversas amigas formadas em Artes Visuais. Por quase uma hora de projeção, parecia que eu estava desgostando do filme, de seu ritmo lento, do enfoque ostensivo da diretora em anticlímaces (vide quase todas as situações referentes ao cuidado com o pombo), Mas, na seqüência da exposição, tudo se justifica, como objetivo a ser alcançado, como ápice de um processo que, mesmo que continue em aberto ou "em curso produtivo", tanto quanto o filme em si (vide a importância situação dos créditos finais), provoca reações intensas em quem testemunha o percurso de criação, não apenas a obra acabada. É uma trama difícil e, não vou mentir, intencionalmente "chata", mas que cresce bastante em nossa apreciação ao término, quando cozemos interiormente os elementos rigorosamente urdidos pelo roteiro minimalista de uma cineasta caracterizada por este adjetivo. Presumo que, numa revisão, gostarei bem mais: num primeiro contato, ele intimida bastante, assusta-nos pela lentidão, pelo registro da alienação de quem trabalha com arte, mas não consegue administrar adequadamente os prazeres da vida. Uma aula de reeducação espectatorial! (WPC>)
Não sabia o que esperar, exceto uma multiplicação de camadas psicanalíticas e alguma metalinguagem roteirística. a julgar pelo que descobrimos no trabalho mais famoso (e premiado) da diretora. Percebi que ele seria exibido no Telecine Cult e aproveitei a oportunidade. E adorei: no início, demorei um pouco para imergir. Minha mãe, ao meu lado, reclamava que não estava entendendo os vais e véns da narrativa. Mas, de repente, eu estava fascinado, obcecado, apaixonado... Cheguei mesmo a gargalhar, de tão aflitivos que são os ápices dramáticos. Virginie Efira está maravilhosa, mas é eclipsada pelo defsile de talentos: Adéle Exarchopoulos tem o desempenho actancial mais pungente desde AZUL É A COR MAIS QUENTE; Gaspard Ulliel angaria um fascínio repulsivo e crescente, em cada aparição; Niels Schneider encanta pela beleza; e Sandra Hüller está absolutamente soberba. Um exercício de análise, em múltiplas significações para a palavra, trabalho de gênia. Só melhora, quanto mais se complexifica: incrível! (WPC>)
Acho válido o espírito de cooperação que validou a feitura, mas, enquanto discurso, o filme é sobremaneira problemático, no sentido de que, por vezes, parece celebrar aquilo que condena, celebrar a esperteza de quem sobrevive mediante o ludibrio... Percebo que, a despeito de seus evidentes defeitos, o filme seja deveras apreciado, o que talvez tenha a ver com um conhecimento de conjuntura (os espaços destinados às interações juvenis de classe média no Rio de Janeiro), com certa verossimilhança na abordagem e confecção dos personagens. Comigo, nada funcionou: além do mau ritmo e das interpretações forçadas, as reviravoltas à la Tarantino não engrenam, o que só piora pela inserção de uma montagem que reverencia a linguagem televisiva. Repito: que bom que o filme foi feito e distribuído, nas condições possíveis, mas foi difícil chegar até o final, de tão contaminado pela podridão que o roteiro é. Desgostei plenamente, o que lamento. (WPC>)
Ainda não vi O PESO DO TALENTO, mas é evidente que é u filme que pega carona nesta verve superexpositiva do Nicolas Cage. Seu personagem, entretanto, é composto com muita seriedade: apesar de a situação tramática logo se desgastar, e o filme ficar cansativo do meio para o final, em razão de sustentar-se em apenas uma piada, seu personagem é delineado com seriedade dramática, oscilando entre o conscientemente ridículo e o merecedor de piedade. Não chegamos a nos identificar, mas torcemos por ele, no desespero. O clima é de pasticho kaufmaniano, mas a direção não é muito firme, o tom do filme é indefinido, encerrando-se de maneira quase cruel, em sua inevitabilidade melancólica. Funciona melhor depois que a sessão termina, em verdade. A execução de uma canção de Talking Heads, nos créditos finais, ressignifica aquilo que pareceu afoito no decorrer das situações: poderia ser um excelente estudo de personagem, mas o roteiro se desperdiça em piadas neogeracionais, em cacoetes da A24 e no reaproveitamento chistoso de temas que renderam um eficiente filme de suspense no oitentista A MORTE NOS SONHOS. Acho que, numa revisão sem expectativas, funcionará bem melhor... (WPC>)
Assisti aos principais filmes deste realizador supostamente 'trash' em ordem invertida, e fiquei positivamente chocado com o teor psicanalítico dos mesmos. Adentrei a sessão enquanto lidava com uma grava situação familiar, envolvendo um irmão mais novo, de modo que o arrebatamento foi intenso: será que o Frank Henenlotter teve acesso aos meus diários?! Brincadeiras à parte, é maravilhoso como ele consegue tornar tão crível um personagem de látex, fazer-nos experimentar legítimas, que vão do medo ou horror inicial a uma piedade sincera, a uma necessidade de compreensão e entendimento da situação trazida à tona: é um filme sobremaneira triste e melancólico, sobre diversos tipos de solidões, não sendo casual que tenha sido locado em Nova York, numa região consagrada aos artistas "alternativos". De fato, antecipa o mote geral de MALIGNO, do James Wan, mas pensei ainda mais na ambientação scorseseana, que se irmana ao que o cineasta fez em DEPOIS DE HORAS ou em seu episódio de CONTOS DE NOVA YORK. 'Exploitation' é algo premonitório, em âmbito social, afinal. Fui pessoalmente tocado por este filmaço, amei! (WPC>)
Fuga do Passado
4.0 86 Assista AgoraApesar de não ter funcionado plenamente comigo, nesta revisão, acho compreensível e defensável que muitos críticos considerem este filme uma obra-prima. Afinal, representa, sim, a quintessência do subgênero 'noir', numa trama sobremaneira complicada (a partir de certo ponto) que, a despeito de uma ou outra firula, não suprime a excelência do roteiro: anotei vários diálogos, enquanto revia o filme. O elenco é ótimo, o desfecho é belíssimo e a condução directiva é adulta, madura e tecnicamente elegante, demonstrando que seu realizador transcreveu com rigor e maestria aquilo que aprendera e executara durante seus maravilhosos filmes de terror. Repleto de possibilidades de interpretações e conjecturas. A ser revisto, novamente! (WPC>)
Grandes Hits
3.4 22 Assista AgoraNão vi o filme anterior do diretor (mas tenho certeza de que o apreciarei) e, pela comparação entre os dois enredos, dá para perceber que ele deseja se firmar como uma espécie de Nick Hornby cinematográfico. O ponto de partida para este filme possui muitas similaridades com ALTA FIDELIDADE, ainda que siga um rumo narrativo à la P.S. EU TE AMO. Seja como for, ele consegue nos cativar e demonstrar volição quanto à superação emocional da protagonista, num luto prolongado por alguém que se foi há dois anos. Os atores são simpáticos e, obviamente, as canções são legaizinhas (Nely Furtado até faz uma ponta!), mas a falta de lógica físico-teleológica do roteiro faz com que percamos o interesse na situação central, visto que as "descobertas" da protagonista, quanto ao disco definitivo que pode mudar o seu passado/futuro, não fazem multo sentido. É uma diversão confortável, mas que desperdiça a chance de ser um filme realmente interessante. O terço final apressa o ritmo e torna-se enfadonho, paradoxalmente. Uma pena. Mas insisto que o diretor merece ser conhecido: aguardemos os seus próximos trabalhos! (WPC>)
Yannick
3.4 9 Assista AgoraApesar de prolífico e tendente ao surrealismo, há algo que me decepciona nos filmes do Quentin Dupieux: em determinado momento de seus trabalhos, em parece capitular ceder às convenções de um divertimento que exige a "facilitação". Não é o caso aqui: naquele que talvez seja o mais realista de seus filmes, ele atinge píncaros de genialidade reivindicativa e de ambigüidade política, criticando desde o fascínio provocado pela extrema-direita entre os trabalhadores fatigados quanto o elitismo dos artistas acostumados ao puxa-saquismo da critica. Raphaël Quenard está belíssimo e mui eloqüente enquanto protagonista, num elenco extraordinário e muitíssimo bem dirigido. A duração curta facilita a adesão imediata dos espectadores à proposta auto-investigativa do realizador, que nos obriga a refletir sobre o que está acontecendo, evitando o maniqueísmo julgamental acerca de quem está certo ou errado. O que temos diante de nós é um dilema: por que escolhemos obedecer a algumas regras? Que interesses ostentamos ao fazê-lo? Um filme inteligentíssimo e engraçado ao lidar com uma situação sumamente dramática. Amei! (WPC>)
Sedução
3.4 29Quando esta produção recebeu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, estranhei que ele retirasse o prêmio dos favoritos orientais; quando o vi pela primeira vez, na extinta "Sexta Sexy", da Band, não entendi algumas situações e frustrei-me por ele não ser "erótico o suficiente". Erro meu! Revisto agora, fiquei impressionado perante a excelência do roteiro e a magnificência dos diálogos e interpretações. Amei a seriedade e perfeição da Chus Lampreave, num personagem não-almodovariano. Mas e Fernando Fernán Gómez que brilha do início ao fim: que personagem sublime, um ideal de maturidade e sanidade, para mim. As cenas são repletas de sutileza política e erótica, unindo ambos os conceitos de maneira inteligentíssima. Maravilhoso! A trilha musical de Antonie Duhamel encantar-me-á perpetuamente: lindo, lindo, lindo filme! (WPC>)
Três Tigres Tristes
3.6 4 Assista AgoraSou fã do diretor e interesso-me bastante pelo modo como ele concede asas livres à sua imaginação, em percursos atravessados pela liberação erótica e auto-reconhecimento identitário. Aqui, fascinei-me de imediato por ao menos dois dos personagens do trio central: Isabella e Jonata são fascinantes, apaixonantes, e foi maravilhoso acompanhar o passeio dominical deles por São Paulo. As menções, entre o ficcional e o documental àquela "pandemia da amnésia" são oportunas e inteligentes, bem como as aparições da diva Gilda Nomacce e os jogos com efeitos sonoros. Há muitos detalhes e referências nas entrelinhas e diálogos, muito humor e muita consciência melancólica (mas não paralisante) da necessidade de seguir e frente. Por vezes, lembrei de CÉLINE E JULIE VÃO DE BARCO, há muitas similaridades com o 'trottoir' surrealista/psicodélico urbano do Jacques Rivette, o que vai se tornando cada vez mais explícito, até a apoteose antes do desfecho. Pessoalmente, preferi muito mais a primeira metade que a segunda, mas gosto de como termina, fiquei com as canções repetindo na mente, algum tempo após a sessão. Minha paixão pelo diretor foi recompensada: um filme fofo e motivacional. Uma belezinha, remédio certeiro para o mal-estar das "pequenas e grandes doenças que todos nós temos"! (WPC>)
20.000 Espécies de Abelhas
4.1 11Enquanto eu via o filme, por mais que eu estivesse fascinado pela magnifica interpretação da garotinha Sofía Otero e pela delicadeza na abordagem da temática da transexualidade infantil, parecia que eu não estava gostando tanto da obra. Quiçá por seu ritmo lento ou pela recusa em aderir a uma narrativa tradicional, no sentido de que o protagonismo é diluído entre mais de uma personagem: a garotinha que descobre a sua própria identidade serve como espelhamento genético para a mãe artista, em dúvida quanto ao(s) próprio(s) talento(s) e o acolhimento mui afetuoso da tia-avó cuidadora de abelhas. Os fatos ocorrem de maneira plácida, sem dependerem de um clímax anunciado, que, quando ocorre, tem uma função mais metafórica que efetivamente causal: é quando aplica-se, na prática, o que é discutido num diálogo anterior, acerca da inexistência daquilo que não tem nome, que não é chamado por ninguém, por conta disso. Terminada a sessão, não paro de pensar no filme, de maneira encantatória: é uma obra sobre relações familiares naturalizadas a partir da aceitação de ideais possíveis e sobre o amor enquanto artefato artístico. Bonito e atípico. O idioma basco causa muita estranheza entre os ouvintes! (WPC>)
Só a Mulher Peca
3.8 27 Assista AgoraPor mais que se reclame do moralismo gritante do título brasileiro, eu gosto de como ele antecipa um rol de expectativas positivamente frustradas: por se tratar de um filme da fase estadunidense do Lang, esperávamos uma trama de vingança. Tem-se um relato de reconciliação interna; por conter uma participação actancial da jovem Marilyn Monroe, pensamos haver erotização exacerbada de sua presença. Encontramos um retrato de rebeldia empregatícia, em sua ótima interpretação; por se tratar de uma época em que as convenções hollywoodianas rendiam-se ao machismo dominante, pensamos encontrar algo que confirme o tal título. Lidamos com um roteiro maduro, em que há também brechas para a exortação da emancipação feminina, não obstante as escolhas que as personagens tenham à disposição sejam exíguas e/ou insatisfatórias. Os diálogos são maravilhosos e a ascendência teatral do enredo rende momentos de suma pujança dramatúrgica, sobretudo na segunda metade, depois que as ondas quebram novamente com violência na praia, sob a luz do luar, agora justificando o título original. Achei a abordagem moderníssima, quiçá influenciada por STROMBOLI e antecipando tanto MARTY quanto o recente RODA GIGANTE. Barbara Stanwyck está soberba, como a protagonista comedida e cansada, após tantos maus tratos da vida livre que ela desejou para ti. Paul Douglas surge enquanto complemento sobremaneira digno. Keith Andes é o jovem sensual, ponderado e intenso em iguais medidas. Enquanto Robert Ryan aparece como aquele que tem a função de estragar tudo o que toca. Foi a única interpretação que eu não gostei tanto (o que demonstra, talvez a intencionalidade alcançada dos propósitos insuportáveis do personagem?). Direção segura, ainda que atípica. Achei o filme deliciosamente estranho, muito à frente das convenções românticas daquele período, no que tange à abordagem de um dilema essencialmente feminino. Em dado momento, soou-me arrítmico, demorado, estendido, prolongado.... Mas assim também era o dilema da protagonista. Muito bom! (WPC>)
A Curva do Destino
3.8 49 Assista AgoraAs reviravoltas deste filme são tão impressionantes e o roteiro é tão impressionante na demonstração daquilo que está contido em seu título, que, não tem jeito: não importa quantas vezes o revejamos, o impacto é sempre como se fosse a primeira vez. Dá pena do personagem de Tom Neal, tadinho, mas a espiral de azar só tende a crescer. Ann Savage é a vilã de filme 'noir' que todos nós queremos e tememos. Incrível o que o diretor faz com um orçamento reduzido e condições céleres de filmagem. Magnífico em cada detalhe e traumatizante na maneira como surgem os relatos de agressão de violência dos personagens, caramba! (WPC>)
Renfield - Dando o Sangue Pelo Chefe
3.2 248 Assista AgoraA direção e o roteiro estragam todas as possibilidades que este filme tinha de ser muito interessante, enquanto análise ambivalente das interferências de 'coaches' nas vidas de pessoas deprimidas e/ou exploradas por outrem. Gosto das interações nos grupos de apoio e de como o personagem de Nicholas Hoult lida com as suas inseguranças subservientes. Porém, quando a personagem de Awkwafina entra em cena, extremamente caricatural, a trama desanda, no sentido de que começa a haver muita competição quanto ao mote tramático principal. Ou seja, além do ótimo ponto de partida contido no título brasileiro, há a briga de gangues e a corrupção policial, de um lado, e a abnegação de duas irmãs para vingar a morte injusta do pai policial. Tudo isso em meio a muito sangue e piadas fora de tom. Minha mãe divertiu-se, ao meu lado, e, volta e meia, eu sentia que o filme poderia render bastante, o que continua a ocorrer entre uma ou outra brecha de banalização psicanalítica. Nicolas Cage ao menos se diverte, ainda que a ovação da "crueldade pela crueldade" não faça sentido na caracterização de seu personagem. Gostei das inserções de sua imagem em versões antigas de produções com o personagem Drácula (risos). (WPC>)
Minha Irmã e Eu
3.1 135 Assista AgoraMeus contatos anteriores com a diretora não são dos melhores, no sentido de que suas intenções sempre descambam para as festividades e, por extensão, celebração das benesses classistas dos seus personagens. Aqui, de fato, tem-se isso logo no início, no aniversário da mãe das protagonistas. Mas o roteiro é direcionado para a "correção" do relacionamento entre as duas personagens fraternais, o que descamba para uma interessante tônica feminista, do meio para o final, culminando num desfecho positivamente empoderado(r). A química entre as duas atrizes principais é descontínua, mas acertada (até porque isso é abordado internamente): gosto muito da Tatá Werneck (por mais que, às vezes, seja difícil compreender o que ela está falando), enquanto a Ingrid Guimarães realmente se esforça para compor uma mulher com sentimentos tridimensionais. A aparição do personagem de Leandro Lima, neste sentido, é importante enquanto catalisador orgástico. Minha mãe, que viu o filme ao meu lado, riu bastante, o que confirma o sucesso da obra, em termos de alcance de público. E Arlete Salles cumpre com dignidade a sua participação, conferindo toques de reflexões adultas a uma obra que não é tão rasteira quanto a sua divulgação faz parecer: em meio a todos os seus vícios discursivos, há algo de inovador e bem-vindo, ao questionar a fidelidade excessiva das donas-de-casa abnegadas. Quem diria? (WPC>)
Pimenta Landscape
2.5 1Antes da sessão, comentei com um dos co-diretores (que repassou-me o arquivo com o filme) que não um dos maiores admiradores do cinema estrutural, subgênero ao qual ele relacionara o filme. Para além das características elementares deste tipo de filme, a sinopse ora acostuma (em relação à qual não tive acesso antes da sessão) demonstra uma intenção mais explícita, quanto ao viés analítico da obra. Não há nada escrito na tela, contextualizando o título/cenário. Para quem nunca foi a Indaiatuba, por exemplo, a fazenda apresentada poderia ser uma senzala antiga, abandonada, e imaginamos os gritos de muitas pessoas maltratadas e exploradas naqueles ambientes. O filme, porém, joga com uma relação entre espaço físico criado pelo homem e a natureza circundante: as plantas insistem em brotar em meio aos tijolos e linhas de trem. Gostei muitíssimo de como o som direto aproveitou a importância e a beleza do canto dos pássaros e farfalhar das folhas. O céu alvo impressiona, inclusive pelo modo se movimenta. Somos testemunhas do tempo em ação, em curso. Mas algo incomodava-me, no que tange à impressão de que aqueles lugares foram palco de exploração do trabalho alheio. Até que um enorme trem corta a tela, numa seqüência que funciona como clímax. A despeito de um eventual mal-estar concernente ao meu problema com o subgênero (sinto falta de ver pessoas e, aqui, achei o projeto pouco discernível na prática da montagem), é um filme divertido de ser visto, é agradável assistir às nuvens que passam, enquanto marimbondos e pássaros eventualmente são captados pela tela. Não é um trabalho que me cative, como eu suspeitava, mas agrada em suas entrelinhas (exceto pelo que a minha imaginação histórica fez divagar quanto ao passado do lugar que eu não conhecia), de modo que, sim, não apenas eu parabenizo os diretores como agradeço à confiança depositada em nós, espectadores. E viva o cinema super alternativo produzido no Brasil! (WPC>)
Todos Menos Você
3.1 352 Assista AgoraQuando vi o 'trailer', pensei que divertir-me-ia: gosto da Sydney Sweeney e achei o seu parceiro de cena muito bonito. Mas a seqüências de abertura já denunciou onde o filme falharia radicalmente: na sua ode à falta de comunicação como algo divertido (não é). Além de a suposta vontade de urinar da protagonista revelar-se inconvincente, o modo como é alimentando o desentendimento entre os dois futuros amantes é vexatório, o que só piora a cada aparição gaiata do estranhamente assexuado personagem Pete, cujas ações estão todas voltadas para os encontros amorosos de outras pessoas. As piadas envolvendo as desavenças entre os protagonistas não repetitivas e, por mais que se mostre os corpos seminus deles, tudo é feito de maneira frígida, sem tesão. É como se o sexo fosse algo destrutivo, tal qual chega a insinuar Pete acerca da geração 'hippie' de seu padrasto, vivido de maneira caricatural por Bryan Brown. Fiquei triste ao perceber Rachel Griffiths e Dermot Mulroney reduzidos a personagens paspalhos e irritantes. A vendabilidade do conforto associado aos benefícios de classe (verdadeiro tema do filme) assume píncaros cada vez mais nojosos à medida que os ensaios para o casamentos são desenrolados. E o que já era muito ruim torna-se pior: o para que o casal adira à previsível reconciliação, é preciso difamar ainda mais as pessoas (e/ou possíveis concorrentes à sua volta). Não vou mentir que gostei de alguns aspectos, como as frases de efeito espalhadas pelo cenário ou o retorno a seqüências-chave da trama, ressiginificadas na cantoria coletiva do desfecho. Mas é tudo muito, muito ruim, de dar medo, tamanho o seu investimento propagandístico acerca do luxo e das referendações institucionais do envolvimento romântico entre as pessoas. Para mim, hediondo. Nem a suposta atualização de uma comédia shakespeareana serviu: péssimo em nível abissal. O diretor é ostensivamente inábil naquilo que pretende: e tome-lhe câmera girando enquanto os protagonistas se beijam mecanicamente, aff! (WPC>)
O Médico e o Monstro
3.6 32 Assista AgoraAinda não li a novela do Robert Louis Stevenson, mas está aqui, em lugar privilegiado em minha lista. Sou obcecado pela versão do Robert Mamoulian e fiquei impressionado pelo elenco reunido, mas a direção do Victor Fleming não extrai a expressividade prometida a partir das situações descritas: achei o filme seco, impessoal, desenxabido: o protagonista é bem delineado, nos diálogos iniciais, mas, depois, resume-me a uma caracterização burocrática de uma malvadeza direcionada e exclusivista; Lana Turner pareceu-me francamente subaproveitada; e Ingrid Bergman brilha, extrai pujança dramática correspondente à sua personagem, de modo que os melhores momentos do filme são quando ela está em cena. Mas, mesmo assim, é insuficiente para resgatar a maestria do trabalho como um todo, visto que o Fleming age como um realização em linha de produção, dá para perceber na tela a quantidade de vezes em que ele ensaiou, esvaziando a trama daquilo que ela tem de mais intensa. Achei o filme interminável por vezes, queria que acabasse logo. Talvez numa revisão sem tantas expectativas funcione melhor. Nalgum momento, quiçá após a leitura do livro, hei de revê-lo. Por ora, não funcionou muito! :( - WPC>
A Matéria Noturna
2.7 2Que filme belíssimo! Estava precisando muito de uma trama lenta e intensa (em sua carnalidade) como essa, em que os personagens se encontram, se amam e seguem as suas vidas, como ocorre com muitos de nós (ou todos nós) no frenesi contemporâneo, sob a égide do capitalismo urbano. A fotografia é calorosa, acolhedora, e a trilha musical de Lucas Carvalho direciona a cadência da montagem, perpetrada pelo próprio diretor. É um filme permanentemente musicado, que traduz em imagens e sentimentos os versos da canção de Dona Ivone Lara, que a protagonista entoa num momento-chave. Shrilene Paixão está ótima em cena, mas é Welket Bungué que nos apaixona ainda mais a cada aparição: que homem lindo e talentoso, sutil na delicadeza da expressões e falas, olhares e movimentos. Fiquei encantado ao longo do filme inteiro, amei o seu ritmo compassado, a ausência de teleologia no desenrolar da narrativa. Encontra-se, desencontra-se e os ciclos recomeçam: é assim em nossos empregos, é assim na rotina da vida. Belíssimo! (WPC>)
Uma Família Feliz
3.4 21Fiquei muito surpreso com algo que acontece no meio dos créditos finais, uma imagem que justifica muitas das opções estéticas da narrativa (que o cenário seja Curitiba, por exemplo). Não entendo o porquê de esse filme ter sido tão atacado por alguns críticos: o achei muito eficiente enquanto exercício de gênero, trazendo para o Brasil situações comuns em Hollywood, na década de 1990, no mesmo clima de A MÃO QUE BALANÇA O BERÇO, por exemplo. Fico impressionado com a versatilidade do José Eduardo Belmonte, ainda que, sendo tão prolífico, ele ainda não consiga ostentar um estilo próprio. Mas é um artesão hábil, que equivoca-se, aqui, ao optar por iniciar o filme com situações de seu desfecho (afinal, em aberto). Nem precisava: a mudança de perspectiva sobre a suspeição do cônjuge ocorre de maneira interessante na trama, por mais que, no início, pareça-se julgar excessivamente a personagem de Grazi Massafera, tanto quanto os demais personagens também o faziam. Não achei as interpretações do casal central ruins: pelo contrário, são eficientes no jogo de aparências que trazem à tona, o que ganha mais pontos com a verve ostensivamente antibolsonarista do roteiro. Por vezes, senti-me positivamente perturbado. É um filme que merece encontrar o seu público, portanto: de minha parte, recomendo-o com entusiasmo! (WPC>)
Abbott e Costello em Hollywood
3.2 1Já tinha ouvido falar muito sobre essa dupla de comediantes, mas nunca tive a oportunidade de conferir nenhum de seus filmes. Acho que comecei por um ideal, repleto de 'gags' e trama geral. É o modelo que deu origem às imitações chanchadescas no Brasil, né? Uma ou outra palhaçada (aliás, palhaçadas o tempo inteiro), perseguições frenéticas, um mote romântico entre coadjuvantes e canções afetadas, aqui e acolá. O Abbott é sério demais, pouco engraçado. Mas papouquei-me de rir com o Costello, desde a primeira aparição, e a situação envolvendo o Rags Ragland. Minha mãe estava ao meu lado, e lembrou de quando via estes filmes, em sua pré-adolescência, na década de 1950. O roteiro é mero pretexto para as 'gags' (e canções), mas o filme diverte. Quando entendemos que ele segue à risca uma fórmula bem sucedida, deixamo-nos levar e caímos na gargalhada. A seqüência final, na montanha-russa, é pura ode às aventuras de quem se atrapalha no dia a dia... kkkkkkkkkkkk (WPC>)
Jornada para Belém
3.3 6 Assista AgoraVi o filme por puro acaso, numa exibição na HBO, e achei uma gracinha. 'Pop' e despretensioso, mas não blasfemo, como talvez tenha sido acusado. Tudo bem, não curti os estereótipos trapalhões do Anjo Gabriel e dos Reis Magos, mas as canções são fofinhas, Milo Manheim é apaixonante e Antonio Banderas está divertindo-se à beça, entregando-se à caricatura sem receio e sem medo de ser feliz (ainda que seja o vilão). Foi realmente uma grata surpresa. Sou obcecado por musicais, não tinha como não funcionar comigo! (risos) - WPC>
Começar de Novo
3.6 54Ainda que a temática das drogas não apareça aqui, achei este filme muitíssimo parecido com (e/ou influenciado por) TRAINSPOTTING - SEM LIMITES. Não apenas pela relação entre os personagens e pela narração dramático-satírica, mas até mesmo alguns planos e enquadramentos são bastante semelhantes. Como eu vi o primeiro da trilogia de Oslo depois de ter conferido os demais exemplares, decepcionei-me um tantinho: o que é elogiosamente visto e descrito como crueza 'punk' tem também um quinhão mui desagradável de elogio concessivo à masculinidade tóxica. As interpretações são desenvoltas, mas acho na hipertrofia do repentino reconhecimento literário dos personagens incomodou-me: pareceu tão corriqueiro publicar um livro, ser reconhecido por ele, etc. . Por vezes, o vai e vém da narrativa confundiu-me, o que é intencional, mas, no geral, acho que o filme teve mais boas idéias que acertos de execução. É gracioso, mas promete mais do que oferece, enquanto obra imbuída de muito frescor juvenil. Culpa do gélido clima norueguês, talvez. (WPC>)
P.S.: achei o intérprete do Erik muito parecido com o Evan Peters!
A Infância de Um Líder
3.1 59 Assista AgoraA empolgação era extrema: enquanto minha mãe assistia ao filme, na sala, ouvi trechos da fantástica trilha musical, de caráter sinfônico, do Scott Walker e fiquei obcecado para conferir o filme. Com as expectativas nas alturas, fui de fato, arrebatado pela seqüência de abertura e gostei da maneira um tanto distanciada como são retratados as situações políticas e os personagens, não obstante as interpretações intensas de um ótimo elenco. Foi quando a frustração instaurou-se: por mais que a direção me fascinasse, em seu pendor experimental, achei o roteiro óbvio, em seu adlerismo. Reiterativo e redundante, em sua demonstração de que crianças mimadas convertem-se em fascistas, oh! A revelação do desfecho, quanto à origem genética do garoto crescido, pareceu-me igualmente insossa, como a maior parte do que acontece. Tudo bem, concordo que o garotinho Tom Sweet entrega-nos uma potente demonstração do quão irritante um filho único pode ser, mas o filme passa a redundar em círculos, a partir de determinado momento. A empolgação do início fenece, ao final, tudo chafurda numa metáfora previsível sobre um fascismo que é também hodierno. Uma pena. Mas preciso do CD deste filme, uau! (WPC>)
Esculturas da Vida
3.3 16 Assista AgoraO titulo brasileiro não é infiel à proposta da narrativa, mas é o original que sintetiza melhor as intenções da diretora, ao fazer com que acompanhemos o cotidiano de produção de uma artista que, a princípio, revela-se tão desagradável enquanto pessoa. Foi importante, para isso, o enfeamento da maravilhosa protagonista, uma de minhas atrizes contemporâneas favoritas: não conseguimos sentir simpatia por ela, mas a empatia surge gradualmente, quando compreendemos o porquê de ela ter ficado tão amargurada, convivendo com aqueles familiares tão problemáticos. Hong Chau transforma-se em cada papel que dignifica: ela está maravilhosa aqui, a personificação de diversas amigas formadas em Artes Visuais. Por quase uma hora de projeção, parecia que eu estava desgostando do filme, de seu ritmo lento, do enfoque ostensivo da diretora em anticlímaces (vide quase todas as situações referentes ao cuidado com o pombo), Mas, na seqüência da exposição, tudo se justifica, como objetivo a ser alcançado, como ápice de um processo que, mesmo que continue em aberto ou "em curso produtivo", tanto quanto o filme em si (vide a importância situação dos créditos finais), provoca reações intensas em quem testemunha o percurso de criação, não apenas a obra acabada. É uma trama difícil e, não vou mentir, intencionalmente "chata", mas que cresce bastante em nossa apreciação ao término, quando cozemos interiormente os elementos rigorosamente urdidos pelo roteiro minimalista de uma cineasta caracterizada por este adjetivo. Presumo que, numa revisão, gostarei bem mais: num primeiro contato, ele intimida bastante, assusta-nos pela lentidão, pelo registro da alienação de quem trabalha com arte, mas não consegue administrar adequadamente os prazeres da vida. Uma aula de reeducação espectatorial! (WPC>)
Sibyl
3.2 31 Assista AgoraNão sabia o que esperar, exceto uma multiplicação de camadas psicanalíticas e alguma metalinguagem roteirística. a julgar pelo que descobrimos no trabalho mais famoso (e premiado) da diretora. Percebi que ele seria exibido no Telecine Cult e aproveitei a oportunidade. E adorei: no início, demorei um pouco para imergir. Minha mãe, ao meu lado, reclamava que não estava entendendo os vais e véns da narrativa. Mas, de repente, eu estava fascinado, obcecado, apaixonado... Cheguei mesmo a gargalhar, de tão aflitivos que são os ápices dramáticos. Virginie Efira está maravilhosa, mas é eclipsada pelo defsile de talentos: Adéle Exarchopoulos tem o desempenho actancial mais pungente desde AZUL É A COR MAIS QUENTE; Gaspard Ulliel angaria um fascínio repulsivo e crescente, em cada aparição; Niels Schneider encanta pela beleza; e Sandra Hüller está absolutamente soberba. Um exercício de análise, em múltiplas significações para a palavra, trabalho de gênia. Só melhora, quanto mais se complexifica: incrível! (WPC>)
O Abajour
2.6 7 Assista AgoraAcho válido o espírito de cooperação que validou a feitura, mas, enquanto discurso, o filme é sobremaneira problemático, no sentido de que, por vezes, parece celebrar aquilo que condena, celebrar a esperteza de quem sobrevive mediante o ludibrio... Percebo que, a despeito de seus evidentes defeitos, o filme seja deveras apreciado, o que talvez tenha a ver com um conhecimento de conjuntura (os espaços destinados às interações juvenis de classe média no Rio de Janeiro), com certa verossimilhança na abordagem e confecção dos personagens. Comigo, nada funcionou: além do mau ritmo e das interpretações forçadas, as reviravoltas à la Tarantino não engrenam, o que só piora pela inserção de uma montagem que reverencia a linguagem televisiva. Repito: que bom que o filme foi feito e distribuído, nas condições possíveis, mas foi difícil chegar até o final, de tão contaminado pela podridão que o roteiro é. Desgostei plenamente, o que lamento. (WPC>)
O Homem dos Sonhos
3.5 134Ainda não vi O PESO DO TALENTO, mas é evidente que é u filme que pega carona nesta verve superexpositiva do Nicolas Cage. Seu personagem, entretanto, é composto com muita seriedade: apesar de a situação tramática logo se desgastar, e o filme ficar cansativo do meio para o final, em razão de sustentar-se em apenas uma piada, seu personagem é delineado com seriedade dramática, oscilando entre o conscientemente ridículo e o merecedor de piedade. Não chegamos a nos identificar, mas torcemos por ele, no desespero. O clima é de pasticho kaufmaniano, mas a direção não é muito firme, o tom do filme é indefinido, encerrando-se de maneira quase cruel, em sua inevitabilidade melancólica. Funciona melhor depois que a sessão termina, em verdade. A execução de uma canção de Talking Heads, nos créditos finais, ressignifica aquilo que pareceu afoito no decorrer das situações: poderia ser um excelente estudo de personagem, mas o roteiro se desperdiça em piadas neogeracionais, em cacoetes da A24 e no reaproveitamento chistoso de temas que renderam um eficiente filme de suspense no oitentista A MORTE NOS SONHOS. Acho que, numa revisão sem expectativas, funcionará bem melhor... (WPC>)
O Mistério do Cesto
3.5 146Assisti aos principais filmes deste realizador supostamente 'trash' em ordem invertida, e fiquei positivamente chocado com o teor psicanalítico dos mesmos. Adentrei a sessão enquanto lidava com uma grava situação familiar, envolvendo um irmão mais novo, de modo que o arrebatamento foi intenso: será que o Frank Henenlotter teve acesso aos meus diários?! Brincadeiras à parte, é maravilhoso como ele consegue tornar tão crível um personagem de látex, fazer-nos experimentar legítimas, que vão do medo ou horror inicial a uma piedade sincera, a uma necessidade de compreensão e entendimento da situação trazida à tona: é um filme sobremaneira triste e melancólico, sobre diversos tipos de solidões, não sendo casual que tenha sido locado em Nova York, numa região consagrada aos artistas "alternativos". De fato, antecipa o mote geral de MALIGNO, do James Wan, mas pensei ainda mais na ambientação scorseseana, que se irmana ao que o cineasta fez em DEPOIS DE HORAS ou em seu episódio de CONTOS DE NOVA YORK. 'Exploitation' é algo premonitório, em âmbito social, afinal. Fui pessoalmente tocado por este filmaço, amei! (WPC>)