Fiquei chocado quando confirmei que a atriz que interpreta a protagonista tem apenas 15 anos, de fato: sua personagem parece bem mais velha e madura - e dotada de um otimismo profissional e excessivamente seguro que se insurge como primeiro problema, numa lista de defeitos que exige muita "concessão", por parte dos espectadores, em relação à excessiva ingenuidade (e à inverossimilhança de algumas seqüências) no roteiro. Primeiramente, não se nega que a também produtora associada Giulia Benitte é tão precoce e carismática quanto a personagem-título. Mas convertê-la numa heroína-líder súbita, como acontece no filme, é demais. Talvez se reclame que, por não ser uma pessoa com deficiência, ela não devesse interpretar uma cadeirante, mas não entrarei nesse mérito: afinal, salvo por uma ou outra frase de efeito sobre acessibilidade e inclusão, isso é espertamente secundarizado pelo enredo, conforme explicado na narração inicial. Porém, as contradições elementares da militância privilegiada são escancaradas aqui, no sentido de que, por mais bem intencionada que seja, Bebel enxerga apenas àquilo que tem acesso, e seu convívio social é predominantemente elitizada, mesmo que a tachem de pobre e/ou caipira. Segundamente, é mister elogiar o entrosamento do elenco, mesmo que os vilões sejam excessivamente caricatos (Marcos Breda imita alguns cacoetes bolsonaristas - gostei!). E, terceiramente, com todos os defeitos do filme e com os seus exageros ativos (o pantim de Zico, por exemplo, quando não quer mais ser amigo dos personagens), sua mensagem é afirmativa e necessária: gostei muito dos exemplos verídicos compartilhados nos créditos finais e, se analisarmos bem, a falta de punição para os criminosos, no filme, talvez ecoe a desesperança transformadora da realidade, no que tange à identificação dos efetivos culpados pela destruição dos bens naturais do planeta. Na verdade, isso também evidencia um discurso inassumidamente conciliador, típico da conjuntura classista em que se passa a ação. Mas esse talvez (talvez, talvez) seja outro debate, bem mais extensivo ao que o roteiro traz à tona... (WPC>)
De coração, fico imaginando o que este diretor sente ao despertar: para que tanta amargura e desconfiança nas pessoas, meu Deus? Para que tanta misantropia? A despeito disso, o cara sabe sabe dirigir muito bem, ainda que os pressupostos de roteiro nem sempre sejam os melhores, no seu afã pelo choque. Aqui, ele acerta em cheio, ao criar um paradoxo de múltiplas repulsas, no sentido de que, por mais aberrante que sejam as motivações e comportamentos do protagonista, há pessoas ainda piores que ele. De fato, há muita polêmica e controvérsia acerca de como foi consentido que os atores mirins (que nem eram atores, em verdade) fossem expostos daquele jeito, mas há "justificativas internas" para as situações. Isso as justifica? Não saberei responder, mas achei ótima a maneira como o filme é conduzido. Hipnótico e divisivo do início ao fim. Perturbador e reflexivo. Um trabalho a ser debatido, portanto. (WPC>)
Vi SPARTA antes desse e gostei bastante. Achei ótimas as rimas e/ou situações mui similares entre os dois filmes, nas seqüências passadas no asilo, sobretudo. Mas achei a trama cansativa e repetitiva aqui: o protagonista possui uma simpatia dúbia, e quase cheguei a torcer por ele, no sentido de manifestações esperançosas de afeto eram percebidas nalguns momentos. Porém, o mote tramático da filha cobrando dinheiro ao pai ausente não se sustenta como interesse roteirístico dominante. Na maior parte do tempo, o filme é um porre, infelizmente. Gosto dos enquadramentos, da fotografia sardônica da praia em neve, de alguns números musicais... Mas a longa duração atrapalha um pouco! (WPC>)
Depois de vários roteiros explicitamente misóginos, o diretor permite um protagonismo feminino, merecidamente agraciado em premiações: Anouk Grinberg está maravilhosa, como uma protagonista voluntária com "uma mente feliz e uma bunda feliz". A primeira cena de sexo com Gérard Lanvin é magnífica (que entrega, que coreografia de corpos, que uso eloqüente da trilha musical elegíaca!) e a entrada em cena do Olivier Martinez é mui oportuna. Ri nalguns momentos e projetei-me emocionalmente na maior parte deles. A amoralidade do realizador permanece manifesta, mas condicionada aos anseios de sua protagonista, cujo ponto de vista é respeitado, antes daquelas reviravoltas espantosas que o Bertrand Blier concebe como ninguém. Muito boas aos chistes cancionais envolvendo o Barry White e é encantadora a simpatia de Valeria Bruni Tedeschi. Uma graça de filme! (WPC>)
Li, nalgumas publicações, que este seria "o filme mais acessível" do diretor. Paradoxalmente. achei o mais difícil de ser acompanhado, por causa de sua atmosfera onírica, que mistura vários tempos distintos, desaguando num desfecho que beira o surrealismo, na maneira como os personagens reagem ás músicas schubertianas, que às vezes são executadas diegeticamente; às vezes, não. A cena em que Josiane Balasko tenta assobiar algo deste compositor e, ao invés disso, sai a trilha de Francis Lai para UMA HISTÓRIA DE AMOR é ótima, no que diz respeito às diferenças de classe entre ela e o seu amado, demonstrando que, apesar de título e diálogos insistirem em comparações sobre aparência física. há muito mais em evidência nas escolhas românticas que fazemos. Carole Bouquet está esplêndida e Gerard Depardieu incorpora uma personificação bem mais insegura, no cotejo com as colaborações anteriores e numerosas com este diretor. O clima é de pesadelo, com momentos belíssimos de breve felicidade erótica. Mexeu pessoalmente comigo, irei revê-lo, eis uma certeza! (WPC>)
Incitado por alguns cinéfilos mais conhecedores desta filmografia inusitada, resolvei empreender uma mini-maratona com seus filmes, já conhecendo o lastro amoral de seus enredos e uma tendência inequívoca à misoginia. E, como tal, surpreendi-me com o que acontece aqui: como a Academia conseguiu premiar um filme tão provocativo? (risos) E, diversos momentos, parece que as seqüências foram filmadas como se fossem "pegadinhas", com vários transeuntes olhando persistentemente para a câmera, enquanto as situações acontecem. Gerard Depardieu está lindo e intransigente (risos) e Patrick Dewaere é um ótimo contraponto. Cabe a Carole Laure uma personificação mui delicada, que fica ainda mais complexa quando o garotinho precoce entra em cena. Amei a progressiva conversão das músicas de Mozart como uma espécie de personagem coletivo à parte. Graças a este efeito, o desfecho é ainda mais impactante, em sua aparência de traição schubertiana. A fotografia cria quadros maravilhosos, nas cenas da biblioteca e naquela conclusão surpreendente. Gostei muitíssimo: fiquei com muita vontade de ver mais filmes do diretor, mesmo incomodado com a fetichização e objetificação da mulher, ofertada como um mero bibelô para outrem... (WPC>)
É perigoso falar mais de filmes baseados em eventos reais, mas... Vamos lá: não gosto desse diretor. Acho-o um carniceiro, que está para o drama tanto quanto o Roland Emmerich está para a ficção científica. Ele não hesita em fetichistar ao máximo - com suas habilidades técnicas mui premiadas - as cenas de catástrofes e acidentes, privilegiando os destinos salvacionistas de alguns personagens, em prol de dezenas de pessoas que morrem, para satisfazer a sua sanha carniceira. E encontra um prato cheio aqui: se já existem versões marcantes de René Cardona (que ainda não vi, mas conheço a repercussão) e de Frank Marshall (que marcou a minha geração) para a mesma trama, para que canibalizar midiaticamente esta situação, mais uma vez? O diretor justifica esta necessidade de "toque pessoal" através do impacto que sentiu quando leu o livro no qual o roteiro foi baseado, mas... Para quê? E a resposta surge de maneira descarada: para fazer exatamente aquilo de que acusaram o Steven Spielberg quando encetou A LISTA DE SCHINDLER. Mas sem a mesma competência ou entrega íntima. O Bayona é um preciosista sem o lastro humanista requerido, por mais que exercite isso de maneira ainda tímida em SETE MINUTOS APÓS A MEIA-NOITE. E o resultado, como não poderia deixar de ser, e catastrófico, em todos os sentidos: a abertura e o desfecho são muito bons, por explorar os sentimentos legítimos dos personagens, enquanto pessoas (não apenas sobreviventes), mas o longo miolo sádico é sobremaneira problemático, pois faz com que o prazer do diretor na contagem de mortos fique escancarado. Fosse o Lucio Fulci ou o Jörg Buttgereit na condução, eu acharia o resultado mais honesto. É um filme que tortura o espectador, quiçá de maneira intencional, a fim de evidenciar que o que está sendo narrado é doloroso, de modo que, ao final, condoemo-nos em relação aos destinos de quem sobrevive, naquelas condições, mas... Puxa, que perversidade. Que sanha cumulativa de malevolências. Detestei O IMPOSSÍVEL, senti algo parecido aqui. Admito que a trilha musical do Michael Giacchino é linda e que vários aspectos deste filme merece os prêmios que receberá, mas... A que custo emocional e moral, urgh! (WPC>)
Esforcei-me para focalizar nos aspectos positivos deste filme, mas o anacronismo da produção incomodou-me demais: o diretor deseja falar sobre o que o incomoda hodiernamente, com o lastro identitário igualmente contemporâneo, e sacrifica trechos da análise de época, ao implantar certos rompantes militantes, por mais que os justifique historicamente nos créditos finais. Gosto da sutil transformação de personalidade da mãe do protagonista, mas achei os personagens caricatos, sem carisma suficiente: as interpretações são boas, mas não desenvolvimento de alguns personagens. Mas amei o uso das canções 'kitsch' e emocionei-me nalgumas apresentações na boate. Serve? (WPC>)
Vasculhando a filmografia do diretor, percebi que não gosto dele. Por mais que, a partir de determinado momento, a trama (baseada numa peça teatral que, por sua vez, é baseada num romance) começa a zombar do comportamento paspalhão dos militares estadunidenses, a condescendência dos personagens (e/ou atores/figurantes) japoneses em relação ao colonialismo é de lascar: aquela abertura com o Marlon Brando nipônico (!!!) comemorando as vantagens das múltiplas ocupações em Okinawa é de dar nos nervos! Mas a entrada em cena do personagem de Eddie Albert dota o filme de uma insuspeita simpatia. Mas a conjuntura pró-empreitada comercial volta a dar o tom no desfecho, de modo que aquilo que surge como valorização comunal, em verdade, é elogiado apenas em seu potencial vendável, embebedador. Minha mãe curtiu... Comigo, simplesmente, não desceu! Quando descobri que o filme foi indicado a um Globo de Ouro de "Promoção do Entendimento Internacional", fiquei chocado: tadinha da Machiko Kyo! (WPC>)
Como os diretores são acostumados à linguagem televisiva de documentários sobre esportes, não possuem suficiente domínio nas seqüências de reconstituição ficcional, de modo que prejudicam a exibição da jornada de superação com muitos 'flashbacks' que são necessários enquanto denúncias e/ou componente formativo da personalidade da protagonista, mas que surgem de maneira dissonante na montagem. A fotografia de Claudio Miranda é linda, mais uma vez, e a trilha musical de Alexandre Desplat é bela e discreta. Mas são as interpretações femininas que mais chamam a atenção: Anette Bening, ótima na composição de um personagem difícil, porque não imediatamente simpática, e Jodie Foster sublime, roubando todas as cenas, ostentando a faceta "caminhoneira" que o finado Rubens Ewald Filho sempre reclamou: fiquei apaixonado pela determinação de sua personagem, que é abnegada, mas não apagada em função de outrem, mas sim defensora da plena comunhão de objetivos. O resultado geral é um tanto forçado, mas o desfecho e as cenas reais dos créditos finais emocionam! (WPC>)
Quanto mais revisto, melhor fica: uma aula magna de Cinema e uma demonstração extrema do carisma de Martin Scorsese, sempre muito carinhoso em relação aos títulos que comenta, mesmo aqueles que considera imperfeitos e/ou defeituosos. Suas escolhas são bastante reconhecíveis em suas obras e a justificativa para encerrar a "viagem" na década de 1960 é perfeita. Aprendi muito (re)vendo este documentário e utilizarei perpetuamente as terminologias utilizadas (a tese do "diretor enquanto contrabandista" tornou-se conceito dominante para a cinefilia). Magnífico!
* P.S.: apesar da excelência do recurso e da magistral inserção (numa montagem coordenada pela Thelma Schoonmaker), os depoimentos de grandes diretores meio que "quebram" o clima, não obstante reiterarem o que o Scorsese narrava. É que, em minha opinião, isso acrescenta um lastro objetivo ao que, desde o início, é definido como extremamente pessoal. Mas é apenas uma observação. Vou repassar este filme para o máximo possível de pessoas queridas: é soberbo! (WPC>)
Por algum motivo, não liguei o diretor à trama, quando o filme foi lançado. Minha mãe - que é obcecada por filmes de Natal! - estava vendo esta obra numa daquelas maratonas do canal Studio Universal e eu estranhei a inteligência dos diálogos (deliciosamente vulgares, às vezes). Esperei ser reprisado e, logo nos créditos iniciais, encontrei os nomes de Emma Thompson (inclusive, como produtora) e Michelle Yeoh. Não tinha como ser ruim! De fato, não foi: uma delícia de filme com uma protagonista muito bem-interpretada e um tanto mimada, que amadurece ao longo da proteção, junto com a simpatia que desperta no espectador. Henry Golding é a aparição ideal, em âmbito namoratório, e as situações são concomitantemente divertidas e emocionantes. Ri bastante, e adorei o uso "inspirador" das canções do George Michael. Uma gratíssima surpresa, quem diria! (WPC>)
Não conhecia este diretor (obliterado por homônimos mais famosos) e achei o filme insuportável nos dois primeiros terços: o protagonista ex-monacal é um porre, um chantagista relacional que defende uma lógica de nicho que muito me incomoda. Para piorar, a sua contrapartida "liberal" é igualmente insuportável, o que torna difícil enfrentar as brigas repetitivas de casal. Mas adorei as inserções documentais da Parada do Orgulho Gay, bem como a ótima reviravolta do desfecho. Pena que, quando o filme começa a ficar bom, ele acaba! (WPC>)
Nunca o considerei um diretor memorável, mas este título sempre me fascinou. Quando encontrei o DVD à venda, num sêbo, fiz questão de o adquirir e já o vi, de imediato - e gostei muito de alguns aspectos. Na pressa por imitar os épicos hollywoodianos sobre máfia, de fato, roteiro e montagem se atropelam. mas os fatos são muito interessantes (não mudou muita coisa em quarenta anos, não é?) e o elenco é digno de uma superprodução: Nuno Leal Maia está incrivelmente competente, Zezé Motta e Chico Diaz estão maravilhosos, Jece Valadão demonstra a sua competência habitual como vilão, a metalinguagem da cena em que Jofre Soares assiste a BOCA DE OURO (1963) é ótima, e Wilson Grey e Maurício do Valle são coadjuvantes de luxo. E tem ainda mais gente para citar. Gostei dos rumos da trama, das traições acumuladas, do cuidado com os eventos (vide as situações relacionadas ao desfile de escola de samba, por exemplo). Parece uma minissérie compactada, às vezes, mas merecia ser mais conhecido do público! (WPC>)
Acho o diretor um um interessante artesão de gênero, mas nada funciona neste filme: o ponto de partida é promissor, demonstrando que os horrores da Guerra Civil são ainda mais devastadores que qualquer manifestação sobrenatural, mas o roteiro desperdiça todas as boas idéias, tornando a definição da protagonista um nulidade. Além do ritmo moroso, a montagem com gritos e sustos que não provocam nenhuma reação desmotiva a adesão espectatorial, de modo que, ao final, não queremos ligar os óbvios pontos da reviravolta vingativa e sem o pretendido impacto. Achei péssimo! (WPC>)
E ele faz de novo: num filme super básico, elementar, o diretor justifica e explica as recorrências de seus enredos, defende o aproveitamento da vida a partir do reconhecimento de que beber, comer, fumar e se divertir é o que faz tudo valer a pena, é o que atribui algum sentido á falta de sentido... Faltou somente um pouquinho de sexo (risos). O elenco é ótimo, e as reverberações de um dos contextos no outro é extraordinário, sendo que a atriz Kim Seung-Yun é um achado de extrema simpatia. impressionante como o diretor/roteirista/montador/fotógrafo/compositor consegue tornar climática a simples adição de tempero à comida. Maravilhoso! (WPC>)
A idéia sintetizada no título do filme é ótima, de modo que adorei o desfecho, mas achei o filme muito problemático em sua adesão irrereada às fórmulas vingativas de tantas comédias adolescentes hollywoodianas semelhantes. A protagonista é muito, muito chata (humanista? Ela está mais para chantagista e mimada mesmo!), mas os demais personagens são honestos em suas participações. Fofinho e equivocado, mas muitíssimo bem resolvido. (WPC>)
Cabrunco do céu, tem mais um cineasta lendo o meu diário: fiquei impressionado com as similaridades psicológicas em relação aos enfrentamentos de meu dia a dia - e gritei de identificação na seqüência das situações "impossivelmente semelhantes". Joaquin Phoenix está ótimo, como de praxe, e a direção é esplendorosa: que direção de arte, que controle das transições entre delírio e realidade! Lembra muito, evidentemente, as produções do Charlie Kaufman. E só não é uma obra-prima absoluta porque aquele desfecho julgamental soou-me autocondescendente. Mas adorei (e temi) me ver na tela desse jeito: se eu tivesse visto este filme na escuridão de uma sala de cinema, perigaria surtar, caramba! (WPC>)
Os elogios, por parte de amigos, eram exacerbados e os meus contatos prévios com obras do diretor foram sempre bem recompensados. Percebi isso desde o início: o poder de evocação das palavras, neste filme, é magistral: basta que algum personagem mencione algo e, de repente, tudo no enredo orbita em função desse algo. Ensina às irmãs Wachowski como se cria um universidade de existencialismo rasteiro mas pungente. Efeitos visuais mui competentes e figurinos maravilhosos: amei os vilões animalescos! O segundo motoqueiro é um tesãozinho, aliás. Muito, muito bom. Exagerado e repetitivo, como eram os melhores seriados de cariz 'tokusatsu', mas tão empolgante quanto. Só achei que cai um pouco do ritmo no quartel final, mas já era tarde: eu estava fisgado! (WPC>)
Adentrei a sessão com expectativas baixíssimas: além de ter ouvido falar muito mal sobre este filme, tenho poucas esperanças nas cinebiografias em tom chapa-branca. Mas este filme apresenta-nos a alguém muito relevante, obliterado historicamente por conta de seu homossexualismo. Achei a personificação de Colman Domingo exagerada, mas, pelos diálogos, parece que o Bayard Rustin era afetado daquele jeito mesmo. Serviu, portanto. Porém, a melhor presença em cena, sem dúvida, é a de CCH Pounder: amei descobrir que era ela, uma enorme atriz ainda subvalorizada. É convencional, claro, mas competente em seus clichês. Curti! (WPC>)
Suprassumo do romance (e da persistência proletária), com acenos maravilhosas à cinefilia: a cena que devolve o afeto do diretor ao Jim Jarmusch é magnífica! Dono de um universo muito próprio, Aki dialoga com o seu próprio cinema, evocando tanto uma trilogia excelente quanto UM HOMEM SEM PASSADO. A fotografia é primorosa, bem como a escolha das canções. Amei o cachorrinho, e torci muito para que o namoro desse certo - e, de quebra, ainda há uma reflexão poderosa sobre o enfrentamento do alcoolismo. Os personagens são fabulosos (amei as interpretações bressonianas!) e, a despeito do tom cômico dominante, há inserções dramáticas intensas, entre um e outro momento de fofura. Soberbo! (WPC>)
Como tanto, amei e fiquei pessoalmente tocado por AGENTE DUPLO, de modo que adentrei a sessão com múltiplas expectativas. O ponto de partida sinóptico e a relevância dos personagens reais referendou a minha entrega prévia: não sabia que o Augusto Góngora havia trabalhado com o Raúl Ruiz - e a cena em que eles se entrevistas mutuamente é magnífica! Inteligente e organicamente politizada que é, a diretora (em comunhão plena com o casal) tece magistrais paralelismos entre as lembranças íntimas e a memória coletiva, entre a necessidade de lembrar (por causa do Alzheimer) e o imperativo de que não se esqueça (em razão do terror ditatorial no Chile). Um filme grandioso em múltiplos aspectos, que, só não é mais potente, porque foi obrigado a confinar-se, na época da quarentena pandêmica. Por razões óbvias, em dados instantes, o enredo documental torna-se repetitivo, iterativo, ainda que urgente no esforço pela manutenção compartilhada daquilo que aconteceu e segue deixando marcas. Amei o uso das canções na trilha sonora e emocionei-me bastante (vide a cena em que o Augusto chora quando teme ficar sem os seus livros). Mas, cinematograficamente, fica um tanto aquém da maravilha anterior; em âmbito afetivo, entretanto, merece ser difundido, elogiado e debatido. Ótimo! (WPC>)
Logo no começo, estranhei o modo como os personagens eram retratados: não na naturalidade de seu cotidiano, mas num destaque espetaculoso, afinal justificado pelo fato de os meninos serem compositores, a mãe dançarina, etc... Mas, depois que o périplo ocorre, comecei a incomodar-me ainda mais: pensei muito nas acusações sofridas pelo Steven Spielberg quanto começou a realizar filmes mais "sérios" (e a cena da "mulher que voa" evoca diretamente IMPÉRIO DO SOL). Quanto mais o filme avançava, mais problemática ficava a abordagem da 'torture porn', ainda que necessária aos intentos narrativos. Era óbvio que isso culminaria no triunfalismo "justificado" do trecho final, em que o título faz sentido, em que o protagonista cumpre a sua missão enquanto personagem amadurecido e heroicizado. Tenho elogios pontuais a diversos aspectos do filme, tão bem-feito quanto uma discreta superprodução hollywoodiana, mas a minha relação com o discurso e com o que ele representa politicamente não é das melhores: é um filme que engabela, muito mais do que exorta a coragem dos jovens senegaleses. Permanecerei encarando este filme com desconfiança... (WPC>)
Sou fã da diretora, obcecada por detalhes e rotinas, mas fiquei tão decepcionado com a sua péssima regravação para O ESTRANHO QUE NÓS AMAMOS, que nem tive coragem ainda de enfrentar ON THE ROCKS. Aqui, adentrei a sessão desconfiado, mas fui logo tragado pela excelente ambientação, pelo uso mágico da trilha cancional (não ter sido autorizada a utilizar os clássicos do Elvis Presley permitiu à diretora uma criatividade absurda na seleção musical!): por mais questionável que seja a aproximação entre o cantor e a adolescente, o roteiro consegue driblar o mal-estar ao enfatizar justamente outro mal-estar, o do extremo confinamento. Em suas opções camerísticas, o filme funciona como uma versão contemporânea de À MEIA-LUZ, ressaltando a divergência de compleições físicas e impacto social entre os personagens. Cailee Spaeny está eficiente, não questiono a sua premiação, mas é, em minha opinião, Jacob Elordi quem brilha: além de estar muito diferente de tipos anteriores que ele vivificou, sua interpretação não é imitativa, de modo que conseguimos acreditar no Elvis tramático. Até porque ele não é o protagonista, mas um ser coadjuvante porém ubíquo em seu potencial de opressão: fiquei impactado com o plano dos revólveres combinando com os vestidos, por exemplo. Fetichista e obsessivo-compulsiva, a diretora faz maravilhas com a montagem, ao ressaltar o caráter cíclico porém cerrado da rotina da personagem-título, cultivada em Graceland como um bibelô. E o desfecho é nada menos que magnífico: lembrarei para sempre de como a canção escolhida combinou magistralmente com o contexto. Lindamente triste, fascinante como a diretora nos treinou a esperar dela: a-do-rei! (WPC>)
Chama a Bebel
1.9 2Fiquei chocado quando confirmei que a atriz que interpreta a protagonista tem apenas 15 anos, de fato: sua personagem parece bem mais velha e madura - e dotada de um otimismo profissional e excessivamente seguro que se insurge como primeiro problema, numa lista de defeitos que exige muita "concessão", por parte dos espectadores, em relação à excessiva ingenuidade (e à inverossimilhança de algumas seqüências) no roteiro. Primeiramente, não se nega que a também produtora associada Giulia Benitte é tão precoce e carismática quanto a personagem-título. Mas convertê-la numa heroína-líder súbita, como acontece no filme, é demais. Talvez se reclame que, por não ser uma pessoa com deficiência, ela não devesse interpretar uma cadeirante, mas não entrarei nesse mérito: afinal, salvo por uma ou outra frase de efeito sobre acessibilidade e inclusão, isso é espertamente secundarizado pelo enredo, conforme explicado na narração inicial. Porém, as contradições elementares da militância privilegiada são escancaradas aqui, no sentido de que, por mais bem intencionada que seja, Bebel enxerga apenas àquilo que tem acesso, e seu convívio social é predominantemente elitizada, mesmo que a tachem de pobre e/ou caipira. Segundamente, é mister elogiar o entrosamento do elenco, mesmo que os vilões sejam excessivamente caricatos (Marcos Breda imita alguns cacoetes bolsonaristas - gostei!). E, terceiramente, com todos os defeitos do filme e com os seus exageros ativos (o pantim de Zico, por exemplo, quando não quer mais ser amigo dos personagens), sua mensagem é afirmativa e necessária: gostei muito dos exemplos verídicos compartilhados nos créditos finais e, se analisarmos bem, a falta de punição para os criminosos, no filme, talvez ecoe a desesperança transformadora da realidade, no que tange à identificação dos efetivos culpados pela destruição dos bens naturais do planeta. Na verdade, isso também evidencia um discurso inassumidamente conciliador, típico da conjuntura classista em que se passa a ação. Mas esse talvez (talvez, talvez) seja outro debate, bem mais extensivo ao que o roteiro traz à tona... (WPC>)
Sparta
3.8 2De coração, fico imaginando o que este diretor sente ao despertar: para que tanta amargura e desconfiança nas pessoas, meu Deus? Para que tanta misantropia? A despeito disso, o cara sabe sabe dirigir muito bem, ainda que os pressupostos de roteiro nem sempre sejam os melhores, no seu afã pelo choque. Aqui, ele acerta em cheio, ao criar um paradoxo de múltiplas repulsas, no sentido de que, por mais aberrante que sejam as motivações e comportamentos do protagonista, há pessoas ainda piores que ele. De fato, há muita polêmica e controvérsia acerca de como foi consentido que os atores mirins (que nem eram atores, em verdade) fossem expostos daquele jeito, mas há "justificativas internas" para as situações. Isso as justifica? Não saberei responder, mas achei ótima a maneira como o filme é conduzido. Hipnótico e divisivo do início ao fim. Perturbador e reflexivo. Um trabalho a ser debatido, portanto. (WPC>)
Rimini
3.5 3 Assista AgoraVi SPARTA antes desse e gostei bastante. Achei ótimas as rimas e/ou situações mui similares entre os dois filmes, nas seqüências passadas no asilo, sobretudo. Mas achei a trama cansativa e repetitiva aqui: o protagonista possui uma simpatia dúbia, e quase cheguei a torcer por ele, no sentido de manifestações esperançosas de afeto eram percebidas nalguns momentos. Porém, o mote tramático da filha cobrando dinheiro ao pai ausente não se sustenta como interesse roteirístico dominante. Na maior parte do tempo, o filme é um porre, infelizmente. Gosto dos enquadramentos, da fotografia sardônica da praia em neve, de alguns números musicais... Mas a longa duração atrapalha um pouco! (WPC>)
Meu homem
3.3 6Depois de vários roteiros explicitamente misóginos, o diretor permite um protagonismo feminino, merecidamente agraciado em premiações: Anouk Grinberg está maravilhosa, como uma protagonista voluntária com "uma mente feliz e uma bunda feliz". A primeira cena de sexo com Gérard Lanvin é magnífica (que entrega, que coreografia de corpos, que uso eloqüente da trilha musical elegíaca!) e a entrada em cena do Olivier Martinez é mui oportuna. Ri nalguns momentos e projetei-me emocionalmente na maior parte deles. A amoralidade do realizador permanece manifesta, mas condicionada aos anseios de sua protagonista, cujo ponto de vista é respeitado, antes daquelas reviravoltas espantosas que o Bertrand Blier concebe como ninguém. Muito boas aos chistes cancionais envolvendo o Barry White e é encantadora a simpatia de Valeria Bruni Tedeschi. Uma graça de filme! (WPC>)
Linda Demais para Você
3.5 9Li, nalgumas publicações, que este seria "o filme mais acessível" do diretor. Paradoxalmente. achei o mais difícil de ser acompanhado, por causa de sua atmosfera onírica, que mistura vários tempos distintos, desaguando num desfecho que beira o surrealismo, na maneira como os personagens reagem ás músicas schubertianas, que às vezes são executadas diegeticamente; às vezes, não. A cena em que Josiane Balasko tenta assobiar algo deste compositor e, ao invés disso, sai a trilha de Francis Lai para UMA HISTÓRIA DE AMOR é ótima, no que diz respeito às diferenças de classe entre ela e o seu amado, demonstrando que, apesar de título e diálogos insistirem em comparações sobre aparência física. há muito mais em evidência nas escolhas românticas que fazemos. Carole Bouquet está esplêndida e Gerard Depardieu incorpora uma personificação bem mais insegura, no cotejo com as colaborações anteriores e numerosas com este diretor. O clima é de pesadelo, com momentos belíssimos de breve felicidade erótica. Mexeu pessoalmente comigo, irei revê-lo, eis uma certeza! (WPC>)
Preparem seus Lenços
3.6 23Incitado por alguns cinéfilos mais conhecedores desta filmografia inusitada, resolvei empreender uma mini-maratona com seus filmes, já conhecendo o lastro amoral de seus enredos e uma tendência inequívoca à misoginia. E, como tal, surpreendi-me com o que acontece aqui: como a Academia conseguiu premiar um filme tão provocativo? (risos) E, diversos momentos, parece que as seqüências foram filmadas como se fossem "pegadinhas", com vários transeuntes olhando persistentemente para a câmera, enquanto as situações acontecem. Gerard Depardieu está lindo e intransigente (risos) e Patrick Dewaere é um ótimo contraponto. Cabe a Carole Laure uma personificação mui delicada, que fica ainda mais complexa quando o garotinho precoce entra em cena. Amei a progressiva conversão das músicas de Mozart como uma espécie de personagem coletivo à parte. Graças a este efeito, o desfecho é ainda mais impactante, em sua aparência de traição schubertiana. A fotografia cria quadros maravilhosos, nas cenas da biblioteca e naquela conclusão surpreendente. Gostei muitíssimo: fiquei com muita vontade de ver mais filmes do diretor, mesmo incomodado com a fetichização e objetificação da mulher, ofertada como um mero bibelô para outrem... (WPC>)
A Sociedade da Neve
4.2 715 Assista AgoraÉ perigoso falar mais de filmes baseados em eventos reais, mas... Vamos lá: não gosto desse diretor. Acho-o um carniceiro, que está para o drama tanto quanto o Roland Emmerich está para a ficção científica. Ele não hesita em fetichistar ao máximo - com suas habilidades técnicas mui premiadas - as cenas de catástrofes e acidentes, privilegiando os destinos salvacionistas de alguns personagens, em prol de dezenas de pessoas que morrem, para satisfazer a sua sanha carniceira. E encontra um prato cheio aqui: se já existem versões marcantes de René Cardona (que ainda não vi, mas conheço a repercussão) e de Frank Marshall (que marcou a minha geração) para a mesma trama, para que canibalizar midiaticamente esta situação, mais uma vez? O diretor justifica esta necessidade de "toque pessoal" através do impacto que sentiu quando leu o livro no qual o roteiro foi baseado, mas... Para quê? E a resposta surge de maneira descarada: para fazer exatamente aquilo de que acusaram o Steven Spielberg quando encetou A LISTA DE SCHINDLER. Mas sem a mesma competência ou entrega íntima. O Bayona é um preciosista sem o lastro humanista requerido, por mais que exercite isso de maneira ainda tímida em SETE MINUTOS APÓS A MEIA-NOITE. E o resultado, como não poderia deixar de ser, e catastrófico, em todos os sentidos: a abertura e o desfecho são muito bons, por explorar os sentimentos legítimos dos personagens, enquanto pessoas (não apenas sobreviventes), mas o longo miolo sádico é sobremaneira problemático, pois faz com que o prazer do diretor na contagem de mortos fique escancarado. Fosse o Lucio Fulci ou o Jörg Buttgereit na condução, eu acharia o resultado mais honesto. É um filme que tortura o espectador, quiçá de maneira intencional, a fim de evidenciar que o que está sendo narrado é doloroso, de modo que, ao final, condoemo-nos em relação aos destinos de quem sobrevive, naquelas condições, mas... Puxa, que perversidade. Que sanha cumulativa de malevolências. Detestei O IMPOSSÍVEL, senti algo parecido aqui. Admito que a trilha musical do Michael Giacchino é linda e que vários aspectos deste filme merece os prêmios que receberá, mas... A que custo emocional e moral, urgh! (WPC>)
Te estoy amando locamente
2.9 3Esforcei-me para focalizar nos aspectos positivos deste filme, mas o anacronismo da produção incomodou-me demais: o diretor deseja falar sobre o que o incomoda hodiernamente, com o lastro identitário igualmente contemporâneo, e sacrifica trechos da análise de época, ao implantar certos rompantes militantes, por mais que os justifique historicamente nos créditos finais. Gosto da sutil transformação de personalidade da mãe do protagonista, mas achei os personagens caricatos, sem carisma suficiente: as interpretações são boas, mas não desenvolvimento de alguns personagens. Mas amei o uso das canções 'kitsch' e emocionei-me nalgumas apresentações na boate. Serve? (WPC>)
Casa de Chá do Luar de Agosto
3.6 13Vasculhando a filmografia do diretor, percebi que não gosto dele. Por mais que, a partir de determinado momento, a trama (baseada numa peça teatral que, por sua vez, é baseada num romance) começa a zombar do comportamento paspalhão dos militares estadunidenses, a condescendência dos personagens (e/ou atores/figurantes) japoneses em relação ao colonialismo é de lascar: aquela abertura com o Marlon Brando nipônico (!!!) comemorando as vantagens das múltiplas ocupações em Okinawa é de dar nos nervos! Mas a entrada em cena do personagem de Eddie Albert dota o filme de uma insuspeita simpatia. Mas a conjuntura pró-empreitada comercial volta a dar o tom no desfecho, de modo que aquilo que surge como valorização comunal, em verdade, é elogiado apenas em seu potencial vendável, embebedador. Minha mãe curtiu... Comigo, simplesmente, não desceu! Quando descobri que o filme foi indicado a um Globo de Ouro de "Promoção do Entendimento Internacional", fiquei chocado: tadinha da Machiko Kyo! (WPC>)
NYAD
3.7 153Como os diretores são acostumados à linguagem televisiva de documentários sobre esportes, não possuem suficiente domínio nas seqüências de reconstituição ficcional, de modo que prejudicam a exibição da jornada de superação com muitos 'flashbacks' que são necessários enquanto denúncias e/ou componente formativo da personalidade da protagonista, mas que surgem de maneira dissonante na montagem. A fotografia de Claudio Miranda é linda, mais uma vez, e a trilha musical de Alexandre Desplat é bela e discreta. Mas são as interpretações femininas que mais chamam a atenção: Anette Bening, ótima na composição de um personagem difícil, porque não imediatamente simpática, e Jodie Foster sublime, roubando todas as cenas, ostentando a faceta "caminhoneira" que o finado Rubens Ewald Filho sempre reclamou: fiquei apaixonado pela determinação de sua personagem, que é abnegada, mas não apagada em função de outrem, mas sim defensora da plena comunhão de objetivos. O resultado geral é um tanto forçado, mas o desfecho e as cenas reais dos créditos finais emocionam! (WPC>)
Uma Viagem Pessoal pelo Cinema Americano
4.6 64Quanto mais revisto, melhor fica: uma aula magna de Cinema e uma demonstração extrema do carisma de Martin Scorsese, sempre muito carinhoso em relação aos títulos que comenta, mesmo aqueles que considera imperfeitos e/ou defeituosos. Suas escolhas são bastante reconhecíveis em suas obras e a justificativa para encerrar a "viagem" na década de 1960 é perfeita. Aprendi muito (re)vendo este documentário e utilizarei perpetuamente as terminologias utilizadas (a tese do "diretor enquanto contrabandista" tornou-se conceito dominante para a cinefilia). Magnífico!
* P.S.: apesar da excelência do recurso e da magistral inserção (numa montagem coordenada pela Thelma Schoonmaker), os depoimentos de grandes diretores meio que "quebram" o clima, não obstante reiterarem o que o Scorsese narrava. É que, em minha opinião, isso acrescenta um lastro objetivo ao que, desde o início, é definido como extremamente pessoal. Mas é apenas uma observação. Vou repassar este filme para o máximo possível de pessoas queridas: é soberbo! (WPC>)
Uma Segunda Chance para Amar
3.5 477 Assista AgoraPor algum motivo, não liguei o diretor à trama, quando o filme foi lançado. Minha mãe - que é obcecada por filmes de Natal! - estava vendo esta obra numa daquelas maratonas do canal Studio Universal e eu estranhei a inteligência dos diálogos (deliciosamente vulgares, às vezes). Esperei ser reprisado e, logo nos créditos iniciais, encontrei os nomes de Emma Thompson (inclusive, como produtora) e Michelle Yeoh. Não tinha como ser ruim! De fato, não foi: uma delícia de filme com uma protagonista muito bem-interpretada e um tanto mimada, que amadurece ao longo da proteção, junto com a simpatia que desperta no espectador. Henry Golding é a aparição ideal, em âmbito namoratório, e as situações são concomitantemente divertidas e emocionantes. Ri bastante, e adorei o uso "inspirador" das canções do George Michael. Uma gratíssima surpresa, quem diria! (WPC>)
Algo Muito Natural
3.4 10 Assista AgoraNão conhecia este diretor (obliterado por homônimos mais famosos) e achei o filme insuportável nos dois primeiros terços: o protagonista ex-monacal é um porre, um chantagista relacional que defende uma lógica de nicho que muito me incomoda. Para piorar, a sua contrapartida "liberal" é igualmente insuportável, o que torna difícil enfrentar as brigas repetitivas de casal. Mas adorei as inserções documentais da Parada do Orgulho Gay, bem como a ótima reviravolta do desfecho. Pena que, quando o filme começa a ficar bom, ele acaba! (WPC>)
Águia na Cabeça
2.7 8 Assista AgoraNunca o considerei um diretor memorável, mas este título sempre me fascinou. Quando encontrei o DVD à venda, num sêbo, fiz questão de o adquirir e já o vi, de imediato - e gostei muito de alguns aspectos. Na pressa por imitar os épicos hollywoodianos sobre máfia, de fato, roteiro e montagem se atropelam. mas os fatos são muito interessantes (não mudou muita coisa em quarenta anos, não é?) e o elenco é digno de uma superprodução: Nuno Leal Maia está incrivelmente competente, Zezé Motta e Chico Diaz estão maravilhosos, Jece Valadão demonstra a sua competência habitual como vilão, a metalinguagem da cena em que Jofre Soares assiste a BOCA DE OURO (1963) é ótima, e Wilson Grey e Maurício do Valle são coadjuvantes de luxo. E tem ainda mais gente para citar. Gostei dos rumos da trama, das traições acumuladas, do cuidado com os eventos (vide as situações relacionadas ao desfile de escola de samba, por exemplo). Parece uma minissérie compactada, às vezes, mas merecia ser mais conhecido do público! (WPC>)
Irmã Morte
3.1 123 Assista AgoraAcho o diretor um um interessante artesão de gênero, mas nada funciona neste filme: o ponto de partida é promissor, demonstrando que os horrores da Guerra Civil são ainda mais devastadores que qualquer manifestação sobrenatural, mas o roteiro desperdiça todas as boas idéias, tornando a definição da protagonista um nulidade. Além do ritmo moroso, a montagem com gritos e sustos que não provocam nenhuma reação desmotiva a adesão espectatorial, de modo que, ao final, não queremos ligar os óbvios pontos da reviravolta vingativa e sem o pretendido impacto. Achei péssimo! (WPC>)
Em Nossos Dias
3.7 4E ele faz de novo: num filme super básico, elementar, o diretor justifica e explica as recorrências de seus enredos, defende o aproveitamento da vida a partir do reconhecimento de que beber, comer, fumar e se divertir é o que faz tudo valer a pena, é o que atribui algum sentido á falta de sentido... Faltou somente um pouquinho de sexo (risos). O elenco é ótimo, e as reverberações de um dos contextos no outro é extraordinário, sendo que a atriz Kim Seung-Yun é um achado de extrema simpatia. impressionante como o diretor/roteirista/montador/fotógrafo/compositor consegue tornar climática a simples adição de tempero à comida. Maravilhoso! (WPC>)
Vampira Humanista Procura Suicida Voluntário
3.7 13A idéia sintetizada no título do filme é ótima, de modo que adorei o desfecho, mas achei o filme muito problemático em sua adesão irrereada às fórmulas vingativas de tantas comédias adolescentes hollywoodianas semelhantes. A protagonista é muito, muito chata (humanista? Ela está mais para chantagista e mimada mesmo!), mas os demais personagens são honestos em suas participações. Fofinho e equivocado, mas muitíssimo bem resolvido. (WPC>)
Beau Tem Medo
3.2 406 Assista AgoraCabrunco do céu, tem mais um cineasta lendo o meu diário: fiquei impressionado com as similaridades psicológicas em relação aos enfrentamentos de meu dia a dia - e gritei de identificação na seqüência das situações "impossivelmente semelhantes". Joaquin Phoenix está ótimo, como de praxe, e a direção é esplendorosa: que direção de arte, que controle das transições entre delírio e realidade! Lembra muito, evidentemente, as produções do Charlie Kaufman. E só não é uma obra-prima absoluta porque aquele desfecho julgamental soou-me autocondescendente. Mas adorei (e temi) me ver na tela desse jeito: se eu tivesse visto este filme na escuridão de uma sala de cinema, perigaria surtar, caramba! (WPC>)
Shin Kamen Rider
3.5 19 Assista AgoraOs elogios, por parte de amigos, eram exacerbados e os meus contatos prévios com obras do diretor foram sempre bem recompensados. Percebi isso desde o início: o poder de evocação das palavras, neste filme, é magistral: basta que algum personagem mencione algo e, de repente, tudo no enredo orbita em função desse algo. Ensina às irmãs Wachowski como se cria um universidade de existencialismo rasteiro mas pungente. Efeitos visuais mui competentes e figurinos maravilhosos: amei os vilões animalescos! O segundo motoqueiro é um tesãozinho, aliás. Muito, muito bom. Exagerado e repetitivo, como eram os melhores seriados de cariz 'tokusatsu', mas tão empolgante quanto. Só achei que cai um pouco do ritmo no quartel final, mas já era tarde: eu estava fisgado! (WPC>)
Rustin
3.3 81 Assista AgoraAdentrei a sessão com expectativas baixíssimas: além de ter ouvido falar muito mal sobre este filme, tenho poucas esperanças nas cinebiografias em tom chapa-branca. Mas este filme apresenta-nos a alguém muito relevante, obliterado historicamente por conta de seu homossexualismo. Achei a personificação de Colman Domingo exagerada, mas, pelos diálogos, parece que o Bayard Rustin era afetado daquele jeito mesmo. Serviu, portanto. Porém, a melhor presença em cena, sem dúvida, é a de CCH Pounder: amei descobrir que era ela, uma enorme atriz ainda subvalorizada. É convencional, claro, mas competente em seus clichês. Curti! (WPC>)
Folhas de Outono
3.8 99Suprassumo do romance (e da persistência proletária), com acenos maravilhosas à cinefilia: a cena que devolve o afeto do diretor ao Jim Jarmusch é magnífica! Dono de um universo muito próprio, Aki dialoga com o seu próprio cinema, evocando tanto uma trilogia excelente quanto UM HOMEM SEM PASSADO. A fotografia é primorosa, bem como a escolha das canções. Amei o cachorrinho, e torci muito para que o namoro desse certo - e, de quebra, ainda há uma reflexão poderosa sobre o enfrentamento do alcoolismo. Os personagens são fabulosos (amei as interpretações bressonianas!) e, a despeito do tom cômico dominante, há inserções dramáticas intensas, entre um e outro momento de fofura. Soberbo! (WPC>)
A Memória Infinita
4.0 43Como tanto, amei e fiquei pessoalmente tocado por AGENTE DUPLO, de modo que adentrei a sessão com múltiplas expectativas. O ponto de partida sinóptico e a relevância dos personagens reais referendou a minha entrega prévia: não sabia que o Augusto Góngora havia trabalhado com o Raúl Ruiz - e a cena em que eles se entrevistas mutuamente é magnífica! Inteligente e organicamente politizada que é, a diretora (em comunhão plena com o casal) tece magistrais paralelismos entre as lembranças íntimas e a memória coletiva, entre a necessidade de lembrar (por causa do Alzheimer) e o imperativo de que não se esqueça (em razão do terror ditatorial no Chile). Um filme grandioso em múltiplos aspectos, que, só não é mais potente, porque foi obrigado a confinar-se, na época da quarentena pandêmica. Por razões óbvias, em dados instantes, o enredo documental torna-se repetitivo, iterativo, ainda que urgente no esforço pela manutenção compartilhada daquilo que aconteceu e segue deixando marcas. Amei o uso das canções na trilha sonora e emocionei-me bastante (vide a cena em que o Augusto chora quando teme ficar sem os seus livros). Mas, cinematograficamente, fica um tanto aquém da maravilha anterior; em âmbito afetivo, entretanto, merece ser difundido, elogiado e debatido. Ótimo! (WPC>)
Eu, Capitão
4.0 70 Assista AgoraLogo no começo, estranhei o modo como os personagens eram retratados: não na naturalidade de seu cotidiano, mas num destaque espetaculoso, afinal justificado pelo fato de os meninos serem compositores, a mãe dançarina, etc... Mas, depois que o périplo ocorre, comecei a incomodar-me ainda mais: pensei muito nas acusações sofridas pelo Steven Spielberg quanto começou a realizar filmes mais "sérios" (e a cena da "mulher que voa" evoca diretamente IMPÉRIO DO SOL). Quanto mais o filme avançava, mais problemática ficava a abordagem da 'torture porn', ainda que necessária aos intentos narrativos. Era óbvio que isso culminaria no triunfalismo "justificado" do trecho final, em que o título faz sentido, em que o protagonista cumpre a sua missão enquanto personagem amadurecido e heroicizado. Tenho elogios pontuais a diversos aspectos do filme, tão bem-feito quanto uma discreta superprodução hollywoodiana, mas a minha relação com o discurso e com o que ele representa politicamente não é das melhores: é um filme que engabela, muito mais do que exorta a coragem dos jovens senegaleses. Permanecerei encarando este filme com desconfiança... (WPC>)
Priscilla
3.4 161 Assista AgoraSou fã da diretora, obcecada por detalhes e rotinas, mas fiquei tão decepcionado com a sua péssima regravação para O ESTRANHO QUE NÓS AMAMOS, que nem tive coragem ainda de enfrentar ON THE ROCKS. Aqui, adentrei a sessão desconfiado, mas fui logo tragado pela excelente ambientação, pelo uso mágico da trilha cancional (não ter sido autorizada a utilizar os clássicos do Elvis Presley permitiu à diretora uma criatividade absurda na seleção musical!): por mais questionável que seja a aproximação entre o cantor e a adolescente, o roteiro consegue driblar o mal-estar ao enfatizar justamente outro mal-estar, o do extremo confinamento. Em suas opções camerísticas, o filme funciona como uma versão contemporânea de À MEIA-LUZ, ressaltando a divergência de compleições físicas e impacto social entre os personagens. Cailee Spaeny está eficiente, não questiono a sua premiação, mas é, em minha opinião, Jacob Elordi quem brilha: além de estar muito diferente de tipos anteriores que ele vivificou, sua interpretação não é imitativa, de modo que conseguimos acreditar no Elvis tramático. Até porque ele não é o protagonista, mas um ser coadjuvante porém ubíquo em seu potencial de opressão: fiquei impactado com o plano dos revólveres combinando com os vestidos, por exemplo. Fetichista e obsessivo-compulsiva, a diretora faz maravilhas com a montagem, ao ressaltar o caráter cíclico porém cerrado da rotina da personagem-título, cultivada em Graceland como um bibelô. E o desfecho é nada menos que magnífico: lembrarei para sempre de como a canção escolhida combinou magistralmente com o contexto. Lindamente triste, fascinante como a diretora nos treinou a esperar dela: a-do-rei! (WPC>)